Acórdão nº 12/09.9TAVGS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução16 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 12/09.9 TAVGS.P1 Comarca de Aveiro, Instância Central, 1.ª Secção de Instrução Criminal (J2) Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 12/09.9 TAVLG, correu termos pelo Juízo de Instrução Criminal da (entretanto extinta) Comarca do Baixo Vouga (agora, pela Instância Central da Comarca de Aveiro), B…, devidamente identificado nos autos, que requereu e foi admitido a intervir como assistente, não se conformando com o despacho de arquivamento (excepto no que tange ao arguido C…, contra o qual foi deduzida acusação relativamente a parte dos factos denunciados) com que o Ministério Público encerrou a fase de inquérito, requereu a abertura de instrução (RAI a fls. 3031 e segs.), no termo da qual foi proferida decisão instrutória de não pronúncia (fls. 3242 e segs.).

Ainda irresignado, o assistente recorreu dessa decisão para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes conclusões (em transcrição integral): 1. “A pronúncia dos arguidos não exige uma certeza da existência da infracção, mas, apenas, factos que, logicamente relacionados e conjugados, formem um todo persuasivo de indiciação dos arguidos, impondo um juízo de probabilidade do que lhes é imputado.

  1. No caso dos autos não só existem os tais indícios, como a certeza de que os arguidos praticaram os actos que lhe são imputados na participação, na acusação do MP e no requerimento de abertura da instrução.

  2. Os autos revelam que entre o dia 10 de Março de 1997 – logo a seguir à destituição do ora recorrente da gerência da D…, Lda – e até 27 de Setembro de 2001, os então sócios-gerentes, B… e o falecido E…, procederam à venda de 77 lotes de terreno para construção, declarando um preço nas escrituras inferior ao efectivo pago pelos adquirentes, de 1.040.200.000$00, com o intuito de se apoderaram das quantias resultantes de tais diferenças, as quais pertencem à empresa e aos demais sócios.

  3. E que entre 1997 e 2001, os arguidos retiraram, de forma faseada das contas bancárias da D…, Lda, quantia monetárias resultantes das vendas daqueles lotes e ainda de mais 36 lotes, estes pelo preço de 185.0000.000$00, e transferiram-nas para contas da sua esfera social, segundo plano criminoso, gizado pelos sócios-gerentes C… e E…, falecido em Setembro de 2002.

  4. Nunca aqueles gerentes, nem os ora arguidos F…, desde 2003, e G…, desde 2005, apresentaram as contas e relatórios de gestão dos exercícios dos anos de 1996 e seguintes, cujas vendas ascenderam a 1.225.200.000$00, sendo que decurso de uma perícia realizado no âmbito do inquérito judicial à sociedade, foi constado, em Julho de 2007, que a escrita da D…, Lda, só estava elaborada até a 2000, pelo foi dado prazo ao TOC, o arguido H…, para regularizar a situação, o que fez, apresentado o balanço e demonstração de resultados de 1996 a 2005.

  5. Tal “balanço” revela, no que concerne às “vendas de mercadorias-subconta-..”, que o volume de negócios nos exercícios de 1997 a 2001, dos 113 lotes, foi de 608.344.276$00, o que revela uma diferença de 616.855.724$00, em desconformidade com a realidade.

  6. Por seu turno, a subconta 255- dívidas da sociedade aos sócios” revela que foram feitos registos de empréstimos fictícios, pois inexistem comprovativos das entradas de fluxos financeiros nas contas da D…, Lda, sejam fotocópia de cheques ou de ordens de transferência sobre cintas pessoas do arguido C…, nem extractos bancários da sociedade que reflictam tais créditos.

  7. No que respeita à subconta 88-resultado líquido de exercício, revela prejuízos em 8 dos 9 anos, quando é certo que a sociedade, à data da exclusão o assistente da gerência da D…, Lda, tinha os custos com, alvarás de loteamento, realização de infra-estruturas, praticamente pagas, faltando pagar cerca de 107.500 contos e realizou mais de 1,225 milhão do contos.

  8. Os autos revelam que, em 02 de Março de 2007, os arguidos F… e G…, na qualidade de gerentes da sociedade D…, Lda, procederam à venda de um lote [prédio urbano, destinado a construção], pelo preço de €275.000,oo, tendo recebido, em pagamento, um cheque de igual montante, que endossaram ao arguido C… e que este depositou em 05 de Março de 2007, numa conta da sua esfera pessoal, como revelam a escritura do contrato de compra e venda, de fls 574 a 577 e a imagem do cheque, fls 3193.

  9. Em manobra de “dissimulação” a escritura da venda do lote foi celebrada, numa 6ª feira e em Santa Maria da Feira, a dezenas de quilómetros dos Cartórios onde foram realizadas as outras 42 escrituras de vendas dos 77 lotes, realizadas em Aveiro ou em Vagos, incluindo aquelas, em número de 4, adquiridas pelos mesmos compradores, em nome próprio ou da sua representada, e depois de horas antes, terem colhido, em Vagos, a certidão da situação registral do lote de terreno.

  10. Resulta, inequivocamente, que o cheque recebido pelos arguidos se destinou a pagar à D…, Lda o preço do lote de terreno, mas que acabou depositado na conta de esfera pessoal do arguido C….

  11. Diz-nos a experiência comum que quem procede assim está a desviar dinheiros que pertença da sociedade D…, Lda, pelo que a actuação dos arguidos F… e G… constitui a adesão e a continuação do “plano engendrado pelo arguido C… - e por que também o MP o acusou - e o falecido E….

  12. A escrituração da D…, Lda, como se disse, foi “regularizada” pelo arguido H…, nos termos referidos nas conclusões 5ª a 8ª, ou seja com a selecção dos documentos a inserir, sejam os valores das vendas realizadas, sejam os valores dos preços recebidos, o que começou a ser feito nos anos de 1997 a 2001, pelo arguido C… e E…, mas que os arguidos F… e G… sancionaram, em 2007, bem sabendo que tais registos eram desconformes à realidade.

  13. Ao fazê-lo, os arguidos F… e G… aderiram ao plano de forjar documentos e pondo em crise a segurança e a confiança do tráfico jurídico, a verdade intrínseca do documento enquanto tal.

  14. A acta nº 13, da Assembleia-geral extraordinária da D…, Lda, realizada em 29 de Setembro de 2003, relata que a arguida F… declarou “que o seu pai, ainda em vida, a pôs ao corrente da situação por que a firma passa desde a destituição da gerência do sócio B…” situação essa que é a referida nas conclusões 3ª a 5ª e que explica a razão de ser da aprovação da escrituração da D…, Lda, referida nas conclusões 6ª a 9ª.

  15. Os autos revelam que o gerente E…, cerca de 2 meses antes de falecer, procedeu ao levantamento de um depósito a prazo de €280.500,00, que certamente não gastou e de que as herdeiras, a mulher e a filha, respectivamente, as arguidas I… e F…, receberam e que teriam de se questionar, a sua origem, pois os gerentes da D…, Lda, o falecido E… e o arguido C… nunca apresentaram contas e por isso, também nunca distribuíram lucros.

  16. Do mesmo modo, as arguidas I… e F… constatariam os depósitos sucessivos naquela conta, os quais, em menos de 8 meses, somam mais de 60 mil contos, e que num só dia, em 2000, atinja os 17 mil contos, valores que só poderiam provir do plano a que se alude na conclusão 3ª, ou seja pela apropriação das quantias monetárias resultantes das vendas dos lotes da D…, Lda.

  17. A contabilidade da D…, Lda, elaborada nos termos acima referidos, revela que o arguido H…, TOC da empresa, omitiu registos dos valores reais dos 42 negócios relativos à venda dos 77 lotes.

  18. O TOC da D…, Lda ao fazer os registos nos termos referidos, e na data em que o fez, foi de acordo com os arguidos C…, F… e I…, e com o “plano engendrado” pelo arguido C… e E…, e para dissimular as saídas ilegítimas dos dinheiros da D…, Lda, a partilhados e a partilhar entre os arguidos.

  19. Inexistem quaisquer outras razões legais ou técnicas para explicar o comportamento dos arguidos.

  20. A execução do plano implicava uma “escrita” minuciosa e permanente e prolongada no tempo, com plúrimos lançamentos “deve” e “haver” para partilha das quantias desviadas da D…, Lda, o que tornava obrigatório o seu conhecimento e controlo.

  21. No plano engendrado, o arguido C… não ficava de mãos livres, antes tinha de prestar contas às herdeiras do falecido E…, passando aqueles sócios, a partir de 1987, a “partilhar” entre si a “absorção” da quota do assistente, de 33%.

  22. O arguido G…, interveniente na vida da sociedade D…, Lda, desde a Assembleia Geral de sócios, de 07-03-1997, foi indicado pelo arguido C… para o substituir na gerência, quando ele foi afastado definitivamente, pelo Ac. do STJ, nunca cumpriu as suas obrigações de apresentar as contas, apenas serviu os interesses dos sócios C… e E… e seus sucessores, o que só é inteligível pela sua participação nos proventos.

  23. O arguido H…, deveria, enquanto TOC da D…, Lda, ter interpelado os gerentes F… e G… pelo preço do lote de terreno, os € 275.000,00, pois a Administração Tributária notificou a D…, Lda do documento de cobrança do IMI e dele já não podia constar o artigo urbano 2541.

  24. A actuação omissiva do TOC e a adulteração da contabilidade da D…, Lda, nos termos que se referem nas conclusões anteriores, só é compreensível, de acordo com as regras da experiência, por via dela, retirar vantagens económicas.

  25. Os arguidos F… e G…, ao entregarem o cheque dos €275.000,00 ao arguido C… e ao não apresentarem as contas e o relatório de gestão, como era seu dever – artº 65º do CSC – logo que foram designados gerentes e ao terem sancionado “escrituração” que consta a fls. 23 e sgs. agiram de acordo com o plano engendrado.

  26. Impõem decisão diversa da recorrida, os documentos discriminados em V.1.1.1 a V.1.6.1.1, e a evidente contradição entre o que é atestado nestes documentos e o que consta do despacho de não pronúncia.

  27. A decisão instrutória recorrida violou o disposto nos artºs 283º nº 2 e 127º do CPP, as quais deveriam se interpretadas no sentido de que consta nos pontos 50 e 52”.

* Admitido o recurso e notificados os sujeitos processuais por ele afectados, quer o Ministério Público...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT