Acórdão nº 4337/12.8TJCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução19 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A... , Ldª”, com sede na Rua (...) Coimbra, instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo sumário (hoje, comum), contra B... , Ldª, com sede na Rua (...) Lisboa, pedindo que a R. seja condenada: a) a reparar imediatamente e a entregar à autora o equipamento IPL D-Light em perfeito estado de funcionamento, com as garantias devidas; ou, em alternativa, na impossibilidade da entrega do equipamento devidamente reparado, deve a ré entregar à autora um aparelho novo; b) a pagar à autora a quantia de € 100 diários, a título de compensação desde a citação até a entrega do equipamento em condições de funcionamento; c) a pagar à autora, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos pelo atraso na reparação do equipamento, a quantia de € 20.836,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa legal, até efectivo e integral pagamento.

Alegou, em síntese, que tem como escopo, entre outros, a prestação de serviços de tratamentos para o corpo, de estética, beleza e bem-estar, essencialmente tratamentos de depilação com recurso a luz pulsada; sendo a R. representante e distribuidora de produtos e equipamentos para estética médica, cosmética e dermocosmética.

Assim, no âmbito de tais actividades, solicitou à R., em Outubro de 2010, a reparação de um seu equipamento de depilação; tendo a R. avaliado os danos do equipamento e efectuado o respectivo relatório técnico de reparação e apresentado orçamento, que a A. aceitou, tendo de pagar – o que a A. fez – 50% do valor orçamentado para que a R. iniciasse a reparação.

Sucede que a R. ainda não procedeu à reparação, não obstante os contactos e solicitações da A..

A A. assentava a maior parte da sua facturação nos serviços prestados com a utilização de tal equipamento de depilação; pelo que, sem o mesma, teve avultados prejuízos e perdeu de clientes, a ponto de ter deixado de ter dinheiro para cobrir as suas despesas, vendo-se obrigada, em Março de 2012, a entregar a loja (onde se situava o seu estabelecimento comercial) e a encerrar a sua actividade comercial.

A R. apresentou contestação.

Alegou que o equipamento em causa já se encontra reparado há muito tempo; reparação de que deu conta à A., solicitando os restantes 50% do preço acordado.

Impugnou, quer no seu montante, quer na sua existência, quer na sua (da R.) responsabilidade, os prejuízos invocados pela A..

Reconvencionou, pedindo que a A. seja condenada a pagar-lhe (os 50% restantes do preço da reparação) a quantia de € 2.300,00, acrescida de juros à taxa legal, desde a notificação da reconvenção, até efectivo e integral pagamento, e a quantia de € 5,00 por cada dia de armazenamento do equipamento.

A A. respondeu, opondo-se à reconvenção e mantendo o alegado na PI.

Foi proferido despacho saneador – em que foi declarada a total regularidade da instância, estado em que se mantém – identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Após o que, realizada a audiência, a Exma. Juíza proferiu sentença, concluindo a sua decisão do seguinte modo: “ (…) julga-se a presente acção improcedente e, em consequência, absolve-se a ré dos pedidos contra si formulados pela autora; julga-se parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência, condena-se a autora a liquidar a quantia de € 2.300,00, acrescida de juros à taxa legal, desde a citação da reconvenção até efectivo e integral pagamento; no mais, absolve-se a autora do pedido reconvencional. (…)” Inconformada com tal decisão, interpôs a A. recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por decisão que revogue/inverta o decidido, julgando procedente a acção e improcedente a reconvenção.

Terminou ou a sua alegação com longas conclusões – ao arrepio da “forma sintética” exigida pelo art. 639.º/1 do NCPC – e que aqui não transcrevemos por tal motivo.

Não foi apresentada qualquer resposta.

Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

* II – “Reapreciação” da decisão de facto Por causa da sua extensão (6 páginas), não procedemos, como acabámos de escrever, à transcrição das conclusões da A/apelante.

A extensão das conclusões da A/apelante – ao arrepio da “forma sintética” exigida pelo art. 639.º/1 do CPC – é, porém, no caso, uma imperfeição menor.

É que a A/apelante, em vez de concluir pelos fundamentos por que pede a alteração da decisão (como se refere no art. 639.º/1 do CPC), procede, nas conclusões recursivas, como se estivesse a intentar uma acção: nas 42 primeiras conclusões parece que está numa PI, a intentar uma acção (começa pela aquisição do equipamento em 21/02/2007, vai por aí adiante, fala da avaria, dos prejuízos e diz coisas que nunca antes foram ditas nos autos); e na 43.ª e última conclusão diz que “a Mmª Juíza fez uma errónea interpretação da prova produzida em julgamento, qualificou mal os factos ocorridos e, com a sua decisão, violou os art. 777.º, 798.º, 799.º,800.º, 804.º e 805.º, todos do C. Civil.

”.

Ou seja, a A/apelante, nas conclusões alegatórias, acaba por só dizer coisas desnecessárias e omite aquilo que a lei processual impõe que seja feito e dito.

Repare-se bem: Percebe-se do corpo das alegações, que a A/apelante quer impugnar a decisão relativa à matéria de facto, porém, em momento algum das suas 43 conclusões, diz qual ou quais foram os factos mal julgados e a decisão que sobre os mesmo deve ser proferida.

Como já se referiu, as conclusões recursivas mais parecem a alegação que é efectuada numa PI, ou seja, a A/apelante usou as conclusões para alegar toda a facticidade do litígio, ali reunindo os factos que estão provados (na sentença recorrida), os factos que não estão provados, os factos mera e remotamente instrumentais e os factos sem o menor relevo jurídico.

Mas, com todo o respeito, formular conclusões recursivas[1] – que constituem a delimitação objectiva dum recurso (cfr. art. 635.º/4 do CPC) – é tudo menos o que a A/apelante fez.

Se um recorrente discorda da algum ponto da decisão relativa à matéria de facto e a quer impugnar basta seguir/cumprir o que diz o art. 640.º do CPC; ou seja, deve, sob pena de rejeição, especificar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, indicar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem decisão diversa, e dizer, ainda, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Nada disto consta das conclusões da A/apelante; foi feito algum esforço, reconhece-se, ao longo do corpo da alegação – referenciando-se passagens da gravação e manifestando-se divergências com pontos de facto da sentença recorrida – mas não se soube formular as devidas conclusões, acabando-se, na conclusão 43.ª, a dizer, tão só e genericamente, que se fez uma errónea interpretação da prova produzida em julgamento, parecendo laborar-se no erro de pensar que bastará uma pedido global e genérico para meter a Relação a reapreciar a prova – porventura até toda a prova – produzida em 1.ª Instância.

Não é, porém, assim; uma vez que os art. 662.º e 640.º do CPC impõem aos recorrentes que pretendam a reapreciação da prova por parte da Relação que fundamentem a sua discordância em relação ao decidido na 1.ª Instância...

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