Acórdão nº 01228/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Março de 2017
Magistrado Responsável | ARAG |
Data da Resolução | 29 de Março de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A………….., vem, nos termos e para os efeitos no disposto no artigo 284.º do CPPT interpor recurso por oposição de julgados, para este Supremo Tribunal, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 4 de Junho de 2015, proferido no processo nº 02994/09, por alegada contradição com o decidido no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 8 de Outubro de 2002, proferido no recurso n.º 06567/02.
O recorrente termina a sua alegação de recurso formulando as seguintes conclusões: A. O artigo 60.° da Lei Geral Tributária (LGT) consagra a participação dos contribuintes na formação de decisões que lhe digam respeito, através do exercício do direito de audição.
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E exceciona deste direito fundamental os casos em que a liquidação é efetuada com base na declaração do contribuinte.
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No caso concreto, e como bem se reconhece, a declaração foi apresentada pela cabeça-de-casal - que não era o Recorrente.
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Não há forma de confundir o contribuinte cabeça-de-casal, com o contribuinte herança e com o contribuinte ora Recorrente, como pretende a AT e o Acórdão Recorrido.
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É uma confusão de personalidades jurídicas e tributárias que não é legal nem aceitável.
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Portanto, não existe o pressuposto de facto em que assenta a decisão do Acórdão Recorrido: o contribuinte, ora Recorrente, não apresentou qualquer declaração e consequentemente, não poderia ter sido preterida, como foi, a formalidade essencial da audição prévia à liquidação.
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Para impedir que, pelo menos para efeitos fiscais, atos praticados por terceiros possam ser especialmente danosos para o contribuinte, o legislador consagrou o direito de este participar na formação do ato tributário, nomeadamente através do exercício de audição prévia.
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Tal foi preterido neste caso.
I. Para este caso, há apenas que interpretar corretamente a norma constante do artigo 60.° da LGT.
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Tal interpretação deverá ser sempre realizada nos termos do disposto nos artigos 11.º da LGT e 9.° do Código Civil, para o qual aquele remete.
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Estando o intérprete legalmente vinculado a presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, não existe qualquer motivo que justifique uma leitura totalmente oposta e contrária àquela que resulta da interpretação literal do artigo 60.° n°2 da LGT, como aquela que é feita pela AT e pelo Acórdão Recorrido.
L. Se a norma expressamente refere que só é dispensada a audição prévia no caso de a “liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte” como pode sequer ser possível admitir uma interpretação que permite incluir no conceito de contribuinte outra pessoa? M. Reitera-se: quem declarou foi o cabeça-de-casal. Quem foi notificado de uma liquidação foi o contribuinte ora Recorrente. O cabeça-de-casal é a mãe do Recorrente. O contribuinte é o Recorrente.
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Conforme refere Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Vol. I 6.ª Ed., Áreas Editora, 2011, p. 431, “Aquela fórmula “com base na declaração do contribuinte” deve ser interpretada, de harmonia com aquela garantia constitucional, com o alcance de apenas dispensar a audição quando a liquidação for efetuada em sintonia com a posição que decorre da declaração do contribuinte, nos aspetos factual e jurídico.” O. A expressão contribuinte, como também indica aquele autor (idem p. 428) refere-se, no caso, à pessoa singular que está vinculada ao cumprimento da prestação tributária.
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E não foi a pessoa vinculada ao cumprimento da prestação tributária (o Recorrente) quem apresentou a declaração. Tal declaração foi apresentada pela sua mãe, cabeça-de-casal.
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Assim, preterir a audição prévia à liquidação consubstancia uma manifesta violação do princípio da legalidade tributária.
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E mesmo que, o que por mera hipótese académica se concebe, se entenda que a cabeça-de-casal seria o contribuinte, nunca a liquidação efetuada foi realizada com base exclusivamente na sua declaração.
5. De facto, a cabeça-de-casal limitou-se a juntar no âmbito do processo sucessório que correu junto da AT as atas e certidões resultantes do processo judicial de inventário que teve lugar.
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De tais documentos não constando, por um lado, os elementos essenciais da liquidação, pois haviam sido elaborados para efeitos judiciais e familiares, e incluíam todos os bens móveis, como recheio de casa, estabelecimento industrial, participações sociais, etc.
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Logo, outra conclusão não...
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