Acórdão nº 455/14.6TBGDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Dezembro de 2017
Data | 14 Dezembro 2017 |
Órgão | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 455/14.6TBGDM Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo central cível do Porto - Juiz 4 Acórdão Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B..., casado, reformado, residente na Rua ..., n.º .. – ....-... ..., intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra C..., advogado, com domicílio profissional no ..., nº .., 1º D.to Frente – ....-... ..., Gondomar, pedindo a condenação do mesmo a pagar-lhe a quantia de €70.495,07 e respetivos juros de mora.
Alegou, para tanto e em síntese, que, na sequência de um processo executivo em que foi executado, foi o réu nomeado seu patrono oficioso. Nesse âmbito, não recorreu de uma decisão do juiz do processo de execução que considerou indemonstrado o pagamento da quantia exequenda, o que ditou a venda judicial do imóvel de sua pertença e que havia sido penhorado à ordem dos autos de execução. Por via disso padeceu diversos danos, patrimoniais e não patrimoniais, que identificou e cujo ressarcimento peticionou.
Citado, contestou o réu, excecionando a sua ilegitimidade, mercê da existência de um contrato de seguro de responsabilidade civil, e alegando que a sua intervenção no processo de execução foi sempre pautada pela defesa dos interesses dos executados, mas eles assumiram uma estratégia de mentiras, tentando convencer o tribunal de que a quantia exequenda estaria paga, aproveitando um erro informático do banco exequente. O autor bem sabe que não pagou a quantia exequenda e que inexistia qualquer fundamento para a extinção da instância executiva. Pediu a sua condenação como litigante de má fé em multa e indemnização a seu favor de 50.000,00 euros. Além disso, recorreu da decisão prolatada no processo executivo, mas o recurso foi tido por extemporâneo.
Foi proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, que foi corrigida.
Foi admitida a intervenção acessória provocada da seguradora, a qual excecionou a sua ilegitimidade, a prescrição do direito do autor e impugnou os demais factos alegados, opondo que a possibilidade de procedência do recurso era nula, por inexistir qualquer fundamento para a pretendida extinção da ação executiva. Pediu a condenação do autor como litigante de má-fé, em multa e indemnização.
Pronunciado o despacho saneador, após realização da audiência de julgamento com observância do formalismo legal, foi pronunciada sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, considero improcedente a pretensão deduzida pelo autor e dele absolvo o réu e a interveniente; Considero improcedentes os pedidos de condenação do autor como litigante de má-fé e deles o absolvo.” Inconformado, o autor recorreu da sentença e apresentou alegação da qual extraiu as seguintes conclusões: “1.ª Na aplicação do Direito, o Tribunal interpreta os factos provados e a matéria dada como não provada, pois só assim faz sentido a discussão da causa com produção de prova e a fixação daquela materialidade, para depois indagar, interpretar e aplicar as regras de Direito.
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Contudo, o Tribunal a quo fez uma errada interpretação da situação factual apresentada tanto pelo autor como pelo réu e, igualmente, fez uma incorrecta interpretação jurídica ao caso aplicável.
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Nos autos do Proc. n.º 1001/2002, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo, o executado, aqui autor, foi representado pelo advogado, aqui réu, Dr. C..., no âmbito de nomeação oficiosa, de 07.02.2003, para, no exercício da advocacia, o patrocinar em juízo, em processo instaurado pelo D..., S. A. contra o autor e mulher, pedindo o pagamento de € 74.460,19, acrescido de juros.
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Em 2005, quando o processo se encontrava em fase de negociação particular, foi junto aos autos cópia do documento remetido ao recorrente B..., e emitido pelo exequente D..., S. A., no qual este declara que “… o Cliente em epígrafe efectuou a entrega das quantias abaixo indicadas para pagamento de juros e amortizações de empréstimos contraídos, junto desta instituição de Crédito, com a aquisição/construção/beneficiação do imóvel destinado à sua habitação permanente… € 64.995,07 ” 5.ª Em 14.04.2008, o réu requereu a extinção da instância por pagamento e a consequente inutilidade superveniente da lide sustentando que a dívida exequenda se encontrava paga.
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Porém, por despacho de 28.10.2008, o tribunal ordena o prosseguimento da execução, considerando que o documento apresentado pelos executados não tinha relevância em termos de documento comprovativo do pagamento da quantia exequenda e indeferiu a requerida extinção da instância executiva com esse fundamento, tendo tal decisão sido notificada apenas ao réu, Dr. C..., que a não impugnou, nomeadamente, pela via do recurso, pelo que a mesma fez caso julgado formal impondo para o futuro a solução que decidiu, tornando indiscutível o resultado da aplicação do direito ao caso concreto que tenha sido realizada por decisão do tribunal, pelo que a mesma fez caso julgado formal, não proporcionando assim ao autor a possibilidade legal de recurso, que lhe daria razão e confirmaria tal valor efetivamente pago.
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O autor não requereu ao Tribunal que apreciasse as questões relacionadas com o documento bancário e se a questionada quantia foi ou não paga ao banco porque esse assunto já transitou em julgado.
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O que o autor pretendia do Tribunal a quo, ao intentar a presente acção, era que o mesmo apreciasse se o réu, na qualidade de advogado do autor devia ou não ter intentando recurso do questionado despacho judicial e se o facto de o não ter intentado representa ou não para o mesmo responsabilidade.
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Provada a culpa do réu, enquanto advogado nomeado, por não ter interposto recurso como devia, é inquestionável que a responsabilidade lhe seja atribuída, tendo em vista o prejuízo causado ao patrocinado e sendo impossível afirmar que o lesado obteria ganho de causa se o recurso tivesse sido interposto, é de aplicar o conceito de “perda de chance”, pois deve ser indemnizado a ausência da possibilidade de o constituinte ter tido a sua pretensão apreciada pelo Tribunal da Relação.
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Mas o Tribunal interpretou erradamente a causa de pedir e o respetivo pedido apreciando erradamente a matéria de facto, discutindo matéria de caso julgado, o que não podia ter feito, porquanto, nos termos do art.º 581.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, “Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
” e no disposto no art.º 628.º do mesmo Diploma legal, “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação.” 11.ª Sem conceder, tendo o Tribunal decidido discutir a causa de pedir e o pedido da execução em questão, é incompreensível que o Tribunal não tenha dado credibilidade às versões do autor e da testemunha E... e tenha dado importância à versão do réu apenas agora invocada quando foi o mesmo que juntou aos autos o documento bancário a título de quitação para os devidos efeitos legais.
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Igualmente, mal andou o Tribunal na apreciação que fez das testemunhas funcionários bancários que nada de relevante adiantaram e referiram que se o dinheiro houvesse sido depositado teria de ter entrado na conta de depósitos à ordem associada ao empréstimos bancário, deixando assim rasto documental, o que, como é consabido, pode não ter sido assim porque a operação bancária podia ainda não ter sido registada dessa forma, o que podia ser esclarecido em sede de recurso do questionado despacho e que não ocorreu, uma vez que não houve recurso.
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Na impugnação de tal matéria de facto, o Tribunal recorrido se pretendia apurar se o recurso a interpor pelo réu traria ou não ganho de causa ao autor, então após ter registado as versão do autor, do réu e das testemunhas, deveria ter inquirido os operadores judiciários envolvidos profissionalmente nas operações do referido processo de execução para assim confirmar de vez se o documento bancário em discussão questão era ou não verdadeiro e se o alegado pagamento da quantia exequenda, ou valor inferior em sede de negociação particular, foi ou não pago pelos executados.
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Nos termos do art.º 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou o documento superveniente impuserem decisão diversa.
” e no n.º 2 do mesmo artigo deste Diploma legal, “A Relação deve ainda, mesmo oficialmente:
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Ordenar a renovação da produção da prova quando houver...
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