Acórdão nº 116/05.7TBNLS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelDR. HÉLDER ALMEIDA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA Legislação Nacional: ARTIGOS 1221º E SS E 1229º DO CCIVIL Sumário: 1. No âmbito do contrato de empreitada, ocorrendo o incumprimento defeituoso assistem ao dono da obra os direitos previstos nos arts. 1221º e ss do CC - as chamadas pretensões edilícias-, que apenas podem ser exercidos segundo a ordem de prioridades ali contemplada. Porém, o exercício de tais direitos pressupõe a manutenção ou persistência do contrato. Ora, “in casu”, essa condição já não se verifica, pois que o dono de obra, de “motu próprio”, pôs fim ao negócio firmado com o empreiteiro mediante a sua operada desistência.

  1. Tendo o dono da obra posto fim à empreitada pelo acto de desistência da empreitada, consentido pelo artº. 1229º do CC, não pode pedir a condenação do empreiteiro na conclusão da mesma, no pagamento de importâncias despendidas em tal conclusão, nem numa indemnização ou compensação.

    Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO 1.

    A...

    intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Nelas, a presente acção com processo ordinário contra B...

    , alegando, em síntese, que se dedicando-se à prestação de serviços de construção de pavilhões industriais e transformação de metais, normalmente em regime de empreitada, no âmbito dessa sua actividade, em 12/05/2003, celebrou um contrato de empreitada com a Ré, materializado em caderno de encargos e formas de pagamento, tendo por objecto a edificação de um pavilhão destinado a oficina de mecânica de automóveis no R/C e um corpo com dois pisos destinado a áreas administrativas e de apoio.

    O valor global da empreitada foi de € 85.000,00, a pagar de acordo com as fases da obra.

    Além dos trabalhos constantes do caderno de encargos, e a pedido da Ré, a A. realizou outros trabalhos que dele não constavam, que veio a descriminar e facturar, no valor de € 10.983,70.

    A Ré não pagou a última prestação, no valor de € 10.000,00, como também não liquidou a última factura no valor de € 10.983,70, o que perfaz o valor global de € 20.983,70.

    E assim fundada, conclui pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 20.983,70, acrescida de juros de mora vencidos no montante de € 547,30, e dos juros vincendos, à taxa legal em vigor.

    A Ré apresentou, por seu turno, contestação e reconvenção, alegando ‑àquele título e também em síntese‑ que a A. não realizou todos os trabalhos constantes do caderno de encargos e, alguns dos realizados, não foram de acordo com o estipulado, não tendo a A. terminado a obra a que se obrigou, chegando mesmo a tê-la parada por vários meses.

    Em reconvenção, aduz que em virtude da A. não ter concluído os trabalhos constantes do caderno de encargos teve de recorrer ao serviço de terceiros, tendo gasto a quantia de € 11.121,98.

    E como assim, conclui pela improcedência parcial da acção, e pela procedência da reconvenção, com todas as legais consequências.

    A A. replicou, no essencial impugnando a factualidade invocada pela Ré, concluindo como no petitório e pela sua absolvição do pedido reconvencional.

    Seguindo os autos os seus normais trâmites, após o julgamento foi vertida nos autos douta sentença julgando a acção totalmente procedente e provada, condenando a Ré nos exactos termos peticionados.

    Quanto à reconvenção, julgando-a na íntegra improcedente, por não provada, absolveu a A. do respectivo pedido.

  2. Irresignado de novo com esta decisão, a Ré interpôs o vertente recurso de apelação, cujas alegações ‑visando a revogação da sentença e sua substituição por outra nos exactos preconizados na parte final de peça recursiva‑, encerra com as seguintes conclusões: 1) Ficou demonstrado que a A. executou com defeitos os trabalhos identificados nos pontos 16, 19, 20, 23, 24, 25 e 27 dos factos provados.

    2) Se assim foi, a sentença recorrida deveria ter deduzido o custo da reparação desses defeitos ao preço da empreitada ainda em falta (ou ter remetido a liquidação desse custo para execução de sentença), em nome do princípio do enriquecimento sem causa e do disposto no artigo 1222 do C. Civil.

    3) Mesmo que assim não fosse, poderia e deveria ter julgado justificado e legitimado o não pagamento do preço em falta da empreitada (10.000 €), enquanto a R. não reparasse esses defeitos, socorrendo-se neste caso do disposto no artigo 428 do C. Civil.

    4) Só por deficiente interpretação dos factos dados como provados ou por erro de raciocínio, a sentença recorrida concluiu que o não cumprimento do contrato de empreitada é imputável à própria R., que soldou os portões de acesso ao pavilhão e impediu o representante da A. de lá entrar.

    5) Isto porque somente se provou que esse comportamento da R. ocorreu a notificação avulsa que fez à A. para concluir os trabalhos, ficando sem se saber se ocorreu antes ou depois de decorrido o prazo de 20 dias que a R. concedeu à A. naquela notificação.

    6) Sendo certo que se ocorreu antes, então a tese da sentença recorrida é defensável; Se ocorreu depois, então tal tese não faz o menor sentido, isto mesmo considerando que já depois da R. ter contratado outro empreiteiro para acabar a obra, a A. se ter apresentado (inutilmente) para o fazer, como resulta dos pontos 10 e 11.

    7) Sem que se tenha averiguado e provado o momento temporal exacto em que esse acto se verificou, não tem o Tribunal elementos que permitam imputar à R. qualquer grau de culpa no não cumprimento do contrato de empreitada.

    8) Existem obras que confessada e demonstradamente a A. não executou (as dos pontos 19, 20, 23 e 28 da fundamentação de facto da sentença) e que a R. não pode nem deve pagar, por não ter beneficiado do respectivo trabalho.

    9) Nenhuma prova foi produzida no sentido de ter ficado demonstrado que a A. efectuou trabalhos a mais para a R. no valor de 10.983,70 €.

    10) Bem pelo contrário, três testemunhas da R. (C...

    , D...

    e E...

    ) afirmaram não só que o número de horas de compressor e de máquina eram excessivas, como os preços superavam os praticados no mercado, como até que a fossa para a cabine de pintura já fazia parte do contrato inicial de empreitada.

    11) Não é compreensível que o Tribunal recorrido justifique quer a natureza quer o valor dos trabalhos a mais apenas com base numa factura que a A. emitiu por sua exclusiva lavra e sem qualquer controle da R, como ficou bem patente na fundamentação apresentada pela Ma. Juiz na resposta ao quesito 2°.

    12) No entender da R. o Tribunal não tinha elementos para fixar o valor exacto desses trabalhos a mais, daí que devesse remeter as partes para liquidação desse valor em execução de sentença.

    13) Estando provado nos pontos 9 e 13 da sentença que a R. só mandou soldar a porta depois da A. ter recebido a notificação avulsa e de não ter concluído os trabalhos no prazo que lhe foi concedido, está mais que legitimada a entrega a terceiros das obras não acabadas.

    14) Daí que a reconvenção devesse ter sido julgada procedente, ainda que parcialmente, por forma a que a R. pudesse ser compensada dos custos das obras identificadas nos pontos 14, 16, 28 dos factos provados.

    15) Foram incorrectamente julgados os pontos 5 e 18, que deveriam ter sido dados como não provados, em face de total ausência de prova sobre a matéria dos mesmos e dos depoimentos das já referidas testemunhas C..., D... e E....

    16) A sentença recorrida violou ou interpretou incorrectamente os artigos 428, 473, 1207, 1222, 883 e 884 do C. Civil.

    3.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    Uma vez que nada a tal obsta, cumpre decidir.

    II – FACTOS Na douta sentença foi vertida, como provada, a seguinte factualidade: 1 – A A. é uma sociedade comercial que se dedica à prestação de serviços de construção de pavilhões industriais e transformação de metais, normalmente em regime de empreitada – (Al. A).

    2 - No âmbito dessa sua actividade, em 12/05/2003, a A. celebrou um contrato em regime de empreitada com a R, a seu pedido, contrato esse que se materializa no caderno de encargos e formas de pagamentos que consta do doc. nº 1, com o seguinte teor: Exmos Senhores A B.....

    ......................

    Nelas 12/05/03 Caderno de Encargos.

    De acordo com o nosso orçamento vimos apresentar os trabalhos e materiais a aplicar na construção de um pavilhão, com as seguintes medidas 35mx15mx6m: - Projecto e cálculos apresentado na Câmara Municipal de Seia.

    - Abertura de sapatas e seu preenchimento em betão armado.

    - Viga de travamento em betão armado.

    - Colocação de montantes para montagem de estrutura metálica.

    - Montagem de pilares e asnas.

    - Colocação de madres na cobertura e paredes laterais.

    - Aplicação de blocos 50x20x20 nas paredes exteriores ate a altura de 2m.

    - Rebocar as paredes interiormente.

    - Colocação da cobertura em painel isotérmico de 3cm de exp.

    - Colocação de painel nas paredes exteriores ate ao chão de 4cm de exp.

    - A platibanda será em chapa lacada.

    - A estrutura dos escritórios e casas de banho será metálica.

    - As paredes das casas de banho e escritório em tijolo.

    - A placa será do tipo Metálico e preenchida a betoni1ha.

    - Os pavimentos do refeitório, casas de banho e escritório em tijoleira de grés.

    - As paredes das casas de banho em azulejo branco.

    - Levará uma escadaria em ferro de acesso ao refeitório respectivos corrimões.

    - As pinturas serão a tinta plástica.

    - As caixilharias em alumínio lacado - Dois portões em painel isotérmico de correr.

    - A parte eléctrica será simplificada.

    - As aguas e telefones ligados à rede publica.

    Desta forma as modalidades de pagamento requerem a seguinte ordem: Pagamento inicial adjudicação.------------------------- 15.000 €.

    Colocação da viga cinta tout-venant e compactação---20.000€.

    Colocação de estruturas metálicas-----------------------20.000 €.

    Colocação de cobertura e paredes------------------------20.000 €.

    N a conclusão dos trabalhos--------------------------------10.000 € 85.000 € - (Al. B).

    3 - Desse documento constam discriminadamente os trabalhos que a A. se propôs e era obrigada a realizar, os quais...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT