Acórdão nº 3872/11.0TBVFR.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS PORTELA
Data da Resolução23 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº3872/11.0TBVFR.P2 Tribunal recorrido: Comarca de Aveiro St. Mª Feira – Inst. Local – Secção Cível – J3 Relator: Carlos Portela (621) Adjuntos: Des. Pedro Lima da Costa Des. Pedro Martins Acordam na 3ª Secção (2ª Cível) do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório: B… e mulher, C…, residentes na Rua …, …., Lourosa, comarca de Santa Maria da Feira, instauraram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra D… e mulher, E…, residentes na Rua …, …, Lourosa, comarca de Santa Maria da Feira, pedindo em síntese que os réus sejam condenados a: a) Reconhecer que os autores são donos do prédio identificado sob o artigo 1.º da petição inicial; b) Reconhecer que sobre o prédio dos réus, outrora inscrito na matriz rústica sob o artigo 1636.º, da freguesia de Lourosa, desde a hoje chamada Rua …, sobre a sua extrema norte, se encontra constituída por usucapião, uma servidão de passagem para pessoas, carros de bois e tractores, numa extensão aproximada de 50m e com a largura de 2m, orientada aproximadamente no sentido poente-nascente, até à entrada do prédio dos autores; c) Retirar o muro de adobes que construíram em frente à entrada do prédio dos autores, inviabilizando a passagem; d) Não impedir, por qualquer forma e em qualquer altura, sempre que os autores tenham necessidade, o exercício do direito de passar sobre tal faixa de terreno, actualmente pavimentado a betuminoso; e) Pagar aos autores os prejuízos que para estes advieram e advirão em consequência de estarem impedidos de aceder ao referido prédio.

Alegaram, para tanto, em síntese, serem donos de um prédio rústico que identificam, ao qual sempre se acedeu, há mais de 20, 30 e 40 anos, a pé, mediante carros de bois e tractores, a partir da via pública, por uma faixa de terreno que faz parte de prédio cujo direito de propriedade atribuem aos réus.

Mais dizem que a dita passagem sempre se processou à vista de toda a gente, sem qualquer oposição, actuando os autores e ante possuidores na convicção de estarem a exercer um direito de passagem por sobre o prédio hoje dos réus e a favor do seu prédio.

Dizem ainda que os réus, através da construção de um muro, vêm impedindo os autores de aceder ao seu prédio através da dita faixa de terreno.

Devidamente citados para o efeito, vieram os réus contestar e deduziram reconvenção.

Na peça processual que deduziram reconhecem aos autores a qualidade de donos do prédio que os mesmos identificam em sede de causa de pedir, mais se afirmando como proprietários do prédio, hoje urbano, que integra uma casa de habitação e a faixa de terreno relativamente à qual os autores pretendem fazer valer direito de passagem, os réus impugnaram todos os factos essenciais hipoteticamente adequados a justificar a invocada constituição de servidão de passagem por usucapião.

Sustentaram ainda que o acesso ao prédio dos autores, desde tempos imemoriais, tem vindo a ser feito pelo caminho público sito a nascente do mesmo prédio, outrora em terra batida, e desde há cerca de 20 anos alcatroado, actualmente denominado Rua …, com cerca de 8 metros de largura, dotada de infra-estruturas públicas, nomeadamente iluminação pública.

Concluem pugnando pela total improcedência da acção e, para o caso de assim o tribunal não o entender, pela procedência da reconvenção, devendo, em consequência: a) Ser declarada extinta, por desnecessária, a servidão de passagem exercida pelos reconvindos, por si e ante possuidores, sobre o prédio dos reconvintes; b) Condenarem-se os reconvindos a reconhecerem que os reconvintes são donos e legítimos possuidores do prédio descrito no artigo 3.º da contestação, o qual integra também a faixa de terreno por onde alegaram existir caminho de servidão; c) Condenarem-se os autores a eliminarem/taparem a abertura no muro de vedação do seu prédio voltado para a aludida faixa de terreno; d) Condenarem-se os autores a absterem-se da prática de quaisquer actos que importem o uso, entrada ou passagem no prédio dos RR, nomeadamente na faixa de terreno por onde alegaram existir caminho de servidão; e e) Condenarem-se os réus a título de litigância de má fé, bem como no pagamento das custas do processo.

Replicaram os autores, propugnando pela improcedência da reconvenção, sustentando, para além do mais, não se ter verificado, no seu prédio (dominante) qualquer alteração objectiva que torne desnecessária a manutenção da servidão de passagem nas condições invocadas na petição inicial, sendo certo que entre o seu prédio e a Rua … existe um desnível de cerca de 0,80m, o que sempre impediu o acesso por meio de carros de bois e tractores.

Os autos prosseguiram os seus termos tendo sido proferido despacho que saneou o processo, admitiu a reconvenção, definiu a matéria de facto provada e elaborou base instrutória com os factos ainda controvertidos.

Foi apresentada pelos autores e pelos réus reclamações a tal peça processual, reclamações estas que obtiveram provimento parcial por parte do Tribunal “a quo”.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento no culminar da qual se proferiu decisão que julgou a matéria de facto controvertida.

Esta decisão não mereceu qualquer reparo das partes litigantes.

Emitiu-se então sentença que julgou parcialmente procedente a acção e a reconvenção e decidiu: Condenar os réus D… e mulher, E…, a reconhecer: 1º) Que os autores B… e mulher, C…, são donos do prédio identificado em 2.1.1) dos factos provados; 2º) Que sobre o seu prédio, identificado sob os itens 2.1.4) e 2.1.5) dos factos provados, desde a hoje chamada Rua …, se constituiu por usucapião, uma servidão de passagem para pessoas, carros de bois e tractores, numa extensão aproximada de 50 metros e com a largura actual de 4 metros, orientada aproximadamente no sentido poente-nascente, até à entrada do prédio dos autores; 3º) Absolver os réus quanto ao demais peticionado pelos autores; 4º) Declarar extinta, por desnecessária, a servidão de passagem mencionada em 2º); 5º) Condenar os reconvindos B… e mulher, C…, a absterem-se da prática de quaisquer actos que importem o uso, entrada ou passagem no prédio dos reconvintes D… e mulher, E…, identificado em 2.1.4) e 2.1.5) dos factos provados, nomeadamente na faixa de terreno que foi objecto de servidão de passagem, descrita em 2º); 6º) Absolver os reconvindos quanto ao pedido de eliminação/tapagem da abertura existente no muro de vedação do seu prédio voltado para a aludida faixa de terreno; 6º) Julgar não verificada litigância de má fé por parte dos autores/reconvintes; 7º) Condenar autores e réus no pagamento das custas deste processo, em igual proporção, tanto no que se refere à acção como à reconvenção (art. 446.º, nºs 1 e 2, do C. P. Civil).

*Inconformado com o teor desta decisão dela vieram recorrer os autores, apresentando desde logo e nos termos legalmente previstos as suas alegações.

Os réus contra alegaram e vieram também e em articulado autónomo, interpor recurso subordinado.

Ambos os recursos (principal e subordinado), foram considerados tempestivos e legais, admitidos como sendo de apelação, com subida imediata nos autos e efeito meramente devolutivo.

Recebido o processo nesta Relação foi proferido despacho que teve os recursos como próprios, tempestivamente interpostos e admitidos com efeito e modo de subida adequados.

Colhidos os vistos legais e porque nada obsta ao seu conhecimento, cumpre apreciar e decidir o recurso em apreço.

*II. Enquadramento de facto e de direito: Sendo certo que como resulta dos autos a presente acção foi proposta em 23.09.2011 e a sentença recorrida foi proferida em 07.06.2013, ao presente recurso é aplicável o regime processual previsto no D.L nº 303/2007 com as alterações introduzidas pela Lei nº41/2013 de 26 de Junho (cf. os artigos 5º, nº1 e 7º nº1 da mesma lei).

Ora como é sabido o objecto do presente recurso e sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório está definido pelo conteúdo das alegações produzidas pelos autores/apelantes no que toca ao recurso principal e pelos réus/apelados no que se refere ao recurso subordinado (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do NCPC).

E é o seguinte o teor das alegações dos autores: 1.Conforme resulta dos autos, não se pode concluir que houve qualquer alteração no prédio dos recorrentes, nem antes, nem depois da constituição da servidão judicialmente reconhecida na sentença ora posta em crise; 2.Dos autos resulta que sempre o prédio dos recorrentes teve, a nascente, confrontação com a hoje chamada Rua …; 3.Contrariamente ao alegado pelos recorridos, nunca os recorrentes e antepossuidores do seu prédio utilizaram a Rua … para acesso ao mesmo; 4.Aliás tal acesso não é possível dado o desnível entre as terras do prédio dos recorrentes e a Rua …, uma vez que há um desnível de 1,10 m conforme resulta da inspecção ao local e consta das respostas dadas aos itens nº. 25 e 26 da base instrutória.

Não se encontra demonstrado que, na esteira da orientação judicial que foi preterida na sentença, tivesse havido qualquer alteração superveniente à constituição da servidão que legitime a peticionada extinção da servidão que onera o prédio dos recorridos.

A superveniência da alteração do prédio dominante nunca existiu, pelo que o pedido reconvencional – atente-se a alguns dos arestos citados e parcialmente transcritos a título meramente exemplificativo – deverá ser julgado improcedente, o que se pede.

Acrescentar-se-á mais o seguinte, em termos de conclusões: 6.Mesmo que a orientação seguida na sentença com a qual, respeitosamente, se...

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