Acórdão nº 118/2000.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução15 de Dezembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1-A personalidade colectiva, sendo uma realidade normativa, não tem a virtualidade de fazer tábua-rasa das realidades ontológicas que lhe subjazem, designadamente, de que a vontade da pessoa colectiva é formada e exprimida pelos seus órgãos e representantes, que são entes humanos (pessoas singulares), mas cuja actuação ilícita e culposa responsabiliza a pessoa colectiva, desde que emitida por quem na sociedade assuma posição de liderança (gerentes, administradores, directores, etc) legal ou estatutariamente competentes para a prática de actos vinculantes da sociedade e que os actos praticados o sejam em nome e no interesse do próprio ente colectivo, como ocorreu no caso vertente.

2-O comprador, tal como o vendedor, exercem direitos, o direito de comprar e vender (da emptio et venditio romana) e não uma mera faculdade de comprar.

3- A faculdade, cujo termo não tem sentido jurídico perfeitamente estabelecido, como ensinava Castro Mendes, usa-se sobretudo para designar possibilidades contidas num direito subjectivo, portanto algo que faz parte dos meios jurídicos, em que o direito se desdobra e que não tem existência autónoma.

Por sua vez, Carvalho Fernandes, considera as faculdades como meios jurídicos de agir postos na disponibilidade do sujeito de direito, em vista à realização do seu interesse.

Ora a nossa ordem jurídica, tal como a da maioria dos países, considera a compra e venda como um contrato, exigindo capacidade de gozo e de exercício dos contraentes ou seja a susceptibilidade de direitos e obrigações e a susceptibilidade de praticar pessoalmente actos jurídicos.

4-Não há que confundir a intenção com a motivação económica da venda, que segundo alega, terá sido a incapacidade financeira da 3ª Ré.

Os motivos são as determinantes endógenas do acto de vontade, o que poderia relevar é a consciência e vontade de realizar um acto ilícito, isto é, a consciência de que a compra iria prejudicar terceiros ( no caso, os promitentes compradores) e, mesmo assim, se decidir a fazer, como aconteceu! 5-Cabe aqui, por inteiramente ajustada à situação sub judicio, o ensinamento de Almeida Costa quando lapidarmente escreve que, relativamente àquelas situações que admitem o efeito externo das obrigações, além das legalmente previstas, « acrescentam-se as situações em que o terceiro que impediu o cumprimento da obrigação pode responder perante o credor, por ter agido com abuso de direito».

Este renomado civilista dá expressamente como exemplo de casos em que se pode ser chamado a responder directamente para com o credor por haver lesado o direito de crédito, o de alguém realizar com outro um contrato-promessa de venda de determinado prédio e o alienar depois a terceiro, impedindo o promitente comprador de o adquirir.

6-Como a obrigação solidária determina a correspondência a uma pluralidade de sujeitos de um cumprimento unitário da prestação, de forma a que, havendo vários sujeitos passivos, qualquer destes responde perante o credor comum pela prestação integral, cujo cumprimento a todos exonera, a doutrina civilista considera como uma das características das obrigações solidárias, a da identidade da prestação.

Certo que o nº 2 do artº 512º do C.Civil estatui no sentido de que a obrigação não deixa de ser solidária pelo facto de ... ser diferente o conteúdo das prestações de cada um dos devedores, mas, como ensinava o saudoso Prof. Antunes Varela, «só há verdadeira solidariedade em relação à parte comum da responsabilidade...só esta parte comum corresponde à prestação integral por que responde cada um dos devedores, nos termos do nº 1 do artº 512º» Decisão Texto Integral: Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO Na presente acção ordinária que AA, BB, CC, DD e EE intentaram, na comarca da Vila Nova de Gaia, contra: FF e mulher, GG, HH e mulher, II, «........ - SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA.» e a sociedade........ -SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA...............................

invocaram os AA. a celebração com a 3a R., de que eram sócios-gerentes os 1° e 2° RR. maridos, de contratos-promessa de compra e venda de lotes de terreno, integrados em prédio alegadamente pertencente à 3a R., mas que foi entretanto adquirido pela 4a R. (de que os 1ºs RR. são sócios-gerentes), e formulado pedido nos seguintes termos: 1°) que fosse lavrada sentença que produzisse os efeitos da declaração negocial dos RR., declarando-se transmitidos a favor de cada um dos AA., cada um dos lotes de terreno objecto das promessas; 2°) ou, subsidiariamente, a condenação dos RR. na restituição a cada um dos AA. das quantias por eles prestadas a título de sinal, em dobro, com juros desde a citação até integral pagamento; 3°) ou, subsidiariamente em relação ao anterior pedido, a condenação dos RR. na restituição a cada um dos AA. das quantias por eles prestadas a título de sinal, em singelo, com juros desde a data da celebração de cada um dos contratos promessa até integral pagamento; 4°) e, ainda, a condenação dos RR. no pagamento a cada um dos AA. da quantia de 1.000.000$00, a título de indemnização por danos morais, com juros desde a citação até integral pagamento.

Embora na petição inicial a ordem dos pedidos tenha sido diferente da ora indicada (o 3° pedido foi formulado antes do 2° pedido), era evidente, por razões de lógica jurídica, haver erro nessa ordem, do que se deu conta no despacho saneador (no penúltimo parágrafo do despacho de fls. 338-355), ordenando-se notificação dos AA. para procederem á rectificação, que teve lugar através do requerimento de fls. 384-385, devidamente notificado aos RR., (v. fls. 386-388).

Os 1os RR. e a 4a R., por um lado, e os 2os RR., por outro, apresentaram contestações autónomas, defendendo-se por excepção e por impugnação.

Estabelecidos os factos assentes e a base instrutória, foi realizado o julgamento, na sequência do qual foi lavrada sentença em que se julgou o seguinte: – improcedente o pedido de prolação de sentença que produzisse os efeitos da declaração negocial dos RR.; – improcedente o pedido de condenação dos RR. no pagamento a cada um dos AA. da quantia de 1.000.000$00, a título de indemnização por danos morais; – improcedentes os demais pedidos quanto à 1a R. mulher e os 2ºs RR. e procedente o 2° pedido (o subsidiário de primeira linha) quanto aos 1° R. marido, 3a R. e 4a R., condenando-os solidariamente a pagar aos AA. quantias correspondentes à restituição em dobro dos sinais por cada um prestados (14.166,86 € ao 1° A.; 14.365,38 € ao 2° A,; 14.964.00 € ao 3° A.; 28.730,76 € ao 4° A.; e 25.937,49 € ao 5° A.), acrescidas de juros à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Inconformados, os Réus FF e a sociedade........ – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA., interpuseram recurso de Apelação para o Tribunal da Relação do Porto que, todavia, julgou o mesmo improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Novamente inconformados, os mesmos vieram interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, re........ndo as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES a) Introdução: 1a- O recurso é interposto do douto Acórdão proferido a fls.1154 e seguintes, nos termos do qual o distinto Tribunal "a quo" negou provimento à apelação dos recorrentes, e confirmou a sentença recorrida; 2a- O Venerando Supremo Tribunal de Justiça conhece unicamente de direito, pelo que, não se vislumbrando razão para impugnação da matéria de facto por recurso ao disposto no art. 722° do CPC, ou ainda para a sindicância dos poderes de alteração da matéria de facto pelo distinto tribunal recorrido, em virtude do não uso deles no caso em apreço, e apesar de inconformados com a matéria de facto fixada nas instâncias, os recorrentes reconhecem estar-lhes vedada a discussão dela; b)Nulidade: 3a- A responsabilidade contratual e a responsabilidade extracontratual não podem ser invocadas simultaneamente, até porque são incompatíveis os regimes do ónus da prova da culpa do devedor, pelo que, quando o mesmo facto constituir, ao mesmo tempo, violação de um contrato e um acto ilícito extracontratual, a solução que se afigura preferível é a de que são aplicáveis as regras de ambas as responsabilidades, à escolha do lesado; 4a- Os AA, podendo ter fundado os respectivos pedidos de indemnização contra os RR tanto na responsabilidade contratual, como na responsabilidade extra-contratual, escolheram como causa de pedir da sua acção a responsabilidade contratual, a qual (causa de pedir) limita a acção do tribunal (na sua causa de julgar), como resulta do pedido subsidiário julgado procedente, pelo que a condenação dos aqui recorrentes feita na sentença de 1a instância e confirmada no douto aresto aqui impugnado com base nos pressupostos da responsabilidade extra-contratual constitui excesso de pronuncia, causal da nulidade apontada, provinda do disposto no art. 668° n° l al. d) do CPC; c)Direito: l. Do 1° Réu: 5a- Para que o gerente de sociedade por quotas possa ser responsabilizado, directamente, perante os credores da sociedade, nos termos do art. 79° n° l do CSC, importa que se alegue e prove que (i) o facto praticado constitui inobservância de disposição legal ou contratual destinada a proteger os credores sociais, (ii) a actuação seja culposa e (iii) o património social se tenha tornado insuficiente para a satisfação dos créditos desses credores, o que os apelados não lograram provar; 6a-O art. 79° n° l do CSC impõe que do facto ilícito do gerente resulte um dano que, directa e imediatamente, afecte o crédito do credor, o que não vem provado; 7º- Os recorridos fundaram a pretensão deduzida a título principal (que definitivamente improcedeu), mas também aquela procedente, feita a título subsidiário de condenação dos RR na restituição das quantias entregues a título de sinais, em dobro, a qual pressupõe a resolução dos contratos promessa, e assim na responsabilidade contratual provinda de convénios celebrados unicamente com a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT