Acórdão nº 5986/14.5T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | LU |
Data da Resolução | 24 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO A (…) e M (…) residentes na (...) , em Coimbra, instauraram contra “O (…) LDA.
”, com sede em Rua (...) , em Coimbra, acção declarativa, com processo comum, pedindo a respectiva condenação no pagamento de € 15.223,85.
Invocaram, para o efeito, que são donos e legítimos proprietários de um prédio urbano, por si identificado; por contrato de arrendamento celebrado em 01 de Agosto de 2012, deram de arrendamento à “L (…), S.A.”, o supra citado prédio, mediante o pagamento da renda mensal de € 1.500,00; as rendas respeitantes aos meses de Fevereiro e seguintes de 2014 e que se computam no montante de € 13.500,00 não foram pagas; em 14 de Janeiro de 2014, foi constituída a sociedade ora Ré, tendo como gerente a mesma pessoa com que os ora Autores haviam celebrado o contrato de arrendamento supra referido na qualidade de legal representante da “L (…) S.A.”, tendo como sede social o locado; os Autores ficaram convencidos de que o estabelecimento explorado no locado por aquela sociedade fora transmitido à ora Ré, incluindo a posição contratual no contrato de arrendamento, tanto mais que os produtos comercializados no estabelecimento eram os mesmos e o objecto do estabelecimento permanecia inalterado, assim como permaneceu inalterada a sua designação comercial “ K (...) ”; em 28 de Agosto de 2014, os Autores depararam-se com o encerramento do estabelecimento comercial que laborava no locado e a indicação de que o mesmo se havia deslocado para outra morada e com outra designação; na nova morada labora um estabelecimento comercial com os mesmos produtos e objecto da ora Ré, embora com a designação de “R (...) ’’ e por ela explorado; entre Fevereiro a Agosto de 2014, foi a Ré que no locado explorou o seu estabelecimento; com a limpeza do armazém e substituição de mosaicos danificados, os AA. despenderam o valor de € 1.216,88; com a substituição das fechaduras do locado, os AA. despenderam o valor de € 222,25, porquanto o locado foi alvo de arrombamento, por desconhecidos, enquanto ainda se encontrava em posse dos arrendatários.
* Regularmente citada, a R. contestou, por impugnação, pugnando pela improcedência da acção e pedindo a condenação dos AA. como litigantes de má-fé.
Invocou, em suma, que os Autores bem sabem que a arrendatária era a Massa Insolvente da B (…) representada pelo Administrador de Insolvência Dr. (…); os AA., em Notificação Judicial Avulsa (NJA), vieram requerer as rendas à insolvente, requereram a resolução do contrato e reclamaram créditos; na NJA, os Autores pedem as rendas de Fevereiro, Março e Abril de 2014, mais as de Maio, Junho e Julho de 2014, posteriores à declaração de insolvência (11.03.2014); os AA. omitiram que a arrendatária foi declarada insolvente e que pediram as rendas à insolvente, através de reclamação de créditos no processo de insolvência; omitem que resolveram o contrato com a insolvente e alegam agora um pretenso trespasse em contradição com o que anteriormente, judicialmente requereram, nomeadamente quanto a rendas e resolução do contrato totalmente incompatível com o que agora requerem; por outro lado, procederam ao arresto de bens da Ré no montante de € 15.000,00, tendo logo sido advertidos de que bem sabiam que quem devia era a massa insolvente da B (…) * Teve lugar audiência prévia, na qual se frustrou a tentativa de conciliação, se proferiu despacho saneador, se fixou o objecto do litígio, seleccionaram os temas da prova e admitiram os meios de prova (fls. 94 e ss.).
Teve por fim lugar a realização da audiência, com observância do legal formalismo, como se alcança da respectiva ata.
* Na sentença, considerou-se, em suma, que face à factualidade apurada, importava concluir no sentido de que foi a Ré (e não a primitiva locatária) que entre Fevereiro e Agosto de 2014 explorou o estabelecimento comercial sito no locado, pelo que, ainda que não se tivesse apurado a que título é que tal ocorreu, na linha do melhor entendimento doutrinal e jurisprudencial, têm os AA., enquanto proprietários de tal locado, direito a ser indemnizados por essa Ré que se intrometeu na utilização dos seus bens, o que configura um enriquecimento por intervenção da dita Ré, sendo as regras aplicáveis as do enriquecimento sem causa, donde se ter reconhecido que esta tinha que pagar aos AA. o valor correspondente à renda em causa pelos ditos 6 meses de utilização do imóvel, o que ascende a € 9.000,00, mas já improcediam os demais valores indemnizatórios peticionados, o que tudo se traduziu no seguinte concreto “dispositivo”: «Face ao exposto julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e consequentemente, condeno a Ré O (…), LDA a pagar aos Autores a quantia de € 9.000,00 (nove mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento.
Custas por A e R., na proporção do decaimento.
Registe e notifique.» * Inconformada com essa sentença, apresentou a Ré recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) * Contra-alegaram os AA., relativamente ao que formularam as seguintes conclusões: (….) * Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
* 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela Ré nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4, 636º, nº2 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detetar o seguinte: - erro na decisão da matéria de facto, por contradição e falta de prova relativamente à factualidade constante dos factos “provados” sob os pontos “5.”, “6.” e “8.”, os quais deviam figurar entre os factos “não provados”; - incorreto julgamento de direito no que respeita à condenação com base no instituto do enriquecimento sem causa, nomeadamente (mas não só) por “violação dos princípios orientadores da Causa de Pedir, do Pedido e do contraditório”.
* 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 3.1 – Como ponto de partida, e tendo em vista o conhecimento dos factos, cumpre começar desde logo por enunciar o elenco factual que foi considerado fixado/provado pelo tribunal a quo, ao que se seguirá o elenco dos factos que o mesmo tribunal considerou/decidiu que “não se provou”, sem olvidar que tal enunciação terá um carácter “provisório”, na medida em que o recurso tem em vista a alteração parcial dessa factualidade. Tendo presente esta circunstância, consignou-se o seguinte na 1ª instância: «São os seguintes os factos provados com relevância para a decisão da causa: 1- A propriedade do prédio urbano composto de edifício de um piso destinado a comércio sito na Rua (...) , Coimbra, união das freguesias de Eiras e São Paulo de Frades, concelho de Coimbra, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o n.º x(...) /19980716 e inscrito no Serviço de Finanças Coimbra 2 com o artigo matricial n.º y(...) (ex- yy(...) ), encontra-se registada a favor do A., casado com a A. sob o regime da comunhão geral, por apresentação de 22-02-1993 – vd. certidão de teor matricial de fls. 87 e de registo predial de fls. 164 (1º da p.i.).
2- Por contrato de arrendamento celebrado em 01 de Agosto de 2012, os Autores deram de arrendamento à sociedade L (…) S.A., representada por (…) o prédio referido em 1), contra o pagamento da renda mensal de € 1.500,00 – vd. contrato de arrendamento e seu aditamento de fls. 18 a 23 (2º e 3º da p.i.).
3- Deixaram de ser pagas as rendas respeitantes aos meses de Fevereiro de 2014 e seguintes (4º da p.i.).
4- Em 14 de Janeiro de 2014, foi constituída a sociedade Ré, tendo como gerente (…) e como sede social o locado – vd. documento de fls. 24 (5º, 6º, 27º e 29º da p.i.).
5- A partir da data referida em 4), os produtos comercializados no estabelecimento comercial a funcionar no locado permaneceram os mesmos, o objecto e a sua designação comercial “ K (...) ” permaneceram inalterados e o atendimento continuou a ser prestado pelo mesmo funcionário (8º, 9º e 31º da p.i.).
6- Em data não concretamente apurada, mas anterior a 28 de Agosto de 2014, o estabelecimento comercial que laborava no locado encerrou e deslocou-se para outra morada e com outra designação (14º da p.i.).
7- Na nova morada labora um estabelecimento comercial com os mesmos produtos e objecto da Ré, com a designação de ‘’R (...) ’’ e por ela explorado (15º da p.i.).
8- Desde Fevereiro a Agosto de 2014, foi a Ré que explorou o estabelecimento comercial sito no locado (16º da p.i.).
9- Em 26 de Setembro de 2014, o portão do armazém do locado estava aberto e com a fechadura forçada (22º da p.i.).
10- Os AA. substituíram as fechaduras do locado, com o que despenderam o valor de € 222,25 (21º e 24º da p.i.).
11- Por apresentação de 27-11-2012, foi registada a alteração da denominação da sociedade L (…), S.A. para B (…), S.A. – vd. relatório de fls. 69 e ss. e consulta à certidão de matrícula constante dos autos de Insolvência n.º 531/14.5TJCBR (7º da contestação).
12- Por sentença de 11-03-2014, proferida nos autos de Insolvência n.º 531/14.5TJCBR, que correu termos no 5º Juízo Cível da Comarca de Coimbra, a B (…), S.A. foi declarada insolvente – vd. relatório de fls. 69 e ss. e consulta à certidão de matrícula constante dos autos de Insolvência n.º 531/14.5TJCBR (7º da contestação).
13- Em 26-06-2014, os AA. requereram a Notificação Judicial Avulsa da Massa Insolvente da B (…), S.A. da resolução do contrato e da obrigação de entrega do locado, sob pena de execução, a qual foi realizada em 15-07-2014 – vd. fls. 49 a 55 e cota que antecede (8º e 10º da contestação).
14- Na NJA os AA. acusaram a falta de pagamento das rendas de Fevereiro, Março e Abril de 2014 e o vencimento das de Maio, Junho e Julho de 2014, posteriores à declaração de insolvência – vd. fls. 49 a 55 (9º da contestação).
15- Os AA...
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