Acórdão nº 869/14.1TBMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelCORREIA PINTO
Data da Resolução30 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 869/14.1TBMAI.P1 5.ª Secção (3.ª Cível) do Tribunal da Relação do Porto Sumário (artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil): I- Perante o disposto no artigo 266.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil, sempre que o réu pretenda o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor, deverá exercer o seu direito por via reconvencional, não se limitando a invocar exceção ou a confirmar a sua verificação.

II- A prévia declaração extrajudicial (unilateral) de compensação de crédito não permite subtrair o consequente pedido de compensação ao regime previsto no artigo 266.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil, mantendo-se a necessidade de formulação de reconvenção.

Acordam, no Tribunal da Relação do Porto: I) Relatório B…, S.A.

, intentou a presente ação de processo comum contra C…, S.A.

, ambas melhor identificadas nos autos.

1.1 A autora alega que realizou, a pedido da ré e no âmbito de subempreitada, uma obra de serralharia, faltando pagar 10% do valor de cada uma das faturas, pagamento que a ré recusa efetuar alegando a existência de defeitos na obra.

A autora reconhece que a obra apresentava oxidação nas calhas de “murolux” e infiltração de água pela cobertura em todas as estruturas de entrada dos blocos mas imputa tais situações à deficiente manutenção da obra, da responsabilidade da ré, e não reconhece que as mesmas sejam imputáveis a deficiências de montagem e de fabrico e, nessa medida, que se encontrem ao abrigo da garantia da obra e lhe sejam imputáveis.

Apesar disso, a ré enviou-lhe três faturas, relativas ao custo das reparações da obra, informando-a que os valores em causa seriam compensados com o crédito da própria autora.

A autora entende no entanto que, pelas razões enunciadas (as imperfeições encontradas na citada obra não são imputáveis a deficiências de montagem e de fabrico, que se encontrem ao abrigo da garantia da obra), o crédito compensado não é exigível pelo que não se verifica a reciprocidade creditícia, isto é, o devedor não é também credor do seu credor. Por conseguinte, não se encontrando preenchido o requisito da alínea a) do artigo 847.º do Código Civil, e não tendo sido estipulada a compensação por acordo entre as partes, (a autora procedeu à devolução das faturas enviadas pela ré relativamente aos trabalhos de reparação da obra), a ré não podia lançar mão da compensação.

Invoca ainda o direito a indemnização pelo não cumprimento pontual das obrigações de pagamento por parte da ré, correspondente ao somatório dos juros de mora, calculados desde o final do prazo de garantia – 24 de abril de 2013.

Termina pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 8.311,98, acrescida de juros de mora vencidos no valor de € 456,42 e vincendos até integral pagamento.

1.2 A ré contestou, aceitando que a autora realizou, a seu pedido, a referida obra, rececionada provisoriamente, mas afirmando que, aquando da vistoria com o dono da obra para receção definitiva da mesma, constataram oxidação/corrosão nas calhas de “murolux” (interior e exterior), oxidação das peças da estrutura de encerramento da caixa de escadas e infiltração de água pela estrutura de encerramento de todas as entradas, alegando que tais situações eram imputáveis à autora.

Mais alega que denunciou os defeitos, fixando um prazo para a autora proceder à reparação mas esta recusou-se a fazê-lo, pelo que teve a ré que diligenciar pela reparação, dado que tinha prazo para entregar a obra definitivamente ao respetivo dono, o que veio a acontecer após a reparação efetuada; nessa reparação despendeu a quantia de € 8.311,98. Procedendo a ré de acordo com o ponto 7.3 do contrato (“Caso o Adjudicatário não proceda ao solicitado pela C…, a C… fará as respetivas correções ou substituições, debitando ao Adjudicatário os respetivos custos e descontando-os nas retenções existentes”), operou-se efetivamente a total compensação de créditos entre as partes, sendo que, por essa via, nada deve à autora.

Termina afirmando que deve ser absolvida na íntegra do pedido formulado pela autora, com todas as consequências legais.

1.3 No despacho de fls. 74, considerando-se ter a ré invocado a exceção de compensação e tendo em vista dispensar a realização de audiência prévia, determinou-se a notificação da autora para, em 10 dias, se pronunciar quanto a essa exceção, nos termos e com as cominações previstas no artigo 587.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

A autora veio então pronunciar-se quanto à compensação de créditos, mantendo que o estado da obra se deve à falta de manutenção, não lhe podendo ser imputável a responsabilidade pelos referidos defeitos; por isso, não é devedora da ré de qualquer quantia a este título, pelo que não se verificam os pressupostos de que a lei faz depender a compensação de créditos.

Conclui como na petição inicial.

1.4 Dispensada a realização da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, onde se fixou o objeto do litígio e a matéria em discussão, indeferindo-se a realização de perícia requerida pela autora.

Concluída a audiência de discussão e julgamento, o tribunal proferiu sentença, onde afirmou os factos que julgou provados e não provados e respetiva motivação, decidindo – pelas razões que enunciou em sede de fundamentação de direito – julgar a presente ação totalmente improcedente e absolvendo a ré do pedido.

2.1 A autora, inconformada com a decisão proferida, veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões (transcrição integral): «1) As questões que aqui se colocam à douta apreciação do Meritíssimo Tribunal “ad quem”, resumem-se a saber:

  1. Se é admissível a invocação da compensação sem a dedução de reconvenção; b) Se ficou, ou não, provado o valor suportado pela R. a título de reparações; c) Se foi, ou não, feita prova de que os defeitos que a obra apresentava não procederam de culpa da Apelante.

    2) Em relação à primeira questão, recorda-se que no domínio do Código de Processo Civil antigo, tanto a doutrina como a jurisprudência divergiam quanto à forma de invocação da compensação.

    3) Atualmente, dispõe a alínea c), do número 2, do artigo 266.º que: “A reconvenção é admissível quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação, seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor”.

    4) Conforme se extrai daquele preceito, se o réu pretender invocar a compensação pela existência de um contra crédito que tenha sobre o A., terá que o fazer pela via reconvencional.

    5) No caso em apreço, a Apelada, na sua contestação, invocou a exceção perentória da compensação.

    6) No entanto, olvidou o formalismo processual adequado para o efeito, (i.e.

    , a reconvenção – Cfr. artigo 266.º do Código de Processo Civil), omitindo, dessa forma, o ónus de reconvir que sobre si impendia.

    7) Nessa medida, o Tribunal “a quo” não podia ter compensado o crédito da Apelante com o débito que a Apelada invocou ter para com a mesma.

    8) Relativamente à segunda questão, a Apelante discorda da afirmação constante na douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo” de que: “A Ré provou que nessa reparação [dos defeitos de obra] despendeu € 8.311,98 (…)”.

    9) A Apelada junta diversos documentos que, na sua ótica, fundamentam os custos respeitantes às reparações exigidas pelo dono da obra.

    10) Trata-se de faturas e notas de encomenda emitidas pela Apelada que ascendem ao valor de € 8.311,98 e que fazem referência genérica a trabalhos realizados no âmbito da obra do Bairro ….

    11) A Apelante desconhece se os trabalhos que constam desses documentos se reportam unicamente às reparações realizadas no âmbito dos mencionados defeitos ou se, pelo contrário, extravasam aqueles vícios.

    12) Porquanto a Apelada não logrou fazer prova da autenticidade, autoria, proveniência, justificação, causas e consequências daqueles documentos e, ainda, das circunstâncias e princípios sob os quais os mesmos foram compostos e compilados.

    13) Além disso, conforme resulta do depoimento de D… (que foi o diretor da obra e que demonstrou ter conhecimento direto dos factos alegados uma vez que acompanhou a produção em fábrica e em obra e que esteve presente na reunião do dia 08/03/2013 na qual a Apelada denunciou os defeitos de obra – Minuto 24:30 a minuto 36:20 do total de minuto 10:52:41 a minuto 11:35:24), estima-se adequado para aquelas reparações o valor aproximado de 1.000,00€ (Minuto 22:00 a minuto 24:12 do total de minuto 10:52:41 a minuto 11:35:24).

    14) Concatenando os factos, por si alegados, de que não existe trabalho na obra que justifique o valor alegado e de que seria considerado razoável para aquelas reparações o valor de 1.000,00€ com a ausência de qualquer prova da autenticidade, autoria, proveniência, justificação, causas e consequências do montante que consta daqueles documentos e, ainda, das circunstâncias e princípios sob os quais os mesmos foram compostos, o Tribunal “a quo” procedeu mal ao afirmar que se provou que a reparação ascendeu ao valor de €8.311,98.

    15) Deste modo, pretende a Apelante pela alteração para não provado da resposta dada ao ponto 19º dos factos provados.

    16) Deste modo, a exceção perentória da compensação invocada pela Apelada deverá improceder desde logo porque não foi respeitado o requisito formal previsto no artigo 266º do Código de Processo Civil – a dedução de reconvenção – e, depois, porque a Apelada não logrou fazer prova do valor alegado para aquela reparação, como lhe incumbia por força das regras de repartição do ónus da prova.

    17) Quanto à terceira questão, a Apelante está em desacordo quanto à resposta dada aos factos considerados não provados na sentença proferida em 1ª Instância.

    18) Os defeitos invocados pela Apelada e que melhor constam dos factos dados como não provados, reconduzem-se, apenas, a duas realidades distintas (depoimento da testemunha D…, Minuto 18:50 a minuto 19:10 do total de minuto 10:52:41 a minuto...

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