Acórdão nº 01336/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | CARLOS CARVALHO |
Data da Resolução | 01 de Junho de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
RELATÓRIO 1.1.
A…………, devidamente identificado nos autos, instaurou, conjuntamente com outros AA. [«B…………, LDA.», C………… e D…………], no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [doravante «TAC/L»] a presente ação administrativa especial contra o “INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, IP” [doravante «IFAP, IP»], peticionando, pela motivação inserta na petição inicial, que fosse anulado o ato do Conselho Diretivo do «IFAP, IP», datado de 18.02.2010, que determinou, nos termos no ofício de ref.ª 201/DAI/UREC/2010, que a «B…………, LDA.
» procedesse à devolução da quantia de 51.315,30 € acrescida dos juros no montante de 10.810,24 €, relativa ao subsídio comunitário concedido no âmbito do projeto de investimento n.º 2002530018155, no quadro do Programa Agro - Programa Operacional de Agricultura e Desenvolvimento Rural, Medida 1.
1.2.
O «TAC/L», por decisão de 15.11.2013, veio a julgar procedentes as exceções da falta de personalidade judiciária da A. «B………… …» [por haver sido dissolvida em 30.12.2009, e antes da propositura da presente ação] e de ilegitimidade ativa dos restantes AA. [os segundo e terceiro AA. na qualidade de sócios, e o quarto A. na qualidade de fiador da sociedade comercial «B………… …»] e, consequentemente, absolveu o R. da instância.
1.3.
O A., A…………, inconformado, recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul [doravante «TCA/S»], o qual, por acórdão de 30.06.2016, julgou improcedente o recurso e confirmou a decisão recorrida.
1.4.
Invocando o disposto no art. 150.º do CPTA o mesmo A., de novo inconformado, agora com o acórdão proferido pelo «TCA/S», interpôs, então, o presente recurso jurisdicional de revista, apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: “...
QUANTO À ADMISSIBILIDADE DA REVISTA: (…) QUANTO AO RECURSO PROPRIAMENTE DITO 29ª) Da decisão recorrida resultou e entendeu-se, em resenha necessariamente breve, que:
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O IFAP concedeu um empréstimo à empresa B…………, Lda., o qual teve o recorrente como fiador; b) A B…………, Lda. investiu o que estava efetivamente programado, adquiriu todos os bens e serviços constantes do seu projeto, o que não é posto em causa pelo IFAP! c) No entanto, como a B…………, Lda. não terá cumprido com determinadas normas procedimentais, o IFAP determinou a devolução de algumas quantias em 08/02/2010; d) A empresa B…………, Lda. a quem foi concedido o subsídio em questão, foi dissolvida e liquidada em 30/12/2009; e) O fiador opôs-se à devolução das quantias exigidas pelo IFAP na medida em que, com o encerramento da B…………, Lda., seria apenas sobre si que recairiam todas as responsabilidades e, desse modo, teria interesse direto em agir; f) O Tribunal «a quo» considerou improcedente o recurso entendendo que o fiador, ora recorrente, «é parte ilegítima na presente causa na medida em que carece de interesse direto e pessoal para pedir a anulação da deliberação (…)».
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) Terá o Tribunal «a quo» razão? Em nosso modesto entendimento, não! 31ª) A presente ação visa suspender a eficácia do ato administrativo da decisão proferida pelo Conselho Diretivo do IFAP proferida em 18/2/2010, notificada à empresa através do ofício 201/DAI/UREC/2010, na qual aquele determinou a devolução da quantia de € 51.315,30 e respetivos juros no valor de € 10.810,24 (cfr. doc. 2 junto com a PI).
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) Com efeito, a B………… era uma sociedade comercial de âmbito familiar, constituída por dois irmãos, jovens agricultores e que se dedicava à atividade agrícola.
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) O ora Recorrente, pai dos sócios, foi o fiador do projeto agrícola de onde deriva a ordem de devolução dada pelo Recorrido.
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) Para prossecução da sua atividade, a B…………, Lda. candidatou-se ao denominado Programa Agro - Medida 1, tendo apresentado em 2002 um projeto de investimento na atividade agrícola destinado à modernização, reconversão e diversificação das explorações (Projeto n.º 2002530018155), sendo que o projeto de investimento totalizava € 242.221,70 (Vd. Doc. 1 que se juntou com a PI).
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) Dessa quantia, € 108.999,77 seria subsidiada no âmbito do Programa Agro, gerido pelo Recorrido, sendo o remanescente no valor de € 133.221,93 suportado por capitais próprios.
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) A quantia de € 108.999,77 tinha uma componente nacional, no valor de € 27.249,94 e uma componente comunitária no valor de € 81.749,83.
A 1ª A. investiu o que estava efetivamente programado e adquiriu todos os bens e serviços constantes do seu projeto, o que não é posto em causa pelo IFAP! 37ª) Contudo, a B………… foi notificada pelo IFAP da seguinte decisão: a) «Pelo exposto e para efeitos de reposição voluntária da quantia em dívida supra, no montante de € 62.125,54 (…), ficam Vs. Exas. notificados de que a mesma poderá ser efetuada por meio de cheque ou vale postal a entregar na Tesouraria deste Instituto na Rua Castilho n.º 45-51 em Lisboa, fazendo referência ao número do projeto e processo indicado neste ofício, no prazo de trinta dias a contar da receção do mesmo.
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Findo o prazo referido no parágrafo anterior e, caso não se verifique a reposição voluntária da quantia supra referida, será o montante em dívida compensado nos termos legais, com créditos que venham a ser atribuídos a V. Exa., seguindo-se, na falta ou insuficiência destes, a instauração do processo de execução fiscal relativamente ao montante em dívida (destacado nosso).
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(cfr. doc. 2 junto com a PI).
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) Ora, nem a B………… nem o Recorrente tem créditos a receber do IFAP, pelo que este não poderá proceder a qual compensação.
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) Logo, o IFAP irá instaurar processo de execução fiscal, se é que ainda não instaurou.
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) Uma vez que a B………… já não tem qualquer atividade nem património e foi, inclusive, dissolvida, liquidada e encerrada, este processo de execução fiscal será necessariamente instaurado contra o fiador, o aqui recorrente.
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) O que levará, necessariamente, à penhora dos bens do recorrente, o qual é agricultor por conta própria e, consequentemente, tal terá as consequências que facilmente se poderão antever.
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) Desde logo, a impossibilidade de recurso a crédito, já que a ação executiva constará no sistema bancário.
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) A impossibilidade de obtenção de declarações de inexistência de dívidas, o que inviabilizará novas candidaturas a projetos agrícolas ou outros.
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) Tudo isto levará que o envolvido no processo de execução fiscal fique impossibilitado, na prática, de prosseguir a sua atividade agrícola, o que lhe acarretará prejuízos incalculáveis e irremediáveis.
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) Visto isto, poderemos, ainda assim, afirmar que os efeitos da decisão do IFAP não se irão repercutir diretamente na esfera jurídica e patrimonial do Recorrente? 46ª) Veja-se que a deliberação do IFAP ora em análise ameaça expressamente com a: «(…) instauração do processo de execução fiscal relativamente ao montante em dívida».
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) Ora, se no momento da deliberação a B…………, Lda. já nem sequer existia, contra quem é que o IFAP vai instaurar a execução? 48ª) A resposta é evidente e não pode deixar de ser o fiador o alvo concreto e único dessa deliberação, não obstante a mesma não lhe ter sido diretamente dirigida.
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) Parece-nos, salvo melhor entendimento, que o Recorrente tem não só todo o interesse como legitimidade para impugnar desde já uma medida que consideram ilegal e cujo destinatário único será ele próprio.
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) «Tem, assim, legitimidade para impugnar quem ‘espera obter da anulação do ato impugnado um certo benefício e se encontra em condições de o poder receber’ sendo o interesse direto desde que de percussão imediata na esfera do interessado.
O interesse direto contrapõe-se, assim, a um interesse meramente longínquo, eventual ou hipotético, que não se dirija a uma utilidade que possa advir diretamente da anulação do ato impugnado. O requisito do caráter ‘direto’ do interesse não tem, pois, em nossa opinião, que ver com a legitimidade processual, mas com a questão de saber se o alegado interesse (que, por isso, é parte legítima no processo) tem efetiva necessidade de tutela judiciária: ou seja, tem que ver com o interesse processual ou interesse em agir» (cfr. Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo...
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