Acórdão nº 1871/10.8TBVCD-C.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução13 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

1871/10.8TBVCD-C.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto Recorrente(s): B… e C….

Recorrido(s): “D…, Lda”.

Comarca do Porto – Póvoa de Varzim - Instância Central - 2ª Secção Cível I - Relatório B… e C…, representadas pelo avô materno E…, filhas dos réus dos autos principais, F… e G…, interpuseram recurso de revisão, invocando como fundamento as alíneas c) e g) do art. 695º do C. P. Civil.

O tribunal recorrido decidiu no sentido de não haver sustentação legal para tal pedido, tendo, nos termos do art. 699º do C. P. Civil, indeferido o presente recurso de revisão.

Transcreva-se integralmente a decisão liminar em apreço para sua melhor elucidação em sede de recurso quanto aos fundamentos e parte dispositiva: “Dispõe o art. 695º (haverá aqui lapso pois trata-se do 696.º) do C. P. Civil que a decisão transitada em julgado – como é o caso da decisão proferida nos autos principais – só pode ser objecto de revisão quando, alínea c), se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida e, quando, nos termos da alínea g), o litígio assente sobre acto simulado das partes e o Tribunal não tenha feito uso do poder que lhe confere o art. 612º do C. P. Civil por não se ter apercebido da fraude.

Quanto a este fundamento, o da alínea g), a legitimidade para a sua interposição está estabelecida no art. 631º, nº3, do C. P. Civil, sendo a mesma conferida a terceiros que sejam prejudicados com a sentença.

Ora, não se vê como as filhas dos réus possam ser prejudicadas com a sentença.

O que está em causa é o património dos pais e não o seu, não havendo que lhes assegurar um putativo direito de herança, pois que, tratando-se de herdeiras legitimárias, a legitimidade dos herdeiros para agir quanto ao acto simulado em vida do simulador apenas existe quando o acto foi praticado com o intuito de o prejudicar. Estes factos não foram alegados, nem se admitem, no contexto da alegação das requerentes – art. 242º, nº2, do C. Civil.

Acresce que, mesmo na versão das requerentes, a alegada simulação não envolveu todas as partes, pois que a mãe não agiu simuladamente, pelo que não se verifica verdadeira simulação processual já que o litígio discutido pela R. era real e não simulado.

A alínea g) do art. 696º do C. P. Civil invocada pelas requerentes não permite assim a revisão da sentença proferida.

Quanto à alínea c) do mesmo normativo, as requerentes juntam aos autos documento que, em seu entender, comprova que a quantia que foi entregue ao marido pela autora do processo principal foi utilizada em proveito próprio deste, para benefício de uma sociedade que este constituíra.

Centram-se assim tais documentos na questão da finalidade do mútuo e da utilização da quantia mutuada.

Porém, como resulta claro da decisão proferida, e foi matéria apreciada no recurso de apelação que interpôs, o fundamento da comunicabilidade da dívida à ré, apesar de contraída apenas pelo réu, não foi o disposto no art. 1691º, nº1, alíneas c) e d), do C. Civil mas na alínea a) do mesmo normativo, ou seja, que a dívida foi contraída pelo réu dos autos principais com o consentimento da aqui requerente.

Ora, o documento apresentado não afasta este consentimento – agora negado mas que foi dado como provado na sentença e aceite pela ré nas suas conclusões das alegações de recurso a fls. 423 – pelo que os documentos juntos pelas requerentes não são suficientes para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

Não foi apresentado qualquer documento que abale este facto – o consentimento – pelo que, com os fundamentos invocados, não há motivo para a revisão da sentença proferida.

Pelo exposto, nos termos do art. 699º do C. P. Civil, o Tribunal indefere o presente recurso de revisão.

Custas pelas requerentes.

”*Inconformadas as requerentes interpuseram o recurso de apelação ora em apreciação, cujas conclusões são as seguintes: 1ª. As recorrentes, enquanto presuntivas herdeiras legitimárias de seus pais, têm plena legitimidade para invocarem, em vida destes, a simulação processual e por essa via interporem o recurso de revisão da sentença posta em crise no seu requerimento inicial.

  1. Não é correcta a afirmação contida no despacho recorrido de que “não se vê como as filhas dos réus possam ser prejudicadas com a sentença, pois que o que está em causa é o património dos pais e não o seu, não havendo que lhes assegurar um putativo direito de herança”, uma vez que, impondo a sentença revidenda a condenação dos pais das recorrentes no pagamento de uma obrigação pecuniária de € 195.000,00, acrescida dos juros moratórios vincendos após a sua citação, calculados à taxa legal, esta dívida constitui obviamente uma significativa diminuição do património dos seus pais, dessa forma prejudicando directamente a futura legítima das recorrentes.

  2. As razões que justificaram o tratamento específico dado aos herdeiros legitimários pelo nº 2 do artigo 242.º do Código Civil prendem-se com a particular natureza dos direitos sucessórios que lhes são reconhecidos, pois que a consistência prática do seu direito à legítima poderia ser posta em causa se não lhes fosse reconhecido o poder de, em vida do autor da sucessão, reagir contra actos simulados celebrados com a intenção de os prejudicar.

  3. O que está em causa não é um direito realmente existente, mas a expectativa jurídica que aos herdeiros legitimários a ordem jurídica reconhece, em vista da tutela preventiva dos interesses que a atribuição da quota legitimária visa assegurar, concedendo-lhes meios para invalidar actos lesivos das suas expectativas de, pela via sucessória, adquirir os bens dos seus pais.

  4. Nesta configuração legal e doutrinária, não podem as recorrentes conformar-se com a alegação do despacho recorrido de que as mesmas não alegaram factos de onde se extraia que o acto simulado foi praticado com o intuito de as prejudicar, já que o que estaria “em causa é o património dos pais e não o seu, não havendo que lhes assegurar um putativo direito de herança”, o que é uma conclusão errada face à ratio da lei.

  5. Efectivamente, a tutela...

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