Acórdão nº 2368/13.0T2AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução12 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Rec. 2368/13.0T2AVR.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Desembargadores Maria Eiró e João Proença Costa. Decisão de 1ª instância de 5/12/2014.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto Súmula do Processo Recurso de apelação interposto na acção com processo comum nº2368/13.0T2AVR, da Instância Central Cível da comarca de Aveiro.

Autor – B….

Réus – C… (advogado), D…, Ltd., e Cª de Seguros E…, SA.

Pedido Que os Réus sejam solidariamente condenados a pagar ao Autor a quantia indemnizatória de € 118.786,86, sendo € 111.286,86 a título de danos patrimoniais, e € 7.500,00, a título de danos não patrimoniais, acrescidas de juros, a contar da citação, até integral pagamento.

Tese do Autor Constituiu o Réu seu mandatário, em acção intentada visando a declaração de nulidade de contratos de mútuo e restituição da quantia pelo Autor mutuada, no montante global de € 80.000, acrescendo juros.

Tal acção foi julgada improcedente em 1ª instância e, apesar de o Réu, por acordo com o Autor, ter interposto recurso, tal recurso não foi admitido, por extemporâneo, por despacho que transitou em julgado.

A 2ª Ré, que segura a responsabilidade civil profissional dos advogados, por apólice em que é tomadora a Ordem dos Advogados, declinou porém qualquer responsabilidade na indemnização.

O Réu agiu com falta de zelo e cuidado, no tratamento das matérias que o Autor lhe cometera.

O Autor sofreu danos não patrimoniais.

A 3ª Ré celebrou igualmente com a Ordem dos Advogados um seguro de responsabilidade civil profissional dos advogados.

Tese do 1º Réu Se o Autor não recebeu até hoje qualquer indemnização, tal deve-se à falta de fundamento para que tal se verifique.

Tese da 2ª Ré Impugna a factualidade invocada pelo Autor.

Invoca que o sinistro, nos termos relatados pelo Autor, se encontra fora da cobertura da apólice respectiva.

A decisão judicial tinha uma reduzida probabilidade de vir a ser revogada na Relação. Aliás, não foi o Autor, mas um outro advogado, que viu o respectivo mandato revogado pelo Autor, quem intentou a acção.

Tese da 3ª Ré O evento que se invoca como gerador de responsabilidade, ocorreu em período temporal no qual a apólice celebrada pela O.A. com a Ré não se encontrava ainda em vigor.

O Segurado não chegou a comunicar à Ré, como lhe impunha a apólice, o evento em causa.

De todo o modo, a conduta do Réu não é geradora de responsabilidade para este.

Sentença Na sentença proferida pelo Mmº Juiz “a quo”, a acção foi julgada improcedente, com a consequente absolvição dos Réus dos pedidos formulados.

Conclusões do Recurso de Apelação apresentado pelo Autor 1ª Atendendo à matéria de facto dada como provada nos autos, entende o autor que a questão a decidir --- ou seja, a apreciação da existência de responsabilidade civil do 1º réu, face ao quadro normativo aplicável, por ter impossibilitado que o autor visse reapreciada em sede de recurso a pretensão negada pelo Tribunal de 1ª instância --- deverá obter resposta positiva, condenando-se aquele e os demais réus, solidariamente, na indemnização ao autor pelos danos patrimoniais e não patrimoniais verificados, e, como tal, revogando-se a douta sentença recorrida.

  1. Verifica-se, desde logo, como expressamente se entende também na douta sentença recorrida, que o 1º réu, por erro quanto ao regime aplicável em matéria de recursos, viu rejeitado um requerimento com o qual pretendia impugnar uma decisão final (sentença) desfavorável ao autor, resultando violado, pela sua actuação, além do dever geral previsto no art. 92º, nº2, do Estatuto da Ordem dos Advogados, o específico dever consagrado na alínea b) do nº 1, do art. 95º, do mesmo EOA - dever de diligência ou zelo -, e que, atento o princípio estabelecido no art. 799º, nº1, do Código Civil, presume-se a culpa do 1º réu, que estava obrigado a proceder ou actuar diligentemente, em conformidade com as regras estatutárias e contratuais em vigor.

  2. Deste modo, no que à responsabilidade civil do 1º réu respeita, a douta sentença recorrida considera verificado o incumprimento culposo do 1º réu.

  3. Entendeu-se, porém, na douta sentença recorrida, que o recurso interposto na mencionada acção judicial, caso tivesse sido admitido e julgado, não beneficiaria de qualquer probabilidade, ainda que reduzida, de vir a merecer provimento, e, desse modo, o aqui autor, não teria sofrido qualquer prejuízo patrimonial decorrente da perda de oportunidade (perda de chance) de ver apreciada, pelo Tribunal Superior, a pretensão que formulou e que, inexistindo danos patrimoniais a ressarcir, o mesmo sucederia com os não patrimoniais, julgando, pois, improcedente a presente acção e absolvendo os réus relativamente ao pedido deduzido pelo aqui autor.

  4. Discorda o autor, com o devido respeito, de tal entendimento, considerando que, independentemente do juízo que se faça sobre a probabilidade de o recurso, não admitido, interposto pelo 1º réu, vir a merecer decisão que alterasse a decisão proferida em 1ª instância, tendo mandatado o 1º réu para apresentar tal recurso, e tendo este aceite tal incumbência e fazendo-o, embora para além do prazo legal, viu o autor frustrado o cumprimento do acordado, o que, tratando-se de um contrato de mandato forense, baseado em relações de específica confiança pessoal, se considera merecer a tutela indemnizatória, independentemente da existência de danos patrimoniais.

  5. O simples facto de, na execução do mandato forense, o autor se ter encontrado, sem culpa sua, na situação de impossibilidade de a sua pretensão ser apreciada pelo Tribunal Superior, sempre, pelas regras da experiência, e sendo facto notório, afectaria a sua esfera jurídica pessoal, nomeadamente a sua garantia de acesso aos Tribunais e consequente direito a obter uma decisão que apreciasse, com força de caso julgado, a pretensão deduzida em juízo, bem como o direito ao recurso, plasmados nos artigos 2º, nº 1, e 627º, nº 1, do CPC, e artigo 20º, nº 1, da CRP.

  6. Verificando-se inequívoca violação culposa de um direito do autor, classificado pela Constituição da República como fundamental, decorre da mesma, com o devido respeito, sempre o direito de ser indemnizado pelo responsável por tal violação, ocorrendo sempre a existência de dano não patrimonial que, pela sua gravidade, merece a tutela do direito --- artigo 496º, nº 1, do Código Civil --- mediante a condenação dos réus no pagamento de compensação a arbitrar pelo Tribunal segundo juízo de equidade.

  7. Acresce que foi provado nos autos que «40 - O autor, ao tomar conhecimento da rejeição do recurso, sentiu-se defraudado em toda a confiança que depositara no 1º réu, relativamente à condução e tratamento do litígio judicial em causa.», reconduzindo-se tal matéria, também, à existência de danos não patrimoniais na esfera do autor, cuja relevância merece, pela sua gravidade, igualmente a tutela do direito, devendo o autor ser sempre compensado pelos mesmos mediante a condenação dos réus no pagamento de compensação a arbitrar segundo juízo de equidade.

  8. Ainda que assim não se entendesse, e sem prescindir, não concorda o autor com o juízo expresso na douta sentença recorrida relativamente à existência de uma efectiva e concreta possibilidade de vir a ser revogada, pelo Tribunal Superior, a sentença proferida no âmbito dos autos que correram termos no Tribunal Judicial de Arouca.

  9. A douta sentença ora recorrida considera, nomeadamente, que a tese, defendida nas alegações apresentadas pelo 1º réu, no sentido de se verificar a existência de enriquecimento sem causa e consequente obrigação de restituição, não poderia merecer acolhimento por parte do Tribunal Superior, pois o autor, tendo alegado uma razão para a transferência patrimonial, o mútuo, não a conseguiu demonstrar, pelo que estando em discussão um negócio causal, nunca poderia ser invocada, em contradição com o motivo que se alegou, a inexistência de qualquer fundamento para a entrega dos cheques e quantias que os mesmos titulavam, isto é, a ausência de causa justificativa da transferência patrimonial, requisito necessário para a procedência do instituto do enriquecimento sem causa.

  10. Entende o autor que, para além do juízo que a douta sentença recorrida expressa quanto aos argumentos apresentados nas alegações de recurso, importa verificar se, desde logo no que respeita ao referido argumento consubstanciado na invocação do enriquecimento sem causa, se verifica, ou não, a possibilidade de o Tribunal Superior, perante tal questão, poder vir a decidir acolhendo a pretensão do autor.

  11. E, existindo essa possibilidade, ainda que mínima e podendo ser considerada a menos provável, proferir um juízo, equitativo, qualificando e quantificando essa possibilidade, condenando, em consequência, os réus, no pagamento de indemnização resultante da aplicação do índice ou percentagem que considerasse adequados.

  12. Desse modo, como se passará a fundamentar, a questão em causa, relacionada com a regra de repartição do ónus probatório relativamente ao requisito de ausência de causa justificativa do enriquecimento sem causa, que fundamentou a sentença de 1ª instância do Tribunal de Arouca (já que os restantes pressupostos, de enriquecimento da referida ré e empobrecimento do autor, decorrentes da transferência patrimonial provada, se verificam) não tem tido resposta unânime das instâncias superiores e, nomeadamente, por parte deste Tribunal da Relação do Porto que era, também, o Tribunal Superior que iria decidir o recurso interposto da sentença do Tribunal de Arouca, caso este tivesse sido admitido.

  13. Assim, em sentido que se entende contrário ao expresso na douta sentença recorrida, e, pelo menos, decorrendo dele a possibilidade de, no caso concreto, ser proferida decisão em sede de recurso acolhendo a pretensão do autor, proferiu este Tribunal da Relação do Porto, em 09.12.2010, no processo 2203/09.3TBPVZ.P1, douto acórdão (acessível na base de dados dgsi com o número de documento: RP201012092203/09.3TBPVZ.P1), por unanimidade, dando-se o mesmo como reproduzido.

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