Acórdão nº 01410/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução31 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 669/15.1BEAVR 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, julgando procedente a impugnação judicial deduzida por A………….. (a seguir Impugnante ou Recorrida), anulou a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) efectuada com referência ao ano de 2011 no que respeita às mais-valias apuradas pela venda de dois imóveis, ocorrida no âmbito do processo em que aquela e o seu marido foram declarados insolventes.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, que sintetizou em conclusões do seguinte teor: «I- O objecto do recurso I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A…………… contra a liquidação de IRS referente ao ano de 2011, pretendendo a recorrente Fazenda Pública a sua revogação e substituição por decisão que considere tal impugnação improcedente.

  1. A questão decidenda consiste em saber se a douta sentença padece de erro de julgamento, por ter anulado a liquidação com fundamento na inexigibilidade da dívida ao insolvente.

    II- O erro de julgamento – a exigibilidade do pagamento III. De acordo com o Tribunal a quo, a “questão fulcral” em dissídio consistia em “determinar a quem deve ser exigido o pagamento de mais-valias relativas à venda, pelo Administrador de Insolvência, de imóveis, integrados na massa insolvente por força da declaração de insolvência, do proprietário/insolvente”.

  2. Assim, considerou que o imposto devido pela mais-valia gerada pela alienação de um prédio integrante da massa insolvente é “uma dívida da massa insolvente”, centrando a sua abordagem na questão da exigibilidade do pagamento de tais mais-valias.

  3. Acompanhando o entendimento vertido no acórdão do TR do Porto de 02-07-2015 (processo n.º 8729/12.4TBVNG-G.P1), o douto Tribunal desatendeu os demais pedidos formulados pela impugnante, anulando apenas a liquidação com fundamento na responsabilidade pelo pagamento da dívida.

  4. Sendo o insolvente o sujeito passivo do imposto, temos aqui uma nítida separação entre quem preenche os pressupostos do facto tributário e tem o dever de cumprir uma obrigação declarativa acessória (a entrega da declaração, nos termos do n.º 2 do artigo 31.º da LGT), i.e.

    , o sujeito passivo stricto sensu e quem deve satisfazer perante o credor tributário a obrigação principal (o pagamento do imposto, nos termos do n.º 1 do artigo 31.º da LGT), i.e.

    , o devedor do imposto.

  5. Logo, se inexiste qualquer ilegalidade que afecte a validade ou existência do acto tributário, mas apenas a sua eventual exigibilidade àquele sujeito passivo, entramos já no domínio da eficácia do acto, pelo que VIII. O meio processual adequado para dirimir esta questão seria a oposição à execução e não a impugnação judicial, por força disposto nos artigos 99.º a contrario e 204.º n.º 1 alínea b), ambos do CPPT.

  6. Por conseguinte, verificando-se um erro na forma de processo e não sendo possível in casu a convolação no meio processual adequado, a declaração de tal erro importaria a anulação de todos os actos que não pudessem ser aproveitados, com a consequente absolvição da instância da Fazenda Pública.

  7. Nestes termos, incorreu o douto Tribunal em erro de julgamento de direito, por: a) ter ordenado a anulação da liquidação com fundamento na sua inexigibilidade, violando o disposto nos artigos 99.º a contrario e 204.º n.º 1 alínea b), ambos do CPPT; b) não ter declarado a ocorrência de erro na forma de processo, sem possibilidade de convolação, com a necessária absolvição da instância por parte da Fazenda Pública, violando o disposto nos artigos 193.º, 278.º alínea e) e 576.º n.º 2, todos do CPC.

    Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser considerado procedente, revogando-se a decisão ora posta em crise, assim se fazendo JUSTIÇA».

    1.3 A Recorrida sustentou a manutenção do decidido.

    1.4 Remetidos os autos a este Supremo Tribunal Administrativo, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, revogada a sentença e julgada improcedente a impugnação judicial, com a seguinte fundamentação: «[…] Em causa está a tributação das mais-valias decorrentes da venda de imóvel integrado na massa insolvente dos ora recorridos.

    A “massa insolvente” é um património autónomo administrado pelo Administrador da Insolvência (adiante AI), que está afecto à satisfação dos interesses dos seus credores. Não obstante esse facto e a circunstância da venda ser efectuada pelo AI no âmbito do processo de insolvência tal não retira ao Insolvente a qualidade de sujeito passivo do imposto devido pelas mais-valias eventualmente realizadas, nem tão pouco o desonera das obrigações declarativas que sobre ele impendem. É que, a declaração de insolvência não transfere a qualidade de sujeito passivo desse imposto para a massa insolvente ou para o AI, nem a titularidade dos bens se transfere com a mera declaração de insolvência. Com efeito, embora o art. 18.º, n.º 3 da LGT não circunscreva à pessoa singular ou colectiva a qualidade de sujeito passivo da relação jurídica tributária, “a massa insolvente não é sujeito passivo de imposto sobre o rendimento por não existir norma de incidência que o determine e, a fortiori, não possui quer personalidade, quer capacidade tributárias”1 [1 Nos termos dos arts. 15.º e 16.º da LGT] (cfr. Bruno Santiago e Beatriz Capeloa Gil, in “A responsabilidade pelo imposto devido na liquidação dos bens que integram a massa insolvente”, “Cadernos de Justiça Tributária”, n.º 13, Julho-Setembro de 2016). A declaração da insolvência apenas priva o Insolvente dos poderes de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente que passam a competir ao AI (art. 81.º, n.º 1 do CIRE).

    Assim, tendo sido realizadas mais-valias no âmbito do processo de liquidação da massa insolvente, como decorre dos factos que resultaram provados, concretiza-se um rendimento que releva em sede de IRS, nos termos do art. 10.º do CIRS, sendo que as mais-valias geradas pela alienação onerosa de bens integrados na massa insolvente não estão contempladas na norma do art. 268.º, n.º 1 do CIRE. Apenas as mais-valias realizadas por efeito...

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