Acórdão nº 2325/15.1T8MTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 02 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelNELSON FERNANDES
Data da Resolução02 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação 2325/15.1T8MTS.P1 Autor: B… Ré: C… e outras.

Relator: Nélson Fernandes 1º adjunto: Des. M. Fernanda Soares 2º adjunto: Des. Domingos José de Morais Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório 1.

A autora, B… na Póvoa do Varzim, intentou a presente acção declarativa com processo comum emergente de contrato de trabalho contra C…, com sede na Maia, C1…, C2…, C3… e C4…, SA, formulando os seguintes pedidos: - Que seja declarada a ilicitude do contrato de cedência ocasional, por violação do artigo 289.º, n.º 1, al. d), 290.º, n.º 1, al. d) (por referência à duração real), todos CT e, em conformidade, válida a opção da autora nos termos do art. 292.º CT, condenando a ré C… a reconhecer a autora como sua trabalhadora da desde 3 de Fevereiro de 2015 e reintegrá-la, no mesmo posto de trabalho, no mesmo local, com a mesma categoria profissional e com a retribuição contratada. Ou, caso assim não entenda, - Que seja declarada a verificação de pluralidade de empregadores, condenando as rés em conformidade e, por violação do disposto no artigo 101.º CT e observando a opção da autora, condenando a ré C… a reconhecer a autora como sua trabalhadora da desde 3 de Fevereiro de 2015 e reintegrá-la, no mesmo posto de trabalho, no mesmo local, com a mesma categoria profissional e com a retribuição contratada.

Mais requer, em qualquer caso, - A condenação solidária das rés no pagamento de €48.288,00 (quarenta e oito mil, duzentos e oitenta e oito mil euros), relativos às diferenças salariais entre Junho de 2009 e Janeiro de 2015, decorrentes da redução da remuneração da autora, e com influência nos Subsídios de Férias e Natal e Isenção de Horário de Trabalho subsequentes, acrescidos do juro à taxa legal até completo e integral pagamento; - Que as rés sejam condenadas a reconhecer a categoria profissional da autora de Coordenadora Comercial na Região entre o Douro e Minho; e, ainda, - Que as rés sejam condenadas a pagar uma compensação por danos morais à autora, em montante a liquidar oportunamente, em montante nunca inferior a €30.000,00 (trinta mil euros), o qual deverá ser provisoriamente fixado.

- Que fixe, desde já, uma sanção pecuniária compulsória na eventualidade de não cumprimento da decisão proferenda, à taxa não inferior a €750 (setecentos e cinquenta euros) diários a cada ré, atendendo à situação económica e patrimonial das rés, a reverter em partes iguais para a autora e para o orçamento da Autoridade para as Condições do Trabalho, sem prejuízo das demais cominações legais.

  1. Frustrada a conciliação em sede de audiência de partes, as Rés contestaram, por impugnação, deduzindo ainda a Ré C4…, reconvenção, na qual pede que seja declarada a cessação do contrato de trabalho entre Autora e Ré.

  2. Seguindo os autos os seus termos subsequentes, proferido que foi o despacho de saneamento, veio depois a procedeu-se à realização da audiência de julgamento, fixando-se a matéria de facto provada, que não foi então objecto de reclamação, para, por fim, ser proferida sentença, de cujo dispositivo consta: “Pelo exposto, julga-se a presente acção improcedente por não provada e absolvem - se as Rés dos pedidos contra elas formulados. Mais se julga procedente o pedido reconvencional formulado pela Ré C4…, S.A. e declara-se que o contrato de trabalho entre Autora e Ré cessou, por denúncia, com efeitos a partir de 3 de Fevereiro de 2015.

    Custas da acção e da reconvenção a cargo da Autora.

    Notifique e registe.” 3.1.

    Não se conformando com o assim decidido, apelou a Autora, tendo rematado as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas: I. - O facto provado “11. Uma vez seleccionada e integrada nas suas funções, a Autora assinou o seu contrato de trabalho, datado de 01.04.2008.” deve ser modificado para: “ 11. Após seleccionada e integrada nas suas funções nos exactos termos propostos cfr. supra 9. da matéria de facto provada, em data não concretamente apurada mas entre Julho e Agosto de 2009, assinou um contrato de trabalho datado de 01.04.2008.” II. - A prova que impõe esta modificação é a conjugada nos documentos juntos na petição inicial e não impugnados a fs 135 (Mºmo interno com as condições do novo contrato a celebrar entre a recorrida C4…, SA e a recorrente, nas quais consta Salário Base - 1.450€ Suplemento e IHT - 25% remuneração) e documentos a fs. 146 a 149 (recibos do ordenado onde consta estas duas parcelas remuneratórias), coadjuvado não só pelas mais elementares regras da experiência comum, como ainda pelo depoimento de D…, às 10h23m, dia 14.03.2016, gravado na acta do mesmo dia com a menção “O seu depoimento ficou registado no sistema de gravação “Habilus” entre as 10:23:58 e 10:59:03 horas, que disse, aos 3m do seu depoimento, quando lhe é perguntado se se recorda dos valores contratados para a recorrente diz: “não tenho presente” [se se se recorda de alguma alteração nos recibos de vencimento da recorrente] “não estou a perceber qual a alteração a que se refere”. [… houve uma] “necessidade contabilística” e aos 4m30s do seu depoimento, “isso ultrapassa-me, foi a empresa...” III. - Em Julho de 2009 houve uma alteração, nos termos da qual a recorrente que auferia €1450 (mil quatrocentos e cinquenta euros) de remuneração base acrescidos de €362,50 de compensação pela Isenção de Horário de Trabalho, correspondentes a 25% daquela, a qual violou o art. 129.º, n.º 1, al. d) do Código de Trabalho.

    IV. - Com efeito, o princípio da irredutibilidade da retribuição proíbe a redução, à margem do que a Lei consigna, da retribuição do trabalhador.

    V. - É verdade, contudo, que tal proibição não impede que haja, com o acordo do trabalhador, modificações às componentes salariais, desde que tais modificações não tenham como objectivo a fraude à lei, isto é, a redução da retribuição.

    VI. - A substituição de parte do salário base, o qual serve de base de cálculo para determinar, entre outros, a compensação ou indemnização em caso de cessação do contrato de trabalho, o montante devido pelo trabalho nocturno, suplementar ou isenção de horário de trabalho é ilícito por violar o art. 129.º, n.º 1, al. d) do Código de Trabalho.

    VII. - Poder-se-ia ponderar a sua alteração para um salário misto, jamais contudo, para nele se incluírem outras prestações que se impõem majoradas, assim eliminando tais majorações, tais como trabalho nocturno ou isenção de horário de trabalho.

    VIII. - Não podem restar dúvidas que houve redução do salário da recorrente, pois que ela auferiu, desde a contratação até ao final do primeiro ano, €1450 (mil quatrocentos e cinquenta euros) mensais, acrescidos de €362,50 (trezentos e sessenta e dois euros e cinquenta cêntimos), passando a receber de salário base apenas €947 (novecentos e quarenta e sete euros).

    IX. - Aceitar que o empregador divida a retribuição base em parcelas, que mais adiante podem ser retiradas ao trabalhador, traduzir-se-ia numa flagrante violação da lei, ao permitisse a redução, por via indirecta e a dois actos, da sua retribuição.

    X. - Convém ter presente que é esse mesmo o objectivo e para tal convicção basta contrapor os documentos a fs. 336 e aqueles a fs 337 a 341 para confirmar a redução de tal componente salarial que, como foi já afirmado pela recorrida, se insere no número 1 do art. 260.º do Código de Trabalho e é tendencialmente progressiva com vista a ser eliminada tal componente! XI. - Deste modo, só poderá concluir-se pela violação do art. 129.º, n.º 1, al. d) do Código de Trabalho, declarando-se em conformidade ineficaz a redução da remuneração base e, consequentemente, da retribuição por isenção de horário de trabalho, condenando-se as recorridas a pagar à recorrente as diferenças patrimoniais daqui decorrentes.

    XII. - O contrato de cedência ocasional foi pré-elaborado pelas recorridas e disponibilizado à recorrente para o assinar, tal como resulta das regras da experiência comum e mesmo do “Regulamento de Admissões e Mobilidade Interna - SICAM” a fs 117.

    XIII.- “O empregador deve informar o trabalhador sobre aspectos relevantes do contrato de trabalho.” (art. 106º, n.º 1 do Código de Trabalho), muito em especial, que o contrato de cedência ocasional que: “A duração da cedência não exceda um ano, renovável por iguais períodos até ao limite máximo de cinco anos” (art. 289.º, n.º 1, al. d) do Código de Trabalho), o que justifica amplamente a referência ao termo 'renovável' no contrato.

    XIV. - O princípio favor laboratoris, norteador da aplicação das normas laborais, que decorre das razões da sua autonomização, é vital no reequilíbrio das posições dos sujeitos do contrato de trabalho, desenvolvendo-se como critério de prevalência na aplicação de normas.

    XV. - Para o prof. Jorge Leite, a norma típica do ordenamento jus laboral era constituída “por uma regra jurídica explícita impositiva e por uma regra jurídica implícita permissiva, vedando aquela qualquer redução dos mínimos legalmente garantidos e facultando esta a fixação de melhores condições de trabalho…” e, expresso à data dos factos no art. 4.º do Código de Trabalho, está agora implícito no seu art. 3.º.

    XVI. - Aliás, acrescenta o prof. António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, Almedina 11.ª Edição, pag. 118, deve este princípio ser o ponto de partida para a interpretação da lei laboral "...aquelas que exprimem uma ingerência absoluta e inelutável da lei na conformação da relação jurídica de trabalho, por forma tal que nem os sujeitos do contrato podem substituir-lhes a sua vontade, nem os instrumentos regulamentares hierarquicamente inferiores aos que as contêm podem fazer prevalecer preceitos opostos ou conflituantes com elas.

    XVII. - O favor laboratoris desempenha pois a função de um prius relativamente ao esforço interpretativo, não se integra nele. É este o sentido em que, segundo supomos, pode apelar-se para a atitude geral de favorecimento do legislador - e não o de todas as normas do direito laboral serem realmente concretizações desse favor e como tais deverem ser...

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