Acórdão nº 205/13.4TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelJUDITE PIRES
Data da Resolução05 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 205/13.4TVPRT.P1 Comarca do Porto Porto – Inst. Central – 1ª Secção Cível – J3 Relatora: Judite Pires 1ª Adjunta: Des. Aristides de Almeida 2º Adjunto: Des. José Amaral Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.RELATÓRIO 1. B…, residente na Rua …, …, Porto propôs acção comum com processo ordinário contra Banco C…, S.A., com sede na Rua …, nº …, ….-… Lisboa, pedindo que seja o Réu condenado a desmobilizar a totalidade das aplicações financeiras que a Autora possui naquele intermediário financeiro, sem perda de capital, juros vencidos e vincendos até à data da efectiva desmobilização.

Refere, para o efeito, que efectuou, sob sugestão e orientação do seu gestor de conta no então “Banco D…“, aplicações em produtos financeiros cujas características ignorava e que nunca lhe foram explicitadas ou explicadas, adiantando que sempre soube o aludido gestor (funcionário bancário do Banco Réu) que a Autora só aceitaria efectuar tais aplicações financeiras se não se tratasse de produtos com risco (de perda de capital) e, ainda, se se tratassem de produtos que poderiam ser «desmobilizados» em qualquer altura, mediante a sua vontade.

De acordo com a sua vontade, conhecida do Banco, alega a Autora que os produtos seriam sempre de capital garantido e sem carácter vitalício, na medida em que poderia a mesma promover a sua desmobilização a qualquer momento e de acordo apenas com as suas instruções, sendo que foi com tais características (capital garantido e livre desmobilização) que aceitou a subscrição dos ditos produtos financeiros e auferiu, inicialmente, «juros atractivos».

Acrescenta a Autora que, após ter ocorrido uma diminuição substancial de tais juros, interpelou o Banco para averiguar da sua causa, tendo então ficado ciente que a dita redução dos juros se ficara a dever a «descidas das taxas de juro do mercado (BCE)», motivo pelo qual, desconhecendo essa situação (que nunca antes lhe tinha sido referida e/ou explicada), solicitou ao seu gestor de conta informações mais concretas e detalhadas sobre os produtos que tinham sido subscritos, vindo, então, a ser-lhe enviado o documento junto a fls. 27 dos autos (doc. 2 junto com a petição inicial), sem lhe ter sido dada qualquer explicação sobre os ditos produtos e as suas características.

Perante tal documento, e uma vez que considerou insuficientes as informações que lhe foram prestadas, a seu pedido, pelo seu gestor de conta, deu a Autora instruções ao mesmo para que procedesse à venda urgente e imediata daqueles produtos, para que o dinheiro em apreço passasse a ficar imediatamente disponível. Apesar desta solicitação, o Banco permaneceu numa postura de silêncio e de falta de informação concreta sobre a situação do seu dinheiro.

Posteriormente, já em Outubro de 2008, na sequência das suas insistências, veio o então o “D…” a prestar-lhe as informações constantes dos documentos de fls. 28 dos autos (doc. 3 junto com a petição inicial), sem qualquer outra explicação/informação adicional relativamente aos ditos produtos financeiros e suas características.

Por esse facto, insistiu ela junto do mesmo Banco e gestor pelo envio de notas explicativas de tais produtos, o que este veio a fazer através dos documentos de fls. 29, 30 e 31 dos autos (docs. n.ºs 4, 5 e 6 juntos com a petição inicial), ficando ela então ciente que o seu dinheiro tinha sido aplicado num produto em que ficaria o dinheiro cativo pelo prazo de 10 anos e que o reembolso do mesmo não dependeria apenas da sua livre vontade (obrigações subordinadas D… 2005 e obrigações subordinadas E… 2004) e, ainda, em outro produto de natureza perpétua e com prazo de vencimento indeterminado (obrigações subordinadas perpétuas D… 2008).

Perante o exposto, ficando a Autora ciente de que o seu dinheiro tinha sido aplicado em produtos de “elevado risco“, “de natureza complexa“ e que não tinham liquidez, em 4.11.2008 interpelou, por escrito, o dito “D…” instruindo-o para proceder à venda urgente e imediata de toda a sua carteira de títulos e obrigações D…, conforme documento de fls. 32-33 dos autos (doc. 7 junto com a petição inicial), venda esta que o dito Banco não levou a cabo, antes se limitando a informá-la de que o estava a tentar fazer.

Diz a Autora que mesmo admitindo, a título de possibilidade, que possa ter assinado um qualquer prospecto de subscrição das aludidas obrigações, tê-lo-á feito sem lhe terem sido dadas pelo dito “D…” informações sobre as características e grau de risco do produto, sem lhe ter sido previamente disponibilizado qualquer documento informativo e explicativo da natureza de tais produtos e, em especial, dos riscos inerentes aos produtos em causa, sendo certo que, se conhecesse tais características, natureza e riscos associados, jamais os teria subscrito.

E ainda mesmo que a Autora tenha assinado os aludidos prospectos de subscrição dos produtos em causa, sustenta a mesma que nunca o dito “D…“ lhe enviou ou forneceu cópia dos mesmos quando para tal foi interpelado, não cumprindo, assim, os deveres de esclarecimento ao cliente do tipo de produto que estaria subscrito.

Por via de toda esta conduta do “D…“ nunca a Autora esteve em condições de, previamente, tomar consciência do tipo de produtos que lhe foram sugeridos pelo gestor de conta, nem dos riscos inerentes aos mesmos, o que a impediu de ter tomado uma decisão esclarecida e consciente dos riscos envolvidos com a subscrição em apreço, sendo certo que, tendo 74 anos, jamais efectuaria um qualquer investimento que envolvesse risco de capital ou um qualquer investimento «perpétuo».

Em função de todo o exposto, invocou a Autora a violação, por parte do aludido “D…” dos deveres de informação e esclarecimento perante ela própria, sua cliente, a violação do dever de adequação dos produtos subscritos ao perfil da cliente, ora Autora, a violação dos deveres de cuidado e protecção dos seus legítimos interesses, enquanto investidora não qualificada, postergando, ainda, os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, em oposição ao consignado nos arts. 304.º, 312.º, 312.º-A, 314.º, 314.º-A, 314.º-B e 317.º do Cód. dos Valores Mobiliários.

Por último, ainda, sustentou a Autora que o negócio celebrado com o aludido “D…” enferma de um vício na formação da vontade dela própria, uma vez que lhe não foram explicadas as condições de subscrição do negócio, o qual nunca teria sido concluído se tivesse conhecimento de todas as condições para a subscrição das aplicações financeiras em questão.

Citado, contestou o Réu, defendendo-se por excepção e por impugnação.

Por excepção, invocou (i) ineptidão da petição inicial, com fundamento na ininteligibilidade do pedido, além de contradição entre o pedido e a causa de pedir, (ii) ilegitimidade substantiva do Réu, alegando que, enquanto intermediário financeiro, não pode o mesmo ser chamado a efectuar o reembolso de obrigações, (iii) a impossibilidade/ilegalidade do pedido, não podendo o Réu, enquanto emitente, proceder ao reembolso específico das obrigações da Autora e não quanto às demais emitidas, sob pena de violação do princípio de igualdade de tratamento entre os credores obrigacionistas, (iv) extemporaneidade da acção, por ter a Autora, que, pelo menos em Outubro de 2008 tomou conhecimento dos factos que putativamente tivesse contratado com a sua vontade viciada, proposto a acção apenas em 14 de Março de 2013, muito para além do prazo de um ano de que dispunha para pedir a anulação do negócio, que, assim, resultou confirmado, (v) falta de alegação de pressupostos essenciais à procedência da acção, por não ter alegado qualquer dano concreto que haja sofrido, nem nexo de causalidade entre facto e dano, (vi) prescrição, por, tendo a subscrição das obrigações sido efectuada pela Autora, pelo menos, desde Outubro de 2008, e não...

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