Acórdão nº 320/15.0T8MGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Dezembro de 2017
Magistrado Responsável | ISA |
Data da Resolução | 12 de Dezembro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. Através dos autos que correm atualmente no Juízo Central Cível de Leiria do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, o autor, Banco A..., S.A.
, instaurou (em 28/08/2015) contra os réus, R...
(1º.
Réu) e E...
(2ª. Ré), todos com os demais sinais dos autos, a presente ação de impugnação pauliana, sob a forma de processo comum.
Para o efeito alegou, em síntese, o seguinte: A B..., S.A., - que entretanto se extinguiu por incorporação no Banco B..., S.A., tendo, por sua vez, na sequência da resolução do Conselho de Administração do Banco de Portugal, de 03/08/2014, sido constituído o Banco A..., S.A., o qual, à luz dessa resolução, ficou, além do mais, incumbido da gestão/administração dos ativos e passivos, para ele transferidos definitivamente, daquele Banco B... – celebrou, no âmbito da sua então atividade, com A... um contrato de locação financeira imobiliária, ulteriormente alterado por meio de aditamento.
Para garantia do cumprimento das obrigações decorrentes desse contrato, o referido locatário, A..., entregou à “B...” uma livrança em branco, subscrita pelo próprio e avalizada, além de outro, pelo 1.º réu.
Acontece que o locatário não pagou, além do mais, as rendas vencidas (no valor total de €10.881,30), pelo que, face a esse incumprimento, o autor resolveu o aludido contrato de locação financeira e, perante a manutenção da dívida (e a recusa do seu pagamento, quer pelo locatário, quer pelos avalistas), procedeu ao preenchimento da referida livrança, pelo montante de €60.210,59, referente a capital, juros de mora sobre rendas e indemnização com juros de mora.
Como tal livrança não foi paga, o autor instaurou execução contra, além de outros, o 1.º réu, para obter o pagamento da aludida quantia de €60.746,59, em ação que correu termos no (extinto) 1° Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande, com o n.º...
Para garantir esse pagamento da dívida o autor apenas logrou localizar os bens imóveis que identifica (artº. 22 da p.i).
Porém, apurou que no âmbito do Processo de Separação de Pessoas e Bens por Mútuo Consentimento ocorrido na Conservatória do Registo Civil de Leiria (sob o nº...), foi proferida decisão, transitada em julgada em 13/09/2012, que decretou a separação de pessoas e bens entre os ora 1º. e 2ª. RR., até essa data casados segundo o regime de comunhão geral de bens, e que nessa mesma data os mesmos outorgaram escritura pública de “partilha por divórcio”, mediante a qual foram adjudicados à 2ª R. todos aqueles imóveis, mediante o pagamento, ao 1º R., das respetivas tornas.
Através dessa partilha foram retirados do património do 1.º R. a totalidade dos bens comuns do casal, uma vez que foram na sua totalidade adjudicados à 2.ª R.; pelo que, em consequência, o autor ficou impossibilitado de, sem recurso aos referidos bens, vir a ser ressarcido dos seus créditos, nomeadamente sobre o 1.º R..
A referida escritura de partilha foi outorgada com o único propósito de sonegar do património do 1.º R. todo o património passível de ser penhorado pelos seus credores, designadamente, pelo autor, tendo ambos os RR. consciência do prejuízo que com tal causavam ao A..
Pelo que terminou o autor por pedir que lhe seja reconhecido o direito à restituição daqueles bens que identifica, na medida do seu interesse na execução pendente contra o 1.º R., podendo executar no património da 2.ª R. os imóveis objeto da partilha.
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Contestou apenas o 1º. R..
Em sua defesa alegou, em síntese, e em primeira linha, que não teve qualquer intervenção no aditamento ao contrato de locação financeira aludido pelo A., cuja existência desconhecia, que alterou o prazo e as condições de pagamento da obrigação, pelo que o mesmo é nulo ou, se assim não entender, ineficaz em relação a si.
Por outro lado, alegou ainda que a separação dos réus foi motivada por uma má relação conjugal, motivada em grande parte por não ter dar conhecimento à ré mulher de que tinha avalizado a sobredita livrança destinada a garantir o cumprimento pelo seu irmão das obrigações decorrentes do contrato de locação financeira em causa, e que os imóveis em questão partilhados tinham advindo ao património comum do casal por herança dos falecidos pais da 2.ª ré, razão pela qual tais imóveis lhe foram adjudicados, tendo-lhe a 2.ª ré pago as tornas devidas (para cujo pagamento teve mesmo de recorrer a empréstimos).
Atuaram sem qualquer propósito ou consciência de prejudicar quem quer fosse e nomeadamente o A..
Pelo que terminou pedindo a improcedência da ação.
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Respondeu o A. à matéria de exceção deduzida pelo R..
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Prosseguindo os autos o seu ritualismo legal, foi proferido, na audiência prévia, proferido despacho saneador, afirmando-se a validade e a regularidade da instância, enunciando-se ainda aí o objeto do litígio e os temas de prova, num despacho que não mereceu reclamação.
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Mais tarde, realizou-se a audiência de discussão e julgamento (com a gravação da mesma).
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Seguiu-se a prolação da sentença que, no final - e com o fundamento de não se mostrarem preenchidos todos os pressupostos da ação de impugnação pauliana, por falta do requisito da má fé dos RR. - decidiu julgar a ação improcedente, absolvendo os RR. do pedido contra si formulados.
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Não se tendo conformado com tal sentença dela apelou o autor, tendo concluído as suas alegações de recurso nos seguintes termos: ...
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Contra-alegou o 1º. Réu, concluindo as suas contra-alegações nos termos seguintes: ...
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Colhidos os vistos legais, cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.
II- Fundamentação
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De facto Pelo tribunal da primeira instância foram dados como provados o seguintes factos: ...
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De direito 1.
Do objeto do recurso.
Como é sabido, e é pacífico, é pelas conclusões das alegações dos recorrentes que se fixa e delimita o objeto dos recursos, pelo que o tribunal de recurso não poderá conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs. 635º, nº. 4, e 639º, nº. 1, e 608º, nº. 2, do CPC) 1.1 Ora, calcorreando as conclusões das alegações do recurso da ré, verifica-se que as questões nelas colocadas e que cumpre aqui apreciar são as seguintes:
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Da impugnação/alteração da decisão da matéria de facto; b) Da verificação, ou não, dos pressupostos legais para a procedência da ação - de impugnação pauliana – (vg. da má fé dos RR.).
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Quanto à 1ª. questão (Da impugnação/alteração da decisão da matéria de facto) 2.1 Questão prévia.
Nas suas contra-alegações o 1º. R. defende, como questão prévia, dever o recurso, na parte referente à impugnação da matéria de facto, ser de imediato rejeitado, à luz do disposto no artigo 640º, nº 2, al. a), do CPC, por o A./apelante não ter indicado com exatidão as passagens da gravação em que se funda essa parte doo seu recurso.
Apreciemos.
Naquilo que para aqui importa, dispõe o artigo 640º do CPC, sob epígrafe “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, que: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria...
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