Acórdão nº 1272/12.3TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAM
Data da Resolução13 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1272/12.3TVPRT.P1 Da Comarca do Porto – Instância Central de Vila Nova de Gaia – 3.ª Secção Cível – J1.

Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró*Acordam no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção: I. Relatório B… intentou contra C…, S.L.

, ambos melhor identificados nos autos, a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, (originária de um processo de injunção de pagamento europeia, iniciado em 5/12/2012), pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia global de 45.676,55 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal de juros comerciais, desde o vencimento de cada uma das facturas até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou, em resumo, que forneceu à demandada, a solicitação desta, diversos artigos de vestuário, constantes de várias facturas, não tendo ela procedido ao pagamento da quantia pedida, na data do respectivo vencimento, nem posteriormente.

A ré contestou alegando, em síntese, que, tendo sido contratada pela empresa “D…, S.L.” para fabricar 13.973 peças de vestuário para a temporada de Primavera de 2012, subcontratou o fabrico de tais peças ao autor e sua mulher, E…; que houve atrasos na entrega de algumas dessas peças e que as peças tinham defeitos, pelo que a “D…., S.L.” devolveu à ré, que, por seu turno, devolveu ao autor e sua mulher, 5.000 dessas peças que estes fabricaram, correspondentes a um valor total de 58.315,53 €, a preço de custo. Assim e tendo já sido emitida a seu favor uma nota de crédito no montante de 12.884,45 €, a diferença de 45.431,53 € (58.315,53 € - 12.884,45 €) corresponde, na essência, ao que está a ser exigido nos presentes autos a título de capital em dívida. Concluiu pela improcedência da acção.

O autor replicou, impugnando os factos alegados e concluindo como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador tabelar e despacho a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova, de que reclamou, com êxito, a ré.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, após o que, em 7/4/2014, foi proferida sentença que julgou verificada a excepção dilatória da ilegitimidade do autor, por preterição de litisconsórcio necessário activo da sua mulher, E…, e, em consequência, absolveu a ré da instância.

O autor suscitou o incidente de intervenção principal provocada da sua mulher como sua associada e, admitido o mesmo, a interveniente declarou que fazia seus os articulados do autor marido.

As partes foram convidadas a produzir alegações de direito, ao abrigo do disposto nos art.ºs 3.º, n.º 3 e 6.º, n.º 1, ambos do CPC, o que fizeram, sustentando as posições já assumidas nos articulados.

E, em 28/11/2014, foi proferida nova sentença que julgou a acção procedente e decidiu condenar a ré a pagar aos autores a quantia de 45.675,55 €, acrescida de juros moratórios calculados sobre a data de vencimento constante das respectivas facturas.

Inconformada com o assim decidido, a ré interpôs recurso de apelação e apresentou a respectiva alegação com as seguintes invulgares, extensas e complexas[1] conclusões: “I – OBJETO DO RECURSO O presente recurso é interposto da douta sentença de 28.11.2014, proferida pelo Mº Juiz “a quo”, que julgou a ação procedente e provada e em consequência condenou a Ré no pedido, com custas a seu cargo.

Decidindo como decidiu, salvo o devido respeito, o Tribunal recorrido: b) Julgou incorretamente alguma da matéria de facto, pois os meios probatórios constantes do processo e reproduzidos em audiência de julgamento impunham decisão diversa da recorrida (art. 640º, do C.P.C.); b) Fez uma incorreta interpretação dos factos e inadequada aplicação do Direito (art. 639º, nº 1 e 2, do C.P.C.).

A Apelante está convicta que V. Exªs reapreciando os meios probatórios constantes do processo e produzidos em audiência de julgamento, reapreciando a matéria de facto e subsumindo-a nas normas legais, doutrina e jurisprudência aplicáveis, não deixarão de revogar a sentença recorrida.

II – AS SENTENÇAS II – A. A 1ª Sentença É proferida sentença em 07.04.2014, na qual o Mº Juiz considera que há uma exceção dilatória de ilegitimidade do A., por preterição de litisconsórcio necessário ativo, da mulher E… e, em consequência, absolve a Ré da instância.

Posteriormente o A. deduz Incidente de Intervenção Principal Provocada, no sentido de chamar aos autos a mulher E….

II – B. – 2ª Sentença A resolução da referida questão processual em sede da primeira instância e sem recurso a nova ação judicial, levou o Mº Juiz a proferir nova sentença em 28.11.2014, na qual deu como provados e não provados os mesmos factos.

Nesta segunda sentença, o Juiz “a quo” limitou-se à apreciação das regras do contrato de empreitada, desconsiderando os gravíssimos factos alegados e provados pela Ré, no que respeita aos atrasos nas entregas das mercadorias e nas graves patologias que as mesmas apresentavam.

Defendendo que a Ré apenas teria direito a exigir a eliminação dos defeitos, ou a realização da obra de novo (art. 1221º do CC) e só nessa altura se tal não fosse realizado, poderia excecionar o não cumprimento da obrigação de pagamento do preço ou a redução do preço.

Concluindo pela condenação da Ré no pedido formulado na p.i..

III – OS DEPOIMENTOS PRESTADOS EM AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO A análise do depoimento do(s) declarante(s) e das testemunhas, que se junta sob os Anexos I a V, permitirá concluir com clareza que há graves falhas da apreciação e valoração da prova e até uma irregularidade processual.

III – F. – Breve Análise O depoimento de todas as testemunhas da Ré, dos declarantes (incluindo a E…) e até da única testemunha válida dos AA. é de uma consistência estrutural, que compagina com o teor dos documentos juntos aos autos, inexistindo discrepâncias que possam pôr em causa a sua veracidade e a convicção do Tribunal.

Apenas a A. E… faz algumas afirmações contraditórias, todavia esta não pode ser relevada como testemunha e muita da matéria que confessa é conforme aos depoimentos supre referidos e favorável à Ré.

IV – ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA E NÃO PROVADA A análise rigorosa da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, anteriormente transcrita, conjugada com a prova documental, permite concluir sem margem para dúvidas que:

  1. Matéria Provada F, deveria afirmar apenas “A entrega dos artigos foi efetuada pelo A. à Ré nas datas indicadas nas faturas, nas instalações da empresa de transportes em Portugal; sendo eliminado “em conformidade com as instruções da Ré”.

  2. deveriam ter sido julgados provados os seguintes fatos, que foram julgados não provados: - Os AA. atrasaram-se na entrega das peças, o que deveria ter ocorrido até ao final do mês de Fevereiro de 2012 ou no máximo em Março e continuaram a ser entregues em Abril e Maio de 2012; - O A. marido emitiu a nota de crédito nº ……0001, por reconhecer também atrasos no envio das mercadorias.

    - O número de peças devolvido pela D… à Ré que, por sua vez as devolveu aos AA., ascendeu a 4.500 ou 5.000, no valor a preço de custo de cerca de € 50.000,00/ € 60.000,00; sendo corrigida em conformidade a matéria dada comprovada na alínea M).

    V – A REVISÃO DA SENTENÇA Com a matéria de facto dada como provada nos autos e com a que agora se requer a sua correção, deverá a sentença da 1ª Instância ser revogada e substituída por outra que declare que houve manifesto cumprimento defeituoso e atraso na entrega das peças por parte dos AA., pelo que não há fundamento fático e legal para exigir à Ré o pagamento da quantia reclamada nos autos.

    Com efeito, não faz qualquer sentido a sentença recorrida invocar os artigos 1221º e 1222º do Código Civil, para colocar a hipótese de os AA. eliminarem os defeitos, ou realizarem obra nova, pelo simples e elementar motivo que, como foi referido por todas as testemunhas, incluindo a ora A. E…, a encomenda se destinava à coleção de Primavera/Verão de 2012, pelo que constitui um absurdo: - imaginar a possibilidade de eliminação de defeitos, pois as peças de malha não se podem desfazer e fazer de novo com o mesmo fio, o qual pura e simplesmente é desaproveitado e as peças são eliminadas; - por outro lado, é impossível a realização de obra nova, ou seja o refazer de parte da referida coleção Primavera/Verão de 2012, que obrigatoriamente tem de se colocar nas lojas em Fevereiro ou no limite Março, quando a devolução das peças defeituosas teve lugar em Julho desse ano; com efeito a obra nova não poderia vir a ser colocada nas lojas em Setembro ou Outubro – meses em que se entrega e vende a coleção de Outono/Inverno – pelo que esta é uma hipótese fantasiosa e totalmente desfasada da realidade e da mais elementar experiencia comum.

    Deste modo, a sentença deve reconhecer o cumprimento defeituoso e o prejuízo invocado pela Ré, de € 58.315,53 – idêntico ao referido pelas testemunhas de cerca de € 60.000,00 (€ 12,00 por peça x 5.000), a que deduzida a nota de crédito de € 12.884,45, dá a diferença de € 45.4311,53 reclamado na contestação.

    O que teria necessariamente de passar por uma das duas últimas hipóteses previstas nos art.s 1221º e sobretudo 1222º do C.C., de redução do preço ou de resolução parcial do contrato no que respeita às peças defeituosas – o que em termos práticos conduz ao mesmo resultado reclamado pela Ré e supra referido no parágrafo anterior.

    Aliás na mesma Sentença de 07.04.2014, a Mª Juiz tendo decidido por uma exceção dilatória de ilegitimidade do A. B…, não deixou de revelar compreensão da questão substantiva ao afirmar: “Porém, face ao quadro factológico demonstrado, a decisão não poderá ser integralmente favorável ao Autor, uma vez que, embora em montante não concretamente apurado, sempre a Ré teria direito a ver reduzido o preço, face aos defeitos das peças para a Primavera/Verão de 2012 que foram devolvidas ao Autor e sua mulher, nos termos dos art.s 884º e 1222º do C.C.” Ora, apesar de na “Motivação” da Douta Sentença de 07.04.2014, se afirmar que as testemunhas da Ré terem...

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