Acórdão nº 0135/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução15 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 1953/16.2BEBRG 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (doravante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, julgando procedente a reclamação deduzida por “A.………, S.A.” (a seguir Executada, Reclamante ou Recorrido) ao abrigo do disposto nos arts. 276.º e 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), anulou a decisão do órgão da execução fiscal de indeferimento do pedido da Executada, de que se mantivesse a suspensão do processo executivo até ao trânsito em julgado da decisão a proferir no recurso por ela interposto do despacho de não homologação do plano de recuperação apresentado em sede do respectivo processo especial de revitalização a correr termos pela 1.ª Secção da Instância Central de Comércio de Guimarães do Tribunal da Comarca de Braga.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «I. Vem o presente recurso interposto da decisão que julgou procedente a reclamação apresentada pela contribuinte, a qual determinou a anulação do despacho do órgão da execução fiscal que indeferiu o pedido de suspensão dos autos de execução fiscal enquanto estiver pendente o recurso interposto pela Reclamante (doravante RR) do despacho de não homologação do plano de revitalização no âmbito do Processo Especial de Revitalização (doravante PER).

  1. Como se extrai da decisão, entendeu a M. Juíza que o encerramento do PER ainda não ocorreu, pois, o despacho [de] não homologação do plano de recuperação ainda não transitou em julgado, em virtude da apresentação de recurso do despacho pela RR.

  2. Com a ressalva do devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com [o] assim decidido porquanto, no seu entender, a mesma fez uma errada interpretação do n.º 1 do artigo 17.º-E do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), como se procurará evidenciar.

  3. Atentos à factualidade cronológica dada como assente, podemos facilmente depreender que a Administração Tributária agiu em conformidade com os princípios básicos da legalidade fiscal, tendo em atenção a intangibilidade dos créditos tributários e a sua prevalência sobre qualquer legislação especial.

  4. O PER visa permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com este acordo conducente à sua revitalização (cfr. artigo 17.º-A, n.º 1 do CIRE).

  5. De acordo como previsto no n.º 3 do artigo 17.º-A do CIRE, o PER trata-se de um processo de carácter urgente que se inicia com a manifestação de vontade do devedor e de pelo menos um credor de encetarem negociações conducentes à revitalização daquele por meio da aprovação de um plano de recuperação (cfr. artigo 17.º-C, n.º 1 CIRE).

  6. Obtida tal declaração, deverá o requerente comunicar ao juiz do tribunal competente para abertura do processo, que pretende dar início às negociações visando a sua recuperação, devendo então o juiz competente nomear administrador provisório (cfr. artigo 17.º-C, n.º 3 CIRE).

  7. Com este despacho determina-se o prosseguimento do PER e simultaneamente obsta-se à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação (cfr. artigo 17.º-E, n.º 1 do CIRE).

  8. Porém, como resulta expressamente deste normativo, quer o obstáculo à instauração de acções para cobrança de dívidas contra o devedor, quer a suspensão de acções já instauradas com idêntica finalidade, apenas perdura enquanto se mantiverem as negociações entre o devedor e os credores.

  9. O prazo para a conclusão das negociações é de dois meses, prorrogável uma só vez e por um mês, mediante acordo prévio entre o administrador provisório e o devedor (cfr. artigo 17.º-D, n.º 5 do CIRE).

  10. Na impossibilidade de alcançar acordo, ou sendo ultrapassado o prazo de negociações sem que se obtenha acordo, o processo negocial é encerrado (cfr. artigo 17.º-G do CIRE).

  11. Salvo melhor opinião, uma vez que o obstáculo à instauração de acções para cobrança de dívida ou a suspensão das que estiverem em curso apenas persiste durante as negociações, concluídas estas, o regime de impedimento ou de suspensão cessa.

  12. Assim sendo, entende a Fazenda Pública que a sentença proferida nos presentes autos e ora recorrida fez uma interpretação errada e aplicação do Direito.

  13. Entendeu o Tribunal a quo que “o despacho de não homologação do plano de recuperação ainda não transitou em julgado, o que significa que aqueles efeitos (suspensivos) se mantêm, pois o processo de revitalização ainda não foi encerrado”.

  14. Ora, com ressalva do sempre devido respeito, não se pode concordar com o entendimento sufragado na douta decisão ora em apreço, segundo o qual “a expressão “durante o tempo em que perdurarem as negociações” equivalerá à pendência do processo de revitalização, pois o processo de revitalização ainda não foi encerrado”.

  15. No entender da Fazenda Pública, o processo especial de revitalização encontra-se findo e [o] processo negocial encerrado.

  16. Na verdade, concluídas as negociações, o plano carece de homologação judicial como determina o n.º 1 e 2 do artigo 17.º-F do CIRE, homologação essa que se destina a aferir da conformidade legal das medidas aprovadas, com observância, designadamente, do disposto nos artigos 215.º e 216.º do diploma citado (por remissão do artigo 17.º- F, n.º 5 do CIRE).

  17. Destarte, face à oposição da Administração Tributária é manifesto que o acordo alcançado não podia ser homologado judicialmente, e tal despacho importa o encerramento do processo, tanto mais que neste tipo de processos, pelo seu carácter urgente, nem sequer pode voltar a ser apresentado qualquer outro acordo.

  18. Assim, com a devida vénia, passamos a transcrever o sumário do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 10.04.2014, proferido no processo n.º 1083/13.9TBBRG.G2, em que refere “No processo especial de revitalização, decorrido o prazo do n.º 5 do artigo 17.º-D CIRE e não sendo homologado o plano de revitalização que entretanto tinha sido aprovado, não é admissível que depois se apresente um segundo plano “para homologação ou recusa da mesma pelo juiz”.

  19. Deste modo, ou os credores chegam a acordo e o mesmo é homologado, ou na falta de acordo ou de homologação do mesmo, o processo é encerrado, e ultrapassada a fase negocial não se reabre a fase negocial, nem o processo volta a ser reaberto, impondo-se o seu encerramento com a cessação da suspensão dos processos de execução.

  20. Efectivamente, o artigo 17.º-E, n.º 1 do CIRE estabelece que a “decisão a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação”. Ou seja, o período de suspensão das execuções inicia-se com a comunicação de que se pretende dar início às negociações, e mantém-se apenas durante o tempo em que perdurarem as negociações.

  21. No caso sub judice o prosseguimento da execução fiscal só teve lugar muito depois das negociações, ou seja, depois de proferido e publicitado o despacho de recusa de homologação do acordo de revitalização.

  22. Nestas circunstâncias, mostrando-se concluídas as negociações referentes ao plano de revitalização, a Administração Tributária poderá instaurar ou fazer prosseguir as execuções contra o devedor, tanto mais que não subscreveu o plano de revitalização.

  23. Por outro lado, acolher argumentação do Tribunal a...

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