Acórdão nº 666/11.6TUMAI.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | PAULA LEAL DE CARVALHO |
Data da Resolução | 05 de Outubro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Procº nº 666/11.6TUMAI.P2 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 714-
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Adjuntos: Des. Rui Penha Des. Maria José Costa Pinto Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, com mandatário judicial constituído e litigando com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos do processo, intentou[1] contra Companhia de Seguros C…, SA ação declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, pedindo a condenação desta a pagar-lhe: a partir de 11.05.2011, dia seguinte ao da alta, uma pensão anual de €2.833,01, calculada com base na IPP de 31,725%; as incapacidades temporárias; a quantia de €30,00 referente a deslocações; juros de mora vencidos e vincendos desde a data do vencimento até integral pagamento.
Para tanto, e em síntese, alegou que: no dia 18.02.2011, no exercício das suas funções e no cumprimento do ordenado pela empresa, foi vítima de um acidente de trabalho que consistiu no seguinte: quando estava a polir uma peça em aço, utilizando uma máquina de polir/rebarbadora, “a máquina rebentou perto da cabeça do Autor (do lado direito), provocando muito barulho (estrondo), sentindo o A. zumbidos no ouvido direito” e passando a sentir que não ouvia muito bem; em consequência da referida explosão ficou afetado de surdez do ouvido direito e da IPP de 31,7250% e de incapacidade temporária desde 18.02.2011 até 10.05.2011, data esta a da alta, não lhe havendo sido paga qualquer indemnização pelo período de tal incapacidade; a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes do acidente de trabalho encontrava-se transferida para a Ré seguradora.
Citada, a Ré contestou aceitando a transferência da responsabilidade, referindo, todavia, que o alegado acidente não ocorreu nas circunstâncias de tempo, modo e lugar descritas pelo A. e, bem assim, que os seus serviços clínicos “consideraram que as lesões apresentadas pelo A. não tinham qualquer nexo causal com o acidente relatado pelo Autor”, sendo que, para além do acidente lhe ter sido participado apenas aos 15.03.2011, das averiguações por si levadas a efeito resulta que o A. recorreu várias vezes ao seu médico de família para consultas e em urgência, nomeadamente desde 14.02. até 21.06.2011, as quais não coincidem com uma data próxima àquela em que o A. situa o evento (18.02.2011). Refere que, assim, competirá ao A. provar que as lesões de foi vítima decorreram do acidente que alega, concluindo que o a ação deverá ser julgada de acordo com a prova a produzir nos autos.
Requereu também a realização de exame por junta médica.
Foi proferido despacho saneador e selecionada a matéria de facto, consignando-se a assente e elaborando-se base instrutória. Determinou-se, também, a abertura de apenso para fixação da incapacidade, no qual se realizou o exame por junta médica que consta do auto de fls. 11 a 13 do mesmo, complementado pelo de fls. 19 a 21.
Realizou-se a audiência de julgamento (aos 26.09.2013) e, após, foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo a Ré do pedido.
Inconformado, veio o A. recorrer, na sequência do que foi proferido o acórdão de 28.04.2014 (de fls. 292 a 300), que decidiu nos seguintes termos: “Pelo exposto, acorda-se em anular o julgamento quanto à decisão da matéria de facto constante das als. h), i) e j) dos factos não provados e quanto ao nº 22 dos factos provados e, consequentemente, em anular a sentença, com vista ao apuramento das questões referidas nos pontos III. 2.2., 2.3.1 e 2.3.2. do presente acórdão e em conformidade com aí referido, após o que deverá ser proferida nova sentença pelo tribunal a quo.
A repetição do julgamento abrange apenas os referidos pontos da decisão da matéria de facto, sem prejuízo, todavia, da apreciação de outros com o fim de evitar contradições.
Custas pela parte vencida a final.”.
Baixados os autos à 1ª instância foram formulados quesitos adicionais a submeter à junta médica (fls. 28/29 do apenso de fixação de incapacidade), a qual se realizou nos termos constantes de fls. 26 a 38 de tal apenso. Teve lugar nova audiência de julgamento (atas de fls. 315/316 e 318/319), após a qual foi proferida sentença em que se decidiu a matéria de facto e se julgou a ação improcedente, absolvendo a Ré do pedido.
Inconformado, veio o A. recorrer, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: “
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Atendendo à matéria de facto dada como provada, a sentença recorrida não poderia, como o fez, absolver a Ré do pedido.
B) De acordo com o disposto no nº 8 das Instruções da TNI, publicada pelo D.L n.º 352/2007 de 23 de Outubro “o resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentarem todas as suas decisões.” H) Sucede que, a fundamentação apresentada pela Junta Médica é inexistente violando ostensivamente o disposto no nº 8, das Instruções Gerais da TNI.
I) Por falta de fundamentação das respostas dos peritos médicos e dos esclarecimentos prestados em Tribunal, não tinha o Tribunal os meios de prova suficientes que suportassem a decisão de facto proferida, pelo que ocorreu erro de julgamento, que determina a anulação da sentença nos termos do art. 662º CPC.
L) Estão provados factos que claramente concretizam o nexo de causalidade entre o acidente e a lesão.
M) O Autor beneficia da presunção legal no sentido de que foi vítima de acidente de trabalho.
N) O art. 6º da LAT fornece-nos o conceito de acidente de trabalho como sendo “aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza directa ou indirectamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução da capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte”.
O) Reconhecida a lesão logo a seguir ao acidente, ocorrido nas circunstâncias previstas no art. 6º nº1 e 2 da LAT, presume-se consequência deste, cabendo à entidade responsável pela reparação o ónus da prova do contrário.
P) Assim, constatada uma lesão no local e tempo de trabalho, presume-se que a mesma é consequência de acidente de trabalho, ou seja presume-se que ocorreu um acidente de trabalho.
Q) Impõe-se assim a modificação da decisão do tribunal “a quo” sobre a matéria de facto, no que concerne à alínea j) dos factos não provados, provando-se antes que a sequela (dada como provada em 22) é consequência directa e necessária do acidente descrito em 11 (facto provado).
L) O recorrente pretende assim que seja reapreciada a prova gravada, no que concerne aos esclarecimentos prestados pelos médicos em audiência de julgamento. [2] M) A presunção prevista no art. 6º nº 1 e 2 da LAT, não foi ilidida pela Ré, que não apresentou qualquer prova em contrário.
N) Não se logrou provar que na produção do dano tenham interferido outros factos concorrentes e posteriores.
O) Deverá assim, ficar provado o nexo de causalidade entre o evento causado e a lesão/sequela.
W) Decidindo como decidiu, violou a Mª Juiz a quo o disposto nos artigos 6º, 5º e 9º da LAT e 7º do RLAT.
Deverá a douta sentença ser revogada substituindo-se por outra que, com fundamento no conjunto dos documentos e elementos de prova juntos aos autos, considere existir nexo de causalidade, considere a acção procedente e condene a Ré nos termos peticionados.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto junto desta Relação emitiu douto parecer no sentido da rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto e do não provimento do recurso, sobre o qual as partes, notificadas, não se pronunciaram.
Colheram-se os vistos legais.
*II. Matéria de Facto [3] É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença: “A. Factos provados 1.
O autor, B…, nasceu no dia 22 de janeiro de 1958.
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No dia 14 de fevereiro de 2011 foi celebrado entre o autor e a sociedade “D…, Lda.” um contrato de trabalho temporário, através do qual o autor foi cedido à firma “E…, Lda.”, para exercer a sua atividade profissional por conta e sob a autoridade e direção desta, ao abrigo de um contrato de trabalho a termo certo.
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No dia 14 de fevereiro de 2011, o autor iniciou as suas funções de operário não especializado na utilizadora de trabalho temporário “E…, Lda.”, na Rua …, n.º .., Lousado.
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Em contrapartida, a empresa utilizadora remunerava o autor com o vencimento base de € 505,00 mensais, acrescido de subsídio de alimentação no valor diário de € 4,40 e subsídio de turno no valor de € 36,05.
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Por contrato de seguro titulado pela apólice n.º 200607609, a “D…, Lda.” havia transferido a sua responsabilidade infortunística laboral em relação ao autor para a ré “Companhia de Seguros C…, S.A.”, pelo salário de €505,00x14 + € 36,05x14 + € 96,80x11.
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No dia 15 de março de 2011, a entidade empregadora participou à seguradora um acidente ocorrido com o autor.
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Dessa mesma participação consta que o acidente ocorreu no dia 15 de março de 2011.
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A seguradora deu alta ao sinistrado em 06.04.2011, considerando-o curado sem desvalorização, por inexistência de nexo de causalidade.
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Alguns dias após o referido em 3, o autor, no exercício das suas funções de operário não especializado e no cumprimento do ordenado pela empresa utilizadora, trabalhava com uma máquina de polir/rebarbadora.
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O autor estava protegido com auditivos (auscultadores).
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Alguns dias após o referido em 3, junto da bancada do autor ocorreu uma fuga de ar comprimido no tubo flexível de alimentação do equipamento pneumático.
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O autor queixou-se de zumbidos no ouvido direito.
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No dia seguinte ao referido em 11, o autor comunicou o referido em 12 ao superior hierárquico F….
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O autor queixava-se que não ouvia bem e de que os zumbidos continuavam.
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O autor queixava-se que no fim de semana seguinte o problema persistia.
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O autor queixava-se de que a máquina tinha rebentado perto da sua cabeça, pelo que tinha ficado com zumbidos e surdo.
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Em data concretamente não apurada de fevereiro de 2011 e após o referido em 11 e 12, o autor foi visto pelo médico da firma “E…, Lda.”.
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No dia...
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