Acórdão nº 01526/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução22 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 - RELATÓRIO – A Representante da Fazenda Pública, vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por, A………………… e B…………….., melhor identificados nos autos, contra a liquidação adicional de IRS relativas ao ano de 2007, no valor de 17.418,36€ e respectivos juros compensatórios no montante de 1. 758,06€.

Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões: «- Incide o presente recurso sobre, a aliás douta sentença, que julgou procedente a presente impugnação, com a consequente anulação da liquidação adicional de IRS do ano de 2007, apurada em ação inspetiva e com base na qual foram detetadas irregularidades que determinaram a realização de correções de natureza meramente aritmética da matéria tributável; - As correções prendem-se com a não relevação, por parte do impugnante marido, em termos contabilísticos, da operação comercial do loteamento e afetação de três dos lotes da atividade empresarial para a esfera particular do impugnante marido; - Ficou assente na sentença que o impugnante marido, em momento anterior à doação, procedeu à transferência dos lotes de terreno que estavam afetos à sua atividade empresarial para o seu património particular, sem que tenha inscrito essa transferência na contabilidade; - Relativamente ao valor dos imóveis a considerar, a AT considerou que, à data de afetação o valor de mercado corresponde ao respetivo valor patrimonial tributário, porquanto, os bens já estavam avaliados nos termos do CIMI; - Defende o julgador que se verifica vício de violação de lei, porque a AT assumiu o valor patrimonial tributário como valor de mercado, em contrário do disposto no art.º 29°, n.º 4 do CIRS, não tendo fundamentado por que motivo o valor atribuído pelo sujeito passivo não corresponde ao que seria aplicado entre pessoas independentes e, como tal, deveria ser corrigido, do que discordamos; - A AT entende que o valor patrimonial tributário determinado de acordo com as regras de avaliação previstas no CIMI se enquadra, no caso concretamente apreciado, na previsão do preceituado no art.º 29°, n.º 3 e 4 do CIRS; - Atente-se no preâmbulo do CIMT que, na sua parte final, refere “…o incremento patrimonial resultante da aplicação das novas regras de avaliação aproximará os valores patrimoniais a cerca de 80% a 90% dos valores de mercado destes mesmos bens”; - O valor patrimonial tributário dos imóveis obtido com base nas regras de avaliação previstas no CIMI pretendeu e concretizou efetivamente uma aproximação do VPT ao valor de mercado dos bens; - Sobre a razão de ser da aplicação do VPT nos termos e para os efeitos previstos no art.° 29°, n.º 3 e 4 do CIRS, é certo que o art.º 29°, n.º 4 do citado diploma legal refere que o valor de mercado a que se faz alusão nos números anteriores, atribuído pelo sujeito passivo no momento da transferência dos bens pode ser corrigido pela Direção Geral dos Impostos sempre que esta entidade considere fundamentadamente que o mesmo não corresponde ao que seria praticado entre pessoas independentes; - Ora, não é definido o que se considera valor de mercado, além de que, o valor indicado pelo sujeito passivo pode ser corrigido pela AT, havendo nesta matéria que atender ao princípio da unidade do sistema jurídico consagrado no art.º 9° do Código Civil e ainda ao art.º 11° da LGT, do qual resulta que em matéria de direito fiscal, devem ser pesquisados os conceitos dos regimes mais próximos; - No caso, não dispondo o CIRS sobre esta temática de uma definição do conceito de “valor de mercado”, há que ir buscá-lo a um dos regimes mais próximos, dentro do direito fiscal, sendo que, o regime mais próximo no âmbito dos códigos tributários é o que consubstancia o valor patrimonial tributário alcançado através de avaliação ao abrigo das regras do CIMI, em conformidade com o determinado no art.º 2°, alínea b) da LGT; - Mas, ainda que assim não sucedesse, sempre diremos que existe uma disparidade manifesta entre o valor que consta da escritura de doação (€ 5.000,00 cada lote, num total de 15.00000 para os três lotes) e o valor patrimonial tributário resultante do processo de avaliação, cujo valor global dos três lotes ascende a € 110.811,55; - Disparidade que não tem qualquer fundamento, considerando que o valor patrimonial tributário pretendeu uma aproximação entre 80% a 90% do valor de mercado dos bens, no dizer do preâmbulo do CIMT; Assim, do ponto de vista da Fazenda Pública, o valor patrimonial tributário em sede de IMI tem perfeito enquadramento legal na norma do art.º 29°, n.º 3 e 4 do CIRS, porquanto: Tal preceito não define o que se considera “valor de mercado”; É preciso buscar o dito conceito às regras de avaliação do ClMl (cfr. art.° 2°, b) da LGT); O VPT foi alcançado segundo as regras do CIMI, com todas as consequências legais; É manifesta a disparidade de valores entre o VPT dos prédios e o valor declarado na escritura de doação em relação aos mesmos; Assim sendo e de qualquer forma, sempre estariam preenchidos os requisitos do art.º 29°, n.º 4 do CIRS; Pois que, é evidente que o preço declarado não correspondeu ao praticado entre pessoas independentes; Podendo, e devendo, a AT corrigir os valores declarados (valor de transferência para o património particular), em conformidade com o VPT que corresponde a um valor equiparado ao valor de mercado, o que sucedeu no caso dos autos; - Em suma, o Meritíssimo Juiz incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação da lei, mormente o disposto nos art.º 29°, n°. 3 e 4 do CIRS e art.º 11.º e 2°, b), ambos da LGT.

Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que se julgue improcedente, por não provado, o vício de violação de lei imputado à liquidação impugnada, com as legais consequências.» Os Recorridos apresentaram as suas contra alegações a fls. 133 a 137 dos autos, com o seguinte quadro conclusivo: «I - Não assiste razão à Fazenda Pública nos argumentos que plasmou no seu libelo recursório, pelo que, deverá ser mantida a sentença recorrida (sem prejuízo do requerimento supra referido atravessado nos autos pelos impugnantes/recorridos).

II - Ao abrigo do disposto no artigo 636.º do CPC, vêm os impugnantes/recorridos requerer a ampliação do âmbito do recurso, para o caso de proceder a argumentação da Fazenda Pública, deve este Venerando Tribunal conhecer dos outros argumentos trazidos aos autos pelos impugnantes/recorridos (um que foi julgado improcedente e aqueles cujo conhecimento ficou prejudicado), uma vez que, os impugnantes/recorridos apresentaram a impugnação nos autos e fundaram-na em vários argumentos, tendo um sido considerado improcedente e tendo o conhecimento de outros ficado prejudicado pela decisão ditada na sentença, são eles: o impugnante marido não tinha de inscrever em termos contabilísticos a operação de loteamento; a consideração da celebração de uma escritura de rectificação em 12.10.2010 rectificar a doação celebrada em 27.03.2007, pois que nesta declarou-se terem sido doados 3 lotes, quando na realidade os impugnantes só doaram um lote, havendo, por isso, errónea quantificação da liquidação; as considerações da Fazenda Pública são designadas correcções aritméticas, contudo, não passam de presunções, que deveriam ter passado pelo crivo dos artigos 91° e 92º do LGT e como não foi dada a oportunidade aos impugnantes do debate contraditório, previsto naqueles artigos, a liquidação encontra-se em vício de forma.

III - Caso assim não se entenda, e ainda na possibilidade de procedência da argumentação recursória da Fazenda Pública, se se vier a considerar que o conhecimento daqueles outros fundamentos (neste caso, daqueles cujo conhecimento ficou prejudicado) não pode ocorrer neste Venerando Tribunal, então sempre se requer a baixa do processo para que o tribunal de primeira instância se possa pronunciar sobre os outros fundamentos (neste caso, daqueles cujo conhecimento ficou prejudicado) invocados pelos impugnantes.

Termos em que, deve ser mantida a sentença recorrida ou, caso proceda a tese recursória da Fazenda Pública, requer-se a ampliação do âmbito do recurso, ao abrigo do disposto no artigo 636.º do CPC, nos termos supra referidos nas conclusões ou, caso assim não se entenda, ser ordenada baixa do processo ao tribunal de primeira instância também nos termos referidos supra nas conclusões.

Assim decidindo, farão V. Exas.

Justiça!» O Ministério Público emitiu parecer com o seguinte conteúdo: «A recorrente acima identificada vem sindicar a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, exarada a fls. 65/69, em 31 de Julho de 2014.

A sentença recorrida julgou parcialmente procedente impugnação judicial interposta contra o acto de Liquidação Adicional de IRS de 2007, no entendimento de que a Administração Tributária assumiu o VPT como valor de mercado, ao arrepio do estatuído no artigo 29.°/4 do CIRS, não tendo, ainda, fundamentado, a razão pela qual o valor atribuído pelos recorridos não corresponde ao que seria aplicado entre pessoas independentes e, como tal deveria ser corrigido.

A recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls.122/l25, que, como é sabido, salvo questões de conhecimento oficioso e desde que dos constem todos os elementos necessários à sua integração, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 635.°/4 e 639.°/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.

Os recorridos contra-alegaram, tendo concluído nos termos de fls. 136/137, que aqui, também, se dão por inteiramente reproduzidos para todos os efeitos legais.

Vejamos.

Estão em causa rendimentos de Categoria B (rendimentos empresariais).

Nesse regime a transferência de bens do activo da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT