Acórdão nº 581/16.7T8AMT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução24 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 581/16.7T8AMT.P1 Sumário do acórdão: I - É aplicável ao processo especial de revitalização (PER), o disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 212.º do CIRE II - Decorrendo da lei, que em primeiro lugar é dado pagamento aos créditos com garantias ou privilégios creditórios e o remanescente, se o houver, será distribuído pelos créditos comuns (artigos 174.º, 175.º e 176.º do CIRE), o plano de recuperação conducente à revitalização do devedor que distingue e privilegia um crédito hipotecário relativamente a um segundo patamar onde integra todos os créditos comuns, não viola o princípio da igualdade enunciado no n.º 1 do artigo 194.º do CIRE.

III - Estipulando-se no plano de recuperação, como a única alteração do crédito hipotecário, a modificação das condições de pagamento [período de carência de capital de 6 meses, com vencimento da primeira prestação no mês seguinte ao do trânsito em julgado da sentença que homologar o plano], deverá entender-se que tal estipulação preenche a previsão legal alínea a) do n.º 2 do art.º 212.º do CIRE.

Acordam no Tribunal da Relação do PortoI. Relatório Em 27.04.2016, B… e C…, casados um com o outro, apresentaram-se em Processo Especial de Revitalização, na Instância Central, Secção de Comércio (J3), Amarante, da Comarca do Porto, alegando, nomeadamente, que devem aos seus credores “valores que ascendem a 44.924,79€, mais concretamente aos 3 maiores credores: a. D…, a quem devem 30.000,00€; b. E…, a quem devem 4.000,00€; c. F…, a quem devem 4.000,00€.”.

Com o requerimento inicial, os requerentes apresentaram relação de créditos detalhada.

Por despacho de 29.04.2016, foi admitido liminarmente o processo especial de revitalização com fundamento no facto de o requerente marido ter alegado “factos demonstrativos de ser um empresário em nome individual”.

Em 19.05.2016, os requerentes solicitaram a retificação da relação de créditos, alegando que só por lapso identificaram a D… como credora hipotecária, sendo certo que tal posição é do G….

A Administradora Judicial Provisória apresentou a relação provisória de créditos, tendo os requerentes, em requerimento de 7.06.2016, impugnado a referida relação, por entenderem que a devem integrar os credores:

  1. Associação H…; b) IGF Segurança Social; c) F…, Lda.; d) I…; e e) Município de J….

    A Administradora Judicial Provisória respondeu à reclamação, concluindo no seu requerimento: «Por outro lado o CIRE relativamente a esta matéria é bastante omisso ficando a dúvida se devemos incluir ou não todos os créditos ou apenas os créditos reclamados.».

    Em 27-06-2016 foi proferido o seguinte despacho: «Decorre da informação prestada pela Sr.ª Administradora Judicial Provisória que nada tem a opor aos créditos objeto das impugnações apresentadas e que apenas os não incluiu na Lista de Créditos Reconhecidos por tais credores os não terem reclamado junto de si no prazo legal Ora, compulsada a Impugnação apresentada pelos devedores, verifica-se que nenhuma prova, designadamente documental foi apresentada e de onde o tribunal pudesse confirmar a existência de tais créditos objeto da impugnação apresentada.

    Assim sendo, por nenhuma prova ter sido produzida pelos Impugnantes quanto à existência dos créditos objeto da impugnação apresentada, sendo que também não foram os mesmos reclamados junto da Sr.ª Administradora Judicial Provisória pelos pretensos credores, julgo improcedente a impugnação apresentada.

    Notifique.».

    Em requerimento de 14.07.2016, a E… veio “nos termos dos arts. 17.º, n.º 4 e 211.º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas”, emitir voto desfavorável.

    Em 14.07.2016, vieram os requerentes juntar aos autos o plano de recuperação apresentado aos credores, propondo o pagamento dos créditos nos seguintes termos: «[…] ao G… SA* (Credor garantido), propõem-se as seguintes alterações contratuais: - Período de carência de capital de 6 meses.

    - Quanto às restantes condições contratualizadas, mantêm-se.

    - A primeira prestação de pagamento vence-se no mês seguinte ao do trânsito em julgado da sentença que homologar o plano de revitalização.

    Relativamente ao Credor Autoridade Tributaria**, propõe-se o seguinte: Face á impossibilidade económico-financeira de solver a dívida de uma só vez, propõe-se o pagamento da quantia em divida em 6 prestações, não sendo cada prestação de valor inferior a uma U.C. (102,00€). Ao montante da dívida de capital, em cada prestação, acrescerão os respetivos juros de mora (5,168%), vencidos até à data em que cada pagamento deva ter lugar. As prestações são iguais, mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira ate ao final do mês seguinte referente ao terminus do prazo previsto no n. 5 artigo 17 D CIRE. Requer-se dispensa de prestação de garantia, em virtude de não existir possibilidade de constituição de qualquer garantia idónea e suficiente, ou seja, existe manifesta falta de meios económicos para a prestar.

    Relativamente aos restantes Credores Comuns, propõe-se um perdão de 50% da quantia total reclamada e reconhecida, sendo pagos 50% que se liquidarão em 84 prestações mensais, iguais e sucessivas, com perdão total de juros vencidos e vincendos, e período de carência por 18 meses. A primeira prestação de pagamento vence-se no 19º mês seguinte ao do trânsito em julgado da sentença que homologar o plano de revitalização Todo o Plano fica subordinado à cláusula "salvo regresso de melhor fortuna".[…]».

    A Administradora Judicial Provisória veio juntar aos autos a ata de aprovação do plano, após o que foi proferida, em 25.07.2016, a seguinte sentença: «B… e C…, residentes na rua …, n.º …, …, Paredes, vieram instaurar o presente processo especial de revitalização.

    Conforme resulta de fls. 94 o plano de recuperação foi aprovado com uma proporção de 82,04%.

    Cumpre apreciar e decidir.

    Estipula o artigo 17.º-F, n.º 3, do C.I.R.E que ““Sem prejuízo de o juiz poder computar no cálculo das maiorias os créditos que tenham sido impugnados se entender que há probabilidade séria de estes serem reconhecidos, considera-se aprovado o plano de recuperação que:

  2. Sendo votado por credores cujos créditos representem, pelo menos, um terço do total dos créditos relacionados com direito de voto, contidos na lista de créditos a que se referem os n.ºs 3 e 4 do artigo 17.º-D, recolha o voto favorável de mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos e mais de metade dos votos emitidos corresponda a créditos não subordinados, não se considerando como tal as abstenções; ou b) Recolha o voto favorável de credores cujos créditos representem mais de metade da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto, calculados de harmonia com o disposto na alínea anterior, e mais de metade destes votos corresponda a créditos não subordinados, não se considerando como tal as abstenções”.

    Tendo em consideração estas normas, nada obsta à homologação judicial do plano de recuperação.

    Nenhum dos credores veio requerer a não homologação do plano de recuperação com fundamento nos artigos 215.º e 216.º, ambos do C.I.R.E.

    Não se verifica qualquer um dos fundamentos previstos no artigo 215.º e o artigo 216.º, do C.I.R.E. para obstar à homologação judicial de um plano de recuperação que mereceu a aprovação dos credores.

    Com efeito, qualquer plano de recuperação tem de conter uma alteração aos contratos – flexibilização do pagamento – que passa pela alteração de prazos, de juros, ou taxas de juros e, muitas vezes, do montante do capital em dívida. Se assim não fosse não se tratava de um plano de recuperação, se assim não fosse, isto é, se se mantivessem os créditos tal como são devidos, não haveria necessidade de um processo de revitalização, cumpriam-se as obrigações tal como foram constituídas.

    O processo de revitalização nada mais é que a formulação de um plano de pagamentos aos credores, desde que estes o aprovem, que encerra a seguinte filosofia – mais vale cumprir parte das obrigações do que não as cumprir de todo e aguardar o colapso...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT