Acórdão nº 841/14.1TYVNG-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução29 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 841/14.1TYVNG-A.P1 Sumário do acórdão: I. No Processo Especial de Revitalização (PER), podem ser reclamados créditos não vencidos, não sendo, no entanto, reclamáveis créditos futuros e hipotéticos II. A função relevante da lista definitiva de credores no PER é única e exclusivamente a de compor o quórum deliberativo previsto no artigo 17º-F, n.º 3 do CIRE, não tendo a decisão sobre as impugnações força de caso julgado fora do estrito âmbito do PER.

  1. Na tramitação do PER, a lei não prevê a “graduação” dos créditos reclamados, ao invés do que ocorre com o processo de insolvência, na medida em que, face ao único e exclusivo objetivo enunciado (composição do quórum deliberativo) e à inexistência de caso julgado fora do âmbito do PER, tal graduação revelar-se-ia inútil.

  2. O que efetivamente releva para o efeito pretendido pela lei, é, unicamente, para além da verificação do crédito, saber se o mesmo tem ou não natureza subordinada, não assumindo qualquer relevância para os efeitos previstos no n.º 3 do artigo 17.º-F do CIRE, o facto de ser comum, privilegiado ou garantido.

    Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Corre termos na Instância Central, 2.ª Secção Comércio, J3, de Vila Nova de Gaia, Comarca do porto, o Processo Especial de Revitalização (doravante designado por PER), da devedora B…, SA, tendo sido apresentada pelo Administrador Judicial Provisório a lista provisória de créditos constante de fls. 4 a 8.

    A credora C… impugnou os créditos da lista provisória reclamados pelos credores: D… e E… (credor nº 2), F… (credor nº 8), G…, SA (credor nº 11), H… e I… (credor nº 13), J… e L… (credor nº 14), M… e N… (credor nº 15), O… (credor nº 16), P… e Q… (credor nº 18), S… e T… (credor nº 28) e U… (credor nº 29).

    Alegou em síntese a reclamante: A Apelante reclamou créditos de natureza hipotecária que incidem sobre as fracções autónomas designadas pelas letras “A”, “B”, “C” “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “K”, “L”, “M”, todas destinadas a habitação, composta por 3 pisos, com entrada pelo nº… da Rua… e nº .. da Rua… e garagem pelo nº .. da Rua… e nº .. da Rua… que fazem parte integrante do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, constituído por edifício de três pisos, (piso -1, piso 0 e piso 1) sito na Rua…nºs .., …, … e …-A e Rua... nºs .., .. e …, da freguesia de …, inscrito na matriz sob a art. 8628 e descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 3203/2008626, como se atesta pela cópia da sua reclamação de créditos; sobre as frações supra mencionadas incide hipoteca voluntária registada a favor da reclamante na aludida Conservatória pela Ap. 22 de 2006/06/01; os credores impugnados deduziram reclamações de créditos com base na falta no cumprimento dos contratos promessa de compra e venda ou permuta, peticionando sinal em dobro e invocando o direito de retenção sobre as frações hipotecadas a favor da Apelante; os credores reclamados peticionaram o reconhecimento dos seus créditos a título de sinal em dobro, a que acresce o valor do imóvel que pretendem permutar e a compensação por despesas, invocando ainda o direito de retenção; no entanto, os contratos em causa têm eficácia meramente obrigacional e não foram incumpridos nem objeto de resolução por parte dos credores reclamantes; “in casu” quando muito, estamos perante mera mora, não havendo incumprimento definitivo; não estando os contratos definitivamente resolvidos, não é possível peticionar o reembolso dos sinais em dobro previsto no nº 2 do art. 442º do CC; face ao exposto, apenas podem ser reconhecidos créditos reclamados decorrentes do sinal e seus reforços prestados em singelo acrescido de eventuais despesas, tudo documental e comprovadamente justificado A 11 de Setembro de 2014, o Administrador Judicial Provisório notificou os credores da lista provisória retificada, a qual foi capeada por esclarecimento que se transcreve: “Não obstante a qualificação dos créditos reclamados não influir na percentagem de votos dos credores para efeitos de aprovação do Plano de Revitalização da Devedora, aproveita o signatário, relativamente aos credores arrolados sob os n.º 2, 4, 11, 13, 14, 16, 18, 19 e 28 da lista provisória de credores e que invocaram a existência de direito de retenção sobre os imóveis que lhes foram prometidos vender pela Devedora, para esclarecer que os créditos reclamados foram qualificados como créditos comuns na medida em que os contratos celebrados entre os referidos credores e a Devedora não se encontram por esta incumpridos definitivamente, nem foram os referidos contratos resolvidos pelos credores em questão, tendo os mesmos efeitos meramente obrigacionais e, não sendo ainda aplicável ao caso o disposto no art.º 442.º do Código Civil, considera o signatário não disporem os promitentes-compradores do direito de retenção previsto no art.º 755.º do CC.”.

    Em resposta à impugnação do credor C…, pronunciou-se o Administrador Judicial Provisório, de forma concordante, nestes termos: “Assiste razão à impugnante na alegação de que os créditos dos credores nºs 2, 4, 11, 13, 14, 16, 18, 19 e 28 que reclamaram créditos decorrentes da celebração dos contratos promessa de compra e venda deveriam ter sido reconhecidos em singelo e não dobro.

    De facto, tal decorreu de lapso na lista provisória pelo que o signatário desde já se redime (negrito e sublinhado nosso) Na verdade e conforme se expôs no requerimento que acompanhou a lista provisória de créditos rectificada, os créditos supra referidos foram qualificados como créditos comuns, na medida em que nenhum dos credores em causa alegou ou provou o incumprimento definitivo dos contratos promessa de compra e venda por parte da Devedora, razão pela qual não é aplicável ao caso o disposto no art. 442º do Código Civil e não foi reconhecido aos credores o direito de retenção sobre as fracções prometidas.

    Como consequência do referido, o crédito a reconhecer correctamente é o seguinte: Número na Lista Provisória/Nome/Crédito Reclamado/ Crédito Reconhecido 2.

    D… e E… (fração K); crédito reclamado = € 993.396,04; crédito reconhecido = € 469.698,02 - Permuta de € 270.000,00; - sinal de € 212.500,00 - obras de € 14.198,02.

    1. F… (Fração H); Crédito reclamado = € 1.162.953,88; crédito reconhecido = € 608.976,94 - sinal de € 545.600,00 - obras de 7.976,94,00 - indemnização de € 55.000,00.

    2. G…, SA (fração M); crédito reclamado = € 1.364.718,56; crédito reconhecido = € 658.715,16€ - permuta de € 300.000,00: - sinal de € 350.000,00 - obras de € 8.715,16 - outras despesas de € 24.716,24 (corresponde a €47.288,24 – € 22.572,00 respeitante a móveis).

    3. H… e I… (fração C); crédito reclamado = €1.081.268,79; crédito reconhecido = € 517.179,81 - permuta de € 275.000,00 - sinal de € 207.570,00 - despesas de € 34.609,81 (corresponde à soma de € 29.306,21+€ 5.303,60).

    4. J… e L… (Fração J); crédito reclamado = 1.355.431,60; crédito reconhecido = € 677.715,80 - permuta de € 355.000,00 - sinais de € 315.000,00 - obras de € 7.715,80.

    5. M… e N…; crédito reclamado = € 44.493,15; crédito reconhecido = € 20.000,00 (sinal em singelo).

    6. O… (fração E); crédito reclamado = € 1.327.614,38; crédito reconhecido = € 663.807,19 - permuta de € 395.000,00 - sinal de € 245.000,00 - obras de 23.807,19.

    7. P… e Q… (fração U); crédito reclamado = € 1.214.845,88; crédito reconhecido = € 622.122,94 - permuta de € 300.00,00 - sinal € 280.000,00 - obras € 12.722,94 - indemnização de €29.400,00.».

      Foi proferida sentença, na qual, no que concerne aos créditos em causa, se decidiu: Quanto aos credores D… e E… (crédito n.º 2): «Tal como os Credores Srs. D… e outra colocam a impugnação, existe, para estes, um interesse no cumprimento do contrato promessa.

      Por conseguinte, inexistem fundamentos para concluir que se verifica o incumprimento definitivo do contrato promessa de permuta celebrado.

      E, por isso, nestes termos, verdadeiramente, os Credores Srs. D… e outra não têm nenhum crédito constituído.

      O crédito só se constituirá se se verificar o incumprimento definitivo do contrato promessa celebrado. É nesse momento que os credores poderão exigir o pagamento do sinal em dobro e demais compensações. E é nesse momento que terão o direito de retenção.

      […] Assim, julga-se a impugnação dos Credores D… e E… parcialmente procedente e a impugnação da X…, relativamente a estes credores, improcedente, e reconhece-se aos credores D… e E… (credores nº 2), o crédito de €993.396,04, sob condição suspensiva (cfr. artº 50º, nº 1, do CIRE), crédito garantido (direito de retenção).» Quanto ao credor F… (crédito n.º 8): «Tal como o Credor F… coloca a impugnação, existe, para este, um interesse no cumprimento do contrato.

      Por conseguinte, inexistem fundamentos para concluir que se verifica o incumprimento definitivo do contrato promessa de compra e venda celebrado. Assim, o credor F… é, desde logo, credor da quantia de €55.000,00, relativo às mora pela realização de obras no imóvel prometido vender.

      Este crédito goza do direito de retenção e, por isso, é garantido.

      Este é o crédito que já se constituiu.

      A restante parte do crédito reclamado pelo credor não se constituiu.

      Com efeito, na restante parte, o credor F… só será credor se se verificar o incumprimento definitivo do contrato promessa celebrado. É nesse momento que o credor poderá exigir o pagamento do sinal em dobro e demais compensações. E é nesse momento que terá o direito de retenção, nesta parte.

      […] Assim, julga-se a impugnação do credor F… parcialmente procedente e a impugnação da X…, relativamente a este credor, improcedente, e reconhece-se ao credor F… (credor nº 8) - o crédito garantido, no valor de €55.000,00; - e o crédito de €1.107.953,88 (€1.162.953,88 - €55.000,00), sob condição suspensiva (cfr. artº 50º, nº 1, do CIRE), crédito garantido (direito de retenção).».

      Quanto à credora G…, SA (crédito n.º 11): «No PER, o reconhecimento dos créditos serve, apenas, para formar o quórum deliberativo para o plano de recuperação.

      […] A G… só será...

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