Acórdão nº 0165/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Março de 2018
Magistrado Responsável | PEDRO DELGADO |
Data da Resolução | 22 de Março de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – GOP – Empresa de Gestão de Obras Públicas Município do Porto, EM, inconformada com a decisão arbitral de 14/01/2016 que correu termos no CAAD com o nº 305/2015-T que julgou improcedente o pedido de regularização do IVA, veio ao abrigo do nºs 2 e 3 do artigo 25.º do RJAT e do nº2 do artº 152º CPTA, interpor recurso para o Pleno do Contencioso deste Tribunal por considerar que a referida decisão arbitral está em oposição com o acórdão da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal, de 14 de Dezembro de 2011, proferido no âmbito do processo nº 0366/11.
2 - Por despacho do relator de 02 de Março de 2016, a fls. 116 dos autos, foi admitido o recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artº 27º, nº1, al. b) do ETAF, 152º, nº4 do CPTA e 26º, nº1 do RJAT.
3 - A recorrente veio apresentar no seu requerimento de recurso a fls. 33 e seguintes, alegação tendente a demonstrar a oposição de julgados com o seguinte quadro conclusivo: «
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A decisão arbitral de que ora se recorre, para além de estar em contradição com as normas legais aplicáveis, encontra-se em manifesta oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com a jurisprudência firmada pelo STA no Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 0366/11, datado de 14 de dezembro 2011, no que tange com a interpretação que é dada aos artigos 78°, n.ºs 1 a 3 da LGT e 98º, n.ºs 1 e 2 do Código do IVA.
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O conceito de questão fundamental de direito tem vindo a ser esclarecido pela jurisprudência pátria como correspondente a «i. identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto o que pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais; ii. que não tenha havido alteração substancial na regulamentação/jurídica a qual se verifica sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica; iii. que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta e esta oposição decorra de decisões expressas não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a invocação de decisões implícitas ou a pronúncia implícita ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.» [neste sentido vd., entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 4 de Junho de 2014, proferido no âmbito do processo n.º 01447/13].
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Neste sentido, dúvidas não persistem quanto à identidade da questão fundamental de direito apreciada no âmbito do Acórdão Recorrido e do Acórdão Fundamento, por este Supremo Tribunal Administrativo, em 14 de dezembro de 2011, no âmbito do processo nº 0366/11, D) Que se consubstancia na determinação do prazo para a revisão do ato tributário e respetiva admissibilidade.
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Em concreto, na decisão proferida no Acórdão Fundamento, o STA afirma que, em caso de erro na autoliquidação, o contribuinte pode solicitar à Autoridade Tributária que proceda à revisão oficiosa do ato, no prazo de 4 anos, e que, sendo tempestivo o pedido de revisão oficiosa dos atos de autoliquidação (o que se verifica, se apresentado dentro do prazo dos 4 anos previsto), a Autoridade Tributária está obrigada a rever o ato.
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Por seu turno, nos termos da decisão proferida no Acórdão Recorrido, um pedido de revisão oficiosa apresentado pelo sujeito passivo dentro do prazo legal (i.e. 4 anos) é ineficaz para efeitos de revisão de atos praticados há mais de 2 anos (ou seja, na prática e pese embora em clara contradição de raciocínio, a decisão arbitral conclui pela intempestividade do pedido de revisão oficiosa).
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O Tribunal Arbitral, em manifesta oposição ao Acórdão Fundamento, entende, assim, que a Autoridade Tributária não estaria obrigada a rever o ato tributário (i.e. a corrigir o imposto liquidado em excesso) praticado há mais de dois anos, H) Enquanto que o Acórdão Fundamento conclui, por seu turno, que esse prazo é efetivamente de quatro anos.
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Acresce que, o Acórdão Fundamento tem subjacente a mesma situação de facto [i.e. devolução ao contribuinte de IVA (auto)liquidado em excesso, dentro do prazo de 4 anos] e de direito (identidade das normas aplicáveis — artigo 78° da LGT e 98° do Código do IVA) que é objeto de apreciação no Acórdão Recorrido.
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Efetivamente, cumpre não perder de vista que o Acórdão Fundamento conclui que, em caso de erro na autoliquidação, a revisão dos atos tributários pela Autoridade Tributária tem de ser feita, quando solicitada pelo sujeito passivo, no prazo de 4 anos e não de 2 anos conforme sugere (erradamente) o Acórdão Recorrido.
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O entendimento referido no Acórdão Recorrido viola ainda o princípio da neutralidade do IVA, pedra basilar do imposto sub judice, na medida em que considera que, em sede de correção de faturas com mais de dois anos, o sujeito passivo não tem o direito a regularizar a seu favor o IVA liquidado em excesso, pese embora — como admite a decisão recorrida — o adquirente mantenha a sua obrigação de regularizar o IVA deduzido a favor do Estado.
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Do vindo de expender resulta cabalmente demonstrado que se verificam in casu todos os requisitos formais e substanciais exigíveis para a interposição de recurso da decisão arbitral, previstos no nº 2 do artigo 25° do RJAT, pelo que nada obsta à sua admissibilidade.
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Termos em que, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogada a decisão recorrida com a prolação de decisão que, ao pronunciar-se sobre o mérito da causa, declare a ilegalidade dos atos de autoliquidação em apreço, no valor total de € 283.882,96, com todas as legais consequências daí decorrentes.
Pelo exposto e sempre com o douto suprimento, requer-se muito respeitosamente a V. Exas se dignem:
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Admitir o presente recurso; b) Decidir o presente recurso no sentido de que existe oposição de julgados; c) Conhecer do objeto do presente recurso, resolvendo, assim, o presente conflito de jurisprudência no sentido do deliberado no Acórdão Fundamento, uma vez que a decisão recorrida fez uma incorreta apreciação e aplicação dos artigos 78° n.ºs 1 a 3 da LGT, bem como dos artigos 78° e 98° n.ºs 1 e 2 do Código do IVA, aos factos em causa, e, concludentemente, declarar a ilegalidade dos atos de autoliquidação em apreço, Com todas as legais consequências daí decorrentes.» 3 – Notificada a Fazenda Pública nos termos dos artigos 284º, nº5 e 282º, nº2 do CPPT, veio apresentar as suas contra alegações com as seguintes conclusões: «I. Do elenco factual acima descrito, subjaz que a Recorrente inconformada com a decisão arbitral veio interpor por recurso por oposição de acórdãos, nos termos e para os efeitos do art.° 25° do RJAT e do art.° 152.º do CPTA, sustentando que a decisão arbitral se encontra em manifesta oposição com o Acórdão proferido por esse Colendo Tribunal, proferido a 14.11.2011 no âmbito do proc. nº 0366/11, pois naquele acórdão fundamento, considerou-se ao invés da decisão arbitral, que da aplicabilidade do art. 78º da LGT (para o qual remete o art.º 98º do CIVA) o prazo para a revisão dos actos tributários é efectivamente de 4 anos e não de 2 como sustentado na decisão recorrida.
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Em sentido contrário, entende a entidade aqui Recorrida que o douto Tribunal “a quo” fez uma exacta apreciação dos factos e correcta aplicação do direito, maxime das normas legais aplicáveis, razão pela qual deverá ser mantida a decisão proferida, recortando-se ainda que, no caso vertente e à revelia do alegado pela Recorrente, inexiste identidade de facto e de direito entre a decisão arbitral e o Acórdão fundamento, III. Como é consabido, o recurso para uniformização de jurisprudência, previsto e regulado no art.º 152.º do CPTA e art.º 25 do RJAT, tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o Supremo Tribunal Administrativo, no caso concreto, proceder à anulação da decisão arbitral e realizar nova apreciação da questão em litigio quando suscitada e demonstrada tal contradição pela parte vencida (ou pelo Ministério Público).
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In casu, inexiste contradição quanto à mesma questão fundamental de direito, inexistindo igualmente similitude factual, razão pela qual, não se encontram reunidos os requisitos legais para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos.
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Desde logo, basta a mera leitura, ainda que perfunctória, sobre a decisão arbitral e o acórdão fundamento, para facilmente se constatar, pela inexistência de similitude quanto às mesmas situações de facto.
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Na verdade, enquanto que na decisão arbitral estava em causa a emissão de facturas e a liquidação de IVA ao Município do Porto tendo a Recorrente recebido deste, IVA que, na sua opinião, foi considerado em excesso, e feito constar das suas correspondentes declarações periódicas que, em tempo, entregou ao Estado, tendo posteriormente, procedido à emissão de notas de crédito a corrigir o enquadramento em IVA aplicado às operações, anulando o IVA liquidado em excesso nas facturas inicialmente emitidas ou seja, estávamos perante uma situação resultante de erros que a Recorrente incorreu em facturas por si emitidas e não nas suas autoliquidações.
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Conforme se expendeu na decisão arbitral “No caso concreto, os erros em que a Requerente assenta a sua pretensão deram-se nas liquidações integradas nas facturas por si emitidas ao Município do.., e não nas suas autoliquidações, que foram feitas em conformidade com o imposto por ela mencionado naquelas facturas, e, como tal, com a lei Daí que a Requerente, confessadamente, haja procedido à rectificação das facturas por si emitidas ao Município do.... justamente por ter consciência de que as autoliquidações por si levadas a cabo apenas seriam ilegais — e, como tal...
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