Acórdão nº 93/13.0TBCLB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelCATARINA GON
Data da Resolução16 de Dezembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

A..., Ldª, com sede na Rua (...) , Celorico da Beira, intentou a presente acção contra B... , Ldª, com sede na Rua (...) , Guimarães, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de 7.817,32€ acrescida de juros, à taxa de 4%, desde a citação e até pagamento.

Alega, para fundamentar a sua pretensão, que: a Ré, em 15-12-2011, deu entrada a um requerimento de injunção contra a Autora, invocando que forneceu a esta materiais e serviços conforme facturas que indicou, fazendo constar desse requerimento a quantia de 5.369,36€ referente às facturas, mais 449,25€ referentes a juros de mora e 102,00€ relativos a taxa de justiça, no total de 5.930,61€; a Autora não contestou o teor desse requerimento de injunção, porque não estava inteirada da sua força executiva e porque, de qualquer modo, tinha a convicção de que, se a Ré avançasse com o requerimento executivo sempre lhe poderia deduzir oposição; todavia, uma vez instaurada a execução, a oposição que a Autora lhe deduziu foi indeferida liminarmente, razão pela qual acabou por pagar a quantia de 7.817,32€ correspondente ao total que, conforme indicação do Agente de Execução, estava em dívida; a verdade é que não devia à Ré o valor correspondente às aludidas facturas, já que algumas das facturas indicadas nunca foram juntas ao processo e a Autora desconhece o seu conteúdo e outras facturas reportam-se ao fornecimento de um computador, respectiva montagem e diversas deslocações devido a constantes avarias desse equipamento que nunca funcionou e que colocou à disposição da Ré por não corresponder ao que havia comprado, o mesmo acontecendo com outro material que a Ré lhe vendeu como sendo novo e que, por não o ser e não funcionar, está à sua disposição; assim, ao receber a quantia constante do aludido processo executivo, a Ré obteve um enriquecimento ilegítimo à custa da Autora.

A Ré contestou, invocando a excepção de caso julgado – face à oposição que a Autora deduziu à execução que lhe foi movida – e, impugnando os factos alegados, alega, em suma, ter fornecido à Autora os bens e serviços descritos nas facturas que fundamentaram o requerimento de injunção e que a Ré aceitou sem reservas, mais invocando a excepção de caducidade porquanto a Autora nunca lhe denunciou qualquer defeito dos bens ou serviços que lhe prestou.

Conclui pedindo a procedência das excepções que invocou ou a improcedência da acção, bem como a condenação da Autora, como litigante de má-fé, em multa e indemnização a seu favor de valor não inferior a 3.500,00€.

A Autora respondeu, sustentando a improcedência das excepções, concluindo como na petição inicial e pedindo a condenação da Ré, por litigância de má-fé, em multa e indemnização a seu favor de valor não inferior a 5.000,00€.

Findos os articulados, foi proferido despacho saneador, julgando-se improcedente a excepção de caso julgado e relegando-se para final a apreciação da excepção de caducidade.

Foi definido o objecto do litígio e foram delimitados os temas da prova.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a Ré do pedido e condenou a Autora, como litigante de má-fé, na multa de três UC e em indemnização, a pagar à Ré, correspondente ao reembolso de todas as despesas a que a má-fé a tenha obrigado e em valor a fixar posteriormente após cumprimento do disposto no art. 543º, nº2, do CPC.

Inconformada com tal decisão, a Autora veio interpor o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: 1ª –Na sentença recorrida refere-se que os depoimentos das várias (três) testemunhas indicadas pela Ré merecem a total credibilidade do Tribunal, assumindo importante papel no processo de formação da convicção do Tribunal, ao contrário dos depoimentos das testemunhas (duas) arroladas pela Autora de molde a convencer o Tribunal, não lhes conferindo o Tribunal qualquer credibilidade.

  1. – Há aqui uma certa precipitação ou equívoco, sendo que as testemunhas da Ré, uma é sua sócia, a outra é o marido dessa sócia e a última seu empregado, ao passo que as da Autora, uma é seu empregado em “par-time” e a outra é um técnico que dá apoio informático à Autora e depuseram sobre factos dos quais tinham conhecimento direto.

  2. –A testemunha empregado da Ré, C... , como se refere na sentença, tendo-lhe sido facultadas todas as faturas (oito) que analisou, afirmou que executou todos os trabalhos a que essas faturas se reportam , incluindo os extintores, explicando de forma circunstanciada cada um dos serviços prestados.

  3. - Só que em metade das faturas – quatro últimas – quem executou todos os trabalho e prestou os serviços foram outros técnicos da Ré – técnico F... e técnico G... , respetivamente, como se verifica nos documentos juntos aos autos e atrás referidos.

  4. - Conclui-se, claramente, que esta testemunha fundamental da Ré, C... , mais experimentada, faltou à verdade e conseguiu eludir e induzir em erro o Tribunal que lhe deu total credibilidade; - a sua pretensa credibilidade ficou ao descoberto e nada se pode aproveitar de quem convictamente não tem respeito pela verdade como foi o caso.

  5. - Quanto às testemunhas da Autora a quem se não deu credibilidade, a testemunha H... constatou as avarias e foi claro quanto aos extintores, referenciados nos docs. acima mencionados.

  6. - A outra testemunha, D... , a quem também se não deu crédito, verificou que não foi entregue computador novo algum, antes foi colocado um antigo e obsoleto e foi necessário retirar peças (placa de portas, placa de rede e placa COB+FIB) de um computador do sócio da Autora para o outro antigo, o que foi confirmado através desses mesmos documentos e do relatório de assistência técnicas da ré (doc.18-fls.71).

  7. – Daqui se conclui que as testemunhas da Autora é que são as credíveis e, dada a evidência dos factos, deve alterar-se a prova da matéria de facto dando-se como não provados os factos que constam dos pontos 9. e 10. a 14. e como provados os factos que constam de a), b), c), e), f), g) e j) da fundamentação de facto da sentença.

  8. - De salientar ainda o teor das faturas juntas pela Ré – Docs.5 a 12, fls. 54 a 61 – onde de verifica o “custo” das deslocações da sede da Ré em Guimarães às bombas da Autora em Celorico da Beira, cujo custo varia entre os 20,00€ mais IVA e, pasme-se, os 660,00€ mais IVA.

  9. -- De igual modo são lançadas despesas de mão de obra, como sucede na fatura 112524 (fls.61) da montagem de computador no valor de 900,00€ mais IVA, quando nem sequer houve montagem alguma como se conclui de ficha técnica nº 1762 (fls.71).

  10. - Na fatura nº 900818 (fla.58) foram debitadas Placas no valor de 45,00€ e de 870,00€ mais IVA quando essas placas foram retiradas da CPU da cliente (Autora), como se verifica no doc.18 de fls.71.

  11. - Foi debitado o CPU TOKHEIM por 1.100,00€ na fatura 112524, fls.61 quando esse CPU nem sequer foi entregue, tendo ficado um antiquado, emprestado pela Ré, como se verifica da ficha de assistência técnica 1762, fls. 171.

  12. – As faturas juntas pela Ré estão viciadas, contendo valores irreais com o objetivo de obter da Autora quantias completamente indevidas.

  13. – A Ré atuou nesta parte das faturas, sem clareza e com má fé, como aconteceu quando em 2010 solicitou à Autora que carimbasse e assinasse nota de crédito (doc.1 junto com a petição) o que originou “confusão” de contas à Autora, sobretudo depois de lhe terem solicitado a devolução de todas as faturas dando-as como pagas e só restando 562,72€ que a Autora pagou conforme recibo de 1-6-2011.

  14. – A Ré não fez prova de que a Autora lhe tivesse ficado em dívida, tanto assim que as faturas contêm a grande parte daquilo que se diz em dívida e que, de facto não existe, provando-se até o contrário.

  15. – A Ré intentou no Balcão Nacional de Injunções, o requerimento injuntivo que consta dos autos contra a Autora, com base em tais faturas sem conter o valor de cada uma e sem juntar fatura alguma.

  16. – A Autora não contestou porque, para além de outras razões que referiu, não lhe foram entregues as faturas para poderem, ser devidamente analisadas e, como se disse, contêm na sua grande maioria valores inexistentes e irreais.

  17. – Apesar destas falhas, essenciais, foi aposta a fórmula executiva ao requerimento de injunção, tendo sido intentada a execução e tendo a Autora deduzido Oposição, surpreendentemente indeferida liminarmente.

  18. –Porque a Autora , no seguimento do processo executivo, viu os seus bens penhorados, pagou à Ré o que lhe foi exigido(e não devido) no total de 7.717,32€.

  19. – A Autora ficou, consequentemente, privada desta quantia que foi indevidamente entregue à Ré que locupletou à custa da Autora.

  20. -- A M.ma Juiz a quo pronunciou-se sobre questões que não devia apreciar e conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, violando-se na sentença recorrida, nomeadamente o disposto no artº 615º, nº 1-d) do C.P.Cv. e artºs 334º,473º e segs. do C.Civil.

-- Deve, assim, dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e dando-se a ação como provada e procedente, com custas e demais encargos pela recorrida.

Não foram apresentadas contra-alegações.

///// II.

Questões a apreciar: Atendendo às conclusões das alegações da Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir: • Saber se – caso estejam reunidos os pressupostos necessários para a apreciação dessa matéria – existiu erro na apreciação da prova e se, em função desse erro, importa ou não alterar – e em que termos – a decisão proferida sobre a matéria de facto; • Saber se, perante a matéria de facto – eventualmente alterada na sequência da apreciação da questão anterior – estão reunidos os pressupostos legais de que depende o funcionamento do instituto do enriquecimento sem causa, com vista a saber se a Ré deve ou não ser obrigada a restituir à Autora o valor que esta lhe pagou no âmbito de uma execução que aquela...

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