Acórdão nº 0800/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – RELATÓRIO 1.

A………………., devidamente identificada nos autos, intentou no TAF de Sintra acção administrativa especial contra a Caixa Geral de Aposentações (CGA), tendo formulado, a final, os seguintes pedidos: “a) deve ser anulado o despacho de 13 de Fevereiro de 2012 da Direcção da Caixa Geral de Aposentações na parte em que procedeu erradamente ao cálculo do montante da pensão por aplicação do artigo 149º em vez dos n.ºs 4 e 5 do artigo 148.º do Estatuto do Ministério Público; b) deve ser condenada a entidade demandada a praticar o acto de determinação do montante da pensão de jubilação da autora (subsequente ao reconhecimento do direito), por aplicação dos n.ºs 4 e 5 do artigo 148.º do Estatuto do Ministério Público; c) deve ainda a entidade demandada ser condenada a reembolsar a autora de todas as quantias em dívida, incluindo os respectivos juros”.

Alegou, em síntese, a A. que: i) “o acto impugnado aplica à pensão da autora as regras relativas à aposentação ou à reforma constantes do artigo 149º, com olímpica desconsideração pela injunção constante do nº 4 do artigo 148º do Estatuto do Ministério Público: «A pensão é calculada em função de todas as remunerações sobre as quais incidiu o desconto respectivo, não podendo a pensão líquida do magistrado jubilado ser superior nem inferior à remuneração do magistrado no activo de categoria idêntica»; ii) “Não existe, tanto quanto a autora se consegue aperceber, qualquer fundamento válido para a aplicação da fórmula do artigo 149.º do Estatuto da Aposentação ao seu caso”; iii) “Trata-se, consequentemente, de um acto administrativo ilegal, por razões substantivas ligadas à determinação do seu conteúdo que, consequentemente, não pode subsistir na ordem jurídica”; “Deste modo, deve ser anulado, o que desde já se requer”; iv) “O interesse próprio da autora não consiste na destruição dos efeitos do acto administrativo que lhe reconheceu o direito à jubilação mas antes na condenação da Caixa Geral de Aposentações na prática do acto que, para além de lhe reconhecer o direito à jubilação fixe o montante da pensão de acordo com os princípios estabelecidos nos n.ºs 4 e 5 do artigo 148º do Estatuto do Ministério Público” (cfr. os artigos 67.º, 70.º, 72.º, 73.º e 74.º da p.i.).

O TAF de Sintra, por decisão de 19.02.14, julgou a acção procedente e anulou o despacho de 13.02.12 da Direcção da CGA na parte em que procedeu erradamente ao cálculo do montante da pensão da A. por aplicação do artigo 149º em vez dos n.ºs 4, 5 e 6 do artigo 148.º do Estatuto do Ministério Público (EMP). Além disso, condenou a demandada CGA a praticar o acto de determinação do correcto montante da pensão de jubilação da A. ao abrigo do artigo 148.º do EMJ. E, mais ainda, condenou-a a reembolsar a A. das quantias em dívida, resultantes da diferença entre o montante inicialmente definido pela CGA e aquele que resulta da “aplicação da referida fórmula de cálculo, incluindo os respectivos juros”.

Da decisão do TAF de Sintra recorreu a R. para o TCAS, o qual, por decisão de 12.02.15, negou provimento ao recurso. Desta decisão do TCAS recorreram ambas as partes.

1.1.

A A., ora recorrente, apresentou alegações de recurso, concluindo do seguinte modo (fls. 368 a 371): “1. O presente recurso de revista restringe-se à parte do acórdão do TCA Sul que extrai dos nºs 4 e 5 do Artº 148º do EMP o entendimento de que no cálculo da pensão da Autora se deverá considerar a remuneração do magistrado no activo de categoria idêntica deduzida da quota para aposentação e pensão de sobrevivência para a CGA.

  1. Estamos perante uma matéria que, por respeitar a pensões de magistrados, é de grande relevância, com protecção consagrada na Constituição da República Portuguesa, designadamente no Artº 63º, nº 3, em que a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo é de extrema importância para uma boa administração da justiça, já que, com antecedência, se irão resolver dúvidas de interpretação, estabelecendo-se uma linha orientadora para os tribunais inferiores.

  2. Não há, assim, dúvidas de que a admissão do recurso é necessária para uma boa aplicação do direito.

  3. Por outra via, a resolução desta questão interessa a um grupo muito alargado de pessoas em condições idênticas, no âmbito quer da magistratura do Ministério Público, quer da magistratura judicial, assumindo especial repercussão em ambas as magistraturas.

  4. Está, assim, em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância social, se reveste de importância fundamental.

  5. É, assim, de admitir o presente recurso de revista, na medida em que os requisitos previstos no Art.º 150.º do CPTA se encontram preenchidos.

  6. A interpretação do acórdão recorrido não está em conformidade nem com a letra, nem com o espírito dos normativos constantes dos nºs 4 e 5 do Artº 148º do EMP.

  7. A opção – aliás, a correcta – do acórdão, pela aplicação do nº 4 do Artº 148º do EMP, em vez do disposto no Artº 149º e respectivo anexo, do mesmo diploma, na determinação da pensão dos magistrados jubilados do Ministério Público, tem como consequência lógica que a remuneração do magistrado no activo de categoria idêntica a considerar não seja líquida da quota para a CGA.

  8. É que nada na letra do nº 4 do Artº 148º do EMP autoriza a concluir pelo cálculo da pensão dos magistrados jubilados com referência à remuneração deduzida da quota para a CGA, 10. contrariamente ao que sucede relativamente ao cálculo da pensão dos magistrados aposentados ou reformados, regulado no Artº 149º do mesmo Estatuto, onde expressamente se prevê que a «remuneração relevante para esse efeito seja deduzida da percentagem da quota para aposentação e pensão de sobrevivência no âmbito do regime da Caixa Geral de Aposentações» - Artº 9º, nºs 2 e 3, do Código Civil.

  9. Este entendimento da Recorrente é reforçado pela circunstância de na versão inicial da proposta que conduziu às alterações ao EMP (Proposta de Lei nº 45/XI/2a) constar a referência à remuneração líquida da quota para a CGA. para efeitos de cálculo e de actualização automática das pensões dos magistrados jubilados, e, depois acabar tal referência por ser retirada da versão final que veio a ser aprovada (Texto de Substituição da Proposta de Lei nº 45/XI/28) - Cfr. docs n.º 1 junto com as alegações de direito na primeira instância e documentos 7 e 6, juntos com a petição.

  10. Há, assim, que reconhecer ter havido uma vontade inequívoca do legislador no sentido de na fixação, bem como na actualização automática, das pensões dos magistrados jubilados do Ministério Público, se dever considerar uma remuneração do magistrado no activo de categoria idêntica sem dedução da quota para a CGA.

  11. Essa "remuneração" de que se parte para o cálculo e actualização automática das pensões dos magistrados do Ministério Público jubilados só pode ser a remuneração base, que integra o sistema retributivo e a que aludem os Arts. 95º e 96º do EMP.

  12. É de notar, ainda, que a expressão "pensão líquida" constante do nº 4 do Artº 148º do EMP apenas pode significar uma pensão deduzida da redução remuneratória de 10% prevista na Lei do Orçamento de Estado para 2011.

  13. Pelo exposto, o acórdão recorrido violou, por erro de interpretação o disposto nos nºs 4 e 5 do Artº 148º do EMP.

    Nestes termos, deverá ser concedido provimento ao recurso, revogando-se o acórdão na parte ora recorrida e decidindo-se por uma interpretação do Artº 148º, nºs 4 e 5 do EMP no sentido de que no cálculo, e, consequentemente, na actualização automática das pensões dos magistrados do Ministério Público jubilados, se deverá considerar uma remuneração do magistrado no activo de categoria idêntica sem dedução da quota para aposentação e pensão de sobrevivência no âmbito do regime da Caixa Geral de Aposentações.

    Só assim se fará JUSTIÇA”.

    1.2.

    A recorrente CGA apresentou alegações de recurso, concluindo do seguinte modo (fls. 379v. a 382): “1.ª Está em causa, no presente recurso, a interpretação do disposto nos artigos 148.º e segts do Estatuto dos Magistrados Judiciais – a qual convém esclarecer para uma melhor aplicação no futuro, não só por ser a primeira vez que esta questão se coloca, como, atendendo ao importante grupo profissional a que se reporta, a mesma assume uma particular relevância comunitária, estando em causa uma verdadeira alteração de paradigma no que concerne à determinação do montante da pensão de aposentação ou "remuneração de jubilado", que passa, na interpretação defendida pelo TCAS a ser relativamente autónoma e independente da carreira contributiva.

    1. Não existe qualquer fórmula de cálculo de pensão específica para magistrados jubilados descrita no artigo 148.º do EMMP.

    2. Refere a primeira parte do n.º 4 do artigo 148.º do EMMP que "a pensão é calculada em função de todas as remunerações sobre as quais incidiu o desconto respectivo..." – se assim é, a pensão terá de ser proporcional à carreira contributiva, a qual, na perspetiva da ora recorrente, resulta precisamente da fórmula prevista no artigo 149.º do EMMP.

    3. Aquela fórmula é precisamente a que se encontrava vigente no artigo 53.º, n.º 1, do Estatuto da Aposentação para a generalidade dos subscritores que se aposentaram até 31 de dezembro de 2005, salientando-se que a pensão de aposentação dos magistrados jubilados sempre foi determinada de acordo com aquela mesma fórmula de cálculo, sendo que a única especificidade prendia-se com o regime de atualização da pensão por indexação.

    4. A partir de 1 de janeiro de 2006, foram sendo sucessivamente alteradas as fórmulas de cálculo previstas no Estatuto da Aposentação, orientadas, por um lado, pelo princípio da convergência do regime de proteção social da função pública com o regime geral de segurança social, e, por outro, pela necessidade da sustentabilidade e equilíbrio financeiro do sistema de pensões.

    5. Manteve-se, no entanto, a fórmula prevista no artigo 51.º, n.º 1, do Estatuto da...

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