Acórdão nº 3481/10.0TBVNG-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução11 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 3481/10.0TBVNG - A.P1-Apelação Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto-Juízo de Execução-J8 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Miguel Baldaia 2º Adjunto Des. Jorge SeabraSumário:I- A nulidade estatuída no artigo 615.º, nº 1 al. c) do CPCivil só se verifica quando o juiz deixe de conhecer as questões essenciais que decidem do mérito do pleito ou de um problema de natureza processual relativo à validade dos pressupostos da instância, quando colocados pelas partes, ou conheça hipótese inversa.

II- O diferimento de desocupação previsto nos artigos 864.º e 865.º do CPCivil constitui um meio de tutela excepcional, estando assim reservado aos casos nele previstos, ou seja, de execução para entrega de casa de habitação arrendada e, por força da remissão operada pelo art.º 150.º, n.º 5 do CIRE, também aos casos de entrega da casa de habitação onde resida habitualmente o insolvente a massa insolvente ou ao adquirente.

III- A restrição ao direito de propriedade em que se traduz o diferimento da ocupação só poderá ocorrer nos confinados casos previstos na lei e se verificados os pressupostos nela exigidos, estando vedada a sua aplicação analógica a outras situações que não as especificamente previstas.

IV- Não detendo a qualidade de insolventes ou arrendatários, a quem o legislador entendeu conferir, de forma exclusiva e nos estreitos termos definidos pelas als. a) e b) do nº 1 do art.º 864º, a tutela legal, não é de reconhecer aos meros detentores do imóvel vendido, ainda que relativamente a eles se verifiquem “razões sociais imperiosas” e cumpram algum dos critérios previstos nas referidas alíneas, o direito ao diferimento da desocupação.

* I - RELATÓRIOAcordam no Tribunal da Relação do Porto: Nos autos de execução que o Banco B…, SA move contra C…. veio D… residente na Rua … nº …, …, …, Vila Nova de Gaia deduzir o incidente de diferimento de desocupação do imóvel.

*O tribunal recorrido indeferiu o referido incidente por despacho de 01/06/2017 do seguinte teor: “Veio D…, na qualidade de ocupante do imóvel penhorado e vendido, apresentar o requerimento de fls. 185, requerendo que, nos termos conjugados dos artigos 861.° e ss. do C.P.C, o Tribunal ordene a suspensão da entrega e o diferimento da desocupação do imóvel por um período de 6 meses, tempo que, segundo a requerente, que se encontra grávida e tem uma filha menor, é suficiente para que possa dar à luz em paz e sossego, acompanhe os primeiros meses do recém-nascido e faça a mudança para a nova habitação, que lhe está prometida entregar para arrendamento.

A exequente, notificada para o efeito, pronunciou-se nos termos que constam de fls. 193 e ss., no sentido do indeferimento da pretensão.

Cumpre, pois, apreciar e decidir.

No caso dos autos, a requerente não é executada. Ademais, também não é arrendatária do imóvel, como ela própria reconheceu na missiva que enviou ao Sr. Agente de Execução e que consta do processo na notificação dela ao exequente, constante do PE com data de 17-03-2013 (cfr. ref. n.° 5634229).

Efectivamente, nessa missiva, a ora requerente expôs que efectuou um acordo com o executado em Setembro de 2009 (altura em que começou a ocupar a casa), nos termos do qual habitaria a casa durante 5 anos, sendo essa a forma do executado pagar uma alegada divida que tinha para com a requerente.

Ora, esses 5 anos há muito que terminaram, sendo certo que a requerente continuou a habitar o imóvel penhorado (aparentemente, sem ter pago qualquer contrapartida desde Outubro de 2014).

Observe-se, ademais, que a ora requerente foi nomeada depositária do imóvel em 16-07-2012 (cfr. fls. 75 e ss.) e em 11-01-2017 foi afixado, na porta do imóvel penhorado um edital de venda (cfr. fls. 177 a 178).

Vale isto por dizer que, compreendendo-se as alegadas dificuldades com que se depara a requerente, o por ela impetrado não tem "jus"”.

*Não se conformando com o assim decidido veio a interveniente interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte: I - O douto despacho recorrido que julgou improcedente o incidente de diferimento de desocupação e, em consequência, não atendeu ao pedido formulado pela Recorrente no mencionado incidente, não aplicou correctamente o direito.

II - O disposto no art.º 864.º do CPC, não pressupõe a existência de um contrato de arrendamento, nem a sua regularidade formal, mas simplesmente a determinar que, com as devidas adaptações, que se deve seguir aquele regime, numa perspectiva de salvaguarda do mínimo de dignidade humana, permitindo ao ocupante do imóvel, usar de um prazo de diferimento da desocupação da casa de habitação.

III – A Recorrente encontra-se grávida de 7 meses, conforme declaração médica junta aos autos e está sob vigilância médica por se tratar de uma gravidez de risco, por esse motivo e pela salvaguarda de direitos fundamentais de ordem social e familiar (o direito à habitação – art. 65º da Constituição da República), deverá ser concedido o diferimento da desocupação do imóvel.

IV - A Recorrente nesta fase final da gravidez, considerada de risco, não consegue diligenciar pela obtenção de uma qualquer habitação com condições de habitabilidade para o seu agregado familiar e com um valor de renda que possa ser suportado, sem colocar em causa a sua sustentabilidade económica.

V - Ao não se ter pronunciado, nem decidido sobre o pedido de diferimento de desocupação de imóvel formulado pela Recorrente, limitando-se a referir que a pretensão não tem “jus”, incorreu o Tribunal “a quo” em omissão de pronúncia o que, consequentemente, é gerador de nulidade, nos termos do art. 615º n.º 1, al. d) do C.P.C., que expressamente se invoca.

VI - No requerimento de...

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