Acórdão nº 85/11.4TBSRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelCATARINA GON
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

A...

e B...

, residentes na Av. (...) , Coimbra, instauraram a presente acção contra C...

e D...

, residentes na Rua (...) , Cernache do Bonjardim, alegando, em síntese: que são proprietários de um prédio urbano que confina com um prédio pertencente aos Réus, onde existia um terraço com varanda que deita directamente para o prédio dos Autores, varanda essa que se encontra coberta por uma cobertura de placas de acrílico; que, há cerca de dois ou três anos, os Réus colocaram, em toda a extensão dessa varanda, uma janela dividida em seis partes, com vidros transparentes, janela essa que é ilegal por tornar mais onerosas as vistas sobre o prédio dos Autores; que os Réus canalizaram todas as águas pluviais do seu prédio para o prédio dos Autores; que toda essa situação causou aos Autores danos morais e que, ao beneficiarem de vistas sobre o prédio dos Autores de modo diferente do que antes beneficiavam, os Réus enriquecem-se à custa dos Autores, porquanto, tendo o terraço sido transformado numa divisão, isso aumenta o valor locativo do prédio dos Réus.

Com estes fundamentos, concluem pedindo a condenação dos Réus a reconhecer os Autores como legítimos donos e proprietários do prédio identificado no artigo 1.º da P.I. (a); a retirar a ou as janelas que colocaram no seu terraço/varanda e aludidas no artigo 11º da P.I. (b); a pagar aos autores a indemnização diária de 5,00€ desde 27/09/2010 até que a ou as janelas aludidas no artigo 11.º sejam retiradas pelos Réus, quantia essa acrescida de juros de mora à taxa legal desde o seu vencimento até efectivo e integral pagamento (c); a indemnizar os Autores na quantia de 2.500€, a título de danos morais (d) e a retirar do prédio dos Autores as águas pluviais, resultantes das obras aludidas no artigo 41ºda P.I. (e).

Os Réus contestaram, alegando, em suma: que o prédio de que são proprietários tem implantado no 1º andar – desde a sua construção, há mais de 80 anos – um terraço que está delimitado por paredes de todos os lados, com excepção do lado sul em que confina com o prédio dos Autores e onde é vedado com murete com altura de 76 cm; que tal terraço está coberto, há mais de 40 anos, com telha acrílica apoiada em estrutura de metal amovível, encontrando-se constituída, por usucapião, uma servidão de vistas a favor do prédio dos Réus e sobre o prédio dos Autores; que também se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de estilicídio a favor do seu prédio e sobre o prédio dos Autores por via da caleira que está colocada na cobertura do aludido terraço e por via da qual as águas pluviais são encaminhadas para o logradouro do prédio dos Autores; que, naquele terraço apenas foi colocada uma caixilharia de alumínio branco com oito janelas de correr que não determinaram qualquer alteração das condições em que as vistas eram exercidas antes da colocação dessas janelas, janelas essas que, aliás, já lá se encontravam quando os Autores adquiriram o prédio e foram colocadas com o conhecimento dos anteriores proprietários.

Concluem pedindo a improcedência da acção e, em reconvenção, pedem: 1. Que se declare que os Réus/reconvintes são donos e legítimos proprietários e possuidores do prédio urbano descrito em 4º, 5º e 6º da contestação, condenando os Autores a reconhecer tal direito; 2. Que se declare que se encontra constituída sobre o prédio dos Autores e a favor do prédio dos Réus servidões de vistas ar e luz relativamente ao terraço situado no 1º andar do prédio dos Réus; 3. Que se declare que se encontra constituída sobre o prédio dos Autores e a favor do prédio dos Réus servidão de vistas relativamente ao terraço situado no 2º andar do prédio dos Réus; 4. Que se declare que se encontra constituída sobre o prédio dos Autores e a favor do prédio dos Réus servidão de estilicídio relativamente às águas pluviais que tombam e escorrem do telhado que é a cobertura de terraço situado no 1º andar do prédio dos Réus para o prédio dos Autores; 5. Que os Autores sejam condenados a absterem-se da prática de quaisquer actos perturbadores do exercício dos direitos de servidão de vistas, luz e ar e estilicídio que beneficiam o prédio dos Réus, nomeadamente de nele executar obras que prejudiquem ou violem aqueles direitos de servidão.

Os Autores apresentaram réplica, impugnando alguns dos factos alegados pelos Réus e reafirmando a posição assumida na petição inicial, alegando, em suma, que, com as obras que efectuaram, os Réus agravaram as servidões que eventualmente existissem e, ampliando o pedido inicialmente formulado, pedem agora que os Réus sejam condenados: a retirar do prédio dos Autores as águas pluviais resultantes das obras aludidas no artigo 41.º da PI e todas as executadas após a compra em 1998, melhor discriminadas nos artigos 104 a 182 da réplica; a tapar a varanda existente no 1.º andar do prédio identificado nos artigos 4.º, 5.º e 6.º da contestação; a tapar o terraço existente no 2.º andar do prédio identificado nos artigos 4.º, 5.º e 6.º da contestação ou in minime, caso assim se não entenda, a demolir parte do murete nesse existente na parte que confronta directamente com o prédio dos autores, repondo a situação anterior a tal construção e descrita nos artigos 88.º da réplica e a demolir parte do telhado e caleira existente sobre a varanda do 1.º andar na parte que invade o espaço aéreo do prédio dos Autores.

Os Réus apresentaram tréplica, impugnando os factos alegados pelos Autores, mantendo tudo o que haviam alegado na contestação e concluindo pela improcedência dos pedidos formulados.

Foi proferido despacho saneador e foi admitida a reconvenção, bem como a ampliação do pedido.

Foi efectuada a selecção da matéria de facto assente e base instrutória.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente e julgando totalmente procedente a reconvenção, decidiu nos seguintes termos: “

  1. Julgo parcialmente improcedente a presente acção e, em consequência, reconheço aos autores A... e B... a titularidade do direito de propriedade sobre o prédio descrito no ponto 1 do elenco dos factos provados, condenando os réus C... e D... a reconhecer tal direito e absolvendo-os dos demais pedidos formulados; B) Julgo totalmente procedente a reconvenção e, em consequência: i) Reconheço aos réus/reconvintes C... e D... a titularidade do direito de propriedade sobre o prédio urbano descrito no ponto 3 do elenco de factos provados, condenando os autores/reconvindos A... e B... a reconhecer tal direito; ii) Declaro que se encontra constituída sobre o prédio descrito no ponto 1 dos factos provados e a favor do prédio descrito no ponto 3 uma servidão de vistas relativamente à varanda situada no 1º andar daquele prédio e também relativamente ao terraço situado no 2º andar do mesmo prédio; iii) Declaro que se encontra constituída sobre o prédio descrito no ponto 1 dos factos provados e a favor do prédio descrito no ponto 3 uma servidão de estilicídio relativamente às águas pluviais que tombam e escorrem do telhado/telheiro que serve de cobertura à varanda situada no 1º andar do prédio descrito em 3; iv) Condeno os reconvindos a reconhecerem a existência de tais servidões e a absterem-se da prática de quaisquer actos perturbadores do exercício dos respectivos direitos a elas inerentes, nomeadamente de executar no prédio descrito em 1 obras que prejudiquem ou violem aqueles direitos de servidão”.

    Inconformados com essa decisão, os Autores vieram interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1º O Tribunal a quo cometeu erro de julgamento, lavrando em erro na apreciação da prova produzida, bem como na interpretação e aplicação do Direito.

    1. Confundiu realidade físicas, arquitectónicas e jurídicas diferentes, tratando varandas, terraços e janelas, como se da mesma realidade se tratassem, quando é a própria Lei (art. 1360º e ss do Cód. Civil) que as diferencia.

    2. Assim, sem para já se colocar em crise parte dos factos constantes da reconvenção, que foram dados como provados e que deviam ter sido dados como não provados, e factos constantes da petição inicial e replica que foram dados como não provados e que deveriam ter sido dados como provados. Resulta dos factos dados como provados que a acção deveria ter sido dada totalmente como procedente e o pedido reconvencional (para além do reconhecimento dos RR. como proprietários do prédio identificado em 3), como improcedente.

    3. Ora, resulta provado entre outros factos que por volta de 2009 (sendo que a acção entrou em Juízo em 2011), no local onde havia uma varanda com um comprimento de 7,22 metros e um parapeito com 76 cm de altura, e coberta com um telhado que dista na vertical 1,67 metros desde o parapeito até à parte interior/exterior do mesmo telhado – na parte em que tal construção dos RR. confronta com o prédio dos AA. (Factos Provado em 40., 41., 43.); foram colocadas pelos RR. janelas em toda a extensão da varanda (Facto Provado em 8.).

    4. Janelas, essas, divididas em oito partes continuas, com vidros transparentes (Facto Provado 12., 59.), estando a menos de metro e meio de distância do prédio dos AA e a menos de um metro e meio de altura do piso do terraço do prédio dos RR. (Facto Provado 13.), tendo cada uma das janelas colocadas no comprimento da varanda 0,95 metros de largura e 2,25 e 1,65 metros de altura (Facto Provado em 14.), sendo possível abrir 4 dessas 8 janelas em simultâneo (Facto Provado 59.).

    5. Assim, desde 2009, que não existe uma varanda/terraço no prédio dos RR., mas sim uma nova divisão coberta e tapada por janelas, vulgarmente designada por marquise.

    6. Ora, uma varanda/terraço é uma plataforma aberta de um edifício, com a qual se comunica por uma porta, que é limitada por parapeito ou por grade ou balaústre.

    7. Enquanto que, uma janela é uma abertura num elemento de vedação arquitectónica, como uma parede.

    8. Resulta dos factos provados, que desde 2009, não existe mais qualquer...

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