Acórdão nº 0355/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GON
Data da Resolução21 de Junho de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, na formação a que se refere o actual nº 6 do art. 150º do CPTA: RELATÓRIO 1.1.

A……………, SA, com os demais sinais dos autos, interpõe recurso de revista excepcional, nos termos do art. 150º do CPTA, do acórdão proferido em 0/11/2016 no TCA Norte, no processo que aí correu termos sob o nº 855/04.0BEPRT e no qual, negando-se provimento ao recurso que havia interposto, se confirmou a sentença do TAF do Porto, proferida em 28/05/2015, que julgara improcedente a impugnação das liquidações adicionais de IVA relativas aos exercícios de 1999 e 2000, bem como aos respectivos juros compensatórios.

1.2.

Para tanto alegou, formulando as seguintes conclusões: I. Por isso, para além de legitimidade para a interposição do presente recurso a recorrente tem também interesse em agir, estado assim totalmente preenchido o conceito de legitimidade previsto no art. 141º do CPTA.

  1. Só os processos a que a lei atribui natureza urgente correm em férias, pelo que, quanto aos restantes, todos os prazos, incluindo o previsto no art. 139º do Cód. Proc. Civil se suspendem em férias.

  2. No caso concretamente em apreço, verifica-se o preenchimento do conceito relevância jurídica fundamental na medida em que, juridicamente, a douta decisão aqui em crise “abre caminho” para que possam ser proferidas sentenças que não sejam processualmente auto-suficientes, no sentido de que, factualmente, assentam, e remetem, para documentos inexistentes nos autos.

  3. Com efeito, in casu, existem factos dados como provados em ambas as instâncias, que se alicerçam em documentos que não constam do processo, ou seja, há factos cuja prova não assenta em simples remissão para documento junto aos autos, mas sim na mera menção da existência de um documento que não consta dos próprios autos.

  4. Tal situação é distinta da prova de factos por remissão para documento, situação que já se encontra bastante tratada a nível jurisprudencial.

  5. Por outras palavras, a relevância jurídica que justifica a admissibilidade do presente recurso prende-se com o facto de na douta decisão recorrida ter sido decidido que numa decisão judicial se podem considerar como provados factos apenas com base em documentos que não constam do processo - cfr. alínea B) dos factos provados, na qual se verifica, a págs. 14 e 15, que são referidos os anexos 1 e 6, enquanto que na alínea C), se remete expressamente para o documento referido na alínea B) - cfr. págs.17 do douto Acórdão aqui em crise.

  6. Isto porque, atento o teor de fls. 334 a 336 dos autos, verifica-se que nos presentes autos não foi ouvido qualquer elemento da AT, tendo apenas sido ouvidas testemunhas arroladas pela recorrente, à matéria por si indicada, toda ela no sentido de contraditar a posição da AT.

  7. Na situação sub judice aqui o que se verifica é que o entendimento vertido no douto Acórdão em matéria de fundamentação da matéria de facto contraria todas as regras aceites pela doutrina e jurisprudência sobre esta questão.

  8. A fundamentação de uma decisão judicial tem, como função primacial, permitir a todos os seus destinatários entender as razões subjacentes à sua prolação, por forma a, se assim o entenderem, e a lei o permitir, poderem contraditá-la em sede própria.

  9. Mesmo tendo em atenção os princípios estruturantes do processo judicial tributário verifica-se que nunca, em caso algum, é admissível que na fixação dos factos provados as regras de fundamentação sejam afastadas, ou seja, apesar do tribunal ter o poder de “(…) esclarecer e instruir autonomamente, mesmo para além das contribuições das partes (...)”, tal não significa que na decisão que vier a proferir - Despacho, Sentença ou Acórdão - as regras da fundamentação sejam limitadas, ou alteradas, por força dos referidos princípios.

    XI.

    In casu,o douto Acórdão do Venerando Tribunal a quo aqui em crise, seguiu um entendimento que, por si só, afasta a possibilidade de sindicância da fundamentação da matéria de facto por parte de qualquer outro tribunal.

  10. Com efeito, ao permitir-se a remissão da matéria de facto dada como provada para documentos que não constam dos autos, está-se a criar uma situação de total incerteza jurídica das decisões judiciais, na medida em que as mesmas poderão extrapolar aquilo que é o conteúdo do processo em matéria probatória, impedindo que as partes ou os tribunais superiores possam sindicar a respectiva fundamentação, e inerente suporte probatório, por virtude de este não constar do processo.

  11. As alíneas B) e C) dos factos provados remetem expressamente para os anexos e o número de folhas em que os documentos cujo teor ali se dá por reproduzido se encontram.

  12. Inexistem nos autos os anexos que contêm a documentação em que a AT alega ter-se baseado para elaborar o Relatório de Inspecção, sendo que, resulta de uma simples leitura deste último que tais documentos são o cerne probatório do processo administrativo que culminou com o dito Relatório.

  13. O Venerando Tribunal a quo entendeu que o facto de a recorrente não ter questionado a não junção de tais elementos aos autos, e também de não ter requerido a sua junção, impede a mesma de alegar a limitação do seu direito de defesa com base nesse facto.

  14. Tal entendimento não tem qualquer validade na situação em apreço, na medida em que até à prolação da douta sentença da 1ª instância era impossível à recorrente, ou a qualquer outra pessoa/entidade colocada em posição idêntica, saber que o Meritíssimo Tribunal de 1ª instância iria dar como provados factos alegadamente resultantes do teor de documentos que não se encontram juntos aos autos.

  15. Atendendo a que um dos princípios estruturantes do processo judicial tributário é o princípio da investigação - cfr. art. 99º, nº 1 da LGT, art. 13º, nº 1, CPPT - não era expectável que o Meritíssimo Tribunal de 1ª instância alicerçasse a sua fundamentação da matéria de facto com base em documentos que não se encontravam juntos aos autos, sem se ter dado ao cuidado de previamente ordenar a sua junção, no exercício do seu poder-dever de investigação.

  16. Não o tendo feito, não é lícito alegar, como fez o Venerando Tribunal a quo, que a recorrente deveria ter requerido a junção de tais documentos, na medida em que a esta não se aplicam as regras constantes dos arts. 266º, nº 1 e 2 da CRP e 55º da LGT.

  17. Não estando juntos aos autos os elementos referidos nas alíneas B) e C) dos factos provados, não ter sido possível quer ao Meritíssimo Tribunal de 1ª instância, quer ao Venerando Tribunal a quo, comprovar materialmente as afirmações constantes do Relatório de Inspecção Tributária e dadas como reproduzidas nas referidas alíneas.

  18. A não junção aos autos dos anexos referidos nas alíneas B) e C) dos factos provados, impediu por si só que ambas as instâncias fundamentassem as suas doutas decisões, dando cumprimento ao disposto no art. 123º, nº 2 do...

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