Acórdão nº 0574/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | PEDRO DELGADO |
Data da Resolução | 23 de Maio de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – Vem a Fazenda Pública interpor recurso da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial interposta pela A…… SA, melhor identificada nos autos, contra a liquidação de Imposto Municipal sobre Transmissão Onerosa de Imóveis e juros compensatórios, relativa ao ano de 2005, no montante de € 2.844.376,04.
Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «I. Na douta sentença ora sob recurso, o Tribunal “a quo” julgou a impugnação judicial procedente e, em consequência, anulou o ato de liquidação impugnado; II. Para decidir pela procedência parcial da presente impugnação judicial entendeu a Meritíssima Juíza do Tribunal a quo que também para os benefícios fiscais automáticos só ocorre a extinção dos seus efeitos se “se mantiver a situação de incumprimento”, e mesmo que a legalidade estrita determinasse a extinção do benefício fiscal (...), certo é que o vetor da proporcionalidade imporia outra atuação por parte da Administração Tributária, que fosse no sentido de considerar desadequada, desnecessária e desproporcional, a aplicação, no caso concreto, do regime do artigo 14.º do EBF, nos termos em que o mesmo é por si interpretado; III. Salvo o devido respeito por diferente entendimento, a decisão recorrida não fez a mais correta interpretação das normas legais e princípios jurídicos aplicáveis já que, para os benefícios fiscais de reconhecimento automático relativos a impostos de obrigação única, não existe qualquer norma legal que preveja a possibilidade de regularização das dívidas fiscais e que, in casu, não se verifica a invocada violação do princípio da proporcionalidade; IV. O segmento da norma estabelecida no artigo 14°, n.º 5, alínea a), do EBF (aplicável aos benefícios fiscais automáticos por força do disposto no n.º 6, do artigo 14°, do EBF), relativo à manutenção da situação de incumprimento, não tem aplicação em situações como a dos autos, já que estamos perante um facto tributário instantâneo que ocorreu na data da aquisição, por parte da impugnante, dos prédios melhor identificados supra; V. Só relativamente aos benefícios fiscais permanentes ou temporários, dependentes de reconhecimento da administração tributária, é que releva a manutenção da situação de incumprimento por parte do sujeito passivo, já que esta, nos termos previstos no artigo 13°, do EBF, é condição de reconhecimento daquela categoria de benefícios fiscais; VI. Não existe norma legal equivalente à do artigo 13°, do EBF, aplicável aos benefícios fiscais automáticos; VII. A justificação desta diferença de tratamento legal entre os benefícios dependentes de reconhecimento e os benefícios automáticos está, certamente, relacionada com o momento em que a Administração Tributária verifica o preenchimento dos requisitos que permitem o benefício fiscal por parte dos diferentes sujeitos passivos; VIII. No caso dos benefícios fiscais dependentes de reconhecimento a verificação do preenchimento dos requisitos que permitem o benefício fiscal é feita em momento anterior ao da sua concessão, ao passo que, no caso dos benefícios automáticos, essa verificação ocorre sempre e momento posterior ao do facto tributário; IX. É a própria lei que impõe que, no caso dos impostos de obrigação única, como é reconhecidamente o caso do IMT, o preenchimento dos requisitos de que dependem os benefícios fiscais deve verificar-se na data em que o facto tributário ocorreu. (Cfr. artigo 14°, n.º 7, do EBF); X. O momento relevante a que deve reportar-se a existência de dívidas fiscais que impedem a produção de efeitos da isenção de IMT prevista no n.º 1, do artigo 7°, do CIMT, é o da celebração da respetiva escritura pública de aquisição; XI. Na situação em apreço, a Autoridade Tributária verificou que o contribuinte, na data em que efetuou a aquisição dos prédios acima identificados, e outorgou a respetiva escritura pública de compra e venda, tendo declarado que os destinava a revenda, não reunia as condições legalmente exigidas para beneficiar da isenção prevista no n.º 1, do artigo 7°, do CIMT; XII. Na data em que foi celebrada a referida escritura de compra e venda, a agora impugnante não preenchia os pressupostos legais do direito ao referido benefício fiscal, já que tinha dívidas fiscais, resultantes de impostos não pagos no respetivo prazo de pagamento voluntário; XIII. O preenchimento posterior dos requisitos legalmente exigidos para beneficiar da isenção prevista no n.º 1, do artigo 7°, do CIMT não permite aquela isenção, já que, no caso do IMT, o facto tributário nasce e esgota-se no momento da aquisição dos prédios; XIV. Na situação em apreço, a divida exigida no processo de execução fiscal n.º 3182200301033042, instaurado no Serviço de Finanças do Porto, não foi objeto de impugnação, nem de oposição, e não se mostrava garantida na data da celebração da referida escritura de compra e venda (15 de abril de 2005); XV. O pagamento das dívidas exigidas nos processos de execução fiscal n.º 3344200201547127 e n.º 3182200301033042, e a subsequente extinção destes processos de execução fiscal, só ocorreu em 4 de agosto de 2005 e em 30 de março de 2007, respetivamente; XVI. Não pode o entendimento vertido na douta sentença ora sob recurso, no sentido de que, assim como para os benefícios dependentes de reconhecimento, também para os benefícios automáticos só ocorre a extinção do seus efeitos se se mantiver a situação de incumprimento, manter-se na ordem jurídica por se revelar contrário ao disposto no artigo 14.°, n.º 5, 6 e 7, do EBF; XVII. Apenas para a extinção dos efeitos produzidos por benefícios fiscais dependentes de reconhecimento é relevante a manutenção da situação de incumprimento; XVIII. Através do n.º 1, do artigo 14°, do EBF, pode constatar-se que os benefícios fiscais se traduzem numa exceção ao sistema de tributação-regra, dado que, com a sua extinção, há uma reposição automática da tributação; XIX. As normas que regulam a isenção de imposto, como é o caso da norma prevista no n.º 1, do artigo 7°, do CIMT, são normas que contrariam os princípios da generalidade e da igualdade da tributação; XX. Com a “ameaça” de extinção, ou não reconhecimento dos benefícios fiscais, o legislador pretende o cumprimento atempado da obrigação de pagamento dos tributos pelos sujeitos passivos; XXI. Só poderão beneficiar destas medidas a que o artigo 2°, n.º 1, do EBF, atribui caráter excecional, os sujeitos passivos que não tenham deixado de efetuar o pagamento de qualquer imposto sobre o rendimento, a despesa ou o património e das contribuições para a segurança social; XXII. A Administração Tributária ao extinguir um determinado benefício fiscal, ao abrigo do disposto no artigo 14°, do EBF, não passa a exigir ao sujeito passivo um tributo desproporcional, já que o seu montante não é superior ao que é devido pela generalidade dos sujeitos passivos; XXIII. Quando extingue um determinado benefício fiscal, ao abrigo do disposto no artigo 14°, do EBF, a Administração Tributária atua em respeito pelo princípio da legalidade e, também, pelo princípio da igualdade; XXIV. O princípio da proporcionalidade está intimamente ligado ao princípio da igualdade; XXV. De acordo com a doutrina e a jurisprudência que se debruçaram sobre esta matéria, o princípio da proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios — o princípio da adequação, o princípio da exigibilidade ou necessidade e o princípio da justa medida ou proporcionalidade em sentido estrito; XXVI. Para aferir da conformidade de determinada norma, ou de determinada decisão da administração, com o principio da proporcionalidade, é entendimento da citada doutrina e jurisprudência que se devem realizar três testes, correspondendo cada um deles a cada um dos acima citados subprincípios, sendo que os mesmos que se devem relacionar entre si segundo uma regra de precedência do mais abstrato perante o mais concreto; XXVII. Na situação em apreço da realização daqueles três testes pode concluir-se que, em abstrato, a extinção do beneficio fiscal prevista no artigo 14°, do EBF, é o meio idóneo para a realização do fim pretendido, é o único meio legalmente previsto para atingir esse fim e os efeitos restritivos ou lesivos que resultam daquela extinção correspondem à justa medida, já que não se exige mais do que aquilo que se exige, por regra, à generalidade dos sujeitos passivos; XXVIII. O entendimento de que o respeito pelo princípio da proporcionalidade se deve aferir em função do valor do imposto em causa, como resulta da sentença aqui em apreço, é contrário ao que determinam os princípios da legalidade, da igualdade e da proporcionalidade; XXIX. Não estabelece a lei qualquer valor ou percentagem que permitam saber a partir de que valor de dívida é que podem ser extintos ou mantidos os benefícios fiscais para que, assim, seja respeitado o princípio da proporcionalidade; XXX. Manter o mesmo tipo benefício fiscal apenas a um de dois sujeitos passivos que devem exatamente a mesma quantia, só porque o valor do benefício é elevado, configura uma clara violação do princípio da igualdade; XXXI. A extinção do benefício fiscal, e a exigência de IMT e correspondentes juros compensatórios no montante total de € 2 844 376,04, em apreço na presente impugnação judicial, revela-se ser a única conduta que a AT podia adotar em respeito pelos princípios da legalidade, da igualdade e da proporcionalidade; XXXII. Ao contrário do que foi decidido pela Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo”, na situação sub judice, o vetor da proporcionalidade não impunha outra atuação por parte da Administração Tributária, uma vez que a aplicação do regime do artigo 14°, do EBF, nos termos em que o mesmo é interpretado por esta, revela-se adequada, necessária e proporcional; XXXIII Não pode a douta sentença ora recorrida ser confirmada e mantida na ordem jurídica pois é contrária ao disposto nos artigos 14°, nºs 5...
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