Acórdão nº 2593/16.1T8VFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelJUDITE PIRES
Data da Resolução23 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 2593/16.1T8VFR.P1 Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo Central Cível de Santa Maria da Feira Relatora: Judite Pires 1ºAdjunto: Des. Aristides de Almeida 2ª Adjunta: Des. Inês Moura Acordam no Tribunal da Relação do Porto:I. RELATÓRIO.

  1. B…, casado, Nif. n.º ………., e mulher, C…, casada, Nif. nº ………, ambos com domicílio na Rua …, … – …, …. - … …, concelho de Santa Maria da Feira, propuseram acção
declarativa com processo comum, contra: 
 a) BANCO D… S.A., pessoa coletiva com o NIPC º ………, com capital social de 6.084.695.651,06 euros, com sede social na Rua …, .. - …, …. - … Lisboa, b) E… S.A., pessoa coletiva com o NIPC ………, com sede na Avenida …, …, …. - … Lisboa, c) F…, pessoa coletiva de direito público, 
com sede junto do Banco de Portugal, à Rua …, …, …. - …, 
em Lisboa.

    Formulam os Autores os seguintes pedidos: - Sejam os RR. solidariamente condenados a reconhecer que os AA. constituíram dois depósitos a prazo comercialmente designados por D1… e D2…, no valor global de 200.000,00€ e consequente restituição do capital investido, respectivos juros contratuais e juros de mora vencidos desde as respectivas datas de vencimento (03.02.2016 e 26.05.2016, respectivamente) e juros vincendos até efectivo e integral pagamento; - subsidiariamente, a declaração de nulidade de actos praticados pelo D… no contexto da intermediação financeira dos investimentos em causa no processo, bem como a nulidade da operação de intermediação financeira realizada e a consequente condenação solidária dos Réus na restituição do capital e juros investidos; - ainda subsidiariamente, no caso de se considerarem válidas as aplicações financeiras subscritas pelos AA. em acções preferenciais, através da intermediação financeira do D…, a condenação do D… a indemnizar os Autores por violação dos deveres legais aplicáveis à actividade de intermediação financeira; e - em qualquer dos casos, a condenação solidária dos RR. no pagamento de uma indemnização no valor de 5.000,00€ a cada um por danos não patrimoniais.

    No que concerne ao R. F…, os AA. alicerçam as suas pretensões na seguinte realidade alegada:
 - “Por força de uma medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal (doravante “BdP”) ao Banco D… (bem como empresas do Grupo D…), em 3 de agosto de 2014, a conta dos AA. no D… passou para o E… (“E…”) de que é único accionista o F…, a qual manteve o mesmo número (…. …. ….).”; - “Por força da medida de resolução adotada pelo BdP, a relação jurídica entre a A. e o D… foi ‘cedida’ a benefício do E…, que é controlado pelo R. F…, em que são únicos intervenientes o BdP e o Ministério das Finanças”; e - “O único acionista do E… é, por essa razão, o responsável máximo pelas relações jurídicas confiscadas e pelos prejuízos derivados dessa sub-reptícia “‘cessão de créditos’”.

    Na sua contestação o R. F… excepcionou a incompetência material dos Tribunais Judiciais para conhecerem desta acção, alegando, para tanto e em síntese, que: - Pertence à jurisdição administrativa e fiscal a competência para dirimir litígios nos quais sejam conjuntamente demandadas entidades públicas e particulares entre si ligados por vínculos jurídicos de solidariedade, como os AA. fazem no caso em apreço; - Embora não seja clara a causa de pedir formulada pelos AA., ainda que se trate de um caso de responsabilidade extracontratual, sendo o F… uma pessoa colectiva de direito público, também a competência pertenceria à jurisdição administrativa e fiscal; - Porém, ainda que se tratasse de um caso de responsabilidade contratual, a responsabilidade do F… sempre seria fundada em normas de direito administrativo, sendo por isso igualmente a competência da jurisdição administrativa e fiscal; Conclui pugnando pela procedência da excepção dilatória de incompetência absoluta dos tribunais judiciais em razão da matéria e, em consequência, que seja absolvido da instância.

    Os AA. B… e C… responderam, para, em síntese, sustentarem: - O litígio em causa tem natureza jurídico-privada, independentemente da natureza jurídica do R. F…; - A responsabilidade deste R. radica em última análise nos próprios negócios e relações jurídico-privadas subjacentes à causa de pedir pelos quais são responsáveis os demais RR. (violação das normas de contrato de depósito irregular), actuando por isso numa esfera de direito privado.

    Terminam pugnando pela improcedência da excepção em apreço.
 Foi proferida decisão que, conhecendo da invocada excepção da incompetência absoluta, julgou a mesma procedente, absolvendo da instância os Réus, declarando que a competência em razão da matéria para conhecer do presente litígio cabe aos Tribunais Administrativos e Fiscais.

  2. Não se resignaram os Autores com tal decisão, pelo que dela interpuseram recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões: A. Os Autores, aqui recorrentes, peticionaram que se julgasse a ação procedente, por provada, e: a) fossem os RR. condenados, solidariamente, a reconhecer que os AA. constituíram dois depósitos a prazo, comercialmente designados por D1…e D2…, na quantia global de €200.000,00 (duzentos mil euros), devendo, em consequência, ressarcir os AA. desta quantia acrescida de juros contratuais, juros de mora vencidos desde a data de vencimento de cada um, respectivamente, 03/02/2016 e 26/05/2016 e juros vincendos até efetivo e integral pagamento; caso assim não se entendesse, b) fossem declarados nulos todos os atos praticados pelo 1o R. na aplicação do dinheiro dos AA. para aquisição de ações preferenciais, bem como, nula a operação de intermediação financeira realizada, condenando-se, assim, os RR., solidariamente, a ressarcir, os AA., da quantia de €200.000,00 (duzentos mil euros), reconstituindo-se a situação de facto à data da aplicação daquela quantia e, devendo esta quantia ser depositada na conta de depósito à ordem da titularidade dos AA., em virtude do contrato de depósito irregular celebrado com o 1º R. e transmitido para o 2º R.; Caso assim não se entendesse: c) Considerando-se válida a aplicação da quantia de €200.000,00 (duzentos mil euros), pelos AA., em ações preferenciais denominadas D1… e D2…, fosse o 1o R. condenado a indemnizar os AA., por violação dos deveres atinentes à atividade de intermediação financeira, nos termos do art.o 483º e ss. do Código Civil e 304º- A e ss. do Código dos Valores Mobiliários; d) devendo ainda os RR. ser solidariamente condenados ao pagamento do valor de €5.000,00 (cinco mil euros) a cada um, a título de danos não patrimoniais.

    B. Por força da medida de resolução decretada por deliberação do BdP, em 3 de agosto de 2014, a relação jurídica contratual entre a recorrente e o D… foi transferida para o E…, a par de um conjunto de ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais, operando uma verdadeira sucessão de direitos e obrigações.

    C. Vem o presente recurso interposto da sentença notificada em 22/03/2017 que julgou “(...) que a competência em razão da matéria para conhecer do presente litígio cabe aos Tribunais Administrativos e Fiscais, pelo que se verifica a excepção dilatória de incompetência absoluta, em razão da matéria, absolvendo-se, em consequência, os RR. da instância (cfr. art. 96º, al. a), 98º e 278º, nº 1 al. a), todos do C.P. Civil).” D. À exceção da incompetência material encontra-se subjacente a tese da incompetência material do tribunal a quo para conhecer do mérito da causa, porquanto o F… é pessoa coletiva de direito público e que, por esse motivo, estaria sujeito à jurisdição administrativa.

    E. Os RR. nas respetivas contestações efetuaram uma interpretação relativamente correta da causa de pedir, no sentido de que os AA. pretendem que, no quadro de uma relação contratual (contrato de depósito irregular celebrado com o R. D… transmitido para o R. E…) seja declarada a nulidade dos seus investimentos, por estar convicto de que esses mesmos investimentos reuniam e assentavam em determinadas características (segurança, isenção de risco e serem equivalentes a depósitos a prazo), quando, e na verdade, por culpa e responsabilidade que não lhes é imputável, investiram em ações preferenciais, comercialmente designadas por “D2…” e D3…”.

    F. É precisamente esta teorização que os AA., aqui recorrentes, propugnam, quando vertem na sua p.i. que o F…, enquanto único acionista do R. E… e responsável máximo pelas relações jurídicas e pelos prejuízos da sub-reptícia cessão de créditos, deve ser condenado, a título subsidiário, no pagamento dos depósitos que aquele tinha junto do D….

    G- De acordo com o entendimento perfilhado pelos AA. nesta ação, a responsabilidade subsidiária do F… baseia-se na relação de natureza jurídico-privada do presente litígio. Tem-se por assente que a presente ação não tem por objeto qualquer relação jurídica administrativa.

    H- Tão pouco está em causa na demanda a prática pelo F… de qualquer ato jurídico cuja...

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