Acórdão nº 01075/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução14 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A Fazenda Pública vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela A…………, SA, melhor identificada nos autos, contra as denominadas taxas para financiamento do sistema de recolha de cadáveres de animais mortos nas explorações (SIRCA), no montante global de € 41.939,17.

Apresentou as respectivas alegações de recurso que resumiu nas seguintes conclusões: «A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra as (auto)liquidações da taxa para financiamento do Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais Mortos nas Explorações, doravante designada taxa “SIRCA”, referentes aos movimentos registados no matadouro da impugnante relativas aos meses de maio, junho e julho de 2013 no valor de €14.191,57, €13.033,55 e €14.714,05 respectivamente.

  1. Da leitura atenta da sentença, extrai-se como único argumento para a procedência da acção, a ilegalidade das liquidações impugnadas, por no entendimento da meritíssima Juiz de Direito do Tribunal a quo padecerem do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, porquanto o n.º 1 do art.° 2.º do DL 19/2011,” ao definir como sujeito passivo da taxa SIRCA o dono do estabelecimento de abate, que não têm qualquer tipo de contraprestação ou interesse na actividade desenvolvida pela DGAV, relacionada com a recolha, transporte e destruição dos cadáveres dos animais mortos nas explorações, viola o art. 4°, n.º 2, da LGT, porquanto está a configurar esse tributo como taxa, quando na realidade não se verifica nenhum dos seus pressupostos definidos no art. 4.°, nº 2, da LGT...” C. Para assim decidir, entendeu o tribunal a quo, que a taxa “SIRCA”, na configuração que lhe foi dada pelo DL 19/2011, de 07/02 não é uma verdadeira taxa, na medida em que os sujeitos passivos, como a Impugnante que ficam constituídos na obrigação de a pagar, não beneficiam do serviço a que a mesma se destina - o Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais Mortos na Exploração (SIRCA).

  2. O Tribunal a quo não efectuou qualquer prévio juízo de inconstitucionalidade, do disposto no artigo 2°, n.º 1, do DL n.º 19/2011.

  3. Ora, sem prejuízo de se entender que a Impugnante beneficia, ou também beneficia dos serviços que a taxa “SIRCA” se destina a sustentar, a questão não pode ser colocada e abordada como a decisão recorrida a colocou, abordou e resolveu.

  4. A questão que se coloca não é a da violação do art. 4.º da LGT ou a do erro nos pressupostos de direito (a Lei Geral Tributária não é uma lei de valor reforçado, mas uma lei ordinária comum) mas uma outra qual seja a de aferir da legalidade da referida taxa “SIRCA” (e do DL n.º 19/2011, de 07/02) face aos preceitos constitucionais enformadores da tributação.

  5. O que não foi feito na douta Sentença em crise. Não existe pois o invocado erro de direito nas liquidações. Pois na verdade, estas obedecem rigorosamente à Lei, neste caso ao disposto no DL n.º 19/2011, de 07/02.

  6. Mas, se este diploma designa o tributo como taxa (o que aliás, é indiferente do ponto de vista da sua qualificação atendendo a que o nomen juris não vincula o intérprete) e o seu art. 2º, n.º 1, determina como sujeito passivo da taxa o estabelecimento de abate, no caso dos autos a impugnante, não pode a Administração Fiscal proceder de forma diversa daquela que é questionada nos presentes autos.

    I. De facto, não cumpre à Administração Fiscal recusar a aplicação de norma alegadamente inconstitucional, uma vez que não lhe é permitido formular um juízo sobre essa constitucionalidade ou recusar a aplicação de norma por força de uma qualquer interpretação sobre a sua legalidade face à LGT.

  7. A Fazenda Pública apela à similitude da natureza jurídica da taxa “SIRCA” e da Taxa de Segurança Alimentar “TSAM”.

  8. Resulta do exposto que a taxa “SIRCA” constitui, em conjunto com os demais tributos referidos no art.º 4.º do diploma que citámos, receita do “Fundo de Segurança Alimentar Mais”, e se destina, como as restantes, a assegurar o financiamento de ações que têm em vista a garantia de segurança alimentar L. Destarte, a impugnante, como os demais intervenientes no circuito, desde os produtores pecuários aos apresentantes dos animais, «aproveitam» as prestações administrativas que esta taxa, em particular, se destina a sustentar.

  9. De facto, as ações desenvolvidas pelos serviços ao abrigo daquele “sistema” têm em vista assegurar que aos matadouros não chegam animais afetados por doenças que eventualmente lhes seriam transmitidas se não fossem as recolhas efetuadas pelo “SIRCA”.

  10. A manutenção da sanidade animal, objetivo intermédio das ações asseguradas pelo “Fundo” com vista à garantia da segurança alimentar, permite aos agentes económicos envolvidos na fileira da produção animal, sejam eles, como a impugnante, matadouros ou apresentantes dos animais, ou ainda produtores, dispor de animais saudáveis e que podem, com segurança, entrar nos circuitos de comercialização com destino último ao consumo humano.

  11. Pelo exposto, considera-se que o douto Tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no art. 4º, n.º 2 da LGT e no art. 2º, n.º 1, do DL 19/2011, de 07/02, enfermando a Sentença recorrida de erro de julgamento.

  12. Não sendo a Lei Geral Tributária uma lei de valor reforçado, antes uma lei ordinária comum, a julgada antinomia entre o disposto no seu artigo 4°, n.º 2 e o estabelecido no artigo 2°, n.º 1, do DL n.º 19/2011, não é motivo válido e suficiente para fundamentar a “ilegalidade das liquidações por vício de violação de lei”, pois que, por definição, tal vício só ocorre entre actos normativos que não têm igual valor hierárquico. Não há, pois, justificação legal para a desaplicação, sem qualquer prévio juízo de inconstitucionalidade, do disposto no artigo 2°, n.º 1, do DL n.º 19/2011, veja-se e cita-se a este propósito o Acórdão do STA de 31-03-2016, processo n.º 0628/15, in www.dgsi.pt: Q. No mesmo sentido, veja-se também o Acórdão do STA de 18-05-2016, processo 102/16, in www.dgsi.pt.

  13. Como defendemos e cremos ter demonstrado, as liquidações sub judicio não sofrem de qualquer vício invalidante pelo que o pedido há-de, na nossa perspetiva, soçobrar na totalidade.

  14. Mas mesmo que se viesse a considerar que as liquidações em causa deveriam ser anuladas, o que só se admite para fundamento do raciocínio que a seguir desenvolvemos, nem assim poderia proceder a parte do pedido que diz respeito à liquidação de juros...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT