Acórdão nº 1343/14.1TBFIG-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução08 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I - RELATÓRIO M (…) vem, por apenso à execução que contra si é deduzida pelo Banco (…) S.A., deduzir oposição à execução mediante embargos de executado, Alegando, em síntese: desde a data em que foi fiadora no contrato de mútuo celebrado entre o exequente e J (…), nunca mais a executada teve conhecimento do que quer que fosse relativamente ao cumprimento ou incumprimento do contrato, nem sequer aquando do acordo de regularização da dívida com o mutuário; tal comportamento impossibilitou a executada/embargante de promover a regularização da dívida antes que ela atingisse os montantes atuais; a exequente recebeu já a quase totalidade da quantia pela qual o imóvel lhe foi adjudicado – 63.000,00 € –, mais o equivalente a cerca de 100 prestações que já haviam sido pagas, mais a fração autónoma, não se percebendo como chegou ao valor de 17.905,39 € peticionados na presente execução; mais invoca integrar o comportamento da exequente um abuso de direito, invocando ainda a liberação da obrigação que contraiu por impossibilidade de sub-rogação, nos termos do art. 653º do CC.

Conclui que, na procedência dos embargos, deverá ser decretada a extinção da execução.

A exequente apresenta contestação alegando, em síntese: por missiva remetida à embargante em 11.01.2008, informou a fiadora/embargante da existência da dívida e do envio para cobrança da mesma, formulando ainda o convite para encetarem negociações, missiva que foi enviada para a morada desta declarada na escritura; foi face ao incumprimento contratual por parte do mutuário no pagamento em 28.03.2007, das prestações convencionadas que ocorreu o vencimento antecipado da totalidade da dívida emergente do contrato de mútuo com hipoteca e fiança, sendo que o mutuário foi posteriormente, em 02.11.2007, declarado insolvente; nos termos do convencionado na escritura de mútuo com hipoteca e fiança, ambas as circunstâncias implicavam o imediato vencimento ou a exigibilidade da totalidade da dívida, sem necessidade de qualquer interpelação; por via da adjudicação do imóvel, o exequente recebeu tão só a quantia de 50.888,00 €, único valor por si recebido até agora após o incumprimento do empréstimo.

Conclui pela improcedência dos embargos.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença a julgar procedentes os embargos, determinando a extinção total da ação executiva e ordenando o cancelamento de qualquer penhora já determinada.

* Não se conformando com tal decisão, o embargado dela interpõe recurso de apelação, concluindo a respetiva motivação, com as seguintes conclusões: (…) * A embargante apresenta contra-alegações, pronunciando-se pela improcedência do recurso.

Cumpridos que foram os vistos legais nos termos previstos no nº2 do art. 657º CPC, cumpre decidir do objeto do recurso. *II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Novo Código de Processo –, as questões a decidir são as seguintes: 1. Impugnação da matéria de facto.

  1. Consequências da falta de interpelação para pagamento das prestações em falta.

  2. Extinção da obrigação por impossibilidade de sub-rogação legal.

  3. Abuso de direito.

    III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 1. Impugnação da matéria de facto (…) Pelo exposto, julga-se improcedente a impugnação deduzida pela apelante.

    * A. Matéria de facto São os seguintes os factos dados como provados na sentença recorrida, que aqui se mantêm inalterados: 1. A Exequente/Embargada “BANCO (…), S.A.”, instaurou a 30-06-2014, o Processo Executivo ao qual os presentes autos se encontram apensados contra a Executada/Embargante M (…), com vista à cobrança coativa dos seguintes créditos (fls.1 a 3 do Processo Executivo cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido): – €12.209,60 de capital; – €5.695,79 de juros moratórios, à taxa contratada (10,609% ao ano), vencidos desde 28-02-2010 até 30-06-2014; e juros moratórios vincendos, sobre o capital, até efetivo e integral pagamento.

  4. No Processo Executivo, a Exequente/Embargada apresentou como título executivo a cópia de uma escritura pública de mútuo com hipoteca e fiança (fls.27v. a 37v. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), outorgada a 18-08-1997, pela qual a Executada/Embargante se constituiu solidariamente fiadora e principal pagadora da dívida contraída pelo mutuário J (…), renunciando ao benefício da excussão.

  5. O capital mutuado foi de €59.855,75, a reembolsar em 300 prestações mensais de capital e juros.

  6. A garantia de hipoteca incidia sobre a fração autónoma de prédio urbano descrita na Conservatória do Registo Predial da Figueira da Foz sob o n.º 811/19900330-H – Tavarede, cujo valor de mercado, em 14-07-1997, ascendia a €76.575,45.

  7. A 21-09-2006, a Executada/Embargante e o mutuário celebraram um contrato de regularização de responsabilidades (fls.69 a 71 cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), pelo qual a Exequente/Embargada obteve o pagamento de duas prestações vencidas e não pagas do mútuo; contrato no qual a Executada/Embargante não teve qualquer intervenção.

  8. O mutuário não pagou a prestação n.º 114, nem nenhuma das posteriores, remanescendo em dívida, a 31-05-2007, o capital de €45.981,27.

  9. A 02-11-2007, o mutuário foi declarado insolvente no Processo de Insolvência n.º 1979/07.7TBFIG.

  10. No Processo de Insolvência, a 11-12-2013, a Exequente/Embargada comprou a fração autónoma hipotecada pelo preço de €63.600,00 [fls.22 a 30 do Processo Executivo cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido] (com dispensa de depósito do preço, com exceção da quantia de €12.720,00 paga para cobrir as custas prováveis do Processo de Insolvência).

  11. Desde a celebração da escritura pública (18-08-1997) até à receção da carta de 03-07-2014 (fls.13) nunca a Executada/Embargante foi informada do que quer que fosse em relação ao cumprimento ou incumprimento do contrato de mútuo pelo mutuário.

    * B. O Direito.

    A sentença recorrida, julgando procedentes os embargos, decretou a extinção da execução com base nos seguintes fundamentos: começando por reconhecer ser necessária a interpelação do fiador por este não ter renunciado ao benefício do prazo (artigo 782º CC), o que importaria a paralisação da execução, vai ainda mais longe e, considerando que a exequente/embargada nunca lhe deu a possibilidade de por fim à mora e pagar a dívida em momento em que a sub-rogação lhe permitisse adquirir garantia hipotecária (artigo 582º, nº1 CC) e /ou reclamar créditos no processo de insolvência do mutuário, acabou por concluir pela extinção da própria fiança, nos termos do artigo 653º do CC.

    O Apelante insurge-se contra a decisão, defendendo a desnecessidade de interpelação do embargante para a exigibilidade da totalidade da dívida e ainda que da declaração de insolvência do mutuário não decorre qualquer impossibilidade de sub-rogação para o fiador, questões que passamos a analisar separadamente.

  12. Necessidade de interpelação para pagamento das prestações em falta.

    Segundo o Embargado/Apelante, não tendo o mutuário procedido ao pagamento da prestação que se venceu em 28.03.2007, teria ocorrido o vencimento antecipado da totalidade da dívida emergente do contrato de mútuo com hipoteca e fiança, sem necessidade de qualquer interpelação, de acordo com o convencionado entre as partes na cláusula nº 15º do documento complementar: “1.

    O incumprimento, por parte do mutuário, de qualquer das obrigações decorrentes do presente contrato, determina o imediato vencimento e exigibilidade da totalidade da dívida e de todas as importâncias cujo pagamento seja devido nos termos contratuais e de lei”.

    Em seu entender, ao estipularem no contrato as situações de facto que implicavam o imediato vencimento e a exigibilidade de toda a dívida, as partes teriam afastado o regime supletivo previsto no artigo 782º do CC.

    Nesta parte, teremos de discordar do apelante. Seja pela aplicação do disposto no artigo 781º CC, seja por força do estipulado entre as partes no contrato de mútuo, nunca a simples falta de pagamento de alguma das prestações vencidas importaria, por si só e automaticamente, o vencimento imediato das restantes.

    O artigo 781º do CC, ao determinar que a falta de pagamento de uma das prestações importa o vencimento imediato das restantes, deve ser interpretado no sentido de que o inadimplemento do devedor gera o direito do credor de exigir dele a satisfação daquelas prestações, e não no sentido de que o não pagamento de uma das prestações no prazo acordado determina, por si só a entrada em mora quanto ao cumprimento das demais[1].

    Ou seja, quando a lei prevê o vencimento “imediato” das restantes prestações na sequência do incumprimento de alguma...

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