Acórdão nº 543/05.0TBNZ.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução23 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA.

  1. L (…) intentou contra J (…) Imobiliária e Turismo Lda.

    , e em que intervém na qualidade de interveniente principal ao lado daquela R., C (…) Lda, ação declarativa, de condenação, com processo ordinário.

    Alegou, sinóticamente: É dono e legítimo proprietário do prédio onde reside e tem a sua habitação, sito no (...) .

    A R. (J (…) Lda) é dona e legítima proprietária de prédio, também sito no (...) , que confronta de sul com o A.

    A linha divisória entre os dois prédios encontra-se física e materialmente definida por um muro meeiro.

    No prédio de que o A. é proprietário edificou o mesmo a sua casa de habitação.

    Tal casa cuja construção se iniciou em Agosto de 2000 e se conclui em Agosto de 2001, consiste em habitação numa moradia unifamiliar tipo t4, de 2 pisos com piscina situada a poente do edifício, na qual desde 2001 o A. e sua família habitam.

    O prédio do A. beneficia de vista excepcional sobre a praia e o mar, de enquadramento urbanístico e paisagístico agradável, enquadrado na paisagem rústica e natural, rodeado de espaço aberto com mancha de vegetação e floresta sem construções próximas, beneficiando de privacidade, tranquilidade e descanso.

    A R. tem vindo a construir no seu prédio um edifício de habitação colectiva de cerca de 9m de altura, composto de rés-do-chão, 1º andar, sótão habitável e cave para garagens com 10 fogos de habitação de tipo T2 e piscina exterior.

    O edifício tem configuração rectangular com o seu lado maior no eixo nascente poente e o lado menor no eixo norte-sul.

    O edifício que a R. vem construindo ao nível do solo e sobretudo a partir das suas varandas- 10 no 1º andar e dez no rés-do-chão do lado sul e duas no topo poente ao nível do 1º andar, permite a vista directa e ostensiva para o prédio do A.

    Vista directa para o logradouro e para a casa de habitação do A. inclusivamente para as suas janelas e varandas, a partir das varandas do topo poente e do lado sul e mesmo do chão do prédio da R.

    O A. e a própria família estão sujeitos e a que mais virão a estar sujeitos no futuro, a privacidade de que beneficiavam na sua moradia deixou de existir.

    A tranquilidade e sossego que a moradia do A. proporcionava está gravemente afectada pela construção e mais virá a estar quando as 10 famílias forem habitar no prédio da R.

    O edifício de habitação colectiva veio alterar e diminuir o aprazível enquadramento urbanístico e paisagístico da propriedade do A.

    Por força da construção da R. o A. tem junto a si, a 2,80m, um edifício de habitação colectiva de grandes proporções e com 10 fogos de habitação com as características já descritas, que, pela proximidade pelas dimensões e enquadramento arquitectónico desajustado afronta a harmonia paisagística e urbanística do prédio do A.

    A situação em que o prédio do A. assim se encontra importa uma desvalorização patrimonial do mesmo, que antes da construção do prédio da R. valeria cerca de € 325.000,00 e agora não valerá mais de € 175.000,00.

    A construção do prédio da R. viola a lei e os direitos do A., desde logo a construção a 2,80m, da linha divisória com o prédio do A. infringe o artigo 73º com referência ao artigo 75º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas.

    A distância entre a fachada sul do prédio da R. e a fachada norte da moradia do A. nunca poderia quedar-se pelos 2,95, mas teria que distar no mínimo 7m, quando não 9m.

    Violado está assim o disposto no artigo 121º do RGEU.

    Há assim grave afectação do conteúdo do direito de propriedade do A. plasmado nos artigos 1302º e seguintes do CC. e artigo 62º da CRP.

    As desvantagens impostas ao A. que se traduzem numa desvalorização de € 150.000,00 têm por contraponto a construção do edifício da R. que lhe permitirá um lucro de € 600.000,00.

    A R. podia e devia ter agido de outro modo, em conformidade com o ordenamento jurídico, sendo por isso a mesma de censura ético-jurídica em que o juízo de culpa se traduz.

    Estão verificados os pressupostos da responsabilidade civil emergente para o lesante da obrigação de indemnizar o lesado pelos danos por este sofridos.

    Termina peticionando: A condenação da R. no pagamento de uma indemnização no valor de € 150.000,00 a que acrescem os juros de mora a contar da citação.

    A ré contestou.

    Alegou, em síntese: Não é dona nem proprietária do prédio que o A. descreve como sendo seu.

    Em Agosto de 2003 a R. permutou com a C (…) o seu prédio que o A. identifica na petição inicial, por três fracções A B J do prédio em construção pela C (…) .

    A R. apenas é proprietária de três fracções no aludido prédio e como tal é parte ilegítima devendo ser absolvida da instância.

    Desconhece se o A. é o proprietário da casa que refere como sendo sua já que a mesma não está registada a favor do mesmo.

    Não consta do projecto aprovado pela Câmara da x (...) a piscina do A. situada a poente do prédio do mesmo, pelo que estará construída clandestinamente.

    Antes da construção do prédio que o A. diz ser propriedade da R. existiam no local a cerca de 15 ou 20 m de distância outros prédios construídos. Os sótãos das moradias construídas no prédio dito da R. não são habitáveis, as varandas destas moradias não são largas nem profundas e nos topos poente e nascente apenas existe uma varanda.

    O prédio do A. tem a mesma altura do prédio que diz ser da R.

    As construções do prédio dito da R. distam 3 metros da extrema divisória com o prédio do A. pois inclui o muro meeiro.

    O prédio do A. devassa tanto o da R. como este aquele.

    O A. conseguiu que a obra no terreno dito da R. fosse embargado durante mais de um ano, embargo esse que terminou com um acordo.

    O A. apresentou acção no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria sobre ilegalidades no licenciamento do edifício tendo tal Tribunal decidido.

    As construções no terreno dito da R. estão de acordo com o PDM em vigor e o projecto de arquitectura, aprovados pela Câmara Municipal da x (...) e com o acordo do A.

    Com o acordo acima aludido o A. estava impedido de intentar a presente acção.

    Pediu: A absolvição da instância, ou a improcedência da acção e a condenação do autor como litigante de má-fé em multa e indemnização não inferior a € 10.000,00.

    Replicou o A.

    Impugnou o alegado pela ré e pediu a sua condenação como litigante de má-fé.

    Foi admitida a intervenção principal da C (…) Lda.

    Esta contestou fazendo seu o articulado da R., e dizendo que adquiriu a propriedade alvo da acção já com os projectos de arquitectura e especialidade elaborados e licenciados pela Câmara Municipal da x (...) .

    Termina peticionando a condenação do A. como litigante de má-fé em multa e indemnização a favor da interveniente no valor de € 10.000,00.

  2. Prosseguiu o processo os seus termos, com algumas vicissitudes, tendo, a final, sido proferida sentença na qual se decidiu: «julgo parcialmente procedente a acção e em consequência: a- Condeno a R. J (…) – Construção Imobiliária e Turismo Lda e a interveniente principal C (…) Lda, solidariamente a pagar ao A. L (…) , a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) a que acrescem os juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da sentença e até efectivo e integral pagamento.

    Custas a cargo do A. em 2/3 e em 1/3 a cargo da R. e da interveniente.» 3.

    Inconformada recorreu a interveniente.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

    1. O Douto Tribunal considerou que a interveniente, aqui recorrente porque construiu, e a Ré, Jomego porque era dona do terreno e nele licenciou o projeto de construção, alteraram com a construção de um bloco de vivendas em banda ao lado do prédio do Autor, não só a paisagem da zona como o enquadramento do prédio do Autor, já construído.

    b) Considerou que do prédio construído é visível pelo menos de um dos apartamentos o logradouro e a piscina do Autor, o que juntamente com o facto da envolvente ficar inexoravelmente alterada, desvalorizou o imóvel daquele em 50.000€, condenado as rés solidariamente a pagar ao Autor por via do enriquecimento sem causa essa quantia.

    c) Ora, o pedido indemnizatório feito pelo Autor nos autos, assenta na responsabilidade civil extracontratual pelos danos que as rés provocaram no imóvel do Autor, assentes no não cumprimento das regras estipuladas no RGEU.

    d) A Douta decisão recorrida, decidiu e bem, que a ter havido violação dessas normas incumbiria à Camara Municipal da x (...) verificar por ser esta a entidade licenciadora.

    e) Conclui afirmando que o prédio está conforme a legalidade e foi construído de acordo com o licenciamento obtido para o efeito, bem como possui licença de habitabilidade.

    f) Foram executados relatórios periciais e produzida prova testemunhal, na qual vem a assentar a decisão ora recorrida, nomeadamente nos depoimentos de três testemunhas: (…), sendo estes contraditórios porque se o primeiro afirmou ter havido uma desvalorização do prédio do Autor na ordem dos 250.000€, o segundo disse que no máximo esta seria de 50.000€, mas por causa da recessão do mercado, e o último afirmou não haver qualquer desvalorização, mas antes uma valorização do imóvel do Autor g) Na sua douta sentença, o Meritíssimo Juiz a quo decidiu que no caso em apreço haveria lugar à aplicação do instituto do enriquecimento sem causa e pronunciou-se pelo empobrecimento do Autor e, na medida inversa do enriquecimento das Rés h) São pressupostos do enriquecimento sem causa, a existência de um enriquecimento, a obtenção desse enriquecimento à custa de outrem; e a ausência de causa justificativa para o enriquecimento, i) Porém e como supra se demonstra não houve qualquer alegação que consolide o pressuposto que houve um enriquecimento. Nenhuma matéria foi alegada e portanto, nenhuma prova produzida relativamente à possibilidade das Rés terem obtido um enriquecimento, muito menos à custa do Autor, j) Para além disso o espirito do artº 474 do C. Civil proibiria ao Autor o recurso à acão de enriquecimento sem causa, uma vez que é subsidiária e este tinha outros recursos disponíveis, nomeadamente o embargo de obra nova ou a...

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