Acórdão nº 1496/14.9T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução13 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 1496/14.9 T8PRT.P1 Comarca do Porto – Porto – Instância Local – Secção Cível – J2 Apelação Recorrentes: “B…, Lda.” e “C…, Lda.” Recorrida: “D…, SA” Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Maria de Jesus Pereira Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO A autora “D…, SA”, com sede na Av. …, nº …, Lisboa, intentou ação declarativa de condenação com processo comum contra as rés “C…, Lda.”, com sede na Rua …, nº .., Porto, “B…, Lda.”, com sede na Rua …, Ermesinde e “E…, Lda.”, com sede na …, lote .., …, Aveiro, pedindo a sua condenação solidária no pagamento da quantia de 36.301,86€, acrescida de juros, à taxa legal para os juros comerciais, desde a citação e até integral e efetivo pagamento.

Alega, em síntese, o seguinte: - Em 29.7.2013 ocorreu um incêndio nas instalações da segurada da autora – a sociedade “F…, Lda.” -, tendo a autora, em virtude desse sinistro, pago à sua segurada uma indemnização no montante de 34.149,36€.

- Pagou ainda à “G…” pelos serviços prestados com vista ao apuramento das circunstâncias do sinistro e dos prejuízos daí resultantes, a verba de 2.152,50€.

- O incêndio ficou a dever-se à projeção de faúlhas, para as instalações da segurada da autora, decorrentes da utilização de um maçarico na operação de corte e desmantelamento da central de betão que então estava a ser efetuada nas instalações da 1ª ré.

As rés apresentaram contestação, tendo a ré “B…, Lda.” pedido a condenação da autora como litigante de má-fé.

A ré “C…, Lda.” requereu a intervenção acessória da “Companhia de Seguros H…, SA”, o que foi deferido.

A autora pronunciou-se sobre o pedido, contra si formulado, de condenação como litigante de má-fé.

A “Companhia de Seguros H…, SA” também apresentou contestação.

Foi proferido despacho saneador, com identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo.

Seguidamente proferiu-se sentença que julgou a ação totalmente procedente e provada e, em consequência, condenou as três rés no pagamento solidário à autora da quantia de 36.301,86€, acrescida de juros de mora (juros comerciais) desde a citação até integral pagamento.

Inconformadas com o decidido, interpuseram recurso de apelação as rés “B…, Lda.” e “C…, Lda.” A ré “B…, Lda.” finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1º Os factos trazidos à douta apreciação deste Tribunal que conforme alega sob o nº 6º destas alegações e elencados sob as alíneas b) e c) que foram julgados como não provados, o que a nosso ver incorrectamente, devem ser considerados como provados o que resulta dos documentos já mencionados, dos depoimentos invocados no nº 8º destas alegações, com a indicação dos respectivos ficheiros, e, também do alegado pela A. na sua petição (artº 11º) e pela Seguradora H… no artigo 13º da sua contestação, e, invocado no nº 3º destas alegações, violando o disposto nos nºs 4 e 5 do artº 607º do C.P.C. que dispõem sobre a análise crítica e conjugadas as provas documental e testemunhal, e, as regras da experiência comum, e, os juízos de normalidade embora à luz do princípio da livre apreciação da prova; 2º Ainda, a sentença deixou de se pronunciar sobre a matéria invocada pela Recorrente nos artºs 6º, 10º, 11º, 12º, 13º, e, 15º da contestação, pois que era relevante que o Tribunal conhecesse como se desenvolveu a compra efectuada pela Recorrente, a venda feita à 3ª Ré, as condições de pagamento se a pronto pagamento ou terem tempo posterior, como igualmente era de considerar se a Ré se encontrava no local aquando do sinistro, muito embora se possa desde já defender que a Recorrente não estava presente; 3º Ao deixar de na sua fundamentação não considerar tal matéria, e, não analisar criticamente as provas, inclusivamente, os factos documentados, foi violado o nº 4 do artigo 607º do mesmo preceito, e, o nº 2 do artº 608 também do C.P.C.; 4º Igualmente, como resulta do que vem expondo, a sentença ao deixar de se pronunciar sobre a matéria daqueles artigos que traz a debate no nº 5, e, fls. 4 e 5 destas alegações, incorreu na nulidade prevista na al. d) do nº 1 do artº 615º do C.P.C. bem como o defendido sob o nº 7 da fundamentação de Direito evidencia uma notória ambiguidade pois que, por um lado, se admite a venda, por outro sem que tal tenha qualquer sustentação, defende-se que a Ré naquela data ainda não tinha vendido a sucata à 3ª Ré; 5º E, tal ambiguidade, resulta ainda do que na decisão se consigna quanto à sua responsabilidade por ter sido a Recorrente “quem escolheu” a 3ª Ré para desmantelar a central, o que, igualmente, gera a nulidade prevista na al. c) do último preceito citado que ora invoca, sendo irrelevante, e, sem fundamento o que se relata no último parágrafo desse nº 7 quanto à reparação de um portão das instalações da 1ª Ré assumida por K… que não é representante da Recorrente como na sentença se alude sem qualquer fundamento, pois que ninguém alegou, e, muito menos provou, pronunciando-se sobre uma questão que não lhe competia com violação da al. d) do nº 1 do citado artº 615º que, do mesmo passo, gera uma nulidade da sentença; 6º Ora, salvo o devido respeito, ao imputar à Recorrente qualquer responsabilidade na produção do sinistro, a douta sentença fez errada interpretação, e, aplicação do nº 2 do artº 493º do C.C. pois que a Recorrente não era proprietária da sucata, nem exercia à data do sinistro qualquer actividade ou estava envolvida na actividade descrita na petição inicial, e, consequentemente, ao considerar a Recorrente responsável solidariamente a sentença faz errada interpretação do nº 1 do artº 497º do C. C.

7º E, sem conceder, como invoca nos nºs 18º e 19º destas alegações, a sentença ao julgar perigosa a actividade referida faz errada interpretação e má aplicação do nº 3 do artº 493º do C. C.

Deve assim ser alterada a matéria julgada não provada e proferida decisão contrária à defendida na sentença recorrida, absolvendo-se a recorrente.

E, se outro for o entendimento, atentos os fundamentos invocados, deve revogar-se a douta sentença, ordenando-se que se supram as nulidades que foram invocadas com todos os efeitos legais.

Por seu turno, a ré “C…, Lda.” finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões: A.- A matéria de facto considerada provada na 1.ª instância deve ser modificada, com fundamento em erro na apreciação das provas, quanto às alíneas q) e uu), para estas passarem a considerar-se não provadas.

B.- As operações e tarefas de corte, desmantelamento, transporte e pesagem da sucata de ferro, não foram da autoria e execução da Ré recorrente. Pois, C.- Houve compra e venda do material de ferro destinado à sucata, sujeita a pesagem, com corte, desmantelamento, transporte e pesagem assegurados e por conta da 2.ª Ré.

D.- A Ré recorrente não estava obrigada a vigiar a execução dos trabalhos por forma a prevenir danos nos prédios vizinhos.

E.- A Ré recorrente nunca teve o exercício de autoridade e direcção sobre os autores dessas operações e tarefas.

F.- Sem facto positivo ou negativo do agente não pode haver responsabilidade.

G.- Os trabalhos de corte, desmontagem e remoção de ferro não podem ser considerados uma actividade perigosa e, no caso concreto, só existiria perigosidade nos instrumentos utilizados caso houvesse no local materiais inflamáveis, mas tal facto não resultou provado.

H.- Não existia razão para exigir à Ré recorrente cuidados especiais para a execução desses trabalhos por terceiros.

  1. Não tem aqui aplicabilidade qualquer presunção de culpa.

J.- A sentença recorrida violou, com erro na apreciação das provas e aplicação do direito, entre outras, as disposições legais dos arts. 483.º, 493.º, n.º 2, 497.º e 500.º do Cód. Civil e o art. 607.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil.

Pretende assim a sua revogação.

A autora respondeu a ambos os recursos pronunciando-se no sentido da confirmação do decidido.

Cumpre então apreciar e decidir.

*FUNDAMENTAÇÃO O âmbito do recurso, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Novo Cód. do Proc. Civil.

*As questões a decidir são as seguintes: I – Apurar se deve ser alterada a matéria de facto dada como provada e não provada (recursos das rés “B…” e C…); II - Apurar se a sentença recorrida padece de nulidade (recurso da ré “B…”); III – Apurar se no presente caso há lugar à aplicação do disposto no art. 493º, nº 2 do Cód. Civil - caraterização da atividade desenvolvida como perigosa (recursos das rés “B…” e C…); IV – Apurar se as rés “B…” e C… devem ser responsabilizadas solidariamente ao abrigo do art. 497º, nº 1 do Cód. Civil (recursos das rés “B…” e C…).

*É a seguinte a matéria de facto considerada provada pela 1ª instância:

  1. A A. é uma sociedade comercial que exerce a actividade seguradora.

  2. A 1ª R. é uma sociedade comercial que se dedica à construção civil.

  3. A 2ª R. é uma sociedade comercial que se dedica ao aluguer de máquinas e equipamentos para a construção e engenharia civil.

  4. A 3ª R. é uma sociedade comercial que se dedica à indústria de reciclagem, limpezas ambientais industriais e similares, comércio e indústria de materiais siderúrgicos metalomecânicos, gestão global de resíduos e desmantelamentos industriais.

  5. Por meio da apólice nº …….., a A. e a sociedade “F…, Lda.”, que se dedica à gestão de instalações desportivas, celebraram um contrato de seguro multirriscos, com início em 1.1.2007, pelo prazo de um ano e seguintes, com as coberturas, entre outras, de incêndio, raio e explosão (até ao limite de € 65.000), bens do senhorio (até € 1.250), demolição e remoção de escombros (até 5% dos prejuízos indemnizáveis) e prejuízos indirectos (até € 19.500), o qual teve por objecto os seguintes bens, que compunham o recheio das suas instalações, sitas na R. …, …/…, no Porto: equipamento de bar (€...

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