Acórdão nº 0644/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Março de 2018
Magistrado Responsável | TERESA DE SOUSA |
Data da Resolução | 15 de Março de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A…………… e B…………….. intentaram uma acção com processo ordinário contra o IEP - Instituto de Estradas de Portugal, sendo chamados a intervir o Município de Coimbra e Companhia Seguradora C…………. – Companhia de Seguros, para efectivação de responsabilidade civil extracontratual emergente de acidente de viação sofrido pelo seu pai.
Na audiência preliminar foi proferido despacho julgando o então IEP parte legítima – cfr. fls. 255.
Desse despacho interpôs o R. IEP recurso para este STA, a fls. 258/259, formulando as seguintes conclusões: 1. Tendo o troço de estrada onde o acidente ocorreu, passado a integrar o património da Câmara Municipal de Coimbra – Município de Coimbra – tendo pois sobre ele toda a jurisdição, é da sua responsabilidade, mantê-la em perfeitas condições de segurança, nomeadamente reforçar ou complementar a sinalização, em situações de especial perigosidade, face à sua concepção, traçado e construção.
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Por isso o IEP não é titular do interesse relevante, não tem interesse em contradizer, pelo que é parte ilegítima.
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A sentença viola entre outros o disposto no artigo 13º, nº 2 do Dec. Lei nº 380/85 de 26 de Setembro, 26º, 288, nº 1, alínea d), 493, nº 2 e 494º alínea e) do CPC.
Os AA. contra-alegaram a fls. 263 a 267, formulando as seguintes conclusões: 1º - A decisão recorrida é justa e inatacável; 2º - Daí ser o IEP parte legítima como muito bem defendeu a Senhora Juíza a quo; 3º - Assim, deve o recurso do IEP ser julgado improcedente e não provado devendo manter-se a decisão recorrida por ser justa e legal.
Recurso que foi admitido, a subir a final.
Por sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra em 22 de Julho de 2010, foi julgada parcialmente procedente a referenciada acção, sendo absolvida do pedido a ré Estradas de Portugal e, condenado o réu Município de Coimbra no pagamento da quantia total de 639.293,71€ a ambos os autores, e no pagamento do montante de 109.735,53€ ao autor A………., importâncias a que acrescem juros moratórios, à taxa legal, desde a data da citação e até efectivo pagamento.
Não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, na parte em que absolveu a ré Estradas de Portugal do pedido, vêm os AA., apenas quanto a esta absolvição do pedido, interpor recurso apresentando alegações a fls. 773 a 780, com as conclusões seguintes: 1 - O Instituto das Estradas (ex JAE), actualmente EP - Estradas de Portugal, S.A. concebe as obras, projecta-as, desenha-as e aprova-as.
2 - Depois transfere as mesmas para a Câmara, órgão executivo da R. Município de Coimbra.
3 - Impõe a sua execução na referida estrada tal e qual como a concebeu, desenhou, projectou e aprovou.
4 - Se a Câmara se afastasse da execução tal e qual como as concebeu, deixaria de participar na verba entregue. Só assim a EP, as financiava e pagava.
5 - A ex-JAE concebe-as, projecta-as e aprova-as, sem ter em conta, que as mesmas não se adaptavam ao local, à curva, à existência de árvores, faz mal os desenhos e os perfis, faz mal o separador, não calculou os perigos e a insegurança daí resultantes, não adequou as obras ao terreno, pelo que 6 - A sua responsabilidade existe em conjunto com a R. Município de Coimbra.
7 - Ao impor à Câmara a execução as obras de certa maneira, ela é responsável porque a Câmara executou-as de acordo com o projecto do Instituto de Estradas e deu no que deu.
8 - A ex JAE e o Instituto que legalmente lhe sucedeu são responsáveis igualmente pelo pagamento das indemnizações fixadas, pelo que nessa parte a sentença violou, entre outros os art 562º, 563º, 564º do CC e ainda as regras gerais de cuidado, prudência e as regras da boa técnica, os saberes da legis artis que no caso falharam de modo clamoroso.
Nestes termos devem V. Exas. darem provimento ao presente recurso e em consequência à condenação também da Ré EP - Estradas de Portugal.
A EP - ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A., apresentou as suas contra-alegações que contém conclusões com o seguinte teor: 1- A Câmara mantinha a estrada em funcionamento e aberta ao trânsito sem sinalização horizontal ou vertical, sem nenhuma visibilidade, sem sinais a indicar por onde os condutores deveriam seguir, com sujidade a cobrir os traços delimitadores da via.
2- É pois a Câmara a única responsável e não a ora EP.
3- Não sendo, por isso, a recorrida parte legitima.
4- Não se configura a existência de qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão constantes da sentença recorrida.
5- Nestes termos devem improceder as conclusões de recurso respeitantes à alegada violação da sentença.
6- Não se mostram verificados nos presentes autos todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas de direito público por actos ilícitos e culposos, para que a recorrida seja condenada.
7- O Município de Coimbra recebeu a estrada em causa, em 27 de Março de 1995, com tudo quanto ela continha, sucedendo então, e desde logo, nos direitos e obrigações, de tudo quanto decorre, da circulação de trânsito automóvel na dita estrada.
8- O troço da estrada em questão, no qual ocorreu o acidente dos autos, não se encontrava sob jurisdição da EP — Estradas de Portugal, S.A., e isto independentemente de quem procedeu à concepção do seu traçado e à sua construção.
9- Assim, se a concepção da estrada e consequente construção ainda pela JAE, oferecia perigosidade, competia ao Município de Coimbra, proceder às devidas alterações e à devida e complementar sinalização.
10- Após o momento em que o Município teve a jurisdição do troço da estrada em questão, passou a integrar o património do Município, só ele sendo responsável pelo cumprimento da obrigação de a manter em perfeitas condições de segurança, nomeadamente reforçar ou complementar a sinalização.
Nestes termos e nos melhores de Direito, que serão por V. Exa. doutamente supridos, deve dar-se provimento ao recurso de agravo e negar-se provimento ao recurso interposto pelos AA, assim se fazendo, como sempre a costumada JUSTIÇA! O Município de Coimbra e C…………. – Companhia de Seguros, SA, também não se conformando com a sentença do TAF Coimbra, vieram interpor recurso, respectivamente a fls. 742 e 747 dos autos.
As alegações da C……………. – Companhia de Seguros, SA, têm as seguintes conclusões, a fls. 800 /804 dos autos: 1- Dão-se aqui como reproduzidas as conclusões constantes das alegações apresentadas pelo recorrente Município de Coimbra; 2- O Réu Município estava obrigado, nos termos do Protocolo, a fazer-se as obras de acordo com o projecto elaborado pela JAE.
3- Apenas dele se podendo afastar com fundamento em motivo justificado; 4- Não resulta provado da matéria apurada a existência de qualquer motivo justificado; 5- E tendo o projecto sido elaborado pela JAE — entidade especialmente vocacionada para a construção e modificação das estradas nacionais, como era o troço de estrada onde ocorreu o acidente ajuizado, com a consequente elaboração dos respectivos projectos — era de presumir, pelo Município de Coimbra, que o Projecto em causa estava elaborado de acordo com as regras técnicas aplicáveis; 6- Pelo que estava vedado ao Município de Coimbra introduzir, na sua execução, alterações ao projectado; 7- Sob pena de violação não só do Código dos Direitos de Autor, como também do Protocolo; 8- Perdendo a comparticipação acordada com a JAE e com o FEDER; 9- Por outro lado, os montantes indemnizatórios fixados mostram-se manifestamente exagerados; 10- Muito superiores aos valores que resultariam da aplicação da Portaria 377/2008, 11- A qual, não sendo vinculativa, será indicativa para o Julgador, por forma a realizar o princípio constitucional da igualdade de todos os cidadãos perante a lei; 12- Consequentemente, a douta decisão recorrida viola o Protocolo outorgado entre a JAE e o Município de Coimbra, bem como o art. 13º da Constituição da República e a Portaria 377/2008.
13- Pelo que a mesma deve ser revogada quanto à condenação do Réu Município de Coimbra; ou, quando assim se não entenda, fixar-se a indemnização em montante aproximado do que resultaria da aplicação dos critérios e valores constante da Portaria 377/2008.
O Município de Coimbra alegou a fls. 840 a 853 dos autos, formulando as seguintes conclusões: 1º Dão-se aqui por integralmente reproduzidas as doutas alegações de recurso apresentadas pela Interveniente, também recorrente, C…………., SA.
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No âmbito da presente acção, não se verificam os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do ora recorrente.
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Contrariamente ao constante na douta sentença recorrida, a participação do Réu IEP não se reduziu a mera participação financeira.
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A estrada onde ocorreu o acidente integrava a rede municipal que, nos termos do previsto no DL n.º 380/85, de 26/9 e no âmbito da transferência de gestão das estradas nacionais, passou a ser gerida pelo recorrente a partir de 27/03/1995.
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Em 10 de Abril de 1995, entre a Câmara Municipal de Coimbra, a Comissão de Coordenação da Região Centro e a ex-Junta Autónoma das Estradas, foi celebrado o acordo de colaboração para a execução da obra: “Reabilitação da EN 111-1 entre Cidreira (Km 0,000) e Coimbra (KM 4,532)”.
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Como constava do protocolo, a participação financeira da Junta Autónoma das Estradas e do FEDER, podiam ser canceladas se a execução das obras se afastar, sem motivo justificado, do projecto aprovado pela JAE, bem como do caderno de encargos ou do programa de trabalhos.
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As obras da referida empreitada tiveram por base as plantas, perfis longitudinais e perfis transversais extraídos do projecto inicial da ex-JAE e a alteração do separador foi aprovada por despacho proferido em 1998.06.26, pelo Presidente da CMC.
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Ou seja, as obras foram projectadas e aprovadas pela ex-JAE, por técnicos especializados e de acordo com as regras técnicas exigíveis, assim como foi esta entidade que elaborou o caderno de encargos...
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