Acórdão nº 2608/16.3T8MTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 02 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARAVALHO
Data da Resolução02 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 2608/16.3T8MTS.P1 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 952) Adjuntos: Des. Jerónimo Freitas Des. Nelson Fernandes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, S.A.

, intentou a presente ação declarativa de simples apreciação, sob a forma de processo comum, contra C…, pretendendo que “seja reconhecida a existências do motivo justificativo a fim de a autora poder proferir a decisão sobre o pedido de atribuição de horário flexível efetuado pela ré”.

Para tanto alega que: A Ré apresentou em 11.01.2016 um pedido no sentido de obter autorização para trabalhar no regime de horário de trabalho flexível, com entrada às 10h00 e saída às 20h30 de segunda-feira a domingo, sem prejuízo do regime de folgas praticado; a autora comunicou-lhe por carta de 22.01.2016 a intenção de recusa de tal pedido, tendo a ré respondido a 29.01.2016 mas sem se pronunciar sobre a proposta de passar a trabalhar em part-time, e que tendo requerido parecer prévio à Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), o mesmo foi desfavorável à decisão de recusa da autora.

Como fundamento para a recusa da atribuição do horário flexível, alegou então a autora e agora reitera na petição inicial, em síntese que a loja onde a ré presta atividade tem horário de abertura entre as 10h e as 24h, que é constituída por uma equipa de 15 trabalhadores que integram as várias categorias de equipas existentes na loja, que o número de trabalhadores existentes no estabelecimento, a soma das respetivas cargas horárias e a forma como se encontram distribuídas e organizadas pelos diferentes turnos e equipas são essenciais para garantir o período de abertura da loja, de segunda-feira a domingo e o exercício de todas as tarefas da loja, inexistindo na secção de vendedores de homem um horário diurno de 40 horas semanais.

Frustrada a conciliação em sede de audiência de partes a ré contestou, alegando que nenhuma razão inultrapassável é apresentada pela autora para negar o horário solicitado, tanto mais que a ré passa grande parte do seu horário de trabalho no armazém e não na venda direta ao cliente, só indo á secção de homem normalmente para repor roupa, que demonstrou abertura para cumprir um horário das 12h às 21h, bem como ir para outra loja, mesmo de outra marca do grupo ou para outro Shopping, não tendo aceite a passagem a part-time porquanto sendo a única pessoa a ganhar para sustentar o seu filho não teria com o salário a receber condições de sobrevivência.

Proferido despacho saneador tabelar, dispensada a seleção da matéria de facto, fixado à ação o valor de €30.000,01, realizada a audiência de julgamento e decidida a matéria de facto, foi proferida sentença, que julgou a ação improcedente e, em consequência, decidiu não reconhecer a existência de motivo justificativo para a A. recusar a atribuição de horário flexível efetuada pela Ré.

Inconformada, a A. veio recorrer, tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: “I – Existe motivo justificativo para a apelante poder proferir decisão sobre o pedido que lhe apresentou a apelada, no sentido de ser autorizada a trabalhar no regime de horário flexível.

II – O horário de abertura da loja onde a apelada exerce a sua atividade profissional é das 10h às 24 horas.

III – Para assegurar o funcionamento do aludido estabelecimento, dentro do referido horário de abertura (das 10h às 24 horas, a apelante dispõe de uma equipa composta por 15 (quinze) trabalhadores, que integram as várias equipas existentes na loja.

IV – As várias equipas existentes na loja são: - 3 encarregados (com horários rotativos (das 10h às 15h e das 15h à 1h, organizados de forma a garantir a presença de, pelo menos um, na abertura do estabelecimento e outro no seu fecho (D…, E… e F...; - 2 coordenadores com horário diurno semanal de 40 horas, das 10h às 15 horas (G… e H…); - 6 vendedores da secção de senhora, todos a tempo parcial: N…, das 10h às 15h; I…, J… e K… das 20h à 1; L…, das 12h às 21 e M… das 15h à 1h.

- 2 vendedores da secção de homem, sendo um (a apelada) do horário noturno, de 40 horas semanais, e outro do horário diurno, 25 horas semanais, O…; - 1 responsável da secção de homem, horário diurno, 40 horas semanais, das 10h às 20 horas, P…; - 1 caixa central – horário noturno, 40 horas semanais, das 15h à 1 hora, Q….

V – Os horários são organizados de modo a que seja assegurada a presença de um maior número de trabalhadores na loja, nas horas e dias em que se verifica um maior volume de vendas, bem como nos dias de maior venda (sábado e domingo), tendo ainda como critério a racionalização de recursos humanos e distribuição de tarefas, de acordo com o número de horas orçamentadas para a loja.

VI – As horas de maior venda entre segunda a sexta-feira registam-se entre as 15 horas e as 22 horas.

VII – O Horário da apelada, é de 40 horas semanais, com entrada às 15h e saída à 1 hora e excecionalmente, à quinta-feira, das 16h à 1:00 hora, com folga fixa à quarta-feira e rotativa à sexta-feira, sábado ou ao domingo.

VIII – Se a apelante atribuísse à apelada o horário de trabalho por ela requerido, iria fazer com que houvesse um menor número de trabalhadores na loja nas horas em que se verifica um maior volume de vendas e houvesse um reforço de trabalhadores nas horas de menor venda, colocando em causa o normal funcionamento do estabelecimento.

IX – Obrigando à contratação de um trabalhador a tempo parcial, para cobrir o horário noturno da apelada entre as 20:30 e a 1hora, ou, então solicitar aos outros trabalhadores da loja a prestação de trabalho suplementar, o que levaria a um aumento substancial das horas orçamentadas mensalmente para aquela loja.

X – O que levaria a um aumento de custos avultados com pessoal, com reflexos na rentabilidade do estabelecimento.

XI – A atribuição do horário nos moldes requeridos pela apelada, colide com o direito da apelada ao livre exercício da iniciativa económica privada e à liberdade de organização empresarial, plasmado nos artigos 61.º e 80.º, n.º 1, alínea c) da CRP, pondo em causa interesses imperiosos do funcionamento da empresa.

XII – Colocando, ainda, em causa o poder de direção da apelante, na medida em que lhe compete estabelecer os termos em que o trabalho deve ser prestado (artigo 97.º do CT/2009).

XIII – A apelante ofereceu à apelada um horário de 25 horas semanais, com entrada às 15:00 e saída às 20:00 horas, de forma a permitir-lhe conciliar a sua vida profissional com a vida familiar, que a segunda não aceitou.

XIV – E tentou, ainda, uma troca de horários com dois trabalhadores do horário diurno (N… e O…), mas estes, por motivos também familiares, não aceitaram.

Pelo exposto, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser concedido provimento ao presente recurso, proferindo-se decisão diversa da recorrida sobre o mérito da presente ação, reconhecendo-se a existência do motivo justificativo para a ora apelante recusar a atribuição do horário flexível requerido pela apelada, (…)”.

A Recorrida contra-alegou, tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: “1. Tendo ficado provado o “mapa de vendas” por hora, na Loja da Recorrida, provou-se que no horário por esta solicitado o grupo de horas com maiores vendas estaria abrangido; 2. Provou-se, também, que se a este facto acrescer as 2 horas para a refeição, que no horário que faz incluem, sempre, horas de grandes vendas, o que não sucede de manhã (entre as 12h e as 14h, por exemplo) nenhum prejuízo advêm para a Recorrente; 3. Provando-se que existem 15 trabalhadores na Loja da Recorrente e que com o novo horário não era necessário contratar outro, 4. Provou-se que podia outro trabalhador que só faz manhã passasse a fazer o horário da Recorrida.

  1. Nenhuma razão se provou que impeça a Recorrente de atribuir o horário solicitado à Recorrida.

  2. Bem decidiu a Douta Sentença ao negar a pretensão da Recorrente.

    Termos em que deve ser negado provimento ao Recurso e ser confirmada a Douta Sentença proferida, (…)”.

    O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que não se deve conhecer do recurso apresentado por: nas conclusões, a Recorrente “limita-se a indicar as razões pelas quais entende que lhe devia ter sido reconhecida a existência dos motivos que alega para a recusa em causa, sem fazer qualquer crítica concreta à matéria de facto dada como provada”, pretendendo, “sem mais, uma decisão contrária àquela que que resultou da matéria de facto dada como provada, e que determinou o sentido da douta sentença”, não tendo as conclusões que a Recorrente retira “qualquer ponto de ligação com o que foi efectivamente dado como provado” na sentença recorrida, sendo que não foi dado cumprimento ao disposto no art. 640º do CPC. Tal parecer, notificado às partes, não foi objeto de resposta.

    ***II. Decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância Na 1ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade: “1) A autora e a ré celebraram a 24/10/2008 um contrato de trabalho, através do qual a trabalhadora exerce as funções de 2ª caixeira na loja B… sita no Centro Comercial S…, em …, estado adstrita ao horário de trabalho das 15h à 1h e excepcionalmente, á quinta-feira, das 16h à 1h, com folga fixa à quarta-feira e rotativa à sexta-feira, sábado ou ao domingo.

    2) A ré, por ter a seu cargo o seu filho menor, à data de 4 anos, apresentou um pedido à autora com a data de 08/01/2016 e recepcionada no dia 11/01/2016, no sentido de obter autorização para trabalhar no regime de horário de trabalho flexível, com entrada às 10h e saída às 20h30 de segunda-feira a domingo, sem prejuízo do regime de folgas praticado.

    3) Por carta datada de 22/01/2016, a autora comunicou à ré que tencionava recusar atribuir-lhe o horário de trabalho requerido, tendo invocado, em síntese, os seguintes motivos: i) a loja onde a trabalhadora presta atividade tem horário de abertura entre as 10h e as 24h; ii) A loja é constituída por uma equipa de 15...

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