Acórdão nº 2044/16.1T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2017
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 07 de Março de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - A Causa: R (…), Devedora nos autos à margem indicados, tendo sido notificada do despacho de recusa de homologação do Plano de Recuperação a fls… e não se conformando com o mesmo, dele veio interpor recurso, alegando e concluindo que: 1. O Meritíssimo Juiz a quo decidiu pela recusa de homologação do Plano de Recuperação, por supor que o plano de recuperação não ficou concluído dentro do prazo legal (in casu, até 19/08/2016) e que foi por isso que o dito documento não foi junto aos autos nessa mesma data, tendo pois sido violada a norma constante do Artº 17º - D nº 5 do CIRE, ocorrendo violação não negligenciável das normas procedimentais.
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Muito mal esteve o Meritíssimo Juiz a quo ao tirar tão surpreendente ilação, que contraria em absoluto todos os actos praticados nos autos e neles documentados É que, pese embora a explicação menos feliz ou elucidativa por parte da Devedora no seu requerimento apresentado em 20/10/2016, bem sabia o Meritíssimo Juíz a quo, porque tinha elementos bastantes nos autos, que o Plano de Recuperação foi terminado dentro do prazo de três meses e aprovado por 78,4903% dos votos dos credores em 18/08/2016.
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O Plano foi enviado em tempo aos credores, parte fundamental do processo, que por tal estavam em condições de o votar em consciência, como fizeram, em 18 de Agosto de 2016, aprovando-o com 78,4903% dos votos.
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A referência feita pela devedora em requerimento datado de 20/10/2016 à concordância da AT com o Plano teve como objectivo único alertar para a seriedade e bondade do mesmo e em nada pretendeu fazer crer que tal Plano se mantinha em aberto ou inacabado.
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Em 19 de Agosto de 2016, o Administrador Judicial Provisório veio aos autos juntar acta de contagem dos votos e a votação enviada pelos credores. A não junção do plano, já votado, não pode penalizar a devedora e seus credores, até porque é ao AJP que cabe o papel, preponderante, de dirigir e fiscalizar o processo das negociações e estabelecer a “ponte” entre devedor, credores e tribunal.
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O Douto Tribunal a quo notificou a devedora, em 19/09/2016, para vir aos autos juntar o Pano de Recuperação no prazo de 5 dias, o que esta fez.
Tratou-se de um autêntico despacho de aperfeiçoamento oficioso, no qual o Meritíssimo Juiz a quo concedeu à devedora prazo para a prática de um acto; desta forma, a irregularidade ficou sanada.
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Tal despacho não foi objecto de reclamação e transitou em julgado, sendo por tal vinculativo. Não pode agora o Douto Tribunal a quo vir decidir que afinal o documento que mandou juntar em 5 dias foi junto “tardiamente” e justificar a recusa de não homologação do plano com a justificação de que este não foi aprovado em tempo, sem qualquer base que o suporte.
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O plano não foi elaborado ou alterado nesses 5 dias de prazo, estava votado e aprovado desde 18/08/2016! 9. Estão em causa situações de demasiada importância para devedora e credores para um plano de recuperação ser assim recusado, de forma tão inconsequente.
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Tal como dispõe o artº 17º - A do CIRE, no seu nº 1, “O processo especial de revitalização destina-se a permitir ao devedor que (…)ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores, de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização.” Ensinam Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª Edição, 2015, Anotação 2.a este preceito, “Está, com efeito, em causa a adoção de um modelo processual próprio, vocacionado para a satisfação de objetivos específicos, que supõe formas de intervenção dos interessados muito distintas do que é característico do processo civil e impõe, por isso, uma adaptação muito significativa e profunda da moldura comum. (…) o processo de revitalização dirige-se a evitá-la (insolvência), assegurando a recuperação do devedor e, nessa medida, a satisfação, também, dos interesses dos seus credores.” Na Anotação 4. a este preceito, prosseguem “O nº 1 do preceito em anotação tem de ser complementado com o estatuído no artº 17º - I. Resulta dessa concatenação que o processo de revitalização, intentando sempre a consolidação de uma solução consensual, fruto de um acordo entre devedor e credores (…).
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Na Anotação 5.a este preceito, os autores relevam o papel fundamental do AJP, que “tem nas suas atribuições a fiscalização da regularidade das negociações e demais trabalhos envolvidos no processo. Ao juiz, por sua vez, sempre que seja alcançado acordo no processo, cabe decidir pela respectiva homologação ou rejeição, devendo, designadamente, observar-se o regime fixado nos artºs 215º e 216º do Código, quanto ao plano de insolvência – artº 17º - F nºs 1, 2 e 5.
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O objetivo primordial do PER é a satisfação dos interesse de devedor e credores, seus verdadeiros protagonistas, tendo como animus evitar a insolvência daquele, já que a sua revitalização assegura, nessa medida, o cumprimento perante aqueles do que aí fica estabelecido. A solução consensual é o que se busca neste processo especial.
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O AJP tem a direção efetiva do processo, assegurando a sua regular tramitação.
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Ao juiz cabe o papel de, havendo acordo entre devedor e credores, homologar ou não o PER, com observância dos artºs 215º e 216 do CIRE - artº 17º - F nºs 1, 2 e 5.
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Foi um processo de extrema complexidade, com muitas horas de trabalho, árduas negociações, adequação às sugestões e exigências dos credores. MAS TUDO DENTRO DO PRAZO LEGAL DOS 3 MESES (artº 17º - D nº 5 do PER).
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Não podia o Douto Tribunal a quo vir “deduzir”, como fez, que o Plano não ficou concluído no prazo legal, pois tinha documentação bastante nos autos para entender de forma diversa e baseou a sua decisão na alegada violação na norma constante do artº 17º-D nº 5 do CIRE. E considerou na sua Douta decisão que ocorreu violação não negligenciável de normas procedimentais – artº 215º do CIRE.
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O AJP tem a direção e fiscalização do processo e conduz os trabalhos do mesmo. É ele quem está em condições de diligenciar nos autos pelo seu bom andamento e regularidade. Estando por ele juntos nos presentes a acta e o sentido de votação dos credores, a alegada omissão da junção do plano que lhes deu origem não pode consubstanciar, como fez o Meritíssimo Juiz a quo, a “violação não negligenciável de normas procedimentais”, com todas as consequências que daí advém.
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Quando muito, houve mera negligência, que em nada releva para a produção do resultado pretendido pelo PER. Neste sentido, pugnam Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª Edição, 2015, Anotação 2. ao artº 215º do CIRE: “Aqui reside, de resto, uma das maiores dificuldades para o intérprete, que se reconduz a saber o eu deva entender-se por vício negligenciável – ou, na fórmula da lei, vício não negligenciável -, cuja verificação constitui requisito de recusa oficiosa de homologação.” Na Anotação 3. a este preceito, continuam: “”(…) há outro problema (…) que é o de saber se a não negligenciabilidade do vício apenas releva quanto a vícios procedimentais ou, igualmente, aos que decorram da violação de regras aplicáveis ao conteúdo do plano. O modo como o artigo se encontra elaborado inculca a ideia de que ambos os tipos de vícios suportam o mesmo tratamento, devendo em qualquer dos casos desconsiderar-se as violações menores”. (sublinhado nosso).
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Na Anotação 5. a este preceito: “Então...
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