Acórdão nº 01213/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | TERESA DE SOUSA |
Data da Resolução | 26 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório O Ministério do Trabalho e Segurança Social (MTSS) e o agrupamento B……… A.C.E. interpuseram recurso de revista, para esta Secção do Contencioso Administrativo, do acórdão do TCA Sul que, revogando a sentença do TAF de Sintra, anulou o procedimento para a prestação de serviços de vigilância e segurança referente ao lote 9- Prestação de serviços de vigilância e segurança humana em todo o Território Nacional, ao abrigo de acordo quadro, e bem assim o respetivo acto de adjudicação e o consequente contrato celebrado entre ambos.
O MTSS nas suas alegações formula as seguintes conclusões (transcrevendo-se apenas as que interessam ao mérito do recurso): a. Clarificar a jurisprudência existente - cfr. o Acórdão recorrido que não admite uma fase de negociação nos procedimentos para a formação dos contratos em questão, em contraponto com o Acórdão do mesmo Tribunal que, embora lateralmente, aceita a realização de uma fase de negociação - Cfr. Acórdão do TCA Sul de 14/05/2015, no processo 11910/15, abaixo transcrito.
Mas também e porque, por outro lado, b. A redacção da norma do artigo 149.° do CCP não permite extrapolar para a interpretação que o Tribunal a quo lhe atribuiu sob pena de violação dos princípios básicos da legistica material, e por confundir os efeitos dos verbos "poder" e "dever" quando inseridos na redacção de legislação e por esses motivos ocorreu um desvio da correcta aplicação do direito, sendo assim a admissão do presente recurso é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, uma vez que o acórdão recorrido errou e carece de fundamento quando considerou violados os artigos 145.° a 149.° do CCP, porque, no caso, a adopção do leilão electrónico era uma faculdade e não uma obrigação, já que a remissão do artigo 259°, n.° 3 do CCP, é também para a fase da negociação, prevista nos artigos 149° a 154° do CCP.
Senão vejamos, No que concerne ao ponto a) - Da clara necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pela jurisprudência de forma contraditória Efectivamente: 13. O procedimento aqui em causa seguiu-se à celebração de um acordo-quadro.
-
Como é sabido, nos termos do disposto no artigo 251° do CCP (Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 18/2008, de 29 de Janeiro), «acordo quadro» "é o contrato celebrado entre uma ou várias entidades adjudicantes e uma ou mais entidades, com vista a disciplinar relações contratuais futuras a estabelecer ao longo de um determinado período de tempo, mediante a fixação antecipada dos respectivos termos".
-
O objectivo do «acordo quadro» é, assim, o de seleccionar um determinado número de empresas que serão ulteriormente consultadas, quando surgir a necessidade de celebrar certos contratos, com vista a, em termos de concorrência entre elas, se proceder à respectiva adjudicação.
-
Assim, o «acordo quadro» não constitui em si mesmo um contrato, mas um acordo sobre contratos a celebrar ulteriormente, nele se disciplinando o regime dos contratos a celebrar entre as entidades por ele abrangidas.
-
Da celebração de um acordo quadro decorre, designadamente, a obrigação do co-contratante do acordo-quadro- "celebrar contratos nas condições naquele previstas à medida que a entidade adjudicante parte no acordo quadro o requeira" (cfr. artigo 255° n° 1 do CCP).
-
Os termos do acordo-quadro celebrado são, pois, vinculativos para as partes que o celebraram, de modo que dos contratos que venham a ser celebrados ao seu abrigo "não podem resultar alterações substanciais das condições consagradas" naqueles (cfr. artigo 257° n° 2 do CCP).
-
Admite-se, contudo dois grandes tipos de acordo-quadro: - os acordos-quadro cujos termos abranjam todos os aspectos dos contratos a celebrar submetidos à concorrência (artigo 258° do CCP); e os acordos-quadro cujos termos não abranjam todos os aspectos dos contratos a celebrar submetidos à concorrência (artigo 259° do CCP).
-
A situação dos autos enquadra-se neste segundo tipo.
-
Ora, em tal caso, a entidade adjudicante "deve dirigir aos co-contratantes do acordo quadro que reunam as condições necessárias para a execução das prestações objecto desses contratos um convite à apresentação de propostas circunscritas: aos termos do acordo quadro a concretizar, a desenvolver ou a complementar em virtude das particularidades da necessidade cuja satisfação se visa com a celebração do contrato; aos aspectos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos do acordo quadro para os efeitos do procedimento de formação do contrato a celebrar ao seu abrigo" (cfr. artigo 259° n° 1 do CPP).
-
Sendo que tal convite "deve indicar o prazo e o modo de apresentação das propostas, bem como os termos ou os aspectos" da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos do acordo quadro para os efeitos do procedimento de formação do contrato a celebrar e, ainda, "o modelo de avaliação das propostas com base nos factores e eventuais subfactores que densificaram o critério de adjudicação previamente previsto no programa do procedimento de formação do acordo quadro" (cfr. artigo 259° n° 2 do CPP).
-
Aplicando-se a tal procedimento, "com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 139° e seguintes" (cfr. artigo 259° n° 3 do CPP).
-
Assim sendo, por força da norma remissiva contida neste nº 3 do artigo 259° do CCP são de aplicar na escolha do co-contratante para o contrato a celebrar ao abrigo de acordo-quadro que não abranja todos os aspectos dos contratos a celebrar submetidos à concorrência (isto é, aqueles a que se refere o artigo 259° do CCP) as regras respeitantes à avaliação das propostas (artigo 139" do CPP), ao leilão electrónico (artigos 140° a 145° do CCP), à preparação da adjudicação (artigos 146° a 148° do CCP) e à fase da nesociacão (artigos 149° a 154° do CCP), sempre, lembre-se, com as necessárias adaptações." cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 14/05/2015, no processo 11910/15, ao qual aderimos, e que não afasta a possibilidade de existência de uma fase de negociação.
-
Sendo que, como se pode verificar, este último Acórdão, foi proferido numa situação idêntica à dos presentes autos, ou seja, num procedimento tendente à contratação de uma prestação de serviços na sequência de um acordo quadro.
-
Assim, entendemos que a intervenção do STA se torna necessária para uniformizar a jurisprudência existente - cfr. o Acórdão recorrido que não admite uma fase de negociação nos procedimentos para a formação dos contratos em questão, em contraponto com o Acórdão do mesmo Tribunal que aceita a realização de uma fase de negociação - que para situações similares tem entendimentos divergentes.
-
Por outro lado, dispõe o n.° 3 do artigo 259 do CCP sob a epígrafe "Celebração de contratos ao abrigo de acordos quadro cujos termos não abranjam todos os seus aspectos submetidos à concorrência" que "Ao procedimento previsto no presente artigo é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 139." e seguintes.
-
Ora, os procedimentos previstos no CCP obedecem ao princípio da tipicidade, sendo que estes, de acordo com o n.° 1 do artigo 16.° do CCP, sob a epígrafe "Procedimentos para a formação de contratos" se circunscrevem aos seguintes: Ajuste directo; Concurso público; Concurso limitado por prévia qualificação; Procedimento de negociação; Diálogo concorrencial.
-
De salientar que o referido artigo do CCP não refere a possibilidade de existência de "outro tipo de procedimentos referidos no mesmo Código".
-
Assim sendo, não constituindo o procedimento a que se refere o n.° 3 do artigo 259.° do CCP um procedimento autónomo e com regulação própria, as entidades adjudicantes são confrontadas com a necessidade de adequar os formalismos dos procedimentos tipificados em função do valor do contrato a celebrar com a disposição do n.° 3 do artigo 259.° do CCP.
-
Daqui resulta que o procedimento objecto dos presentes autos teve de se socorrer, em função do valor do contrato a celebrar, do formalismo a que obedece o procedimento por "concurso público".
-
Também o Tribunal a quo deu como facto assente que a " (,..) para os contratos individuais derivados de acordo quadro segue, por determinação de lei expressa, o regime do concurso público, paradigma do "concurso aberto" por contraposição ao "procedimento negociado. " 33. Ora, as peças do procedimento para a formação de contratos em que seja utilizado o concurso público são o programa do procedimento e o caderno de encargos - cfr alínea b) do n.° 1 do artigo 40.° do CCP, sendo que o convite remetido aos concorrentes e para a evitar a duplicação de peças processuais, corresponde e tem o mesmo conteúdo do programa do concurso.
-
De acordo com o artigo 132.° do CCP, que regula o conteúdo do programa de concurso, verifica-se a existência de uma disposição, referimo-nos mais concretamente à do n.° 4, que refere e transcrevemos "O programa do concurso pode ainda conter quaisquer regras específicas sobre o procedimento de concurso público consideradas convenientes pela entidade adjudicante, desde que não tenham por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência." 35. E não podemos ignorar que uma das regras do concurso público é precisamente a possibilidade de existência de uma fase de negociação, pelo que não vislumbramos o porquê de a entidade adjudicante, à luz do n.° 4 do artigo 132.° do CCP não poder optar por uma fase de negociação.
-
Veja-se por outro lado que tanto o leilão electrónico previsto no artigo 140.° do CCP bem como a fase de negociação de propostas - 149.° do CCP - tem como objectivo primordial permitir aos concorrentes melhorar progressivamente as suas propostas, ou seja, o mesmo objectivo final, pelo que não se percebe qual a intenção do legislador em restringir a aplicação de uma destas fases em detrimento da outra, uma vez que a única...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO