Acórdão nº 367/13.0PAOVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Maio de 2015

Data06 Maio 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 367/13.0PAOVR.P1 Aveiro Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto.

(2ª secção criminal) I. RELATÓRIO No processo de instrução nº 367/13.0PAOVR, da Instrução Central de Aveiro, 1ª Secção de Instrução Criminal, Juiz 1, da Comarca de Aveiro, foi proferido despacho de não pronúncia da arguida B…, com os demais sinais dos autos.

*Inconformada, a assistente “C…, Lda.” interpôs recurso, apresentando a competente motivação, que remata com as seguintes conclusões: 1. “Nos termos do artigo 308º, nº 2 do CPP, é aplicável ao despacho (de pronúncia ou não pronúncia) o referido no nº 1 desta norma e ainda o constante dos nºs 2 a 4 do artigo 283º do mesmo diploma.

  1. Determinam as disposições supra que o julgador está vinculado à obrigatoriedade de narração dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança, ainda que de forma sintética.

  2. Para que um Tribunal Superior possa aferir da bondade da decisão recorrida, valorando os indícios como suficientes ou insuficientes para pronunciar ou não um arguido, é necessário que saiba quais são os indícios dados como assentes pelo Tribunal a quo, confrontando-os com toda a prova carreada aos autos de instrução.

  3. Na decisão recorrida, as referências efectuadas aos depoimentos das testemunhas arroladas limitam-se à questão da perícia realizada à letra constante dos sacos que continham as quantias monetárias furtadas, não sendo indicados outros factos relevantes para além de pequenos excertos dos depoimentos, que se circunscrevem à letra e condições de preenchimento dos sacos onde é guardado o dinheiro das vendas efectuadas por cada período do dia.

  4. Os factos narrados no despacho de não pronúncia são claramente insuficientes para ajuizar da eventual pronúncia ou não pronúncia da arguida.

  5. A ausência de descrição dos factos determina, nos termos dos art. 308º, nº 2, conjugado com o art. 283º, nº 3, b) do CPP, a nulidade do despacho de não pronúncia de que ora se recorre, deverá este vício ser apreciado pelo Tribunal da Relação.

  6. O exame crítico das provas carreadas aos autos de inquérito consiste na explicação (e fundamentação) do que foi valorado ou não pelo Tribunal, para a formação da convicção do mesmo.

  7. De acordo com o MM. Juiz, a assistente sustentou a sua posição no resultado de uma perícia à letra constante do objecto da mesma: os sacos de transporte de dinheiro.

  8. É verdade que a perícia foi efectuada por peritos pagos pela assistente mas esta, no seu requerimento de abertura de instrução requereu “Que se oficie uma entidade certificada como Perita junto das Entidades judiciais na Peritagem da Caligrafia no sentido de efectuar uma contra peritagem aos sacos e à letra constante no auto de declarações da denunciada, todos documentos já juntos aos autos.” 10. Em despacho (com data de conclusão de 22.05.2014), proferia o MM. Juiz o seguinte: “Indefere-se a perícia proposta uma vez que no inquérito já foi realizada a perícia com igual objecto.” 11. Não foi, pois, efectuada qualquer outra perícia (como requereu a assistente em sede própria) à letra constante dos sacos porque o Tribunal não o permitiu, alegando que já tinha sido realizada uma ao mesmo objecto.

  9. Apesar de não ter permitido que fosse efectuada nova perícia, desta vez por técnico especializado e imparcial, vem o MM. Juiz do Tribunal a quo fundamentar agora o despacho de não pronúncia da arguida no facto de a mesma não ter qualquer relevância probatória dado que não foi ordenada pela entidade judiciária competente.

  10. Refere o despacho recorrido: “(…) Nos termos do preceituado no art.º 151º do CPP a prova pericial tem lugar quando a percepção ou apreciação dos factos exigirem especiais conhecimentos técnicos.

    A perícia é realizada em estabelecimento, laboratório ou serviço oficial apropriado ou, quando tal não seja possível ou conveniente, por perito nomeado de entre pessoas constantes de listas de peritos ou, na sua falta ou impossibilidade de resposta em tempo útil, por pessoa de honorabilidade e de reconhecida competência na matéria em causa – vide art.º 152º, nº 1 do CPP.

    Dispõe o art.º 154º, nº 1 do CPP que a perícia é ordenada, oficiosamente ou a requerimento, por despacho da autoridade judiciária, contendo a indicação do objecto da perícia e os quesitos a que os peritos devem responder, bem como a indicação da instituição ou o nome dos peritos que a realizarão.

    A autoridade judiciária assiste, sempre que possível e conveniente, à realização da perícia, podendo a autoridade que a tiver ordenado permitir a presença do arguido e do assistente – art. 156º, nº 2 do CPP. (…) A perícia, qualquer perícia, deve, por isso, obrigatoriamente, ter assegurada a imparcialidade dos peritos e sujeitar-se aos princípios da igualdade de armas e do contraditório.

    Mas, além disso, o objecto da perícia – neste caso, os sacos de transporte do dinheiro – deve ser preservado para que, até à realização da perícia, seja possível determinar de que modo foi preservado e quem foram os responsáveis pelo seu manuseio. Essa preservação – a cadeia de custódia – é essencial para que dúvidas não existam sobre eventuais adulterações da prova. E quanto maior for o cuidado na preservação da prova, mais robusto e confiável será o procedimento, deixando o relatório técnico produzido com teor irrefutável. (…) Porém, como é bom de ver, no caso dos autos a perícia não foi ordenada pela autoridade judiciária competente. Os peritos foram escolhidos e pagos pela assistente. A arguida não teve oportunidade de exercer o contraditório. Ou seja, não foi garantida a imparcialidade dos peritos e a perícia não respeitou os princípios da igualdade de armas e do contraditório.

    E tanto bastaria para lhe retirar qualquer relevância probatória. (…)” 14. Salvo o devido respeito, que é muito, se a arguida não pôde exercer o contraditório, se não foi garantida a imparcialidade dos peritos e se não foram respeitados os princípios da igualdade de armas e do contraditório, tal não se deveu à assistente mas ao Tribunal a quo, que despachou no sentido de indeferir a realização da perícia requerida pela assistente, em sede de abertura de instrução.

  11. Não, pode, pois, a decisão assentar em factos cuja responsabilidade não é imputável à assistente, mas sim ao MM. Juiz da causa que, por lapso ou não, decidiu não admitir a realização de perícia à caligrafia constante nos sacos do dinheiro, alegando que já havia sido efectuada uma ao mesmo objecto.

  12. Ao referir a pretensa violação dos princípios da igualdade, imparcialidade e do contraditório como fundamentos para não pronunciar a arguida, quando, na verdade, a não observação dos mesmos unicamente se poderá imputar ao despacho proferido pelo MM. Juiz de Instrução, a decisão instrutória revela deficiências que acarretam a nulidade do despacho de não pronúncia, devendo o douto Tribunal da Relação ordenar a sua revogação.

  13. Por outro lado, refere-se no despacho recorrido que “(…) os restantes elementos recolhidos não permitem, com a segurança exigida em processo penal, imputar à arguida a prática dos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT