Acórdão nº 0716/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução14 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – Vem a Fazenda Pública recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela A…………… SGPS, SA, melhor identificada nos autos, contra o despacho que indeferiu o recurso hierárquico da decisão da reclamação graciosa quanto à correcção dos prejuízos fiscais do ano de 2004, no montante de € 813.903,13.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A……….. SGPS, S.A. contra a liquidação de IRC, referente ao exercício de 2004, pretendendo a Fazenda Pública, ora recorrente, a sua revogação e substituição por decisão que considere tal impugnação improcedente; II. A presente peça estruturar-se-á em dois planos distintos, a saber: I- DA NULIDADE POR NÃO APRECIAÇÃO DAS ALEGAÇÕES PRODUZIDAS PELA FAZENDA PÚBLICA NOS TERMOS DO ARTIGO 120-° DO CPPT III. Consta do proémio da douta sentença que, não obstante as partes terem sido notificadas para apresentar alegações escritas, apenas a impugnante usou dessa prerrogativa; IV. No entanto, também a Fazenda Pública produziu e remeteu ao TAF as respectivas alegações escritas; V. Importa, então, saber se esta omissão de apreciação das alegações constitui uma mera irregularidade ou uma nulidade processual, susceptível de determinar a anulação de todos os actos processuais subsequentes, incluindo a douta sentença de mérito entretanto proferida; VI. As nulidades processuais distinguem-se das nulidades das sentenças; VII. Nos termos do n.º 1 do artigo 201.º do CPC, norma especialmente dirigida às nulidades processuais, ocorre nulidade quando a prática de um acto ou a omissão de um acto possam influir no exame ou na decisão da causa, sendo esta apreciação da competência da entidade julgadora, à qual cabe, no seu prudente arbítrio, decretar ou não a nulidade; VIII. Devem as partes ser notificadas para alegações se, sendo a questão de facto e direito, os autos não contiverem, findos os articulados, todos os elementos necessários para a sua apreciação segura, ou seja, se posteriormente àquela fase (que finda com a contestação), qualquer das partes tiver junto elementos/meios de prova com relevância para a decisão; IX. Para efeitos da invalidade em causa, existe uma equivalência entre não notificar as partes para produzir alegações e notificá-las, mas não as apreciar, considerando-as inexistentes, na medida em que a consequência é exactamente a mesma: a parte ver-se impedida de levar o Tribunal a tomar em consideração a sua posição, de facto e de direito, sobre a relevância desses novos documentos na apreciação e julgamento jurídico da sua pretensão; X. Nos presentes autos, a impugnante deu entrada de um requerimento e respectivos documentos, referentes a uma decisão da Direcção de Serviços de IRC que recaiu sobre um recurso hierárquico interposto pela ora recorrida relativamente a IRC de 2005, argumentando que o mesmo versaria sobre matéria alegada na PI e que a AT teria adoptado posição divergente da dos presentes autos naqueloutro caso; XI. Tal entendimento foi acolhido pelo douto Tribunal na sentença aqui posta em crise, (fls. 10 in fine); XII. Ora, como se pode retirar das alegações então produzidas pela agora recorrente, foi tomada posição expressa sobre a (ir)relevância de tais documentos para a decisão da causa, sustentando que inexiste qualquer incoerência na posição da AT; XIII. Destarte, não poderia o douto Tribunal a quo ignorar o teor das alegações produzidas pela Fazenda Pública, na medida em que quer os documentos juntos pela parte, quer a sua apreciação por parte da recorrente, influenciaram o exame da causa; XIV. Não obstante a recorrente ter sido notificada da junção aos autos daqueloutros documentos, entendemos, como JORGE LOPES DE SOUSA (op. cit, pág. 298), que, ainda que “a parte contrária tenha sido notificada da junção e se tenha pronunciado, não pode dispensar-se a notificação das partes para alegações”; XV. Assim, esta não apreciação das alegações produzidas pela Fazenda Pública, ao não permitir levar para a discussão da causa o debate de facto e direito das questões nelas suscitadas, mormente sobre a pronúncia quanto à relevância ou irrelevância desses mesmos novos documentos na apreciação e julgamento jurídico da sua pretensão, nos termos consagrados na alínea e) do n.º 3 do artigo 652.° e no artigo 657.º, ambos do CPC, constitui a omissão de um acto susceptível de influir na decisão da causa.

XVI. Tendo sido cometida a identificada nulidade e tendo sido a mesma arguida em tempo — na medida em que a arguente apenas teve conhecimento de tal nulidade com a notificação da douta sentença de que ora se recorre — por força do preceituado no n.º 2 do artigo 201.º do CPC, deverão ser anulados os termos processuais subsequentes ao momento em se não apreciaram as alegações escritas da Fazenda Pública, no que se inclui a douta sentença de mérito proferida, o que desde já se requer.

No caso de assim se não entender, II- DA ILEGALIDADE DAS CORRECÇÕES POR «VÍCIO DE LEI» XVII. A Direcção de Finanças de Aveiro realizou uma acção inspectiva à ora recorrida, relativamente aos exercícios de 2004 e 2005, a qual culminou com a elaboração do Relatório Final, que o douto Tribunal deu por integralmente reproduzido (ponto 1. dos FACTOS PROVADOS); XVIII. O douto Tribunal recorrido considera, portanto, que “a questão que importa apreciar e decidir, é a de saber o seguinte: - se a constituição da provisão em causa seria obrigatória para a impugnante, a fim de que esta, mais tarde, pudesse deduzir o custo efectivo em que veio a incorrer; - e se a mesma teria de ser inscrita no exercício em que a acção judicial foi interposta contra a empresa”; XIX. Quanto à OBRIGATORIEDADE DE CONSTITUIÇÃO DA PROVISÃO, o douto Tribunal a quo considerou que a sociedade se não encontrava obrigada a constituir a aludida provisão, com base em dois argumentos: a) até ao trânsito em julgado da decisão condenatória, sempre confiou no sucesso da sua pretensão de não pagar qualquer indemnização; b) só com o trânsito em julgado é que pôde conhecer o exacto valor a pagar.

XX. O regime jurídico das provisões fiscais encontrava-se, à data dos factos e na matéria que importa aos autos, consagrado na alínea c) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IRC XXI. As provisões são, por definição, custos estimados de um exercício, correspondentes a despesas cujo montante ainda não é certo ou a despesas que são de eventual ocorrência futura e têm por primacial desiderato imputar os custos aos exercícios a que respeitam, evitando fazer deslocar para exercícios futuros custos ou perdas pertencentes àqueles em que se concretizam.

XXII. Ora, QUANTO AO PRIMEIRO ARGUMENTO, o douto Tribunal recorrido entendeu que, até ao trânsito de uma decisão, é lícito que a parte vencida tenha uma expectativa de sucesso quanto ao resultado da querela; XXIII. Nem legislador o pretendeu, nem o intérprete se pode bastar com uma mera expectativa para justificar a não constituição de tal provisão; XXIV. No caso em apreço, a impugnante não podia alegar que confiou sempre no sucesso da acção, atendendo a que (cfr. ponto 3. dos FACTOS PROVADOS), consta no RIT o seguinte: i) B………….. exerceu funções na sociedade A……………, S.A. até 12/07/1988; ii) em 1989 intentou no Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feira uma acção de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, contra a referida sociedade; iii) em 22/03/1991 foi proferida sentença condenatória desfavorável à impugnante; iv) em 1991 a ora impugnante constituiu uma provisão contabilística — Provisão para Outros Riscos e Encargos — no valor de € 374.098,00; v) por acórdão do tribunal da Relação do Porto, de 28/09/1992 foi confirmada a sentença proferida em 1.ª Instância; vi) em 1993 a ora impugnante reforçou a provisão Contabilística — Provisão para Outros Riscos e Encargos — em € 124.699,00; vii) tendo aquela sentença transitado em julgado em 23/03/1995, por decisão do Supremo Tribunal de Justiça, foi a impugnante condenada a pagar ao então requerente as diferenças de retribuição referentes a: férias e subsídios de férias resultantes da consideração das remunerações do “saco azul” ou “caixa B” e da participação nos lucros como parte integrante da retribuição; prestações vencidas, desde a data do despedimento até à data da sentença, de remunerações pagas por cheque do designado “caixa B” e da participação nos lucros referentes aos exercícios de 1988 a 1990; participação nos lucros referentes aos exercícios de 1986 e 1987; as retribuições vencidas desde a data da suspensão até à data do despedimento; juros de mora até total reembolso sobre os montantes anteriormente referidos; viii) em 24/04/1996, por apenso ao processo supra mencionado, foi requerida a execução da sentença, atendendo a que foram somente liquidadas na sentença exequenda as prestações atinentes ao salário base, habitualmente processado por talão de salário; ix) em 13/07/2001 foi proferida sentença que ordenou o prosseguimento da execução pelo valor global de € 945.700, 61 (189.595.950$00), acrescido de juros de mora vincendos; x) por acórdão proferido em 21/10/2002 pelo Tribunal da Relação do Porto foi negado provimento ao recurso interposto por ambas as partes; xi) por decisão proferida em 20/01/2004 pelo Supremo Tribunal de Justiça foi condenada a ora impugnante a pagar o montante de € 557.449,61; xii) a impugnante contabilizou, no exercício de 2004, na conta 698401 — Outros Custos e Perdas Extraordinárias o montante de € 813.903,13; xiii) notificada para o efeito, a sociedade apresentou um mapa em que discriminou o valor registado na referida conta 698401, sendo o mesmo referente: ao montante da condenação no processo judicial, a IRS de conta do mencionado B………. pago pela...

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