Acórdão nº 2305/10.3TBAMT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Abril de 2015

Data09 Abril 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Inventário 2305/10.3TBAMT-A do 1º juízo de Amarante ……………………………………………… ……………………………………………… ……………………………………………… Acordam no Tribunal da Relação do Porto os juízes abaixo assinados: No inventário supra, numa conferência de interessados de 11/12/2012, foi deliberada, “nos termos e para os efeitos do disposto no art. 1353/1c) do CPC, a “venda dos bens relacionados por proposta em carta fechada a fim de o produto da mesma ser distribuído por todos, tendo por valor base os constantes na relação de bens”.

Na data marcada para a venda, 18/11/2013, foi apresentada uma proposta de 30.100€ para a aquisição da totalidade das verbas (verba 1 até 102) e duas outras propostas para a compra da verba 102 (imóvel), uma pelo valor de 10.021,95€ e outra pelo valor de 15.151€.

Concluída a abertura das propostas, e na mesma diligência, a proponente global “esclareceu” “que a proposta por si apresentada reportar-se-á unicamente à verba 102, mantendo o valor de 30.100€.” e depois aquela mesma proponente e uma outra interessada requereram que as restantes verbas fossem vendidas por negociação particular.

Foi então proferido o seguinte despacho [aqui como abaixo com algumas simplificações, assinaladas a itálico ou parênteses rectos, para evitar transcrições ainda mais extensas]: “São notificados todos os interessados para, querendo, se pronunciarem quanto à proposta global, consignando-se desde já que nada dizendo no prazo de dez dias tal proposta é considerada aceite. Quanto à venda por negociação particular, indique a secção encarregado da venda, a fim de se proceder à mesma […]”.

Em 27/11/2013, a autora da proposta de 15.151€ pela verba 102 veio requerer a rejeição ou não admissão da alteração da proposta global com os seguintes fundamentos: “A alteração da proposta global ocorreu após a abertura de todas as propostas apresentadas, incluindo a apresentada pela requerente, e, portanto, após serem conhecidos os respectivos valores. Tal alteração não é legalmente permitida, uma vez que representa, na prática, uma nova proposta, totalmente diferente da originalmente apresentada, e constitui, aliás, uma frustração dos princípios da boa-fé e da igualdade das partes - cfr. arts. 8 e 2 do CPC de 2013. A alteração ou apresentação de propostas após a abertura das tempestivamente apresentadas não constitui apenas mera irregularidade cuja arguição ou sanação devesse ocorrer no próprio acto, constituindo, antes, uma violação de regras imperativas, nomeadamente, as relativas ao prazo de apresentação de propostas - que deve ocorrer, no máximo, até à abertura das propostas (cfr. art. 820 do CPC de 2013 ou 893 do CPC de 1961) - e as relativas à eficácia da declaração negocial e à irrevogabilidade da mesma - cfr. arts. 224 e 230 do Código Civil.

Por outro lado, a aceitação da alteração ou apresentação extemporânea da proposta global ou a adjudicação dos bens que à mesma venham a seguir-se, inquinarão de nulidade a respectiva venda - cfr. art. 294 do Código Civil.

[…] Nestes termos, requer […] que se digne rejeitar a alteração ou apresentação intempestiva da proposta global, e, consequentemente, que se digne aceitar a proposta da aqui requerente, relativa à venda do imóvel, por ser a de maior valor.

Na verdade, sendo a proposta global, no montante de 30.100€, para aquisição de todos os bens móveis e imóveis, terá de concluir-se que, no mínimo, a parte desse valor relativa aos móveis, cujo valor total é de 17.695€, corresponde a 85% do respectivo valor anunciado, ou seja, ao valor de 15.040,75€, pelo que a parte relativa ao imóvel corresponderá à importância de 15.059,25€, a qual é, portanto, inferior à apresentada pela aqui requerente, no montante de 15.151€ […]”.

Em 06/02/2014 foi proferido o seguinte despacho [que é o despacho recorrido]: “[…] face ao teor da acta de abertura de propostas, à alteração operada, com base em suposto “erro” na redacção da mesma, entendemos que a proposta [global] mesmo “alterada” não prejudica os interessados, nem máxime [um]a [outra] interessada, uma vez que é de valor superior à [de 15.151€]. Assim, não deve ser rejeitada, sem mais.

No entanto, é patente o prejuízo para a proponente reclamante, porquanto se propunha a adquirir o dito prédio por sensivelmente metade do valor da proposta objecto de reclamação.

Assim, face às vicissitudes ocorridas na diligência de abertura de propostas e à posição assumida pela proponente [dos 15.151] e pela interessada [da proposta global], constantes dos requerimentos que antecedem, e com vista e permitir uma justa composição do litígio, em prazo razoável, determino se proceda a nova abertura de propostas, apenas quanto à verba 102 (imóvel), mantendo-se no demais a venda por negociação particular (quanto às restantes verbas), nos termos constantes da respectiva acta, e por falta de propostas quanto às mesmas, ante a rectificação à proposta global (cfr. art. 6 do nCPC).

Designo para o efeito o dia 7/4/2014, às 14h.

Quanto às restantes verbas – 1 a 101 – indique encarregado da venda”.

A autora da proposta dos 15.151€ recorre deste despacho – para que seja revogado e substituído por outro que anule todos os actos posteriores após a abertura de propostas de 18/11/2013, declare válidas as propostas apresentadas e indefira a alteração da proposta global, seguindo-se os ulteriores termos com adjudicação a si da verba 102 – terminando as suas alegações com as seguintes conclusões úteis: “[…] 5. Em face das propostas apresentadas, a recorrente foi a proponente que apresentou proposta mais elevada para a aquisição do imóvel relacionado sob a verba 102, atentos os valores anunciados de venda e os critérios fixados para a sua aquisição pelos interessados.

  1. Surpreendentemente, imediatamente após a abertura das propostas e de ter tomado conhecimento do valor das propostas apresentadas, a autora da proposta global requereu a alteração da proposta regular e validamente apresentada por si, afirmando que o valor total da sua proposta passava a ser, apenas e só, para a aquisição da verba 102.

  2. Tal pedido de alteração de proposta foi expressamente rejeitado pela recorrente, mediante requerimento junto aos autos no prazo concedido para o efeito.

  3. Ora, para além de ininteligível, o tribunal a quo, com o despacho recorrido, não apreciou, nem se pronunciou, sobre a reclamação apresentada pela recorrente, não se pronunciou sobre a regularidade e validade das propostas apresentadas e abertas em 18/11/2013, a sua expressa aceitação ou rejeição, conforme lhe é imposto imediatamente após a abertura das mesmas.

    […] 11. De forma tácita, o tribunal a quo considerou a alteração da proposta apresentada pela cabeça de casal, pelo menos, no efeito que acarretou, ao determinar a designação de nova data para apresentação de propostas.

  4. O nosso ordenamento jurídico não permite alterações às propostas abertas em carta fechada em momento imediatamente seguinte às suas aberturas.

  5. A sua permissão representaria, na prática, a possibilidade de apresentação de nova proposta, diferente da oportunamente apresentada, o que esvaziaria o sentido e pretensão que se pretende garantir com esta modalidade de venda judicial e encontrado o modo de fuga para beneficiar interessados ou proponentes com maior capacidade financeira, ao ser-lhes permitido cobrir os valores apresentados pelos restantes interessados ou proponentes.

  6. A sua consideração tácita pelo despacho recorrido, que in casu inquinou a realização dos ulteriores termos do acto de abertura das propostas, previsto nos arts. 820 e seguintes do CPC, constitui uma clara frustração das legítimas expectativas da recorrente e viola as normas legais relativas à venda mediante propostas em carta fechada, assim como, os princípios da boa-fé e da igual-dade das partes.

  7. Viola igualmente as regras relativas à eficácia da declaração negocial e à irrevogabilidade da mesma, assegurada nos normativos 224 e 230 do Código Civil.

  8. Com o despacho proferido, o tribunal a quo […] ignorou a pretensão e reclamação apresentada pela recorrente, pois não se pronunciou sobre a proposta apresentada pela recorrente de forma regular e tempestiva, a qual lhe permitia adquirir a verba anunciada a venda sob o numero 102, por apresentação de maior valor.

  9. O despacho recorrido não reveste qualquer mecanismo legal de simplificação e agilização processuais que garanta a justa composição do litígio em prazo razoável, como preconizado pelo art. 6/1 do CPC.

  10. Antes viola flagrantemente o princípio da igualdade das partes.

    […] Não foram apresentadas contra-alegações.

    *A questão que importa decidir é a de saber se a verba 102 devia ter sido adjudicada à recorrente.

    *Antes de mais, esclareça-se que, face aos despachos já proferidos neste processo, não se coloca a questão da tempestividade do recurso.

    Depois esclareça-se que, dada a data em que foi deliberada a venda das 102 verbas, a mesma é feita, por força do art. 463/3 do CPC - aqui como à frente, na versão anterior à reforma de 2013 -, pelas formas estabelecidas para o processo de execução e, no caso, dada a deliberação dos interessados, pela modalidade da...

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