Acórdão nº 452/05.2GTLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Junho de 2016
Magistrado Responsável | FERNANDO CHAVES |
Data da Resolução | 15 de Junho de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório 1.
No processo sumário n.º 452/05.2GTLRA, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Leiria – Instância Local – Secção Criminal – J1, em que é arguido A...
, com os demais sinais nos autos, foi proferido, em 27 de Outubro de 2015, despacho que indeferiu o requerimento do arguido, a fls. 273 a 274 vº, onde suscitou a questão da declaração da nulidade da contumácia por falta de notificação da sentença condenatória e, por via disso, a extinção do procedimento criminal por efeito da prescrição.
-
Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, terminando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «I - O requerente foi julgado em 2005 pela prática de um crime de condução sob o efeito de álcool, e condenado em 7 meses de prisão por sentença de 09-11-2005.
II - Tal sentença não foi notificada pessoalmente ao arguido até à data, uma vez que o arguido apenas esteve presente na 1ª sessão de julgamento, e não chegou a ser notificado para a leitura de sentença.
III - A sua defensora oficiosa de então recorreu da referida sentença mesmo sem o arguido ter sido dela notificado.
IV - Confirmada a mesma pelo Tribunal da Relação, continuou o arguido sem ser notificado quer da sentença da primeira instância, quer da 2ª instância, tendo o tribunal de 1ª instância considerado o trânsito em julgado da mesma em 20/06/2006.
V - Foi ordenada a publicação de editais para comparência do arguido em Juízo com vista à sua notificação, o que, frustrado tal propósito, veio a originar que o mesmo fosse declarado contumaz nos termos do então vigente artº 476º do CPP.
VI - Decorre do nº5 do artº 333º do CPP que a notificação da sentença deve ser feita ao arguido pessoalmente.
VII - Não tendo a mesma sido notificada ao arguido, nunca poderá ter-se tal sentença como transitada em julgado.
VIII – O recurso interposto pela defensora oficiosa não deveria ter sido admitido uma vez que a notificação pessoal da sentença ao arguido não tinha tido lugar. (Veja-se nesse sentido acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 21-03-2012 proferido no processo 83/08.5JAGRD.C1 – Relator – Alberto Mira) IX - A exigência da notificação pessoal da sentença ao arguido assenta na ideia de que este será quem tem o poder de decisão de reação ou aceitação de uma sentença que sobre ele recai, sendo o mandatário/defensor oficioso, apenas a entidade tecnicamente legitimada para pôr em prática a vontade processual do arguido.
X - Neste caso, a vontade processual do arguido não pode ter-se como vertida no processo uma vez que o mesmo nunca chegou a ser notificado da sentença.
XI - Foi o arguido declarado contumaz, com fundamento no então artº 476º do CPP, ora revogado, e que tinha por pressuposto a situação em que o arguido se terá eximido ao cumprimento da pena, o que pressupõe que a mesma teria chegado ao conhecimento deste e transitado em julgado. Tal não aconteceu.
XII - A falta de notificação pessoal da sentença ao arguido constitui uma nulidade insanável que foi invocada no requerimento do arguido e que aqui se reitera, e que inevitavelmente afeta de nulidade todos os atos processuais posteriores que dela estejam dependentes. (artºs 120º e nº 122º do CPP).
XIII - Nomeadamente a interposição de recurso, a decisão que sobre o mesmo recaiu e a declaração de contumácia que deverá também ela ter-se por nula.
XIV – Sem prescindir, nunca a contumácia deveria ter lugar mesmo com fundamento no artº 335º do CPP por não ter o mesmo previsto a detenção para notificação de sentença, pelo que, concluindo, seja por que fundamento for, não deveria a contumácia ter tido lugar nestes autos por falta de enquadramento legal.
XV - Não sendo a declaração de contumácia válida não existe causa de suspensão que impeça o decurso do prazo de prescrição do crime em causa, pelo que decorridos que estão já 10 anos sobre os factos, encontra-se o respetivo procedimento criminal já prescrito.
XVI - Os argumentos acima enunciados, corporizam o requerimento sobre o qual recaiu o despacho ora recorrido.
XVII - Sobre os mesmos, nenhuma análise crítica fundamentada decorre da decisão ora recorrida que rebata legal e juridicamente a posição defendida pelo arguido.
XVIII - Efetivamente, é esta completamente omissa sobre a análise do mérito da mesma, no que diz respeito à defendida inexistência de trânsito em julgado limitando-se apenas a constatar factos como assentes – sentença, recurso, trânsito em julgado - e remetendo a análise da questão para momento processual posterior dos autos, que tem a factualidade processual posta em causa pelo arguido como pressuposto pacífico, sem que tal opção tivesse sido fundamentada.
XIX - Com efeito, a considerar-se procedente a argumentação do arguido no seu requerimento, a contumácia não teria validade e, como tal, nada obstaria ao decurso do prazo de prescrição, neste caso há muito expirado.
XX - Pelo que, não ocorrendo qualquer causa de suspensão ou interrupção do prazo de prescrição do procedimento criminal, previsto no artº 118º do CP, a mesma deve ser conhecida e declarada.
XXI - O despacho ora recorrido, seguindo a linha de continuidade processual dos autos, dando tudo o que para trás ficou como assente, não conhecendo de qualquer nulidade invocada (que podia até ser de conhecimento oficioso atenta a sua natureza) veio defender, antes sim, a solução de continuidade jurídica da ratio da norma revogada constante do artº 476º do CPP. que fundamentou a declaração de contumácia do arguido.
XXII - Tal norma foi, como referido na decisão ora recorrida, revogada pelo artº 8º 2 a) da Lei 115/2009 de 12-10.
XXIII - Tal Lei retirou também competência ao tribunal de primeira instância onde corre o processo para decidir sobre a contumácia a declarar após trânsito em julgado da sentença.
XXIV - Tal alteração resulta do artigo 138.º nº 4 x) do CEPMPL da Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro.
XXV - Atenta a vertente de análise da questão, optada pelo tribunal “ a quo” como sendo a jusante de uma condenação e não a montante como defendíamos, este não terá competência material para o fazer, cabendo tal desiderato ao Tribunal de Execução de Penas em conformidade com o dispositivo legal acima indicado.
XXVI - Peca assim, o despacho ora recorrido, neste aspeto e desde logo, por incompetência material para o conhecimento da questão nos termos em que o foi.
XXVII - Aliás, considerando a questão nesta perspetiva, que note-se, na nossa opinião se encontraria já prejudicada pelos motivos acima invocados, temos que existe neste momento uma contumácia declarada ao abrigo de uma norma revogada e declarada por uma entidade que agora é materialmente...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO