Acórdão nº 2939/14.7T8CBR-F.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução20 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - A Causa: I (…), executada nos autos do processo à margem identificado, não se conformando com a despacho proferido em 21 de Dezembro de 2016, veio dele interpor Recurso de Apelação, alegando e concluindo que:

  1. O presente recurso restringe-se à apreciação da matéria de direito de despacho de dia 21-12-2016, no qual se concluiu por: ”indeferir o pedido de suspensão da execução e o diferimento da desocupação por manifestamente improcedentes (cfr. Artigo 865.º n.º 1 alínea c) do C.P.C)”.

  2. Salvo o devido respeito, que é muito, a ora Apelante não se conforma com a decisão proferida entendendo padecer a mesma de vicio de nulidade. E mesmo que assim não se entendesse, outra deveria ter sido a sentença a proferir prelo Tribunal a quo, que atenda às circunstâncias descritas pela Executada e em que sejam salvaguardados os direitos desta, revogando-se o referido despacho.

  3. Na verdade o despacho do Tribunal a quo refere que a executada requer a suspensão da diligência de entrega de imóvel adjudicado à exequente, com fundamento no disposto no artigo 863.º do C.P.C, reproduzindo o competente despacho a norma citada, e concluindo que: “ Todavia a Executada I... não apresentou qualquer atestado médico que indicasse, fundadamente, que a diligência de entrega colocava em risco de vida a sua mãe e o prazo durante o qual a execução deveria ser suspensa.” D) Ora e salvo devido respeito, tal argumentação não pode aceitar-se, desde logo, em 23 de Setembro de 2016 procedeu a Executada a entrega de competente relatório médico no qual se descrevia a situação clinica da mãe da Executada, bem como e face à contestação apresentada pela Exequente solicitou a Executada através de requerimento datado de 28 de novembro de 2016, a notificação do Hospital Distrital da Figueira da Foz para que remetesse informação do quadro clinico desta de forma que não subsistissem duvidas sobre a situação clinica alegada.

  4. Ao que o Tribunal a quo não respondeu, nem admitindo, nem rejeitando a referida diligência de prova, omitindo assim a sua pronúncia, mantendo-se a referida omissão pelo presente despacho. Pelo que é nulo por falta de pronúncia o despacho que não admite nem rejeita a realização de determinada diligência probatória, não se pronuncia nem fundamenta a razão de oposição à realização dessa diligência.

  5. Pelo que padece o presente despacho de nulidade por omissão de pronúncia sobre questão que o tribunal devia apreciar, prevista na alínea d) do nº 1 do art. 615º do CP.C. : De acordo com este preceito, temos que a sentença (ou despacho) é nula “Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento»; tal normativo está em consonância com o comando do nº 2 do art. 608º, no qual se prescreve que «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras». No requerimento em que requereu a realização da diligência probatória em causa, alegou o recorrente motivos para a referida diligência. Ora, no despacho recorrido a Sr.ª Juíza não se pronunciou sobre essa matéria, como devia, pois tratava-se de uma verdadeira questão. O despacho recorrido está, assim, ferido de nulidade por não se ter pronunciado sobre questão que devia apreciar.

  6. Por outro lado, o tribunal a quo ao proferir o presente despacho e reproduzir a norma do artigo 864.º do CPC não atentou às circunstâncias alegadas, a doença da mãe da Executada, não procurou inteirar-se das razões invocadas pela Executada. Assim teme a Executada que a diligência de desocupação da habitação ponha em sério risco de vida a mãe desta, dada a sua saúde débil e confronto com o facto de se ver despejada juntamente com a sua filha e seus netos. Deve ainda dizer-se que, tal como resulta do exposto no nº 4 do citado artigo 864.º do C.P.C, uma vez na posse e análise de tais elementos o juiz deverá depois decidir norteado por princípios de equidade, tomando sempre em consideração, sopesando-os, os vários interesses conflituantes em jogo, tais como, por um lado, a preservação da saúde e da vida da pessoa doente, e, por outro lado, o direito de propriedade privada do executor, conexiado com os prejuízos patrimoniais advenientes para o mesmo com tal situação, e bem assim ainda as demais circunstâncias concretas que no caso se façam sentir.

  7. Ou seja, e no dizer dos profs. Pires de Lima e A. Varela (in “Código Civil Anotado, Vol. I, págs. 55”), a correspondente decisão judicial a tomar depois deverá subordinar-se, não tanto aos critérios normativos fixados na lei, mas antes dar tributo a razões de conveniência e de oportunidade, principalmente de justiça concreta, em que a equidade se funda.

  8. No que concerne ao último requisito acima referido, referente à exigência formulada no texto de que o atestado médico indique «o prazo durante o qual deve sustar-se o despejo», perfilhamos o entendimento do conselheiro Aragão Seia (in “Ob. cit., pág. 400”) quando opina que tal expressão do legislador não terá sido, porventura, a mais feliz, devendo antes ser entendida “com o sentido de prazo provável de duração da crise que a suspensão reclama”. Exigência essa que deve ser igualmente entendida tão somente “como manifestação de compromisso e seriedade que o certificado médico deve revestir e não como directiva em comando a que o tribunal deva acato. (...) Basta, pois, que se indique a duração provável da crise ainda que por simples menção às características da doença e a sua normal evolução de que a duração se infira”.

  9. Pelo que, e reportando-nos, mais de perto, ao caso em apreciação, da matéria factual alegada, é, desde logo, possível concluir que a doença de que padece a mãe da executada é aguda (veja-se relatório médico), como inclusive tal doença é de carácter crónico. Por outro lado, de tal matéria factual é possível concluir-se que tal doença ponha em real risco a vida do aludido doente, no caso de o mesmo ser mudado da habitação em que atualmente vive e que se pretende despejar. Não foi este o entendimento seguido pelo presente despacho que sem mais desconsiderou que não foi junto atestado medico que indicasse o prazo durante a qual a execução deveria ser suspensa. Ora é natural que atestado médico não indica o tempo em que se deve sustara execução, ou sequer o tempo provável de duração da alegada crise. E aqui percebesse bem tal omissão, já que, tratando-se de doença de carácter crónico, não faria sentido tal indicação. Exigência de indicação, essa que pressupõe necessariamente que a crise do doente seja provisória ou limitada no tempo, o que, como vimos, não sucede no caso.

  10. Concluindo a referida sentença nos seguintes termos, “ In casu a Executada foi citada em Maio de 2001, tal como resulta de fls. 26 a 28, do processo em papel, pelo que o prazo para deduzir oposição à execução, e em simultâneo, o diferimento da desocupação terminou há muito. Sendo que inicio da execução não colide com os factos ora trazidos, nem com os factos que sustentam o diferimento da desocupação requerido. Assim e atendendo ao alegado pela ora apelante no seu requerimento, a mesma requeria a referida suspensão da execução, na medida em que, não detinha condições económicas que lhe permitissem o realojamento através de recurso a arrendamento, sendo certo que a mesma tem dois filhos a seu encargo sendo um deles ainda menor, bem como a sua progenitora que padece de doença grave sendo que a referida diligência porá em risco a sua vida.

  11. Pelo que, e voltando ao caso dos autos no nosso entender foram carreados elementos e alegados factos suficientes para que fosse arbitrada a referida suspensão e consequente deferimento da desocupação por um período não superior a 5 meses, Foi demonstrado que na habitação principal a Executada reside com a sua filha menor A... e filho maior B... , bem como com sua progenitora C... com 76 anos de idade. Subsistindo a Executada de uma pensão de sobrevivência no valor de 223,81 € , sendo com este valor que provê diariamente pela alimentação, vestuário e todas despesas inerentes à educação dos seus filhos, designadamente as referentes à sua filha menor que reside consigo ininterruptamente, e que é estudante. Para alem do filho maior aos fins de semana e a sua progenitora que padecendo de estado de saúde frágil, sofrendo de diversas patologias, designadamente foro cardíaco, M) Entendendo a Apelante que a concreta diligência de entrega coerciva e desocupação não pode fazer-se sem que se verifiquem as circunstâncias previstas na lei, que a título excecional concedem especial protecção quando esteja em causa a habitação principal do Executado.

  12. Assim e verificadas que sejam sérias dificuldades de realojamento, deve-se suspender a diligência de entrega coerciva, pelo que as referidas dificuldades da executada foram convenientemente apontadas por esta em sede de requerimento, pelo que deveria ter sido outra a decisão proferida, e não o indeferimento liminar conforme se produziu, sem aquilatar as concretas circunstâncias da Executada, sem atender à frágil situação económica e financeira do agregado familiar da Executada, que justificaria que a entrega do imóvel fosse diferida.

  13. Uma vez que não se trata de suspender a execução, mas sim de suspender a concreta diligência de entrega coerciva, sendo que a mesma estaria sempre limitada no tempo. Nem se pretende que a suspensão da diligência seja ad eternum, mas tão só que permita que a sociedade – o Estado, as instituições do Estado, as instituições governamentais – consigam o realojamento do cidadão que, de outro...

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