Acórdão nº 01602/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | TERESA DE SOUSA |
Data da Resolução | 27 de Outubro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A…………, Magistrada do Ministério Público com a categoria de Procuradora-Geral Adjunta, com os demais sinais dos autos, interpõe contra o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) a presente acção administrativa especial na qual impugna o acórdão do Plenário do CSMP de 14.07.2015, que indeferiu a reclamação do acórdão proferido pela Secção permanente do CSMP, de 22.04.2015, bem como todos os actos subsequentes praticados em cumprimento daquele acórdão, cumulando o pedido de condenação à prática do acto legalmente devido.
Formula, a final, os seguintes pedidos:
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Ser anulado o acto administrativo impugnado, consubstanciado no acórdão do Plenário do CSMP de 14.07.2015, que indeferiu a reclamação do acórdão proferido pela Secção permanente do CSMP, de 22.04.2015, bem como todos os actos subsequentes praticados em cumprimento daquele acórdão; b) E, consequentemente, ser o R. condenado a praticar o acto que consiste na emissão de novo acórdão que reconheça à A. o direito à jubilação e disso informe, em consequência, a CGA, para que esta entidade proceda ao cálculo e fixação à A. da respectiva pensão de jubilação.
O Réu contestou defendendo que a acção deve ser julgada totalmente improcedende e, em consequência, absolvido o CSMP dos pedidos.
Notificadas para alegações, nos termos do art. 91º, nº 4 do CPTA (na redacção primitiva), ambas as partes alegaram formulando a A. as seguintes conclusões: A. Vem a presente acção administrativa especial de impugnação do Acórdão do Plenário do CSMP, de 14.07.2015, que indeferiu a reclamação do Acórdão proferido pela Secção Permanente do CSMP, de 22.04.2015, nos termos do qual a Autora não reúne as condições para a jubilação, bem como de todos os actos administrativos subsequentes praticados em cumprimento daquele Acórdão, cumulando o pedido de condenação do ora Réu à prática do acto legalmente devido.
B. O CSMP, devidamente citado, contestou a acção, defendendo-se por impugnação, contestando os vícios assacados pelo Autor ao Acórdão do CSMP impugnado, concomitante pugnando pela improcedência da presente acção administrativa especial e manutenção do acto impugnado na ordem jurídica.
C. A Autora entende que o Acórdão do Plenário do CSMP, de 14.07.2015, é inconstitucional e ilegal, por padecer de erro de direito equivalente a violação de lei, na medida em que manteve a decisão de não reconhecimento do seu direito à jubilação, não podendo, por esse motivo, conformar-se com o mesmo.
D. Os magistrados Ministério Público gozam de um estatuto próprio, constitucionalmente reconhecido e aprovado por Lei da Assembleia da República (cfr. n.° 2 do artigo 219.° e alínea p) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa).
E. Tal estatuto consta da Lei n.° 47/86, de 15.10: Estatuto do Ministério Público ('EMP').
F. Os artigos 145.° a 150.° do EMP determinam que os magistrados do Ministério Público se aposentam quer voluntariamente quer obrigatoriamente - por incapacidade, por limite de idade ou em consequência de sanção disciplinar.
G. O Capítulo V da Parte II do EMP, que integra tais artigos, foi alterado pela Lei n.° 9/2011, de 12.04, que procedeu à alteração do EMP em matéria de aposentação, reforma e jubilação, tendo alterado, em consequência, diversas disposições do EMP.
H. Através da alteração da redacção do artigo 148.°, operada pela Lei n.° 9/2011, os magistrados do Ministério Público deixaram de beneficiar do instituto da jubilação ao atingir a idade máxima para o exercício de funções, l. Passando, então, a beneficiar deste instituto apenas quando tenham a idade e o tempo de serviço previstos no anexo II do EMP e contem, pelo menos, 25 anos de serviço na magistratura, dos quais os últimos 5 tenham sido prestados ininterruptamente no período que antecedeu o pedido de jubilação, sem que fosse previsto, em tal diploma, um regime transitório de progressiva adaptação a estas novas exigências legais.
J.
As alterações introduzidas pela Lei n.° 9/2011 reforçaram a distinção entre o instituto da jubilação (artigo 148.°) e o instituto da aposentação e reforma (artigo 149.°).
K. O instituto da jubilação tem consequências relevantes ao nível da determinação do montante da pensão (superior ao montante da pensão de aposentação), contrapartida de uma determinada situação jurídica sócio-profissional, com direitos e deveres extravagantes relativamente ao regime geral.
L. Nos termos do disposto no artigo 148.° e no Anexo II do EMP, em 2015, os pressupostos relevantes para o regime da jubilação são 62 anos e 6 meses de idade mínima e 38 anos e 6 meses de serviço.
M. Por seu turno, no que diz respeito à aposentação, o artigo 149.° e o Anexo III do EMP estabelecem que, em 2015, o tempo de serviço mínimo é de 40 anos.
N. A idade máxima para o exercício de funções é de 70 anos, nos termos da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas ('LGTFP'), aprovada pela Lei n.° 35/2014, de 20.06.
O. A Autora requereu a aposentação/jubilação, em 16.09.2014, com efeitos a 08.01.2015.
P. Data (08.01.2015) em que atingiria 70 anos de idade, tendo, nessa altura, 37 anos, 4 meses e 26 dias de tempo de serviço.
Q. Sendo, em 2015, o tempo de serviço necessário para a jubilação de 38 anos e 6 meses de serviço necessários, conforme Anexo II do EMP.
R. O CSMP, no Acórdão impugnado, entende que a Autora não tem o tempo de serviço estabelecido no Anexo II do EMP, não reunindo, por isso, os requisitos para a jubilação, tendo prestado informação nesse sentido à CGA e ao Senhor Director-Geral da Administração da Justiça.
S. A alteração do regime da jubilação, operada pela Lei n.° 9/2011, através da qual os magistrados do Ministério Público deixaram de beneficiar do instituto da jubilação ao atingir a idade máxima para o exercício de funções, configura uma clara violação das expectativas dos Magistrados do Ministério Público.
T. Com efeito, aquando do ingresso da Autora na Magistratura, o regime vigente estatuía que a jubilação era automática para os magistrados do Ministério Público que atingissem 70 anos de idade, idade máxima do exercício de funções, independentemente de outros requisitos, como o tempo de serviço.
U. Era essa a convicção dos magistrados do Ministério Público: caso se mantivessem em funções até atingir o limite máximo de idade, seriam jubilados.
V. O Estado de Direito também assenta na durabilidade e previsibilidade da ordem jurídica, uma vez que a instabilidade normativa é susceptível de lesar posições jurídicas subjectivas, colocando em causa os valores da confiança e da segurança.
W. A reversibilidade das soluções normativas, alicerçando-se no princípio democrático próprio do Estado de Direito constitucionalmente configurado, terá sempre de se harmonizar com os valores da segurança jurídica e da protecção da confiança em relação a certos níveis de realização dos direitos sociais, que são também objecto de protecção constitucional (artigo 2.° da CRP).
X. A alteração supra referida viola, assim, o princípio da protecção da confiança, uma vez que afecta desfavoravelmente o direito adquirido pelos magistrados do Ministério Público de se jubilarem ao atingirem o limite máximo de idade legalmente estabelecido, Y. Os quais confiaram na continuidade daquele regime legal, segundo o qual, a jubilação era automática para os magistrados do Ministério Público que atingissem 70 anos de idade (idade máxima do exercício de funções).
Z. O princípio da protecção da confiança, amplamente tratado pelo Tribunal Constitucional, tem sido entendido por este órgão como um princípio, ínsito na ideia de Estado de Direito democrático (artigo 2.° da CRP), que postula um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que lhes são juridicamente criadas...
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