Acórdão nº 1627/15.1T8PVZ-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução27 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1627/15.1T8PVZ-A.P1 Sumário do acórdão: Incumbe a quem invoca o pacto atributivo de jurisdição nos negócios internacionais, a prova dos requisitos enunciados nas alíneas do n.º 1 do artigo 25.º do Regulamento (EU) n.º 1215/2012 do Parlamento e do Conselho, de 12.12.2012.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 30.11.2015, B…, Lda., intentou contra C…, na Secção Cível da Instância Central da Póvoa de Varzim, da comarca do Porto, ação declarativa de condenação com processo comum, pedindo a condenação da ré no reconhecimento da legalidade da resolução do contrato de compra e venda de equipamento industrial, na restituição do valor entregue a título de preço e no pagamento de indemnização por alegados danos.

Na contestação, a ré invocou a incompetência internacional do tribunal, alegando que a mesma incumbe ao tribunal de Antuérpia.

Em 30.11.2016, foi proferido despacho com o seguinte dispositivo, no que respeita à exceção dilatória em apreço: «Sendo assim, julga-se improcedente a excepção de falta de jurisdição dos tribunais portugueses e considera-se internacionalmente competente a presente instância central cível do Tribunal da Comarca do Porto».

Não se conformou a ré, e interpôs o presente recurso de apelação, apresentando alegações, findas as quais formula as seguintes conclusões:

  1. Nestes termos, nunca poderia ter sido julgada improcedente a exceção da falta de jurisdição dos tribunais portugueses, devendo, pelo contrário, ter sido a mesma julgada procedente por provada, razão pela qual o despacho recorrido violou as normas jurídicas dos artigos 25º do Regulamento Comunitário 1215/2012 da Comissão e 94º do cód. proc. civ..

  2. A nota de encomenda e a fatura juntas pela recte. à contestação, com as respetivas páginas das condições gerais, não foram, quando podiam ter sido, impugnadas pela recda..

  3. A recda. nunca esteve impedida de se pronunciar sobre aspetos de completude, veracidade dos documentos ou inserção de cláusulas, mesmo que não compreendesse o seu conteúdo (o que por mera hipótese se admite, sem conceder).

  4. Nos termos do artigo 134º do cód. proc. civ., apenas mediante ordem do Tribunal, oficiosa ou a requerimento, é que as traduções têm de ser juntas, o que significa que apenas era lícito à recda. relegar os aspetos relacionados com o objeto da tradução, ou seja, o conteúdo dos documentos, para momento posterior à apresentação das traduções.

  5. Não tendo a recda. impugnado os documentos apresentados pela recte., que estavam acompanhados das condições gerais, é óbvio que não podia o Tribunal a quo dar como provado que nenhum dos dois documentos estava acompanhado das condições gerais, devendo, em vez disso, o Tribunal a quo ter considerado procedente por provada a exceção deduzida pela recte., considerando os Tribunais Portugueses incompetentes para julgar o caso em apreço.

  6. Nos termos do número 1 do artigo 446º do cód. proc. civ., a recda. tem 10 (dez) dias após a junção dos documentos para arguir a alegada inserção de declarações divergentes do ajustado com o signatário, pelo que, não o tendo feito em tempo, já não o podia fazer através do requerimento que apresentou no dia 20.06.2016.

  7. A recte. juntou aos autos por requerimento de 9.9.2016, os ficheiros informáticos do e-mail onde foi enviada a nota de encomenda, provando assim que foram enviadas para a recda., não só a página que contém a assinatura, mas também as condições gerais que constam do ficheiro informático como anexo.

  8. O Tribunal erra ao decidir que os documentos apresentados não são bastantes e não faz sentido que diante dessa alegada insuficiência, não permita que seja produzida prova testemunhal com vista a esclarecer a questão do envio à recda. das condições gerais com a nota de encomenda e com a fatura.

  9. A prova testemunhal que deve ser produzida não irá ser contra documentos, nem em vez de documentos, tratando-se apenas de saber se os documentos foram enviados completos ou não à recda..

  10. O despacho recorrido não pode conhecer da exceção a favor da recda. sem admitir prova testemunhal, o que se traduz numa nulidade processual nos termos do artigo. 195º do cód. proc. civ..

  11. Não se pode ignorar que a página da assinatura da nota de encomenda, em mais do que um sítio, adverte de forma visível e clara para a existência de condições gerais que regulam o contrato celebrado, contendo ainda uma declaração do responsável da recda. em como este leu e aprovou as mesmas.

  12. Não fará sentido argumentar-se que se trata de uma folha num verso de uma página uma vez que isso não faz sentido num documento enviado por via eletrónica, onde não há frentes e versos, mas sim números de páginas.

  13. Considerando que toda a troca de correspondência com vista à aquisição da máquina teve lugar em língua inglesa, não poderá pôr-se em causa que a recda. não percebia ou que não entendia a língua em que estavam escritos os documentos, ou seja, a língua inglesa.

  14. Os termos e condições gerais do negócio eram do conhecimento da recda., tanto mais que foram enviados em datas diferentes, ou seja, em 27/04/2015 e em 4/05/2015.

  15. A autoria da assinatura da recda. em como tinha lido e aceitado condições gerais da nota de encomenda enviada pela recte. nunca foi posta em causa, o que faz com que se deva considerar demonstrado ter havido efetivo conhecimento e aceitação das mesmas, tendo o Tribunal a quo errado na avaliação da prova de que dispunha.

  16. Em face da declaração da recda. em como as condições gerais tinham sido lidas e aceites, o Tribunal a quo devia ter considerado procedente por provada a exceção deduzida pela recte., considerando os Tribunais Portugueses incompetentes para julgar o caso em apreço.

  17. O regime das cláusulas contratuais gerais não se aplica ao caso em apreço por estar excecionado pelo disposto na alínea b) do artigo 3º do DL 446/85, de 25 de Outubro, uma vez que a cláusula que fixa a jurisdição dos tribunais belgas resulta da aplicação do Regulamento Comunitário 1215/2012, da Comissão Europeia, decorrente do Tratado de Adesão à União Europeia vigente em Portugal.

  18. Sendo a lei Belga competente para julgar esta questão, não se pode aplicar a lei portuguesa, nomeadamente o diploma das cláusulas contratuais gerais à regulação do contrato celebrado entre a recte. e a recda..

  19. Não é concebível que se aplique um diploma legal de um Estado na interpretação de cláusulas que vão determinar se é a lei desse Estado a aplicável ou a lei estrangeira ao abrigo de um regulamento comunitário, porque isso significaria antecipar o resultado da aplicação num momento anterior ao da fixação da lei aplicável.

  20. Havendo uma cláusula que ao abrigo de um diploma internacional determina a aplicação de uma lei estrangeira, no caso a lei Belga, não se pode recorrer à lei portuguesa para evitar ou impedir esse resultado.

  21. As normas utilizadas pelo Tribunal a quo para julgar competentes os tribunais portugueses, designadamente o diploma das cláusulas contratuais gerais, são ainda inaplicáveis por força da al. b) do art. 3º desse diploma pelo facto de a escolha dos tribunais ser feita ao abrigo de tratado internacional.

  22. Mesmo que as normas sobre as cláusulas contratuais gerais fossem aplicáveis ao caso, o que por mera hipótese se admite, sem conceder, não há nenhuma norma do respetivo diploma que proíba o pacto atributivo de competência, o que aliás sempre seria violador do direito internacional.

  23. Nestes termos, nunca poderia ter sido julgada...

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