Acórdão nº 0287/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução26 de Abril de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.

“SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL” [doravante «STAL»] [em representação da sua associada A………….

], devidamente identificados nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada [doravante «TAF/A»] a presente ação administrativa especial para impugnação de ato contra o “MUNICÍPIO DE SETÚBAL”, nos termos e com a motivação aduzida na petição inicial de fls. 01 e segs. dos autos, peticionando «i) a declaração de nulidade ou anulabilidade do ato impugnado - despacho da Vereadora, com competência delegada da Câmara Municipal de Setúbal, de 21.06.2011, que homologou a lista unitária de ordenação final do procedimento concursal comum de recrutamento para a carreira geral e categoria de assistente operacional (área de limpeza de espaços públicos) a que se reporta o aviso n.º 4904/2011 [publicitado no Diário da República, 2.ª Série, de 17 de fevereiro] - bem como do procedimento concursal, no segmento relativo à aplicação do método de seleção da entrevista profissional; ii) a condenação da entidade demandada a “proferir despacho que determine e proceda à expurgação de todos os vícios e irregularidades do procedimento concursal, repetindo o mesmo”».

  1. O «TAF/A», por acórdão de 30.04.2013 [cfr. fls. 196/209], julgou a ação procedente e, em consequência, anulou o despacho da Vereadora da Câmara Municipal de Setúbal, de 21.06.2011, que homologou a lista unitária de ordenação final, e condenou a entidade demandada a praticar um novo ato, devendo a classificação atribuída aos candidatos na entrevista profissional de seleção ser devidamente fundamentada.

  2. O R. interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul [doravante «TCA/S»] que, por acórdão de 16.06.2016, negou provimento ao recurso, julgando-o improcedente e mantendo o decidido, com a fundamentação dele constante [cfr. fls. 292 a 311].

  3. Invocando o disposto no art. 150.º, n.º 1, do CPTA [na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 214-G/2015 - redação essa a que se reportarão todas as demais citações de normativos daquele Código sem expressa referência em contrário], o R., não se conformando com o acórdão proferido pelo «TCA/S» interpôs, então, o presente recurso de revista, produzindo alegações [cfr. fls. 318 a fls. 334], com o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: «…

    1. O douto acórdão sob recurso, confirmando a decisão de 1.ª instância, considerou a classificação da entrevista profissional da representada do A., prestada no concurso em causa nos autos, insuficientemente fundamentada, no que, salvo o devido respeito, carece de razão.

    2. Com efeito, a fundamentação da classificação da entrevista foi efetuada através da ficha constante do processo, que constitui uma grelha ou matriz por onde se molda a avaliação a atribuir à prova, grelha essa que estava fixada no programa do concurso.

    3. Aliás, tal grelha torna perfeitamente percetível o percurso cognoscitivo que determinou a atribuição da classificação, na medida em que define os parâmetros porque se determinou a avaliação da entrevista e define os valores atribuídos a cada um desses parâmetros e a avaliação qualitativa que corresponde a cada um deles.

    4. Desse modo, da análise dessa ficha resulta claro e perfeitamente percetível que os elementos do júri consideraram que a representada do A. só a nível reduzido satisfazia os diversos parâmetros sobre os quais incidiu a entrevista, dando-lhe possibilidade, caso considerasse que tal avaliação era errada, de contrariar a convicção formada pelo júri relativamente a cada um desses parâmetros.

    5. Sendo certo que o A. não alega, minimamente, quaisquer factos de onde pudesse resultar a existência de um erro grosseiro ou grave na avaliação atribuída pelos elementos do júri, o que, dado estar-se perante atos praticados no quadro de uma discricionariedade técnica, teria de invocar e comprovar.

    6. Aliás, a transparência e seriedade da avaliação de uma entrevista são garantidas não só pela exigência de fundamentação, mas, também, pelo facto de a entrevista ser pública e a decisão ser coletiva.

    7. Por outro lado, o entendimento, que parece ser o implícito na douta decisão de 1.ª instância e do acórdão recorrido, de que a fundamentação da entrevista profissional de seleção, para ser suficientemente fundamentada, teria de reproduzir, ainda que sucintamente, as perguntas feitas e as respostas que foram dadas e ainda os motivos pelos quais se consideraram tais respostas de nível elevado, bom, suficiente, reduzido ou insuficiente, conduziria a tornar perfeitamente inviável programar-se uma prova de seleção deste tipo, num concurso com a amplitude do aqui em causa.

    8. Desse modo, atendendo à natureza do ato em causa e às finalidades das exigências de fundamentação, o ato impugnado satisfaz os requisitos previstos no art. 125.º do CPA.

    9. Ao assim não decidir e ao considerar, confirmando o acórdão de 1.ª instância, insuficientemente fundamentada a classificação atribuída à representada do A. na prova de entrevista de seleção, o douto acórdão recorrido fez uma errada aplicação da referida disposição legal, violando-a.

    10. O douto acórdão recorrido, pelo menos aparentemente, como resulta aliás, da condenação também na sua repetição, anula todas as provas da entrevista profissional de seleção prestadas no quadro do concurso.

    11. Ora, a presente ação é interposta pelo Sindicato A. exclusivamente em representação de uma sua associada e, em concreto, apenas à entrevista desta assaca o vício da falta de fundamentação.

    12. Por tal, ainda que se considerasse que idêntico vício ocorreria nas demais entrevistas, o acórdão recorrido ao considerar a sua anulabilidade e condenar na repetição de todas elas, decide “ultra petita”, em ofensa ao disposto no art. 3.º, n.º 1 do N.C.P.C. e no n.º 2 do art. 95.º do CPTA, incorrendo na nulidade prevista na alínea e), n.º 1 do art. 615.º daquele código.

    13. E, caso se entenda, para obstar ao reconhecimento de tal nulidade, que o pedido de anulação de todas as entrevistas está contido no pedido do A., na medida em que pede a “anulação do ato homologatório” e a anulação “do procedimento concursal por aquele acolhido”, será questionável a sua legitimidade para a formulação de um pedido com tal objeto.

    14. Assim, o A. apenas instaurou a presente ação em representação de uma sua associada, pelo que a legitimidade que daí lhe advém é correspondente à legitimidade desta, que não sofria, nem invoca sofrer, qualquer prejuízo direto das classificações atribuídas aos demais concorrentes, carecendo, assim, de legitimidade para as impugnar.

    15. E, não tendo sido impugnadas tais classificações, mesmo que padecessem de vício de falta de fundamentação, o mesmo importaria a sua mera anulabilidade, que já estaria sanada pela sua não impugnação, pelo que, ao declarar a sua nulidade e ordenar a repetição das entrevistas, o douto acórdão recorrido violou também o disposto nos arts. 133.º e 135.º do CPA e 58.º do CPTA.

    16. O douto acórdão recorrido, em face da anulabilidade que atribuiu à classificação da prova da entrevista profissional de seleção da representada do A., ato antecedente da homologação da lista de classificação final impugnado, declarou a nulidade da totalidade dessa homologação enquanto ato consequente do ato (ou atos) que declara anuláveis.

    17. Ora, salvo o devido respeito, tal anulação é completamente desproporcional em relação às exigências de reposição da legalidade, colidindo com os direitos subjetivos de todos os opositores ao concurso que foram integrados e ordenados na lista final.

    18. Desse modo, por força do princípio da proporcionalidade previsto no n.º 2 do art. 5.º do CPA, que impõe o aproveitamento da parte dos atos administrativos que não resulte inquinada por um vício que colida com a sua legalidade, e ainda por força do disposto na alínea i) do n.º 2 do art. 133.º do mesmo código, a decisão deveria limitar a repercussão do pretenso vício de falta de fundamentação no ato de homologação da lista final unitária, apenas no estritamente necessário para reposição de legalidade.

    19. E, atendendo a que a anulação do ato antecedente, tem como fonte um vício meramente formal, podendo até ser renovado “in totum”, o douto acórdão recorrido nunca poderia anular a totalidade da lista unitária, apenas podendo condenar o R. a introduzir nessa lista as alterações que se impusessem, para reposição da legalidade, consequente à anulação do ato antecedente de classificação da entrevista da representada do A.

    20. O que poderá até consistir na total manutenção dessa lista ou apenas, em virtude da eventual inclusão na mesma da representada do A., na sua alteração parcial restrita à sua colocação numa ordenação que, no mais, se manterá.

    21. Desse modo, ao fazer repercutir a pretensa anulabilidade da classificação da representada do A. na prova de entrevista profissional de seleção na totalidade da lista final unitária, declarando a nulidade de toda ela, o douto acórdão recorrido fez uma errada interpretação e aplicação dos princípios legais atrás referidos.

    22. Por outro lado, o douto acórdão recorrido, ao determinar a repetição de todas as entrevistas, nada de substancial define relativamente ao direito que possa caber à representada do A., mas está apenas a definir procedimentos de execução da sentença.

    23. O que colide com a margem de liberdade da administração para dar execução espontânea às decisões judiciais anulatórias dos seus atos quando, como é o caso, estando em causa vícios de natureza meramente formal, o tribunal ainda não tem poderes de definir, em concreto, o que é de direito na relação jurídico administrativa controvertida.

    24. Ao assim decidir, o douto acórdão recorrido fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 4 do art. 95.º do CPTA.

    25. Deste modo, o douto acórdão recorrido violou todas as disposições legais atrás referidas, devendo, como tal, ser revogado.

    26. E, tendo em conta as questões...

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