Acórdão nº 6582/13.0YIPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Novembro de 2014
Magistrado Responsável | ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 20 de Novembro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Recurso de Apelação Processo n.º 6582/13.0YYPRT-A.P1 [Comarca do Porto - 2.ª Juízo de Execução] Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto: I.
Por apenso ao processo de execução para pagamento de quantia certa que lhe foi instaurado pela B…, com sede em Montpellier, França, veio a executada C…, Companhia de Seguros, S.A., com sede em Lisboa, deduzir oposição à execução, reclamando a extinção da execução ou a redução da quantia exequenda.
Para o efeito, arguiu a prescrição do crédito da exequente com o fundamento de que o mesmo emerge do direito de regresso previsto no artigo 524º do Código Civil e antes da instauração da execução já haviam decorrido mais de três anos sobre o alegado pagamento efectuado pela exequente.
Mais alegou que a exequente não fundamentou o pedido de juros, não juntou documento do qual advenha a sua legitimidade para os requerer, não interpelou previamente a executada para efectuar o pagamento e não a informou de ter pago a quantia que ora reclama a título de regresso, pelo que não devem ser considerados quaisquer juros ou, a serem considerados, os mesmos só deverão ser calculados a partir da sua citação.
A exequente contestou, defendendo que o crédito não está prescrito uma vez que o normativo legal citado pela executada não se aplica no domínio da responsabilidade contratual que é a que subjaz ao crédito. No tocante aos juros sustenta que os mesmos estão fixados no título executivo e a executada tinha total conhecimento da existência da dívida e foi por diversas vezes interpelada judicialmente para pagar.
Findos os articulados, o Mmo. Juiz a quo entendeu estarem reunidas as condições para decidir de imediato a oposição e, fazendo-o, julgou a oposição improcedente, ordenando o prosseguimento da execução.
Do assim decidido, a executada interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as conclusões que se passam a indicar (expurgadas das meras repetições, citações ou partes irrelevantes): […] 4. … a decisão proferida [violou as] normas jurídicas aplicáveis ao caso concreto, nomeadamente artigos 306º/1, 309º, 497º, 498º/2, 524º, 592/1, 593º/1 e 825º todos do Código Civil.
-
… esteve mal o douto Tribunal a quo ao considerar que a responsabilidade da ora Recorrente decorre do cumprimento defeituoso de um contrato, aplicando-se, por isso, um prazo prescricional de 20 anos, invocando-se, por isso, desde já, o erro na determinação da norma aplicável ao caso dos autos, nos termos e para os efeitos do artigo 639º, nº 2 alínea c) do CPC.
-
Concede-se que o prazo prescricional contido na supra citada norma não é aplicável no âmbito da responsabilidade contratual, […]. Não obstante, a questão que se coloca, é a de que, no caso em apreço, não estamos perante uma obrigação contratual.
-
Não obstante, a relação contratual existente entre as co-rés ora executada, D…, exequente, B… e a sociedade E…, S.A. e a Autora F… extinguiu-se no momento do cumprimento da obrigação pela exequente, ora Embargada, através do alegado pagamento da quantia em dívida, nascendo, posteriormente, um direito ex novo entre os responsáveis solidários – o direito de regresso.
-
No âmbito da sentença proferida pelo Tribunal Francês, estamos perante uma situação de responsabilidade civil solidária, sendo, por isso, possível ao credor exigir de qualquer dos responsáveis (devedores) a totalidade da indemnização, nos termos do artigo 519º, nº 1 C.C.
-
Assistindo, depois, ao devedor que satisfizer o direito do credor, para além da parte que lhe competir, o direito de regresso contra cada um dos co-devedores, na parte que a estes competir, conforme decorre do artigo 524º C.C.
-
Direito de regresso este que existe entre os responsáveis (devedores) na medida das respectivas culpas e das consequências que delas advieram, presumindo-se iguais as culpas dos responsáveis, nos termos do artigo 497º C.C., sendo que, nos termos do disposto no nº2 do artigo 498º do C.C., o direito de regresso entre responsáveis prescreve no prazo de 3 anos a contar da data do cumprimento.
-
…. 12. …. 13. Na verdade, o direito de regresso do co-devedor não se confunde, de todo, com o direito de indemnização que contra eles (devedores) foi feito valer pelo lesado: com a satisfação desta indemnização – ainda que por apenas um dos co-devedores – surge na esfera jurídico-patrimonial de quem satisfez tal obrigação, um direito de crédito verdadeiramente novo, embora consequente à extinção da relação creditícia de indemnização anterior. E este direito de regresso deve ser exercido no prazo previsto no artº 498º, nº 2 do Código Civil – o de 3 anos.
-
… 15. Assim, a Embargada pretende exercer, através da presente execução, o direito de regresso estabelecido no artigo 524º C.C., e não o cumprimento de uma obrigação de indemnização que deriva do cumprimento defeituoso de um contrato. Isto porque, a obrigação decorrente do cumprimento defeituoso do contrato já se extinguiu, no momento em que a Embargada procedeu ao pagamento da quantia indemnizatória decorrente da condenação, conforme disposto no artigo 523º C. C., de onde resulta que a satisfação do direito do credor, por cumprimento, produz a extinção das obrigações de todos os devedores.
-
Na verdade, o titular do direito de regresso exerce um direito próprio, um direito à restituição do que pagou ao credor além da parte que lhe competia (art. 524º do C.C.).
-
… 18. Ora, decorreram mais de 8 anos desde a data do pagamento (21.06.2006) até à data de entrada do requerimento executivo (06.02.2014) e consequente citação da ora executada, pelo que o direito que a exequente pretende exercer encontra-se prescrito desde Junho de 2009.
-
Considerando que a Embargada exerce na presente execução, nos termos referidos, o direito de regresso previsto no artigo 524º C.C., e que efectuou o pagamento da totalidade ao credor, conforme igualmente se referiu, em 21 de Junho de 2006, fácil é concluir que já decorreu o prazo prescricional estabelecido no nº 2 do artigo 498º C.C.
-
Motivo pelo qual, salvo o devido respeito, que é muito, entende a ora recorrente que ao ser aplicado ao caso dos presentes autos o disposto no artigo 309º C.C. em detrimento do disposto no artigo 498º C.C. existiu erro na determinação da norma aplicável para efeitos do disposto no artigo 639º, nº 2 c) do CPC, o que desde já se invoca para todos os devidos e legais efeitos. Na verdade, e salvo douto entendimento em contrário, o Tribunal deveria ter aplicado o disposto no artigo 498º C.C., nomeadamente concluindo pela prescrição do direito de regresso da exequente pelo decurso do prazo de 3 anos.
-
Acresce que, a Exequente peticiona, nos presentes autos, a condenação da ora executada ao pagamento da quantia de € 74.416,02, acrescendo ao referido valor os respectivos juros, desde 21 de Junho de 2006 (data do alegado pagamento realizado pela Exequente) até integral e efectivo pagamento, os quais se cifram já em €49.979,27.
-
Nos termos do artigo 805º, nº 1 C.C. o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extra-judicialmente interpelado para o cumprimento.
-
Ainda que se considere que a obrigação de pagamento seja solidária entre exequente e executada, à luz do artigo 512º do Código Civil, a Exequente não fundamenta o seu pedido quanto aos juros reclamados nem junta qualquer documento do qual advenha a sua legitimidade para os requerer.
-
A ora Exequente peticiona juros pelo alegado “atraso” no pagamento referido, não tendo, no entanto, a ora exequente interpelado previamente a ora executada a qualquer pagamento.
-
Não dando, sequer, conhecimento à ora executada de que havia procedido ao alegado pagamento da totalidade do crédito, encontrando-se, por isso, sub-rogada da posição de credora face às co-devedoras e, neste caso, face à ora executada.
-
A ser condenada no pagamento dos juros, o que, conforme se referiu, apenas se admite por cautela de patrocínio, estes apenas deveriam ser contabilizados desde a data da citação da ora executada da presente execução (11.02.2014), devendo, por isso, e também nesta parte, a douta sentença de que ora se recorre, ser alterada.
A recorrida respondeu a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado.
Após os vistos legais, cumpre decidir.
II.
As conclusões das alegações de recurso demandam deste Tribunal que resolva as seguintes questões: i) Se o direito de crédito da exequente está subordinado ao prazo de prescrição do artigo 498.º, n.º 2, do Código Civil.
ii) Se são exigíveis da executada juros de mora sobre a quantia que a exequente pretende que lhe seja paga a título de direito de regresso e, na afirmativa, a partir de que data se contam.
III.
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1– A exequente, B…, intentou contra a executada C…, Companhia de Seguros, S.A., a acção...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO