Acórdão nº 0598/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Abril de 2018
Magistrado Responsável | ISABEL MARQUES DA SILVA |
Data da Resolução | 18 de Abril de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A…………, S.A., com os sinais dos autos, vem, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 27.º do ETAF e do n.º 2 do artigo 280.º e do artigo 284.º do CPPT interpor recurso para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido em 19 de Novembro de 2015 no processo n.º 08976/15, por alegada contradição com o decidido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16 de Dezembro de 2010, proferido no recurso n.º 0587/10.
Admitido o recurso por despacho do Juiz Desembargador a fls. 303 dos autos e verificada a oposição de Acórdãos por despacho do Juiz Desembargador a fls. 360 dos autos, a Recorrente veio apresentar as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: a) Subjacente ao acórdão-recorrido e ao acórdão-fundamento – acórdão do STA, de 16 de Dezembro de 2010, proferido no processo n.º 0587/10 – encontra-se a mesma situação de facto, dado que, em ambos os casos houve um atraso na liquidação do imposto devido que motivou a liquidação de juros compensatórios, sendo que tanto o contribuinte como a Administração Tributária falharam em aperceber-se do exacto «alcance jurídico e fiscal» da obrigação legal que justificava a liquidação de imposto a taxa superior, tendo sido em virtude da «compreensível falta de imediata percepção […] do exacto alcance jurídico e fiscal da situação de facto subjacente à necessidade de liquidar o imposto devido que o contribuinte retardou o respectivo pagamento.
b) Em ambos os casos o imposto detectado em falta foi pronta e voluntariamente regularizado pelos contribuintes, no caso do acórdão-recorrido, por exclusiva iniciativa da ora Recorrente, já que a Administração Tributária nunca chegou a aperceber-se do lapso praticado.
c) Perante os referidos factos, também se verifica identidade no direito apreciado, pois em ambos os acórdãos interpreta-se o artigo 35.º da LGT, e se analisam as consequências, ao nível da imputabilidade da responsabilidade por juros, dos comportamentos consubstanciados na não percepção dos erros praticados pelos contribuintes por parte da Administração, por um lado, e na detecção e regularização imediata e voluntária desses mesmos erros por parte dos contribuintes.
d) Face à mesma questão de direito e de facto, e não tendo havido alterações ao quadro legislativo relevante, foram emitidas, de forma expressa, decisões opostas.
e) No acórdão-recorrido retira-se imediatamente da liquidação de imposto à taxa reduzida a imputabilidade, a título negligente, do retardamento do imposto que esteve na base da liquidação de juros compensatórios, sem atender à desculpabilidade do erro praticado, e sem valorar a boa-fé demonstrada na respectiva reparação (imediata, voluntária e de sua exclusiva iniciativa) perante o Estado, bem como a falta de percepção da obrigação legal também por parte da Administração Tributária.
f) Ao invés, no acórdão-fundamento rejeita-se essa posição, considerando-se não ser de formular um juízo de censura à actuação errónea do contribuinte em relação ao retardamento da liquidação de imposto a taxa superior devida, devendo considerar-se excluída a sua culpa, assente na falta de clareza legal percepcionada pelo contribuinte e Administração e na boa-fé evidenciada pelo contribuinte na correcção dos erros praticados, sendo, em consequência, afastada a sua responsabilidade pelo pagamento de juros compensatórios.
g) Não se pode considerar que exista jurisprudência consolidada do STA no sentido da decisão constante do acórdão-recorrido, tanto mais que o acórdão-fundamento foi proferido pelo próprio STA (2.ª Secção).
h) O acórdão-recorrido decidiu mal quanto à apreciação da verificação do elemento subjectivo da responsabilidade por juros compensatórios, dade que, desde logo, não basta, neste âmbito, uma conexão objectiva entre o atraso e a actuação do contribuinte, sendo necessário que a sua conduta seja censurável, a título de dolo ou negligência.
i) A Recorrente limitou-se a aplicar o que dispunha a própria Lei n.º 171/99, de 18 de Setembro, e a preencher a modelo 22 da forma que se afigurava mais razoável, fazendo aplicar a taxa à matéria colectável, sendo certo que nem a lei nem a declaração modelo 22 em momento algum faziam qualquer referência à existência de limites ao benefício que aparentavam conceder.
j) Foi a Recorrente que detectou o lapso evidenciado na sua declaração de rendimentos e regularizou-o de imediato, não tendo a Autoridade Tributária suscitado qualquer dúvida sobre a aplicação da taxa reduzida plasmada na Lei n.º 171/99, de 18 de Setembro, à totalidade da matéria tributável da Recorrente.
k) Atenta a boa-fé manifestada em toda a questão e o controverso enquadramento legislativo do limite ao benefício fiscal, deve entender-se que a ora Recorrente agiu sem culpa ao preencher as declarações de imposto e autoliquidar IRC, aplicando a taxa reduzida de 20% à totalidade da matéria tributável de acordo com as instruções oficiais de preenchimento da declaração modelo 22.
l) A não percepção imediata da obrigação legal de aplicação (em parte) da taxa normal de IRC nos períodos em causa pela Recorrente, mas também pela Administração fiscal, associada à regularização voluntária do imposto em falta assim que foi detectado o erro – ocorridas no caso dos Autos – são, como julgou o acórdão-fundamento, evidentes indícios de boa-fé e convicção do contribuinte na rectidão da sua conduta, assim como um indício da falta de evidência e clareza da correcta aplicação do regime jurídico no caso concreto.
m) Ademais, nos termos sustentados pela jurisprudência firmada sobre esta matéria, inexiste qualquer imputação a título de dolo ou negligência designadamente se o contribuinte apresentou errada declaração dos seus rendimentos, mas corrigiu esta no prazo que lhe foi fixado pela Administração Tributária, sendo que in casu o contribuinte até se antecipou à Administração Tributária para declarar e pagar o imposto de cerca de 16 milhões de Euros, sem que aquela tivesse detectado qualquer falta ou incorrecção na modelo 22 de IRC.
n) Dito isto, à luz do que foi decidido no acórdão-fundamento do Supremo Tribunal Administrativo, face ao circunstancialismo acima descrito, não seria possível formular um juízo de censura à actuação errónea do contribuinte, em relação ao retardamento da liquidação de imposto a taxa superior devida, devendo considerar-se excluída a sua culpa e, em consequência, afastada a sua responsabilidade pelo pagamento de juros compensatórios, o que caberia ao Tribunal a quo reconhecer.
o) Bastando-se o Tribunal a quo para a manutenção da liquidação de juros compensatórios com a emissão de juízo conclusivo no sentido de que «a ignorância da lei não justifica a sua falta de cumprimento» e de que a Recorrente não respeitou o enquadramento legal vigente à data dos factos no que se refere à aplicabilidade de taxa reduzida de imposto, a decisão por este emitida incorre na violação das normas ínsitas no artigo 35.º da LGT e no artigo 94.º (actual 102.º) do Código do IRC.
p) Demonstrando-se que foi o acórdão-fundamento aquele que adoptou a decisão mais acertada face à melhor interpretação da Lei e dos princípios de direito, caberá, deste modo, anular a decisão ínsita no acórdão-recorrido, que se encontra em oposição com aquela.
Termos em que se requer a V. Excelências que, reconhecendo a oposição entre acórdão-recorrido e o acórdão-fundamento, considerem o presente recurso procedente por provado, revogando-se o acórdão recorrido com a consequente anulação dos actos de liquidação de juros compensatórios em crise, tudo na senda da jurisprudência do acórdão-fundamento, e com os demais efeitos legais.
Igualmente e desde já se requer a dispensa da ora Recorrente do pagamento do remanescente, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento de Custas Processuais.
2 – Não foram apresentadas contra-alegações.
3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste STA emitiu o parecer de fls. 443 a 445 dos autos no sentido da improcedência do recurso, concluindo nos seguintes termos: “Não oferece dúvidas que nos dois arestos se suscitou a questão da responsabilidade pelo pagamento de juros compensatórios pela verificação do retardamento do montante do imposto devido, à luz do disposto no artigo 35º da LGT. E em ambos os casos apreciados nos dois arestos se suscitou a questão da apreciação da imputação dessa responsabilidade a título negligente.
A questão passa então por verificar se na apreciação da conduta negligente do contribuinte foram adotados entendimentos diversos que expliquem as diversas soluções dadas aos casos.
No acórdão “fundamento” considerou-se que embora o retardamento fosse imputável ao contribuinte, a culpa seria de afastar se à luz das regras de experiência e das provas obtidas, se concluísse que o contribuinte actuou com a diligência normal no cumprimento das suas obrigações fiscais. Tendo o tribunal concluído que tal ocorria no caso concreto, uma vez que o erro era desculpável, em face do circunstancialismo apurado nos autos.
Ressalta, assim, que neste caso está em causa a caracterização do “erro desculpável” que afasta a responsabilidade do contribuinte. Tendo o STA considerado que preenchia tal noção o facto de o contribuinte não ter relevado, para efeitos de definição da taxa de IVA aplicável nas operações comerciais, a diversa natureza jurídica de uma empresa municipal em contraposição com a de um serviço municipalizado, não lhe sendo censurável esse erro [A...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO