Acórdão nº 733/14.4GBCLD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução10 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1.

No âmbito do processo comum singular n.º 733/14.4GBCLD do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, C. Rainha – JL Criminal, mediante acusação pública, foi o arguido A..., melhor identificado nos autos, submetido a julgamento, sendo-lhe então imputada a prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de consumo de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 40.º, n.º 2, do D.L. n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I – C anexa.

  1. Realizada a audiência de discussão e julgamento, por sentença de 25.05.2017, o tribunal decidiu [transcrição do dispositivo]: Pelos motivos e com os fundamentos expostos, julgo improcedente a acusação e, em consequência, decido absolver o arguido A......, da prática de um crime de consumo, p. e p. pelo art.º 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, de que vinha acusado.

    […] Após trânsito, extraia certidão dos presentes autos e remete à Comissão para a Dissuasão da Toxicodependência, atento o disposto no artigo 5º e ao regime especial previsto no artigo 10º e seguintes, todos da Lei 30/2000, de 29.11.

    […].

  2. Inconformado com a decisão recorreu o Ministério Público formulando as seguintes conclusões: a) A CONTRADIÇÃO INSANÁVEL ENTRE A MATÉRIA DE FACTO PROVADA E A DECISÃO – artigo 410º b) do C.P.P: A. Como se pode ler do texto da sentença, todos os factos constantes da acusação foram dados como provados, inclusive que o arguido tinha consigo quantidade de canábis suficiente para 86 doses.

    1. Observando a motivação da matéria de facto, verifica-se que tal facto resultou da valoração do exame pericial de fls. 44 no qual consta que o produto estupefaciente apreendido é suficiente para 86 doses, calculadas nos termos da portaria 15/93.

    2. Já no “enquadramento jurídico” da sentença (a fls. 201 e 202 dos autos), pode ler-se: ”Ora, perscrutando a matéria de facto provada não se poderá deixar de concluir que o arguido sabia e quis deter para seu consumo cannabis, sendo que esta se integra na Tabela I – C anexa ao referido diploma, que se destinava na totalidade ao seu próprio consumo.

      O arguido detinha na sua posse, 23,074 gramas de flores e sumidades de cannabis, tendo em conta o limite máximo para cada dose diária definido pela Portaria n.º 94/96, de 26 de Março – no caso concreto, o limite máximo para cada dose diária é de 2,5 gr. -, concluindo-se assim que a quantidade detida pelo arguido não excedia o necessário para o consumo médio individual durante 10 dias” D. Ora, tendo sido dado como provado que a quantidade detida pelo arguido podia ser subdividida em 86 doses e tendo sido valorado, sem qualquer hesitação o relatório pericial, não se compreende em que se fundou o Tribunal para considerar que o arguido tinha consigo menos de 10 doses, ou seja, da quantidade permitida para 10 dias.

    3. Existe, assim, inegavelmente, uma contradição insanável entre a matéria de facto dada como provada e a decisão e uma errada aplicação do direito.

    4. Afigura-se-nos que a Meritíssima Juiz baseou a sua decisão apenas na pesagem das folhas detidas pelo arguido: 23,074g (peso obtido pela P.J. mas não pela GNR) que dividiu pelos 2,5 gramas referidos na tabela constante da portaria 15/93. Sucede que, nem tal raciocínio está descrito ou fundamentado na sentença, nem está correto, como passaremos a demonstrar: b) EXISTE ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA, NOMEADAMENTE DO EXAME PERICIAL – artigo 410º, nº 2 c) G. Nos termos do artigo 40º 15/93 (Lei da Droga), após a sua repristinação pelo AUJ do STJ de 8/2008, pratica o crime de Consumo quem detiver, para seu consumo plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a IV, se a quantidade exceder a necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 dias.

    5. A tabela IC anexa a tal diploma define o conceito de canábis, folhas e sumidades floridas e frutificadas e o Mapa anexo à portaria 94/96estabelece como se calcula as doses referentes ao consumo médio individual.

      Assim, tendo em consideração as alíneas a) e c) aplicáveis à canábis, a quantidade média diária tem de ser calculada com base na variação média de THC existente nos produtos de canábis. Especificamente para as folhas a indicação de 2,5g foi calculada a uma concentração média de 2% de THC.

      I. Conforme se pode ver pela mera leitura da tabela não se trata de uma simples multiplicação de 2,5 gramas por 10 dias. Sendo necessário o apuramento e o cálculo do THC e da sua concentração (em percentagem) na canábis.

    6. Tratando-se de uma operação que exige conhecimentos técnicos, científicos e exames laboratoriais, tal cálculo terá de ser efetuado por perito credível e com conhecimento da matéria, in casu o Laboratório de Polícia Científica da P.J.

      L. Sendo matéria, necessariamente sujeita a exame pericial, tem aplicação o artigo 163º do C.P.P. que disciplina que O juízo técnico, cientifico ou artístico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador.

    7. Ou seja, no caso concreto, o apuramento do THC e das doses resultantes da quantidade apreendida resultam exclusivamente da prova pericial estando assim, subtraída à livre convicção do julgador.

    8. Ou seja, não poderia, sem mais, a Meritíssima Juiz afastar a conclusão da perícia, de que estávamos perante 86 doses. E, caso estivesse convicta do seu conhecimento sobre a matéria, teria de fundamentar adequadamente, tal divergência, o que não fez.

    9. Não o fazendo a sentença recorrida é ilegal, por violação do artigo 163º do C.P.P., padece de erro notório na apreciação da prova e de falta de...

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