Acórdão nº 0509/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Dezembro de 2017

Data20 Dezembro 2017
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A FAZENDA PÚBLICA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (TAF de Coimbra) datada de 08 de Fevereiro de 2017, que julgou procedente a oposição deduzida por A…………, na qualidade de devedor subsidiário no processo de execução fiscal n.º 3050200501075519, instaurado originariamente contra a sociedade "B………… III - Consultas Oftalmológicas, Lda", para pagamento de dívida proveniente de IRC e juros do ano de 2004, no valor de 203.986,83€.

Consequentemente a decisão determinou a extinção da execução fiscal na parte revertida contra o oponente.

Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue: 1- A Mma. Juiz do Tribunal "a quo" julgou procedente a oposição à reversão contra o oponente levada a cabo pelo Serviço de Finanças de Coimbra 2, na qualidade de devedor subsidiário, no Processo de execução fiscal n.º 3050200501075519, instaurado originariamente contra a sociedade B………… III - CONSULTAS OFTALMOLÓGICAS, LDA., para cobrança coerciva de dívida de IRC e juros do ano de 2004 no valor de € 203.986,83 (duzentos e três mil novecentos e oitenta e seis euros e oitenta e três cêntimos).

2- Considerou a Mma. Juiz, que no caso ocorreu vício de forma do acto de reversão, por preterição de audiência prévia quanto a elementos novos que fundamentam o despacho de reversão, com os seguintes fundamentos: "Tanto quanto é possível apreender da cópia do processo de execução fiscal junto aos autos o OEF apenas considerou, no projeto de reversão, a escritura de dissolução da sociedade pois os outros documentos ("Acta N° 8" e Auto de Notícia) ainda não constavam do processo. Nesta perspetiva, dúvidas não se suscitam em como a "Decisão Final" se baseou em elementos de prova novos (porque ainda não tinham sido considerados para efeitos da decisão de reversão), sobre os quais o Oponente não teve a Oportunidade de se pronunciar antes de tal decisão.

Ora, como flui do que acima genericamente se expôs acerca do direito de audiência prévia, este deve efetivamente ser assegurado através da disponibilização ao administrado de todos os elementos de prova carreados para o procedimento, permitindo-lhe emitir pronúncia sobre os mesmos e por essa via participar ativamente na formação da decisão, sob pena de se verificar um vício procedimental.

É certo que a jurisprudência dos nossos tribunais superiores vem aceitando que tal vício pode degradar-se em não essencial acaso se apure que, independente da eventual pronúncia do administrado sobre os elementos omitidos a decisão seria necessariamente a mesma. Sucede que, salvo mais esclarecido entendimento, no caso em análise não é possível extrair tal conclusão porquanto, como foi assinalado aquando da análise da questão da culpa do Oponente, este não alegou nem fez prova de factualidade que, em abstracto, permite admitir como vagamente possível que o tribunal chegasse a conclusão distinta daquela a que chegou. E, perante esta possibilidade, ainda que remota, afigura-se que não pode o vício em questão degradar-se em não essencial, pelo que a sua ocorrência implica a anulação do despacho de reversão." 3- Com todo o respeito pela douta decisão "a quo" e reconhecendo a profunda análise efectuada pela Mma. Juiz, entende esta Representação da Fazenda existir erro de direito, consubstanciado na existência de contradição entre a fundamentação e a decisão (art. 615.º, n.º 1 aI. e) e nº 4 do CPC, ex vi art. 2.° aI. e) do CPPT).

4- Pois, do exposto pela Mma. Juiz, resulta precisamente o contrário do concluído isto é que a formalidade preterida era não essencial, tanto não o era que a decisão em sede da sentença não podia ser outra, na apreciação da culpa do oponente revertido (cfr. fls. 35 da douta sentença), pois nada de relevante trouxe acerca dos documentos em causa, que eram, saliente-se, uma acta (nº 8) de uma Assembleia Geral da sua própria sociedade devedora originária B………… III CONSULTAS OFTALMOLÓGICAS, LDA., na qual esteve presente e deliberou e um auto de notícia levantado pela AT.

5- Auto de notícia que deu origem a processo de Inquérito por crime fiscal que correu termos no Serviço de Apoio Técnico à Acção Criminal da Direcção de Finanças de Coimbra e no Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra com o NUIPC 103/06.8IDCBR, no qual o oponente foi constituído arguido, em 13/12/2006 tendo tomado conhecimento do conteúdo do mesmo, conforme Processos arquivados no Arquivo desta Direcção de Finanças e no 3.º Juízo Criminal da Vara de Competência Mista e Juízos Criminais de Coimbra.

6- Tendo vindo a ser condenado pela prática do crime de Frustração de créditos, previsto e punido pelo art. 88.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), por Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido em 18/01/2012 transitado em julgado, que decidiu recurso interposto pelo oponente da sentença de primeira instância proferida pelo 3º Juízo Criminal da Vara de Competência Mista e Juízos Criminais de Coimbra em 10-12-2010 (Recurso n.º 103/06.8 IDCBR-C).

Nestes termos e com o douto suprimento de Vªs Ex.ªs, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que conclua pelo aproveitamento do acto de reversão levado a cabo pelo Serviço de Finanças de Coimbra-2, do Processo de Execução Fiscal n.º 3050200501075519, contra o oponente, mantendo-se a mesma e assim se fazendo JUSTIÇA.

Contra-alegou o recorrido, tendo concluído:

  1. A sentença em crise, limitou-se a analisar criticamente a factualidade dada como assente, tendo dito o que na realidade queria dizer e disse-o de forma clara em termos perfeitamente coerentes e inequívocos, pelo que se terá de concluir que não ocorreu qualquer construção viciosa da sentença.

  2. A actividade antecedente à citação deve ser qualificada como instrução e, portanto, concluir que após a sua finalização era obrigatório ouvir o oponente nos termos do então art.º 100.º do CPA e do art.º 60º da LGT, tal como a douta sentença exarou: "Tanto quanto é possível apreender da cópia do processo de execução fiscal junta aos autos, o OEF apenas considerou, no projeto de reversão, a escritura de dissolução da sociedade pois os outros documentos (Acta n.º 8 Auto de Notícia) ainda não constavam do processo. Nesta perspetiva, dúvidas não se suscitam em como a Decisão Final se baseou em elementos de prova novos (porque ainda não tinham sido considerados para efeitos da decisão de reversão), sobre os quais o Oponente não teve a oportunidade de se pronunciar antes de tal decisão. Ora, como flui do que acima genericamente se expôs a propósito do direito de audiência prévia, este deve ser efetivamente assegurado através da disponibilização ao administrado de todos os elementos de prova carreados para o procedimento, permitindo-lhe emitir pronúncia sobre os mesmos e por essa via participar ativamente na formação da decisão, sob pena de se verificar um vício procedimental. É certo que a jurisprudência dos nossos tribunais superiores vem aceitando que tal vício pode degradar-se em não essencial acaso se apure que, independente da eventual pronúncia do administrado sobre os elementos omitidos, a decisão seria necessariamente a mesma. Sucede que, salvo mais esclarecido entendimento, no caso em análise não é possível extrair tal conclusão porquanto, como foi assinalado aquando da análise da questão da culpa do Oponente, este não alegou nem fez prova de factualidade que, em abstrato, permite admitir como vagamente possível que o tribunal chegasse a conclusão distinta daquela a que chegou. E perante esta possibilidade, ainda que remota, afigura-se que não pode o vício em questão degradar-se em não essencial, pelo que a sua ocorrência implica a anulação do despacho de reversão".

  3. A conduta da AT inviabilizou que o oponente tivesse oportunidade de se pronunciar e requerer a realização de diligências sobre o conteúdo do tal auto de notícia, não se vislumbrando no mesmo qualquer referência a sentença e acórdão proferidos no processo n.º 103/06.8IDCBR, nem tal encontra qualquer respaldo no probatório, tratando-se de matéria nova.

  4. O despacho do chefe de finanças não se pronuncia e omite a análise da prova apresentada pelo responsável subsidiário, não precisando sequer porque dispensou a inquirição das testemunhas, o que determina uma preterição de formalidade legal que inquina a decisão.

  5. Será que se pode afirmar com segurança que inquiridas que fossem as testemunhas, a decisão administrativa não poderia ser outra que não aquela que foi? f) Com o devido respeito, parece-nos que não, sendo que não existe juízo de prognose que possa ser feito no sentido de se considerar que os depoimentos das testemunhas então arroladas conduzissem a AT à mesma decisão, acrescendo que já no decurso do processo judicial o recorrido viu-se na necessidade de proceder à substituição de duas daquelas, pelo facto de ter perdido o contacto pessoal e profissional.

  6. Não basta a AT afirmar que "os argumentos invocados pelo revertido não justificam a alteração da decisão administrativa nem a audição das testemunhas arroladas", sem se explicar porquê, sendo ilegal a interpretação que o Tribunal para sufragar a posição daquela em clara violação do princípio da separação de poderes entre os tribunais e o executivo ou a administração, consagrado como princípio estruturante do sistema de poderes no artigo 111.º da Constituição.

  7. O Tribunal não está vinculado à qualificação jurídica efectuada pelo recorrente como questão prévia no articulado nela referido.

  8. A questão qualificada juridicamente como "questão prévia" consubstancia um fundamento de ilegalidade substantiva que foi alegada como causa de pedir da ilegalidade da reversão da dívida da originária devedora contra o oponente.

  9. Mesmo admitindo alguma imprecisão da alegação, o juiz não pode deixar de considerar, na resolução da questão jurídica, "os factos instrumentais e os factos que sejam complemento ou...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT